• Nenhum resultado encontrado

4.5 Resultados obtidos

4.5.2 Estrutura coronal

As observa¸c˜oes espectrosc´opicas da corona confirmaram a existˆencia da risca de emiss˜ao loca- lizada na regi˜ao do verde (1474 da escala de Kirchhoff)126 anteriormente observada no eclipse de 1869 (figura 4.10). Para a sua origem foram apresentadas v´arias propostas, entre as quais

Figura 4.10: Espectro da corona observado em Augusta pela expedi¸c˜ao italiana (imagem inferior), para efeitos de compara¸c˜ao a imagem inclui tamb´em o espectro solar (Santini, 1872)

a de que era uma risca de ferro origin´aria de um poss´ıvel material meteor´ıtico que circun- dava o Sol ou mesmo a existˆencia de um novo elemento, mais tarde chamado “coronium”. Apenas nos anos 40 do s´eculo XX foi apresentada a explica¸c˜ao f´ısica para esta observa¸c˜ao. Sabe-se hoje que esta risca corresponde a uma transi¸c˜ao proibida do ferro ionizado devido `as condi¸c˜oes f´ısicas muito especiais em que se encontra a corona, em particular, alta tempera- tura e muito baixa densidade.127 Uma temperatura da ordem do milh˜ao de graus Kelvin era algo inimagin´avel em 1870.

Um resultado mais importante foi obtido atrav´es da compara¸c˜ao das imagens da corona - fotografias e desenhos - obtidas durante a totalidade. Willard, da expedi¸c˜ao americana em C´adiz e Brothers, na Sic´ılia conseguiram obter fotografias da corona. Ap´os colocar as foto- grafias e um desenho de Watson efectuado na Sic´ılia na mesma escala e orienta¸c˜ao, Brothers concluiu que n˜ao existia a menor d´uvida sobre a coincidˆencia entre as localiza¸c˜oes das di- ferentes estruturas coronais em particular as dos espa¸cos escuros nas trˆes imagens (figura 4.11).128 Tendo as observa¸c˜oes sido efectuadas em duas localiza¸c˜oes geogr´aficas afastadas,

Sul de Espanha e Sic´ılia, esta constata¸c˜ao colocava em causa a hip´otese que atribu´ıa a origem da corona `a atmosfera terrestre, visto que n˜ao era esperado que a resposta da atmosfera fosse similar em locais e tempos diferentes. John Herschel, por exemplo, considerou que

Assuredly the decidedly marked notch or bay in both photographs (those taken at Cadiz and Syracuse) agreeing so perfectly in situation (marked so definitely by its occurrence just opposite the middle point between two unmistakable red prominences) is evidence not to be refused of its extra atmospheric origin, and almost conclusive of its proximity to the solar globe. I see nothing which gives me the idea of rays or streaky irradiation [...] which, if it could be believed, would point to lunar mountains as the origin of the dark spaces, and bring

126

Comprimento de onda de 531,7 nm.

127

Dewhirst, David e Hoskin, Michael: Cambridge Illustrated History of Astronomy. Cambridge: Cambridge University Press. 1997. – Cap´ıtuloThe Message of Starlight: The Rise of Astrophysics, p. 217.

128

Brothers, A.: Photographs of the Eclipse. Nature, 3 1871a, Nr. 71; Brothers, A.: Photographs of the Solar eclipse of Dec. 21-22, 1870. Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 31 Mar¸co 1871b.

Figura 4.11: Esquema comparativo das v´arias estruturas coronais segundo o desenho de Watson e as fotografias de Willard e de Brothers (Brothers, 1871a)

the whole phenomenon within the distance of the lunar orbit. A terrestrial- atmospheric origin is quite out of question”.129

Brothers ainda verificou que

When prints from the second and fifth negative are combined stereoscopically the effect of relief is produced. In the interval of 73 seconds, the Moon has changed her place sufficiently to show that the corona, is not an atmospheric phenomenon. If it had not happened that the great rift, occuring between the two prominences shown so distinctly in the American and my own photographs, had decided the solar origin of the corona, these two photograhs would probably have been sufficient for the purpose.130

Contudo, nem todos os observadores concordaram com esta interpreta¸c˜ao. Por exemplo, Norman Lockyer concluiu da an´alise das mesmas fotografias que

the rifts were not identical, that the two cameras had not photographed the same pheno- menon, although at first it appears to be sufficient similarity to make the matter appear doubtful.131

Acumulavam-se, contudo, os ind´ıcios que apontavam correctamente para uma origem solar da corona. O relat´orio apresentado na reuni˜ao anual da Royal Astronomical Society em 1871 considerou cautelosamente que

There may exist at least three distinct sources of the light seen about the Sun, in addition to the prominences, the corona, a solar halo overlapping the corona or beginning at its exterior limit, and an atmospheric halo produced by the scattering of the light by our atmosphere.132

E qual foi o resultado obtido pela expedi¸c˜ao portuguesa? Segundo o relat´orio elaborado pela comiss˜ao,

No dia 21 de Dezembro achando-se tudo preparado e disposto; cheios de esperanc¸a todos os vogaes da Commiss˜ao pela belleza e esplendor, com que se havia apresentado este dia; esperavam que lhes seria propicio o dia seguinte, permittindo-lhes colherem os fructos de tantos trabalhos, incommodos e 129

Brothers, A.: Photographs of the Solar eclipse of Dec. 21-22, 1870. Monthly Notices of the Royal Astronomical Society, 31 Mar¸co 1871b.

130

Ibidem

131

Lockyer, J. N.: The mediterranean eclipse, 1870 - part II. Nature, 3 1871, Nr. 69.

132

Council RAS: Notes on some points connected with the progress of astronomy during the past year. The Total Solar Eclipse, Dec. 22, 1870. MNRAS , 31 Fevereiro 1871, p. 114.

fadigas, que com grande responsabilidade e vivo interesse pela sciencia sobre si haviam tomado n˜ao se prestaram porem as caprichosas vicissitudes atmosphericas a que se realizassem os justos e louvaveis desejos, de quem s´o pertendia cumprir os seus deveres, e colher alguma pequena gloria para o seu paiz; o amanhecer do dia 22 de Dezembro de 1870 na estac¸˜ao de Sto Antonio apresentou-se carregado de densas e escuras nuvens para o lado do O N O; o vento refrescando comsigo trouxe repetidos aguaceiros; e o c´eo toldando-se completamente, assim se conservou quase todo o dia: apenas portanto se poderam fazer as observac¸˜oes meteorologicas.133

4.6

Em resumo

Conscientes da importˆancia de aproveitar a oportunidade providenciada pelo eclipse de 22 de Dezembro de 1870, os professores da Faculdade de Matem´atica da Universidade de Coimbra peticionaram o governo com vista a constituir-se uma expedi¸c˜ao de observa¸c˜ao. O apoio governamental e o interesse igualmente demonstrado por Filippe Folque, director do Ob- servat´orio da Marinha implicou, por fim, a colabora¸c˜ao de v´arias institui¸c˜oes nacionais - observat´orios astron´omicos de Coimbra, Lisboa e Marinha, observat´orios meteorol´ogicos e Magn´eticos de Coimbra e Lisboa, Instituto Industrial de Lisboa, Escola Polit´ecnica de Lis- boa e Universidade de Coimbra - o que permitiu obter sinergias importantes a n´ıvel das competˆencias t´ecnicas e cient´ıficas dispon´ıveis. A tabela indica os v´arios intervenientes deste processo bem como a institui¸c˜ao a que pertencem. A observa¸c˜ao do eclipse foi, assim, um verdadeiro esfor¸co nacional.

Nome Institui¸c˜ao

Jacome Sarmento de Vasconcellos Fac. de Matem´atica e Obs. Astron´omico, UC Luiz Albano Moraes e Almeida Fac. de Matem´atica e Obs. Astron´omico, UC Antonio dos Sanctos Viegas Fac. de Filosofia, UC

Julio Augusto Henriques Fac. de Filosofia, UC Antonio Pedro Leite Obs. Meteorol´ogico, UC

Francisco Ant´onio de Miranda Ex. funcion´ario do Obs. Astron´omico, UC Filippe Folque Obs. da Marinha (*)

Jo˜ao Carlos de Brito Capello Obs. Meteorol´ogico Infante D. Luiz

Frederico Augusto Oom Direc¸c˜ao Geral dos Trabalhos Geod´esicos (*) Antonio Augusto d’Aguiar Escola Polit´ecnica de Lisboa

Jos´e Mauricio Vieira Instituto Industrial

Tabela 4.3: Afilia¸c˜ao dos membros da expedi¸c˜ao portuguesa presentes em Tavira. (*) Filippe Folque e Frederico Augusto Oom pertenciam `a Direc¸c˜ao Geral dos Trabalhos Geod´esicos do Reino, institui¸c˜ao respons´avel, nesta altura, pelo Observat´orio Astron´omico da Tapada da Ajuda que ainda se encontrava em constru¸c˜ao

Pretendendo, desde o in´ıcio, efectuar observa¸c˜oes que pudessem ser relevantes no pano- rama internacional, os cientistas portugueses contactaram os seus cong´eneres estrangeiros com vista a obterem informa¸c˜oes. Os observadores portugueses estavam perfeitamente in- formados dos principais aspectos a serem estudados durante o eclipse de 22 de Dezembro de 1870. Apercebendo-se, tamb´em, das vantagens de obter experiˆencia pr´atica na nova t´ecnica da espectroscopia, um dos membros da comiss˜ao, Santos Viegas, foi enviado para estudar em It´alia. Nos dias anteriores ao eclipse fizeram-se experiˆencias fotogr´aficas e espectrosc´opicas.

133

Contando com um generoso patroc´ınio governamental foram adquiridos os instrumentos ne- cess´arios e onze observadores deslocaram-se at´e Tavira. Na tabela 4.4 comparam-se algumas das despesas efectuadas pelos governos de diversos pa´ıses com a observa¸c˜ao do eclipse de 1870.134 O valor apresentado para Portugal inclui apenas as despesas efectuadas com a

Subs´ıdio

Pa´ıs Moeda do pa´ıs Francos Nota

Espanha 7500 pesetas 6900 S´o expedi¸c˜ao do Obs. de Madrid Fran¸ca 5000 francos 5000

Gr˜a-Bretanha 2500 libras 57500 Exclui transporte pela Royal Navy Portugal 5620 mil r´eis 31400 Valor m´ınimo

Tabela 4.4: Despesas governamentais efectuadas com a observa¸c˜ao do eclipse de 22 de Dezembro de 1870

maior parte dos instrumentos encomendados a Repsold (tabela 4.2, pagina 150) e a viagem de Santos Viegas. N˜ao conseguimos, em particular, encontrar informa¸c˜ao sobre os custos das viagens para o Algarve e a despesa associada `a permanˆencia da comiss˜ao em Tavira. Tendo em conta o or¸camento apresentado pela comiss˜ao da Universidade de Coimbra em Janeiro este valor poderia ascender a um conto de r´eis (tabela 4.1, p´agina 145). Tamb´em n˜ao conseguimos obter estimativas das despesas efectuadas pelas expedi¸c˜oes norte-americanas.

Da an´alise da tabela 4.4 verifica-se que o governo portuguˆes despendeu uma verba pelo menos igual a metade da do seu cong´enere britˆanico. O baixo valor despendido pelo governo espanhol compreende-se pelo facto de que o Observat´orio de Madrid possu´ıa v´arios instru- mento que tinham sido adquiridos para a observa¸c˜ao do eclipse de 18 de Julho de 1860, ou seja, encontrava-se numa situa¸c˜ao diferente da portuguesa.

Apesar de alguns percal¸cos e de possuir apenas uma esta¸c˜ao de observa¸c˜ao, a expedi¸c˜ao portuguesa esteve ao n´ıvel do que de melhor se fez internacionalmente. A n˜ao obten¸c˜ao de resultados devido `as condi¸c˜oes atmosf´ericas era algo que estava para l´a do controlo humano. Ap´os a “mallograda campanha ao Algarve” ficaram, contudo, em territ´orio nacional os instrumentos e os saberes entretanto adquiridos. O seu impacto no desenvolvimento da astronomia portuguesa ser´a analisado nos pr´oximos dois cap´ıtulos.

134

Ministre de l’Instruction Publique: Lettre `a l’Acad´emie. Comptes Rendus de l’Acad´emie des Sciences de Paris, 71 1870; Council RAS: Notes on some points connected with the progress of astronomy during the past year. The Total Solar Eclipse, Dec. 22, 1870. MNRAS , 31 Fevereiro 1871; Folque, Fillipe: Relatorio da Commiss˜ao. 1871; Arroyo, Manuel L´opez: El Real Observatorio Astron´omico de Madrid (1785-1975). Direcci´on General del Instituto Geogr´afico Nacional. 2004.

... o mundo marcha, as instituic¸ ˜oes carecem de ser aperfeic¸oadas todos os dias, `a medida que progride a civilizac¸ ˜ao, e quem estiver parado recua.

Ant ´onio Jos ´e de ´Avila, Duque de ´Avila e Bolama

5

Sinais contradit ´orios em Coimbra: 1870–99

A 30 de Dezembro de 1870 realizou-se a ´ultima reuni˜ao da comiss˜ao respons´avel pela ob- serva¸c˜ao do eclipse solar. Nesta reuni˜ao ficou definido que os diferentes membros da comiss˜ao deveriam enviar os seus relat´orios preliminares a Filippe Folque que, na qualidade de pre- sidente da comiss˜ao, elaboraria o relat´orio final a ser apresentado ao governo. Decidiu-se, tamb´em, por unanimidade

manifestar ao governo de S. M. a conveniencia de distribuir pelos estabelecimentos physico-astronomicos do reino os instrumentos novos que haviam sido postos ´a sua disposic¸˜ao, para o fim de se continuarem os estudos a que haviam sido destinados.

Num of´ıcio datado de 2 de Janeiro, a comiss˜ao propˆos ao governo que os instrumentos fossem distribu´ıdos da seguinte forma

• Oculo no1 com um dos spectroscopios de Merz fossem entregues ´a Faculdade de Philosophia

para serem depositados no gabinete de physica para uso do professor de optica

• Oculo no2 com o outro spectroscopio de Merz fossem entregues ao Real Observatorio Astrono- mico de Lisboa

• Oculo no3 fosse entegue no Observatorio Meteorologico do Infante D. Luiz.

• Oculo no4 ou o Photoheliographo fosse entregue ´a Faculdade de Mathematica para ser deposi- tado no Observatorio Astronomico de Coimbra pauso do professor da Astronomia pratica1

O governo acedeu, na generalidade, a este pedido e, pela portaria de 4 de Janeiro de 1871, estipulou que

• o oculo numero um, com o spectroscopio correspondente de Merz, ´e destinado ´a facul- dade de philosophia da Universidade de Coimbra

• o oculo numero dois, com o o outro spectroscopio, ao real observatorio astronomico da Tapada

• o oculo numero tres, com um dos spectroscopios encommendados a Hofman [sic.], ao observatorio do Infante Dom Luiz

• o oculo numero quatro, com todas as pe¸cas correspondentes e com o outro espectros- copio encommendado a Hofman , ´a faculdade de mathematica.2

Note-se a existˆencia de uma diferen¸ca subtil entre a proposta da comiss˜ao e a portaria go- vernamental. A portaria removeu a especificidade da utiliza¸c˜ao dos instrumentos destinados `a Universidade pelos professores de Optica e de Astronomia pratica. Os instrumentos foram atribu´ıdos `as Faculdades de Filosofia e de Matem´atica que, n˜ao s´o eram respons´aveis pela lecciona¸c˜ao das disciplinas de Optica e de Astronomia pratica, como tamb´em, pelo menos em teoria, pelos observat´orios Meteorol´ogico e Astron´omico da Universidade, respectivamente.

1

Folque, Fillipe: Relatorio da Commiss˜ao. 1871.

2

Abreu, Jos´e Maria de: Carta ao Reitor, 7 de Janeiro. 1871.

Por outro lado, esta decis˜ao contrasta com a de atribuir o “oculo numero tres” ao Obser- vat´orio do Infante Dom Luiz, uma dependˆencia da Escola Polit´ecnica de Lisboa. A atribulada rela¸c˜ao existente na ´epoca entre o director do Observatorio Astron´omico e a Faculdade de Matem´atica explica esta discrepˆancia, como veremos mais tarde.

Neste cap´ıtulo vamos analisar as tentativas efectuadas com vista a implementar os estudos astrof´ısicos na Universidade de Coimbra e, em particular, verificar qual o impacto dos novos instrumentos atribu´ıdos pelo governo em 1871. A compreens˜ao das decis˜oes tomadas na defini¸c˜ao dos objectivos cient´ıficos do Observatorio Astron´omico, na d´ecada de 70, obrigou- nos a analisar a sua actividade nas d´ecadas anteriores, nomeadamente o trabalho desenvolvido na publica¸c˜ao das Efem´erides (sec¸c˜ao 5.1), bem como a sua organiza¸c˜ao institucional (sec¸c˜ao 5.2). Na sec¸c˜ao 5.3 daremos conta da implementa¸c˜ao dos estudos astrof´ısicos na Faculdade de Matem´atica (5.3.1), da evolu¸c˜ao da actividade cient´ıfica do Observat´orio Astron´omico (5.3.2) e da instala¸c˜ao e utiliza¸c˜ao dos instrumentos destinados `a Faculdade de Filosofia no Observat´orio Meteorol´ogico e Magn´etico da Universidade (5.3.3).

A an´alise do impacto dos novos instrumentos no desenvolvimento da astronomia nas institui¸c˜oes de Lisboa ser´a efectuada no cap´ıtulo 6.

5.1

As efem´erides do Observat´orio Astron´omico

As efem´erides astron´omicas permitiam a astr´onomos e navegadores conhecer, antecipada- mente, as posi¸c˜oes de v´arios corpos celestes e as circunstˆancias de eclipses do Sol, Lua, trˆansitos, oculta¸c˜oes, etc. As aplica¸c˜oes n´auticas que resultavam do conhecimento adequado do c´eu implicaram n˜ao s´o a cria¸c˜ao, no s´eculo XVII, dos observat´orios de Paris e de Gre- enwich, como deram um forte est´ımulo `a publica¸c˜ao regular de efem´erides astron´omicas. Em 1679 ´e publicado, em Fran¸ca, o primeiro volume de La Connoissance des temps, ou calendrier

et ´eph´em´erides du lever & coucher du soleil, de la lune, & des autres plan`etes, habitualmente

conhecida por Connaissance des Temps, sucessora directa da s´erie de efem´erides publicada por Kepler, a partir de 1617. Posteriormente, outras efem´erides foram publicadas em v´arios pa´ıses europeus. A tabela 5.1 indica as mais antigas que sobreviveram at´e ao s´eculo XX em- bora nem sempre em publica¸c˜ao cont´ınua, por exemplo, as efem´erides de Coimbra sofreram duas interrup¸c˜oes durante o s´eculo XIX.

Pa´ıs Publica¸c˜ao Referente ao ano de Efem´eride

Fran¸ca 1678 1679 Connaissance des Temps

Inglaterra 1766 1767 The Nautical Almanac

Alemanha 1774 1776 Berliner Astronomisches Jahrbuch

Espanha 1791 1792 Almanaque n´autico y efem´erides astron´omicas

Portugal 1803 1804 Ephemerides Astronomicas de Coimbra

Tabela 5.1: As mais antigas efem´erides astron´omicas em publica¸c˜ao durante o s´eculo XX. A data corresponde ao ano de publica¸c˜ao do primeiro volume

Inicialmente, diferentes efem´erides baseavam-se em diferentes modelos do movimento dos corpos celestes, diferentes constantes astron´omicas, diferentes meridianos de referˆencia e di- ferentes escalas. As discrepˆancias entre os valores calculados e os observacionais estimulavam a procura de melhores hip´oteses iniciais. Como consequˆencia, a precis˜ao das previs˜oes foi sendo, interactivamente, incrementada.

A publica¸c˜ao por parte do Observat´orio Astron´omico da Universidade de Coimbra, das

de Coimbra surgiu como consequˆencia directa da carta r´egia de 4 de Dezembro de 1799 que

regulamentou a institui¸c˜ao.3 No artigo s´etimo desse regulamento ordenava-se que

Para o Meridiano do Observatorio, e para uso delle (assim como se pract´ıca nos mais celebres da Europa) se calcular´a huma Ephemeride Astronomica, a qual igualmente possa servir para o uso da Navega¸ca˜o Portugueza. Esta Ephemeride n˜ao ser´a reduzida, e copiada do Almanak do Observatorio de Greenwich, nem de outro algum, mas calculada sobre as Taboas Astrono- micas. E para sahir sempre com a antecipa¸ca˜o conveniente, para ser a tempo transportada aos Paizes mais distantes, come¸car-se-h´a logo pelo trabalho da que hade servir no anno de mil outo centos e quatro, e depois della nas dos seguintes.

O primeiro volume das efem´erides de Coimbra para o anno de 1804 ´e dado `a estampa em 1803 (figura 5.1), doze anos ap´os o in´ıcio do Almanaque n´autico de San Fernando (Cadiz,

Espanha). As v´arias inova¸c˜oes implementadas na elabora¸c˜ao destas efem´erides, surgidas do g´enio criativo do primeiro director do observat´orio, Monteiro da Rocha, levaram a que a sua publica¸c˜ao n˜ao passasse despercebida a n´ıvel internacional. Na apresenta¸c˜ao do primeiro volume `a Acad´emie des Sciences de Paris, na sess˜ao de 1 de Junho de 1804,4 Delambre ter´a

afirmado que

eu n˜ao me atreveria a entreter a classe com uma obra deste genero, se a Ephemeride da Uni- versidade de Coimbra n˜ao fosse uma obra inteiramente distincta de todas, quantas apparecem com este titulo, e a mais rica em mudan¸cas uteis, e em Memorias ´acerca dos pontos delicados em Astronomia.5

Duas das novidades introduzidas por Monteiro da Rocha nas efem´erides coimbr˜as foram efectuar todos os c´alculos em tempo m´edio, contrariamente ao uso institu´ıdo, e apresentar as distˆancias da Lua aos planetas. Ambas as inova¸c˜oes foram, posteriormente, adoptadas noutras publica¸c˜oes similares. Em particular, a utiliza¸c˜ao do tempo m´edio foi recomendada pela comiss˜ao do Council of the Astronomical Society6 encarregada de analisar as melhorias a introduzir no Nautical Almanac por instiga¸c˜ao do almirantado britˆanico.7

The attention of the Committee was, in the first instance, directed to a subject of general importance, as affecting almost all the results in the Nautical Almanac; viz., whether the quantities therein inserted should in future be given for apparent time (as heretofore), or for mean solar time. Considering that the latter is the most convenient, not only for every purpose of Astronomy, but also (from the best information they have been able to obtian) for all the purposes of Navigation; at the same time that it is less laborious to the computer, and has already been introduced with good effect into the national Ephemerides of Coimbra and Berlin, the Committee recommend the abolition of the apparent time in all the computations of the Nautical Almanac; excepting only the place, &c of the sun at the time of its transit