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5 ANÁLISES E DISCUSSÕES

5.1 SOBRE A AULA DA ALUNA-PROFESSORA SAKURA

5.1.2 Execução do Problema 1

A aluna-professora Sakura iniciou a aula fazendo uma breve apresentação pessoal, expondo para os alunos-graduandos seu nome, formação e relato de que era aluna do programa de mestrado Educimat. Após essa rápida etapa, Sakura exibiu a imagem Waterfall (Figura 14) do artista Maurits Cornelis Escher, solicitando aos alunos-graduandos que socializassem suas opiniões sobre O que essa imagem nos traz? [pausa] O que ela nos remete? (JUNHO, 2016)

Figura 14 - Obra de arte Waterfall de Cornelis Escher

Fonte: http://www.mcescher.com/gallery/recognition-success/waterfall/

Apesar de conduzir a aula por questionamentos, estes foram amplos, causando um silêncio entre os estudantes (C14). Além disso, verificamos que essa iniciativa de discussão sobre a obra de arte, não estava registrada no planejamento colaborativo. Sakura intencionava associar a imagem à um enigma. Entretanto ser considerado um enigma, não contribuiu para a construção e o

desenvolvimento de estratégias entre os alunos-graduandos, ou seja, não teve foco na aprendizagem matemática do aluno, demandou tempo que não fora consumido de forma adequada (C21), além de não ser produto colaborativo do grupo, conforme orientação de dois dos sete aspectos ditados por Ponte (2014).

Após as discussões, Sakura revelou o problema 1 (Figura 15), com o auxílio de um computador e um DataShow e solicitou que algum aluno-graduando lesse o enunciado do problema em voz alta.

Figura 15 - Problema 1

Fonte: http://www.somatematica.com.br/desafios/desafio76.php

A aluna G1 prontificou-se a ler o enunciado, seguida do seguinte questionamento, pela aluna-

professora: Vocês pensaram alguma coisa? (JUNHO/2016). Compreendemos que esse questionamento foi amplo e não beneficiou a construção do raciocínio dos estudantes (C14), uma vez que os alunos-graduandos ficaram em silêncio e pensativos imediatamente após essa indagação, essa ação desviou o foco na aprendizagem do aluno-graduando, novamente descumprindo as orientações de Ponte (2014).

Ela prosseguiu a condução da aula, explicando aos alunos-graduandos que, para se resolver o problema, seriam utilizadas as etapas de resolução de problemas de Pólya (2006). Não era relevante que os alunos-graduandos soubessem dessa informação, por mais que fossem alunos de Graduação de Matemática, talvez seria, se o objetivo fosse o de ensinar a Resolução de Problemas (C21).

Sakura apresentou novamente o enunciado verbal do problema 1 e solicitou que os alunos- graduandos formassem duplas para estabelecerem estratégias de solução do problema. Todavia, apesar de estarem em duplas e na etapa de estabelecimento de estratégias, os alunos-graduandos não demonstraram que compreenderam o problema, alguns leram o enunciado exibido na lousa por diversas vezes. A falta de compreensão se demonstrou na fala do aluno-graduando G2 que

fez o seguinte questionamento: Eu tenho uma dúvida! Tipo assim, quando você [pausa] é [pausa] os dois últimos números. Pode ser, é igual, eu nasci em 1995. Pode ser idade 95 e idade

Problema 1: Meu pai me contou que, em 1938, conversava com o avô dele e

observaram que a idade de cada um era expressa pelo número formado pelos dois últimos algarismos dos anos que haviam nascido. Assim, quando meu pai nasceu, qual era a idade do meu avô?

59? (JUNHO, 2016). Isso comprovou que a etapa de compreensão não foi esgotada. Os alunos- graduandos ainda demonstraram dúvidas com relação à situação proposta a eles. Pólya (2006) nos assegura que se não houver compreensão completa das variáveis relacionadas no problema, estabelecer um plano de estratégia seria difícil, aliás, apesar de constar no planejamento a utilização das etapas de Pólya (2006), Sakura não as implementou em aula.

Entendemos que a aluna-professora Sakura não verificou se havia palavras, expressões e trechos passíveis de bloqueio no fluxo de compreensão do problema pelos alunos-graduandos (C12). Ela poderia ter realizado mais questionamentos relacionados ao enunciado verbal do problema, tais como: Quantas pessoas estão envolvidas nessa situação? Sobre o quê eles estão conversando? Quem é o mais velho? O que significam os dois últimos algarismos dos anos que haviam nascido? Qual o valor posicional de cada um dos algarismos que formam o ano 1938?

A aula prosseguiu com a tentativa de alguns alunos-graduandos buscando maior detalhamento sobre os dados do problema e em encontrar uma solução válida, enquanto a aluna-professora Sakura se deslocava entre as duplas para auxiliá-los no processo de solução (Figura 16).

Figura 16 - Aluna-professora Sakura auxiliando uma das duplas em sala de aula

Fonte: Acervo dos autores

Nesse momento, os questionamentos, que realmente foram feitos por ela, para auxiliar o fluxo de raciocínio dos alunos-graduandos quanto às estratégias matemáticas, não estavam em sintonia com os que constavam no planejamento, o que nos indica que não houve um cuidado em tentar planejá-los. Alguns foram eficientes, outros causaram bloqueios, por serem amplos, conforme já relatado acima (C15). Outrossim, apesar de serem alunos de graduação em Matemática, eles demonstraram bastante dificuldade em estabelecer estratégias de resolução para o problema,

sendo que uma das duplas deram indicídos de que haviam desistido de encontrar a solução, isso comprova a importância de tentar se antecipar à essas dificuldades e verificar os conhecimentos prévios dos estudantes (C5), para potencializar a instrução da aula.

Apesar disso, um aspecto favorável da prática da aluna-professora Sakura, que converge para o defendido por autores japoneses e demais que apoiam esta Pesquisa, é que a todo momento, valorizava as respostas e dúvidas dos alunos-graduandos (C19), contribuindo para que muitos continuassem suas tentativas de solucionar o problema.

A aluna-professora identificou que duas duplas já haviam conseguido resolver o problema. Após, ela discorreu algumas observações sobre o enunciado do problema, tais como: quantas pessoas estão envolvidas e quais as relações entre a idade deles. Entendemos que essas observações, não presentes no planejamento, foram exploradas tardiamente, elas poderiam ter sido executadas na etapa de compreensão do problema (C12) e não, quase ao final da aula. Esse fato foi destacado durante a seção de discussão/reflexão, como uma fragilidade do planejamento e da execução da aula.

Nesse instante, as duas duplas que haviam solucionado o problema demonstraram interesse em descobrir se as estratégias estabelecidas por elas eram iguais, ou se havia diferenças. Porém, essa empolgação não foi utilizada de maneira adequada. Sakura poderia ter se valido dessa empolgação, para que G1, G2, G5 e G6 socializassem suas estratégias e que toda a turma

discutisse se eram matematicamente válidas. Ela poderia ter solicitado que as duplas fossem à lousa para registrar suas estratégias, ao invés disso, solicitou que as relatassem oralmente (C27 e C28). Essa prática não pareceu contribuir para que os alunos-graduandos, que não tiveram sucesso em determinar a resposta, compreendessem as estratégias utilizadas pelos integrantes das duplas.

Sakura confirmou nossa suposição ao dizer em sua aula [...] para duas discussões, [pausa] depois a gente dá mais um tempinho [pausa]. Vamos fazer o seguinte, vocês relatam [dirigindo a palavra paras as duas duplas que solucionaram o problema] e a gente dá um tempinho pra ver se o relato de uma dupla contribui com o pensamento de mais duas duplas. Pode ser? (JUNHO, 2016). Essa ação de Sakura demostra preocupação com a socialização dos conhecimentos pelos alunos-graduandos (C28), previsto no Lesson Study. Uma das soluções foi feita por tentativa e erro (Figura 17a) e a outra utilizou uma forma algébrica (Figura 17b).

Figura 17 - Soluções dos alunos-graduando para o problema 1, sendo (a) solução de G1 e G2 e (b) de G5 e G6

(a) (b)

Fonte: Acervo dos autores

A primeira a relatar sua estratégia foi a aluna-graduanda G1, que utilizou a tentativa e erro

(Figura 17a). Segundo ela

[...] primeiro o pai, como ele nasceu entre 1900 e 1937, aí eu fui pegando, se foi em 1, aí ele teria 37 anos, se ele nasceu em 2, ele teria 36 [pausa]. Aí se eu fosse nessa linha assim, eu ia chegar em 19, que a metade de 38 é 19. Se ele nasceu em 19, então naquele ano [1938] ele teria 19 anos. Foi a primeira coisa que eu pensei! Aí o avô [pausa], bisavô, né! Seria, aí eu pensei, logo ele nasceu antes de 1900, então de 1899 pra baixo. Então eu fui pegando números aleatórios, tipo: em 1850, daí em 38 ele teria 88 anos, então não bateu! Aí eu peguei um maior, 1880, aí ele teria 58 anos. Também não deu! Aí eu fui fazendo isso até chegar no, um igual ao outro, que eu consegui! Vi que foi chegando perto! Foi tentativa e erro mesmo! Aí até chegar, 70, ele teria 68 anos, aí [pausa] faltava só tirar de um e por no outro. Aí 69 [1869] ele teria 69 anos! (JUNHO, 2016)

Sakura utilizou a explicação de G1 para relacionar o raciocínio utilizado por ela, com o Sistema

de Numeração Decimal, um possível conteúdo para a solução desse problema, valorizando a produção da dupla e na tentativa de ajudar a construção do raciocínio dos demais estudantes (C26). Contudo, ao questionar se a explicação havia ajudado a entender o problema, a aluna G7

disse: Pra mim não ajudou em nada! (JUNHO, 2016). Essa falta de entendimento pode ter relação com o fato de que essa aluna poderia possuir uma mente matemática que compreende melhor as estratégias algébricas (Figura 18), fato destacado por Souza e Guimarães (2015). O

registro da tentativa de solução da aluna-graduanda G7, nos mostrou apenas registros algébricos,

caracterizando tentativa de encontrar uma equação válida para resolver o problema (Figura 18). Apesar de estabelecer o início de uma estratégia, ela demonstrou não conseguir concluir o raciocínio da solução do problema.

Figura 18 - Tentativa de solução da aluna-graduanda G7

Fonte: Acervo dos autores

Apesar disso, de maneira propícia, Sakura solicitou que a outra dupla explicasse sua solução, a fim de ajudar no entendimento dos demais (C26), em especial da aluna-graduanda G7. Dessa

maneira, G6 segue explicando que

[...] seguindo a mesma linha de raciocínio das meninas [primeira dupla] no início, a gente também chegou a conclusão de que [pausa] o pai, né, nasceu em mil novecentos e “alguma coisa” e o bisavô nasceu em mil oitocentos e “alguma coisa” [pausa]. De forma que, os dois últimos algarismos, da idade do pai fosse maior que os dois últimos algarismos da idade do filho [nesse momento ela fala sobre o pai e o bisavô]. Aí, a gente pegou, por exemplo, pra calcular a idade do pai, a gente pegou 1938 e subtraiu de mil e novecentos, daí eu chamei de CD [fazendo referência ao número 19CD], como os dois algarismos da idade. Então subtraindo os dois, como os dois primeiros algarismos são iguais, fica só 38 – CD! E eu chamei [pausa] e essa idade, que é quantos anos que o pai tinha em 1938, é igual a CD! E aí você resolve e acha que CD dá 19! Que é a idade do pai. Então ele nasceu em 1919! Aí segui o mesmo raciocínio para o bisavô, só que agora com 1938 menos 1800, e eu coloquei AB [fazendo referência ao número 18AB]. Aí agora como eu tenho uma diferença entre os dois primeiros algarismos, aí eu fiz como? [pergunta pra ela mesma responder] É [pausa] têm 38 é da diferença, vai dar os 38 primeiro, que já foram dos anos de 1900 a 1938, mais quanto que falta de 19AB até chegar a 1900! No caso seria 100 – AB! Aí resolvendo essa expressão que, esse valor, que é a idade do bisavô é igual a AB, eu cheguei na idade do bisavô, deu 69 anos![Figura 17b] (JUNHO, 2016)

Um fato que se destacou entre diversos comentários sobre a solução da dupla G6 e G7 se fez

presente no diálogo entre os alunos-graduandos.

Aluna-graduanda G1:– Foi boa a sua resposta! [...] Ficou bonita! Elegante!

Aluna-graduanda G1: Você fez tudo bonitinho, uma expressão [...] Eu fiz tudo no chute!

Aluna-graduanda G1 e G2: [risos]

(JUNHO, 2016) Esse diálogo demonstrou haver uma crença que uma solução algébrica possui maior valor ou elegância entre as diversas estratégias de solucionar um problema. A aluna-graduanda G1

demonstrou estar mais satisfeita com a solução relatada por G6, do que a dela mesma.

Após a explicação realizada pelas duas duplas (G1 e G2; G5 e G6) sobre suas soluções, Sakura

optou por compartilhar suas estratégias, exibindo-as na lousa. Ou seja, as soluções apresentadas já estavam prontas e não foram construídas em conjunto com os alunos-graduandos (C19 e C20). O que não converge para o que é defendido pelos autores que divulgam os pressupostos do Lesson Study, além de destoar de um dos sete aspectos que emanam do desenvolvimento profissional, difundido por Ponte (2014). Esse aspecto foi amplamente discutido após a aula pelo grupo de professores buscando contribuir com a formação de todos.

Ao apresentar sua primeira solução (Figura 19), Sakura pediu que os alunos-graduandos pudessem ajudá-la a justificar matematicamente uma divisão por 2 adotada como estratégia.

Figura 19 - Primeira solução apresentada pela aluna-professora Sakura

Fonte: Acervo dos autores

Porém, nenhum aluno-graduando conseguiu justificar, houve apenas a contribuição da aluna- graduanda G6 que relatou que na sua solução, também apareceu uma divisão por 2, em

consequência da equação encontrada. Apesar disso, consideramos que a exibição dessa solução, não contribuiu para um melhor entendimento do problema, uma vez que Sakura trouxe a

estratégia e não forneceu uma justificativa matematicamente válida (C24), mesmo diante da ausência de argumentações dos alunos-graduandos.

Logo após, ela apresentou a sua segunda solução (Figura 20), utilizando elementos da álgebra para solucionar a questão.

Figura 20 - Segunda solução apresentada pela aluna-professora Sakura

Fonte: Acervo dos autores

Sakura apenas explicou qual o pensamento ela teve, fato que também foi observado por alguns alunos-professores observadores da aula, que descreveram em seus registros que [...] [Sakura] apresentou uma solução boa. Porém a solução foi apresentada pronta, poderia ter sido construída junto com os alunos. (JUNHO, 2016). Outrossim, sua solução apresentou alguns descuidos que poderiam atrapalhar o entendimento dos alunos-graduandos que estivessem lendo sua resolução (C22, C23 e C24). Por exemplo, ela estabeleceu a incógnita x, significando 10A + B, e ora ela traz o x em minúsculo, ora em maiúsculo. Apesar de ser um detalhe, essas pequenas variações, podem causar interpretações diversas, por acreditarem se tratar de incógnitas diferentes.

Essa solução, possui forte sintonia com a solução apresentada por uma das duplas, contudo essa relação não foi estabelecida em aula (C23). Sakura poderia ter correlacionado as duas soluções e corrigido os erros apresentados pela dupla dos alunos-graduandos G5 e G6. Esses alunos

demonstraram não compreender a forma correta de se realizar a subtração 1938 – 19AB, considerando o Sistema de Numeração Decimal. O aluno-graduando G5 apresentou a seguinte

dúvida: Só, é [pausa] quando você colocou x = 10A + B [pausa], por quê isso? 10A + B? (JUNHO, 2016). Nesse momento, Sakura apresentou uma explicação matematicamente correta

(C13), quando esclareceu à G5 que foi necessário realizar uma decomposição dos números 1938

e 19AB, respeitando o valor posicional de cada algarismo. Entendemos que, além dessa explicação, Sakura poderia ter utilizado algum exemplo para potencializar a justificativa.

A aluna-professora encerrou a aula, no momento que todos os alunos-graduandos não apresentaram mais dúvidas quanto às estratégias de resolução do problema e finalizou com uma conversa com os estudantes sobre quais os conteúdos que eles poderiam destacar no problema 1(C17). Sakura destacou que o problema 1, também foi desafiador e difícil para ela. Foram necessárias discussões entre diversas pessoas para solucioná-lo, o que justificou a iniciativa de que os alunos-graduandos estivessem em duplas.

Na seção de reflexão, a aluna-professora em conjunto com seus pares revelaram que as ações colaborativas e reflexivas contribuíram para que Sakura demonstrasse uma preocupação em envolver todos os alunos-graduandos na resolução do problema, atenção esta, que não esteve presente no seu planejamento individual, nem ao executar uma aula para seus pares, com esse mesmo problema em momento anterior. Eles destacaram, também que, apesar das falhas do planejamento revelados durante a execução da aula, obtiveram resultados melhores quando do segundo planejamento, realizado colaborativamente com vistas à ser executado, não mais entre seus pares, mas sim com os alunos-graduandos. Segundo eles, as ações que emanam do processo colaborativo e reflexivo, por meio das discussões feitas pelo grupo, forneceram elementos que deixavam o professor que iria executar a aula mais seguro do quê e de como propor alguma prática em sala de aula.