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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

2.2 RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS SEGUNDO GEORGE PÓLYA

George Pólya, matemático húngaro, contribuiu fortemente para o campo da heurística de problemas matemáticos ao divulgar suas ideias no livro How to solve it traduzido para o português como “A arte de resolver problemas”.

Em sua obra, Pólya (2006) menciona quatro etapas fundamentais para se resolver um problema, a saber 1 - a compreensão do problema, 2 - elaboração de um plano, 3 - execução de um plano e, por fim, 4 - retrospecto e análise da solução encontrada.

De início, Pólya (2006) esclarece que não é possível responder a algo proposto se o problema não for compreendido corretamente. Para isso, faz-se necessário que a questão esteja bem escrita, planejada e que o nível de dificuldade esteja adaptado ao nível de conhecimento da turma. O problema não deve estar nem fácil demais, nem difícil demais, pois ambos os casos podem desestimular os alunos. Problemas muito fáceis, não desafiam nem instigam sua curiosidade, e os muitos difíceis, se tornam tão complexos que desestimulam a participação do indivíduo. Além disso,

O aluno deve também estar em condições de identificar as partes principais do problema, a incógnita, os dados, a condicionante. Daí porque, raramente, pode o professor dispensar as indagações: Qual é a incógnita? Quais são os dados? Qual é a condicionante? (PÓLYA, 2006, p.5).

Pólya (2006) destaca que o aluno deve analisar atentamente o enunciado verbal do problema e esquematizar seu raciocínio por meio de figuras e esquemas que elucidem sua compreensão, atribuindo notações adequadas.

O autor traz, em sua obra, um exemplo para ilustrar esse primeiro estágio da resolução de problemas: Calcular a diagonal um paralelepípedo retângulo sendo conhecidos os valores de seu comprimento, largura e altura. Esse é um problema de Geometria Espacial que não faria sentido propor para indivíduos que não conhecem o Teorema de Pitágoras, por isso a importância de se escolher uma situação-problema adequada para o grupo de alunos que se está a trabalhar.

Ele ressalta que para resolver esse problema, não é fundamental que os alunos tenham um conhecimento muito aprofundado sobre Geometria Espacial, é imprescindível que os mesmos tenham familiaridade com o tema, e o professor poderá contribuir ao relacionar a forma geométrica espacial com formas conhecidas no cotidiano do aluno. Ao concretizar o problema, o professor pode tornar o desafio motivador.

A partir da compreensão de todo o problema, o aluno poderá ser capaz de estabelecer um plano de execução, os caminhos a serem percorridos até que se chegue à solução. Nessa busca pela estratégia, o professor deve estimular seus alunos indagando-os, por exemplo, se “conhecem um problema correlato?” Se sim, “é possível utilizá-lo?” etc (PÓLYA, 2006, p.7).

Nesse sentido, Pólya (1981) utiliza no seu livro Mathematical Discovery: On understanding, learning, and teaching problem solving, exemplos que ilustram a utilização de problemas correlatos para solucionar certos requisitos que poderiam ser mais complexos de serem resolvidos, caso o aluno não conheça algum problema que o possa auxiliar. Entre eles, Pólya (1981) relembra a célebre história sobre um menino chamado Gauss que frustrou as expectativas de seu professor, ao resolver rapidamente a soma dos vinte primeiros números naturais. O autor, absorvendo a ideia do ‘pequeno Gauss’, generaliza e demonstra como obter uma fórmula para a soma dos n primeiros números naturais. Após explicar esse resultado, ele amplia a ideia inicial, traçando paralelos com as ideias e desdobramentos gerados pelo problema de Gauss, como, por exemplo, a soma dos quadrados dos n primeiros números naturais.

As indagações propostas por Pólya (2006), quando bem conduzidas, podem levar os alunos a buscar em sua experiência, problemas que já foram resolvidos e que podem contribuir para estabelecer um plano apropriado para a resolução do mesmo. A propósito dos questionamentos sugeridos por Pólya para a condução do raciocínio dos alunos, vale ressaltar a importância dos questionamentos para o estímulo do fluxo de raciocínio do aluno, em meio à resolução. Por exemplo, Morais (2016) sugere algumas perguntas acerca de uma experiência na Resolução de Problemas com alunos de Ensino Fundamental. A autora sugere questionamentos do tipo “Você entendeu a estrutura do problema? Você entendeu bem o problema?” (MORAIS, 2016, p.39). Na primeira pergunta, o uso da palavra “estrutura” pode ser complexa para um aluno de Ensino Fundamental, já o segundo questionamento, é amplo e não contribui para o estímulo ao raciocínio do aluno. Pelo contrário, indagações desse tipo bloqueiam o pensamento, por não saberem exatamente o que o professor esperaria como resposta, tal como, relatado por Wrobel et al. (2016).

Caso as indagações não funcionem, é útil examinar vários aspectos do problema proposto, a fim de reformulá-lo, tal como sugerem Souza e Guimarães (2015) a partir de estudos baseados na escrita de problemas e apoiados no método de Pólya. Os autores analisam diversos textos de problemas verbais10 de matemática, entre eles encontra-se o problema ilustrado na Figura 3.

10

Conforme Souza e Guimarães (2015) os problemas verbais são vistos como problemas que recorrem principalmente à linguagem natural associada à linguagem matemática para transmitir um contingente de informações que deverão ser selecionadas e compreendidas pelo indivíduo que objetiva solucionar o problema.

Figura 3 - Problema Verbal de Matemática

Fonte: Souza e Guimarães, 2015, p.15

Souza e Guimarães (2015) relataram de outros estudosque a palavra “total” dificultou o fluxo de leitura dos alunos, e que isso pode ter influenciado no resultado obtido por eles. Provavelmente pelo aluno não ter associado a palavra total ao seu significado em Matemática (resultado da operação matemática), mas sim à sua significação na língua materna (completo, inteiro).

Uma alternativa para tornar esse texto do problema mais adequado e de melhor compreensão, seria: “Num cinema há 12 fileiras com 16 poltronas e 15 fileiras com 18 poltronas em cada fileira. Quantas poltronas há nesse cinema?” (SOUZA; GUIMARÃES, 2015, p.15). Ademais é indicado que o professor promova uma discussão que esclareça o significado da palavra total no contexto matemático.

Pólya defende a ideia que nem sempre é fácil estabelecer esse plano. O caminho de transição entre a compreensão do problema e a definição de um plano de ação pode ser longo e trabalhoso. Para ele, o estabelecimento de um plano é o ponto chave da resolução de problemas.

[...] o principal feito na resolução de problemas é a concepção da ideia de um plano. Esta ideia pode surgir gradualmente ou, então, após tentativas infrutíferas e um período de hesitação, aparecer repentinamente, num lampejo, como uma “ideia brilhante” (PÓLYA, 2006, p.7).

Dessa forma, o professor pode contribuir com certas indagações e modos de agir que tendem a provocar o que o autor denomina como “ideia brilhante”. Aos alunos, muitas vezes, falta experiência em resolver problemas, e essa carência pode comprometer a elaboração do plano de resolução proposto por Pólya. Para ele, as boas ideias surgem da experiência e conhecimentos que o aluno carrega consigo e que foram previamente obtidos. As boas ideias surgem de problemas similares que já foram solucionados e de teoremas que já foram demonstrados ao longo de seu percurso escolar. Por isso, ele sugere que essa etapa seinicie com o questionamento se o aluno conhece algum problema similar.

Problema 5: Num cinema há 12 fileiras com 16 poltronas e 15 fileiras com 18 poltronas. O número total de poltronas é

(A) 192 (B) 270 (C) 462 (D) 480

Pólya (1981) faz uma analogia dessa situação como se estivéssemos em um quarto escuro, tarde da noite, e não soubéssemos onde se encontra o interruptor para acender a lâmpada. Inicialmente, ficaríamos perdidos e consequentemente, esbarraríamos em vários obstáculos, deixando-nos confusos sobre a configuração e disposição dos pertences do quarto. Porém, após encontrar o interruptor, tudo que parecia ser confuso, passa a se tornar mais familiar. Assim

Essa pode ser a experiência de resolver um problema; um esclarecimento repentino que traz luz, ordem, conexão, e propósito para detalhes que antes pareciam obscuros, confusos, espalhados, e evasivos (PÓLYA, 1981, p.54, v.2. tradução nossa).

Ainda assim, alguns obstáculos podem surgir nesse estágio. Para um mesmo tema, pode haver vários problemas similares vivenciados pelos alunos, e entre essas opções, deve escolher a correta. Essa escolha nem sempre é fácil, e dessa forma, é essencial retomar a algumas indagações feitas na etapa da compreensão do problema para filtrar quais opções dos problemas similares realmente contribuem com o estabelecimento do planejamento correto.

Observa-se, dessa maneira, que essas etapas de resolução não são isoladas e nem lineares, mas, constantemente, elas podem entrelaçar-se. É possível constatar na concepção de um plano que o problema não foi realmente ou integralmente compreendido. É preciso que o caminho a ser seguido na resolução da questão esteja claro na mente dos alunos.

Com o plano já estabelecido, sua execução se torna mais fácil. Pólya (2006, p.10) assegura que “[...] executar o plano é muito mais fácil; paciência é o de que mais se precisa.” Dessa forma, o plano fornece apenas um roteiro do que deverá ser executado, isso não significa que detalhes, que anteriormente não haviam sido percebidos, não podem ser incluídos ao plano original durante o processo de execução. O autor atenta que se o plano for esquecido pelo aluno, é bem provável que o mesmo sofreu influências de meios externos, seja do professor, ou de outros alunos. Quando o plano é elaborado pelo próprio aluno, este tenha compreendido a ideia final, então dificilmente se esquecerá das etapas as quais deve percorrer para solucionar o problema. Por fim, a quarta etapa é o retrospecto. Muitos alunos, e até mesmo muitos professores, ignoram ou valorizam pouco essa etapa e que, de fato, é valiosíssima. Ao fazer a análise de sua resposta final, verificando cada passo, cada demonstração e o caminho que o levou até tal solução, o conhecimento poderá ser consolidado. Ou ainda, meios mais fáceis de solucioná-lo podem ser elaborados.

A construção do conhecimento sempre é passível de erros. É possível perceber na verificação (looking back) que um erro foi cometido. Se assim for, ao identificar a origem do erro, a resposta real poderá ser encontrada.

Outros fatores podem surgir nessa etapa. Pontos particulares que foram tomados como verdades para a execução do plano podem ser demonstrados. Por conseguinte, o percurso e discussões sobre os problemas se tornam profundamente ricos.

Nesta etapa, Pólya (2006) ressalta que todo bom professor precisa compreender que nenhum problema fica completamente esgotado. Nas palavras de Pólya:

Um bom professor deve compreender e transmitir a seus alunos o conceito de que problema algum fica completamente esgotado. Resta sempre alguma coisa a fazer. Com estudo e aprofundamento, podemos melhorar qualquer resolução e, seja como for, é sempre possível aperfeiçoar a nossa compreensão da resolução (PÓLYA, 2006, p.12). Assim, vale ressaltar que nessa fase da resolução de um problema é possível encontrar novos caminhos para alcançar o objetivo final do problema proposto. Nessa busca, novos conceitos são construídos, novas ideias surgem e poderão ser demonstradas ou refutadas, ou até mesmo, a partir da análise do processo de resolução o aluno vivencia a oportunidade de refletir sobre os caminhos e métodos escolhidos por ele para solucionar o problema, que, por sua vez, o levam à descoberta da essência do mesmo, conduzindo-o ao processo de generalização do problema dado, ou então, ao uso deste em problemas com características semelhantes, conforme defende Pólya (2006).

Um dos primeiros deveres do professor é não dar aos seus alunos a impressão de que os problemas matemáticos têm pouca relação uns com os outros, de que nenhuma relação tem com qualquer outra coisa. Surge uma oportunidade natural de investigar as relações de um problema quando fazemos o retrospecto de sua resolução (PÓLYA, 2006, p.13). Outro fator importante de salientar, é que nessa etapa é viável analisar a natureza do erro cometido pelo estudante. É possível que o professor analise esse processo e identifique o tipo de erro cometido para que, assim, possa (re)pensar a sua prática para inferir de maneira mais eficaz na aprendizagem dos alunos.