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2.7 O eclipse solar de 15 Mar¸co de 1858

3.1.1 Modelo solar

Ap´os a inven¸c˜ao do telesc´opio astron´omico, em 1609, o estudo das manchas solares teve um r´apido desenvolvimento. Fabricius21 publicou, em 1611, o primeiro livro sobre as manchas.

Num curto intervalo de tempo, os primeiros observadores telesc´opicos, Fabricius, Galileu, Harriot e Scheiner,22 conclu´ıram que as manchas pertenciam ao Sol, localizavam-se essenci- almente numa banda equatorial e, atrav´es destas, estimaram o per´ıodo de rota¸c˜ao solar e a inclina¸c˜ao do eixo de revolu¸c˜ao. Estes pioneiros ainda reconheceram a existˆencia de zonas visualmente mais brilhantes que a fotoesfera - as f´aculas.23 Ap´os este empenho inicial e, em- bora existam indica¸c˜oes de que o Sol continuou a ser observado,24 a baixa actividade solar, isto ´e, o baixo n´umero de manchas solares neste per´ıodo25 ´e uma explica¸c˜ao prov´avel para a

falta de descobertas significativas, durante o resto do s´eculo XVII e a maior parte do s´eculo XVIII.26 Novo avan¸co ocorre em 1774. Wilson27 prop˜oe, ent˜ao, um modelo geom´etrico para explicar a altera¸c˜ao da forma vis´ıvel das manchas quando estas se aproximam do limbo solar (figura 3.2).28 Neste modelo, as manchas s˜ao depress˜oes na superf´ıcie do Sol, resultando a

Figura 3.2: Ilustra¸c˜ao do efeito de Wilson (Secchi, 1875)

altera¸c˜ao da sua forma quando observada da Terra de um efeito de projec¸c˜ao como se ilustra na figura 3.3. Observa¸c˜oes posteriores efectuadas durante o fim do s´eculo XVIII e primeira metade do s´eculo XIX, pareciam confirmar esta interpreta¸c˜ao. Uma das mais originais foi efectuada por Warren De la Rue que obteve uma “sterescopic picture of a sun-spot, and some surrounding faculae” e que conclui que

the faculae occupy the highest positions of the sun’s photosphere, the spots appearing like holes in the penumbrae, which appeared lower than the higher regions surrounding them; in one case parts of the faculae were discovered to be sailing over a spot, apparently at some considerable height above it.29

21

Johann Fabricius (1587–1616?).

22

Galileo Galilei (1564–1642), Thomas Harriot (1560–1621) e Christoph Scheiner (1575?–1659).

23

Meadows, A. J.: Early Solar Physics. Oxford: Pergamon Press. 1970.

24

Vaquero, J. M.: Historical sunspot observations: A review. Advances in Space Research, 40 2007, e referˆencias do artigo.

25

O m´ınimo de Maunder ocorre aproximadamente entre 1650 e 1720.

26

Soon, Willie Wei-Hock e Yaskell, Steven H.: The Maunder minimum and the variable Sun-Earth connection. World Scientific. 2003.

27

Alexander Wilson (1714–1786).

28

Wilson, Alexander: Observations on the Solar Spots. Philosophical Transactions of the Royal Society of London, 64 1774, Nr. 1.

29

Rue, Warren de la: The Bakerian Lecture - On the Total Solar Eclipse of July 18th, 1860. Philosophical Transactions of the Royal Society of London 152 1862; Meadows, A. J.: Early Solar Physics. Oxford: Pergamon Press. 1970.

Hoje pensa-se, contudo, que este efeito de Wilson resulta da maior transparˆencia ´optica das manchas quando comparada com a da fotoesfera circundante.30

Figura 3.3: Interpreta¸c˜ao do efeito de Wilson (Secchi, 1875)

Depois de se interessar pelo estudo do Sol, William Herschel31prop˜oe, no in´ıcio do s´eculo

XIX, 1801, um modelo para a constitui¸c˜ao f´ısica do Sol. Neste modelo, o Sol ´e um corpo frio rodeado por duas camadas esf´ericas de nuvens. A camada exterior ´e luminosa enquanto que a interior apenas reflecte a radia¸c˜ao n˜ao emitindo luz pr´opria. As manchas solares correspon- deriam a aberturas em ambas as camadas de nuvens. A penumbra e umbra corresponderiam `a observa¸c˜ao da camada n˜ao luminosa e da superf´ıcie fria do Sol, respectivamente (figura 3.4). A existˆencia de uma superf´ıcie solar fria leva mesmo William Herschel a conjecturar

Figura 3.4: Estrutura do Sol segundo William Herschel: (1) camada atmosf´erica exterior luminosa; (2) camada atmosf´erica interior opaca; (3) n´ucleo solar (Secchi, 1877)

a poss´ıvel existˆencia de habitantes solares.32 Este vago modelo n˜ao ´e mais do que uma ela-

30

Benestad, Rasmus E.: Solar Activity and Earth’s Climate. 2.a

edi¸c˜ao. Chichester: Springer and Praxis. 2006, p. 47.

31

Frederick William Herschel (1738–1822).

32

bora¸c˜ao de ideias anteriores, algumas das quais bem antigas, sobre a existˆencia de um n´ucleo tel´urico solar. ´E, no entanto, Herschel com o peso da sua reputa¸c˜ao que credibiliza esta ideia na comunidade cient´ıfica.33

A observa¸c˜ao das protuberˆancias solares, durante o eclipse solar de 1842, bem como o efeito de escurecimento do limbo, levou `a proposta de inclus˜ao de uma terceira camada gasosa absorvente exterior `a camada luminosa. John Herschel,34 filho de William, procurou explicar a forma¸c˜ao destas aberturas atmosf´ericas (as manchas) atrav´es de movimentos na atmosfera solar, semelhantes aos ventos al´ısios terrestres.35 E, se em 1855, Peters36 afirma

que

Our knowledge of the physical constitution of the surface of the Sun has made very little or no progress since the time of the elder Herschel.37

O modelo de Herschel sobrevive, no entanto, a toda a primeira metade do s´eculo XIX de tal forma que Lardner no seu Hand-Books of Natural Philosophy and Astronomy, publicado em 1858, escreve

All the phenomena which have been described, and others which our limits compel us to omit, are considered as giving a high degree of physical probability to the hypothesis of Sir W. Herschel.38

Encontr´amos, ainda, referˆencias a este modelo nos anos 60 do s´eculo XIX, quer nas edi¸c˜oes do cl´assico de John Herschel, Outlines of Astronomy, quer na segunda parte da Astronomia de Rodrigo Ribeiro de Sousa Pinto escrita em 1866, na qual se lˆe

Supp˜oem-se o nucleo do Sol um corpo espherico escuro, solido ou liquido; e em volta d’elle tres atmospheras: a mais interior opaca e reflectora; a media gazosa e luminosa, chamada photosphera; a externa transparente.39

´

E, contudo, de referir que, neste ´ultimo exemplo, a descri¸c˜ao f´ısica do Sol corresponde a um pequeno par´agrafo numa obra dedicada ao estudo da mecˆanica celeste.