• Nenhum resultado encontrado

Os conhecimentos em análise

3.4. Estudo piloto

Quando os dados são recolhidos sob condições de ambiente não controlado, ou seja, em contexto real, é o investigador que deve adaptar o seu plano de recolha de dados e informações à disponibilidade dos participantes (Yin, 2005). Para facilitar esta adaptação, Yin (2005) sugere que sejam realizados estudos de caso piloto, por forma a serem criadas melhores condições aquando da realização do estudo de caso propriamente dito. O estudo de caso piloto auxilia o investigador ao nível da recolha de dados, tanto ao nível do seu conteúdo, como ao nível dos procedimentos, revestindo-se de um cariz formativo para o investigador (Yin, 2005). Esta investigação preliminar pode ser mais ampla e menos direcionada do que o plano final para a recolha de dados, podendo incluir, para além disso, questões de natureza metodológica (Yin, 2005). Neste último aspeto poderão surgir questões de campo relevantes ou questões relacionadas com a logística, que inicialmente não estavam previstas (Yin, 2005). Em geral, a conveniência, o acesso aos dados ou a proximidade geográfica, são os principais critérios para a seleção do caso piloto (Yin, 2005). A utilização de múltiplas fontes de evidências implica treino e perícia do investigador do estudo de caso, pelo que, é importante assegurar que o investigador tenha as habilidades desejadas para extrair do caso as informações relevantes através de procedimentos fortemente baseados na perceção e na capacidade analítica (Yin, 2005).

Desta forma, com a realização do estudo piloto pretendemos atingir os seguintes objetivos: i) implementar uma estratégia de ensino e de aprendizagem baseada na perspetiva de EPP, num contexto real de sala de aula, no âmbito do ensino secundário; ii) testar diferentes meios de recolha de dados, nomeadamente o cra (caderno de registos dos alunos) e iii) treinar a investigadora nos procedimentos associados ao estudo de caso, no âmbito da implementação de estratégias de ensino e de aprendizagem.

O estudo piloto foi levado a cabo durante o 3.º período do ano letivo de 2007/08, na Escola Secundária/3º Ciclo de Vouzela, escola onde a investigadora se encontrava a exercer funções docentes. A temática curricular selecionada foi a “diversidade na biosfera”, do programa de

biologia e geologia de 10.º ano de escolaridade16 e envolveu 19 alunos de uma turma. A tabela 14

apresenta, sumariamente, uma caracterização dos sujeitos que integraram a população analisada no estudo piloto.

Tabela 14. Caracterização da população envolvida no estudo piloto

Data de realização N.º total de

alunos Género Idades Nível de ensino

2007/08 19 16♀ e 3♂ 15-16 Secundário / 10.º

ano

Os alunos envolvidos eram maioritariamente do sexo feminino e possuíam 15 anos, na sua maioria. Para a implementação do estudo piloto foi solicitada a colaboração da professora de

72

biologia e geologia da turma atrás descrita. Mediante a sua aceitação, e previamente à implementação do estudo piloto, foram realizadas algumas reuniões de cariz informal entre a investigadora e a professora colaboradora, no sentido de se definirem algumas orientações/estratégias de atuação, das quais se destacam:

- a estratégia de ensino e de aprendizagem baseada na perspetiva de EPP iria ocupar aulas interpoladas, ao longo do 3.º período letivo;

- a estratégia EPP iria decorrer da apresentação de uma situação problema relacionada com a temática curricular selecionada;

- a investigadora estaria presente em todas as aulas dedicadas ao trabalho;

- os alunos poderiam solicitar ajuda e/ou esclarecimentos sobre o trabalho à professora e/ou à investigadora, nas aulas e via correio eletrónico;

- O esquema metodológico geral a seguir seria: i) apresentação de um problema aberto aos alunos; ii) trabalho de grupo com diversas atividades propostas pelos alunos e orientadas pela professora colaboradora (TE, TL, TC, entre outras) e iii) comunicação à turma, com apresentação do trabalho desenvolvido por cada grupo.

De acordo com o programa curricular definido para a disciplina de biologia e geologia de 10.º ano (ME, 2001), os conhecimentos que os alunos deverão construir, mediante o estudo do tema “diversidade na biosfera”, são os que se encontram na tabela 15.

Tabela 15. Conteúdos programáticos previstos para o estudo do tema “diversidade na Biosfera”, da disciplina de biologia e geologia, no 10.º ano de escolaridade (ME, 2001, p.78)

Conteúdos conceptuais 1 – Biosfera 1.1 - Diversidade 1.2 - Organização 1.3 – Extinção e conservação Conteúdos procedimentais

- Realizar estudos em ambientes naturais

- Participar nos processos de planificação das atividade a realizar antes, durante e após as saídas de campo

- Fazer recolhas criteriosas e perspetivar a sua relevância no trabalho laboratorial - Identificar seres vivos a partir de dados obtidos com a ajuda de instrumentos de laboratório e/ou pesquisa bibliográfica

- Compreender a existência de diferentes modos de interação entre os seres vivos de um ecossistema

- Prever a evolução de um determinado ecossistema se sujeito a alterações.

Conteúdos atitudinais

- Reconhecimento e valorização das funções dos diferentes constituintes do ecossistema e sua contribuição para o equilíbrio do mesmo

- Valorização do registo sistemático de dados durante os trabalhos de campo - Preocupação de evitar que as atividades de campo afectem o ambiente em estudo - Identificação de atividades humanas responsáveis pela contaminação e degradação do ecossistema.

Pelo facto dos referidos objetivos não estarem de acordo com as referências teóricas por nós seguidas, procedemos a algumas modificações, incluídas na tabela 16.

As atividades foram desenvolvidas no 3.º período letivo e ocuparam 7 aulas interpoladas (de 90 minutos cada uma).

73 Tabela 16. Conteúdos programáticos previstos para o estudo do tema “diversidade na Biosfera”, ao nível da disciplina de biologia e geologia, no 10.º ano (adaptado de ME, 2001)

Conteúdos

conceptuais - Conhecer e aplicar o conceito global de Biosfera, nomeadamente ao nível da biodiversidade, da extinção e da conservação de espécies. Conteúdos

procedimentais - Abordar as situações problema, levando a cabo um conjunto de estratégias que lhe permitem chegar a uma ou mais soluções para o problema. Conteúdos

atitudinais - Contribuir e intervir para o equilíbrio dos ecossistemas, através do reconhecimento e valorização das funções dos seus constituintes. - Reconhecer e valorizar as funções dos constituintes dos ecossistemas, intervindo e contribuindo para o seu equilíbrio.

- Assumir uma atitude crítica e interventiva face às atividades humanas responsáveis pela contaminação e degradação dos ecossistemas.

- Manifestar autonomia, espíritos crítico e de iniciativa na resolução de problemas.

A tabela 17 apresenta um resumo das atividades desenvolvidas durante o estudo piloto.

Tabela 17. Resumo das atividades desenvolvidas, em sala de aula, durante o estudo piloto

Calendarização Atividade

31 março A professora apresentou a investigadora à turma e esta fez uma breve apresentação do trabalho e respetivos objetivos.

A investigadora e a professora apresentaram o problema aos alunos:

“De há uns tempos para cá tem-se verificado que o número de indivíduos de diferentes espécies do rio Zela tem diminuído principalmente daquelas que se relacionam com habitats em bom estado de conservação”.

A investigadora fez uma breve apresentação sobre o trabalho a desenvolver. Foram salientados os seguintes aspetos:

- o trabalho a desenvolver decorre de um problema / situação problemática ligado ao estudo dos ecossistemas;

- os trabalhos são feitos em grupo; constituídos por escolha dos alunos;

- a abordagem foi feita mediante as decisões do grupo, sob orientação da professora e da investigadora;

- os registos/apontamentos deverão ser individuais, organizados e datados em caderno próprio, que ficará com os alunos;

- ao longo do trabalho, o grupo irá proceder a algumas comunicações à turma. Esses momentos correspondem à apresentação, por parte de um elemento do grupo, de um resumo dos trabalhos desenvolvidos, com possibilidade de troca de ideias com o grupo turma; deverá ocorrer rotatividades por todos os elementos do grupo;

- algumas aulas irão contar com a presença de outra professora/investigadora na orientação dos trabalhos;

- o contacto entre todos os alunos, a professora e a investigadora, fora das aulas, é feito via correio electronico.

Seguiu-se um diálogo entre a professora, a investigadora e os alunos, no sentido de clarificar e esclarecer todas as dúvidas que estes colocaram (por exemplo: “como é que este trabalho é integrado na avaliação da disciplina?”, “como sabemos qual a solução que está correcta?”, entre outros);

A investigadora distribuiu um caderno de registos por cada aluno.

3 de abril Trabalho de grupo. Os alunos iniciaram uma reflexão, no grupo, sobre a forma como gostariam de abordar o problema (definição do domínio de abordagem ao problema). 10 de abril Trabalho de grupo. A professora e a investigadora falaram com todos os grupos no

sentido de perceber qual o domínio de abordagem ao problema selecionado e forneceram algumas sugestões de bibliografia, esclarecendo algumas dúvidas e relembrando o problema em estudo.

14 de abril Os grupos comunicaram aos colegas o domínio de abordagem ao problema e no resto da aula deram continuidade às suas pesquisas.

74

(interrupção dos trabalhos devido à realização dos testes intermédios) junho Retoma dos trabalhos de grupo

junho Trabalhos de grupo. Planeou-se uma saída de campo para a semana após o final das aulas.

Na primeira aula, procedeu-se à apresentação do trabalho e respetivos objetivos; clarificaram- se aspetos relacionados com a organização, os registos, a avaliação e as formas de contacto fora das aulas, entre outros. A situação-problema apresentada aos alunos foi a seguinte: “De há uns tempos para cá tem-se verificado que o número de indivíduos de diferentes espécies do rio Zela tem diminuído, principalmente daquelas que se relacionam com habitats em bom estado de conservação.” É de salientar que o rio Zela é um pequeno rio (afluente do rio Vouga), que atravessa a Vila de Vouzela e passa a cerca de 1 Km da escola. Ainda na primeira aula, foi solicitado aos alunos que se organizassem em grupos de três alunos, iniciando uma primeira abordagem ao problema apresentado. Dado o número total de alunos da turma, foram constituídos 5 grupos de 3 alunos e 1 grupo de 4 alunos. Nas sessões seguintes, a professora e a investigadora, incentivaram os alunos no sentido destes levantarem hipóteses, planificarem trabalhos experimentais, analisarem, interpretarem e tirarem conclusões, sempre com vista a alcançarem a(s) solução(ões) para o problema. É de salientar que, apesar de planeada a saída de campo, não foi possível realizá-la. Tal ficou a dever-se a diversos factores, nomeadamente à vigilância de exames por parte da professora e da investigadora e também à inexistência de seguro escolar dos alunos para a realização de uma saída de campo, após interrupção das atividades letivas.

Nas diferentes etapas do trabalho foram privilegiadas as situações em que os alunos direcionavam a investigação e se viam implicados em tomadas de decisão sobre a prossecução do trabalho. O papel do professor (e, pontualmente, da investigadora) traduziu-se em orientar e facilitar as atividades propostas pelos alunos.

Durante o estudo piloto foram implementados diferentes materiais de recolha de dados, a saber: i) cadernos de registos dos alunos (caderno distribuído a cada aluno, com o objetivo de nele serem feitos todos os registos relativos a este trabalho), ii) as mensagens via correio eletrónico entre alunos e investigadora iii) reflexão da professora colaboradora e iv) os registos da investigadora.

Relativamente ao caderno de registos, é de referir que a investigadora selecionou, para análise, o caderno de registos que considerou melhor traduzir a pesquisa feita pelo grupo. Tal opção visou alcançar os objetivos do estudo piloto, reduzindo o objeto de estudo e permitindo uma análise mais pormenorizada.

Os domínios de abordagem ao problema privilegiados pelos alunos foram: as alterações do caudal do rio, a lontra, as libelinhas, as alterações à composição química da água e as substâncias químicas que são lançadas ao rio.

75 A análise dos resultados do estudo piloto (capítulo 4, secção apresentação e análise dos resultados do estudo piloto), permitiu tomar algumas decisões, relativamente à implementação do estudo-principal, a saber:

- O caderno de registos do aluno é um importante meio de recolha de dados, desde que esclarecidos com os alunos alguns aspetos relativos ao seu funcionamento, a terminologia científica, entre outros aspetos (Lopes & Bettencourt, 2009a).

- A análise de conhecimentos de natureza atitudinal implica a implementação de meios de recolha de dados específicos, e não apenas o caderno de registos do aluno.

- Os contatos via correio eletrónico constituem um importante meio de recolha de dados. - A temática curricular escolhida para implementar a estratégia EPP deve ser o mais possível transversal ao programa, por forma a não criar obstáculos ao “cumprimento do programa” e a promover uma articulação efetiva entre o estudo empírico e a programação da disciplina.

- A estratégia EPP deve abranger um período de tempo superior a um período letivo, por forma a rentabilizar o trabalho extra-aula e o TG.

- O documento de reflexão da professora colaboradora deve incluir itens orientadores, no sentido de potencializar este meio de recolha de dados.

- As tabelas de conhecimentos conceptuais, procedimentais e atitudinais em análise, devem ser adequadas ao nível de ensino e em concordância com o programa da disciplina.

Foi nossa intenção implementar o estudo empírico, com a mesma professora que colaborou no estudo piloto, mas numa turma com alunos de 11.º ano (que não os mesmos do estudo piloto), no ano letivo seguinte e ao nível da disciplina de biologia e geologia. Nesse sentido, selecionámos a temática curricular “sistemática dos seres vivos”, bem como analisámos os diferentes tipos de conhecimentos previstos pelo programa (ME, 2003). Na tabela 18, apresentamos os diferentes conhecimentos previstos no respetivo programa.

Tabela 18. Conteúdos programáticos previstos para o estudo do tema “Sistemática dos seres vivos”, da disciplina de biologia e geologia, no 11.º ano de escolaridade (ME, 2003, p. 13)

Conteúdos conceptuais

1 – Sistemas de classificação 1.1 – Diversidade de critérios 1.2 – Taxonomia e Nomenclatura

2 – Sistema de classificação de Whittaker modificado

Conteúdos processuais

- Integrar e contrastar perspetivas e argumentos associados aos diferentes sistemas de classificação que foram sendo elaborados.

- Distinguir sistemas de classificação práticos / racionais, artificiais /naturais e filogenéticos.

- Utilizar chaves dicotómicas simples e regras básicas de nomenclatura.

- Comparar a classificação de Whittaker com as outras antecedentes atendendo ao número de reinos e aos critérios utilizados.

- Discutir razões de consensualidade desta classificação face a outras propostas apresentadas posteriormente.

Conteúdos atitudinais

- Reconhecimento da importância dos conhecimentos de taxonomia e nomenclatura para o estudo da biologia.

- Valorização do conhecimento da história da ciência para compreender as perspetivas atuais.

- Reconhecimento de que a construção do conhecimento científico envolve opiniões controversas e nem sempre é possível chegar a novos consensos.

76

Verificada a impossibilidade de dar seguimento à nossa intenção de implementar o estudo ao nível do 11.º ano, e aberta a possibilidade de implementar o estudo empírico ao nível da biologia de 12.º ano, dedicámo-nos à análise do respetivo programa disciplinar.