• Nenhum resultado encontrado

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

2.3 LESSON STUDY

O Lesson Study está em constante destaque por existir indicadores da utilização de algumas características em países europeus, das nações asiáticas, além dos Estados Unidos, que compõem a APEC (Cooperação Econômica Ásia-Pacífico), conforme destacado por Fujii (2014). Essencialmente, o Lesson Study se encontra sublinhado por estimular o aperfeiçoamento das práticas dos profissionais da educação, em comunidades de investigação. Por meio da experiência coletiva e da prática investigativa esses profissionais aprendem, compartilham, agregam e constroem conhecimento, isto é, o Lesson Study pode ser uma ferramenta eficaz para elevar a qualidade do currículo, do ensino e da aprendizagem na localidade em que ele se empreende (ISODA; OLFOS, 2009).

Ao participarem de um Lesson Study, os professores vivenciam a oportunidade de compreenderem as orientações curriculares e o conteúdo que lecionam, as dificuldades/facilidades dos seus estudantes e a prática didática. Todos esses elementos integram as práticas exigidas ao profissional docente (PONTE et al. 2015). Isoda e Olfos (2009) complementam que o Lesson Study pode ser compreendido como uma forma de desenvolvimento do profissional docente como parte da prática dos docentes japoneses a fim de melhorar o ensino de Matemática local.

Sendo assim, o método é estruturado em etapas básicas de planejamento/execução/reflexão, que são consenso por diversos autores (Fujii, (2014); Isoda; Olfos,(2009); Baldin (2009) e Fernandez; Yoshida (2004)). Fernandez e Yoshida (2004), em seu livro Lesson Study: A Japanese Approach to Improving Mathematics Teaching and Learning, estruturam o ciclo do método em seis etapas, a saber: 1 - Planejamento colaborativo; 2 - execução do plano elaborado na primeira etapa; 3 - Discussão/avaliação da execução da aula; 4 - Replanejamento da aula; 5 - Reexecução da aula e por último 6 - a Discussão/Avaliação da nova versão da aula. Porém, Fernandez e Yoshida (2004) relatam que as três primeiras etapas são fundamentais e as três últimas opcionais.

Na primeira etapa do Lesson Study, ocorre o estabelecimento de metas e o planejamento. Nela os professores se reúnem para discutir e planejar em conjunto o objetivo daquela aula (ou de uma sequência de aulas), assim o “plano é meticuloso e possui uma natureza colaborativa” (FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004, p.7, tradução nossa). O objetivo em questão deve focar a

aprendizagem de um determinado conteúdo o que trará, como consequência, mudanças de atitudes, melhoria do comportamento e comunicação em sala de aula, além do despertar da curiosidade dos alunos.

O planejamento da aula é realizado em torno de um problema desafiador, que envolva o conteúdo pré-estabelecido. Além disso, o planejamento deve considerar o aluno como agente central da aprendizagem, com uma participação ativa. No Japão, é comum o Lesson Study ser aplicado em aulas de resolução de problemas de matemática como eixo orientador. Para a escolha de tal problema, é necessário um forte trabalho de pesquisa sobre a matemática envolvida e dos conhecimentos prévios dos alunos, ou seja,

Professores partilham as suas ideias buscando o melhor design do plano de aula, inspirando-se em suas experiências anteriores, nas observações de seus alunos atuais, no manual para o professor, em seus livros e também em outros recursos. O produto final deste primeiro passo é um plano de aula que descreve detalhadamente o design que o grupo tenha formado sobre o seu plano de aula. (FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004, p.7, tradução nossa).

Destarte, os professores terão uma compreensão mais profunda acerca do problema e conteúdo proposto para aquele planejamento, contribuindo tanto com a construção do conhecimento específico para se ensinar matemática, quanto para que a aprendizagem do aluno se torne mais abrangente. Na elaboração conjunta são debatidos: situações propostas para o princípio da aula e por quais motivos elas são pertinentes para aquele público (FUJII, 2014); se a proposta está adequada ao contexto dos alunos (ISODA; OLFOS, 2009; FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004); questionamentos que serão realizados para conduzir a aula; quais respostas são esperadas para esses questionamentos; dúvidas poderão surgir; obstáculos epistemológicos que serão encontrados, bem como alternativas metodológicas que poderão ser utilizadas (ISODA; OLFOS, 2009). Nessa busca conjunta, os professores se (re)formam continuamente, e o debate gerado, torna-se rico devido ao compartilhamento de informações e experiências.

É válido destacar ainda que Fernandez e Yoshida (2004) dividem o planejamento (primeira etapa do Lesson Study) em três seções – Uma Introdução do Plano de Aula; Informação sobre a Unidade e Informação sobre a Lição, que objetivam detalhar profundamente, a atividade que se intenciona aplicar na aula.

Assim, na primeira seção (Uma Introdução do Plano de Aula), os autores defendem que é necessário que o professor planeje uma introdução que conste descrições básicas acerca dos

sujeitos que participarão da aula, o tempo, a data em que ela ocorrerá, bem como aspectos relacionados ao contexto, interesses e atitudes dos alunos, seus conhecimentos prévios, o que os motivam, informações acerca do que é necessário e quais objetivos almejam com a unidade proposta (FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004).

A segunda seção (Informação sobre a Unidade) visa levantar informações acerca do(s) conteúdo(s) que será(ão) abordado(s), das metas/objetivos propostos com cada atividade, alguns conteúdos que estejam relacionados com as atividades propostas, bem como esclarecimentos sobre a organização das atividades em blocos. Desse modo, no caso deste trabalho, é importante que o professor realize um levantamento dos conteúdos matemáticos podem ou não estar relacionados com o problema que está sendo proposto, pois ele deve se antecipar às reações dos alunos e planejar como irá sanar as dúvidas ou utilizar as possíveis contribuições advindas de seus estudantes.

Por fim, a última seção (Unidade e Informação sobre a Lição), centra-se em aspectos referentes ao próprio plano. Nela, os professores devem levar em consideração

[...] as dimensões, ao longo do qual, as reações do aluno para esta atividade serão avaliadas. Estas dimensões envolvem o interesse do aluno e sua atitude, suas maneiras de pensar, como eles processam conceito, e seu conhecimento. Sob formas de pensar, por exemplo, os professores planejam olhar para a capacidade do aluno para resolver problemas usando conceitos previamente aprendidos. (FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004, p. 45, tradução nossa).

Os autores ainda sublinham, que essa última seção, constitui “o coração do plano de aula” (FERNANDEZ; YOSHIDA, 2004, p.45, tradução nossa). Ela é intitulada ‘Progresso da Aula’ e é organizada em uma tabela que relaciona a explicação da atividade que será proposta, quais os questionamentos que os professores realizarão aos alunos em cada momento da aula, bem como textos que objetivam direcionar o professor no fechamento da atividade com as reações esperadas pelos alunos, diferentes estratégias de solução que podem ser formuladas pelos alunos e quais aspectos serão considerados como critério de avaliação.

Ao se tratar de diferentes estratégias de solução para o mesmo problema, é válido ressaltar a importância dessa característica, pois Souza e Guimarães (2015) nos trazem esclarecimentos sobre diversas representações mentais que podem emanar a depender de como ele é proposto. Diferentes estratégias de solução podem ser formuladas pelos alunos a partir da geração de diferentes modelos de representação mental. Em outras palavras, dependendo de como o

professor apresente o trabalho inicial, diferentes modos de pensar podem surgir e consequentemente diferentes estratégias de solução podem ser propostas pelos alunos, inclusive o bloqueio mental.

Portanto, a primeira etapa vai além de um planejamento simples como é comumente concebido no Brasil e denunciado por Baldin (2009), que nos conta que

[...] tal prática [Lesson Study] não é vista no Brasil. Raramente, os planejamentos de aula contêm tal nível de detalhamento, nem são revistos após as aulas, a não ser possivelmente para registro de que algum conteúdo não fora executado. (BALDIN, 2009, p.2).

Na segunda etapa do Lesson Study (Execução), ocorre a aplicação do plano que foi elaborado em conjunto. Nela, um professor (regente da turma) aplica o planejamento em sua aula, enquanto os demais professores que participaram da elaboração do plano de aula, atuam como observadores (aqui denominados professores-pesquisadores) com foco na relação recíproca entre a prática do professor e aprendizagem dos estudantes. Fujii (2014) ainda adverte que não é objetivo que o plano de aula seja um roteiro que deva ser seguido literalmente pelo professor. Ao contrário, ele deve ser constituído por um conjunto de ações que orientem a condução de sua aula.

Verificamos que a observação realizada pelos presentes na execução da aula é direcionada. Nela, os professores observadores, com o plano de aula elaborado em mãos, anotam todas as situações ocorridas, destacando as respostas, dificuldades e facilidades dos alunos, atitudes e respostas do professor, bem como se o planejamento atingiu o objetivo, ou se é necessário realizar um novo planejamento a fim de melhorar o que já foi posto em prática. No decorrer da abordagem, Fernandez e Yoshida (2004) descrevem o transcorrer de uma aula que foi planejada nos moldes do Lesson Study. Nela, é possível observar que, inicialmente, o professor apresenta o problema a ser trabalhado com os estudantes a partir de uma situação que seja familiar a eles.

Após essa problematização, os alunos iniciam a tentativa da resolução, individualmente, ou em grupos, enquanto o professor regente bem como os professores-observadores, fazem anotações cuidadosas sobre os processos e estratégias utilizadas pelos alunos para resolver os problemas. Essas anotações são pertinentes não apenas na investigação das estratégias utilizadas, mas também no processo de mediação das diferentes respostas que poderão ser alcançadas, a fim de promover uma rica discussão sobre o problema em questão. Em um terceiro momento, ocorre

um resumo e reflexão do que foi realizado na aula, visando refletir, discutir e aprimorar os conceitos e habilidades matemáticas dos estudantes.

É importante destacar que os professores observadores (aqui denominados professores- pesquisadores) podem ser os próprios docentes da escola, de outras escolas e, até mesmo, de universidades. O papel desses professores-pesquisadores é apenas o de observar as diversas esferas da aula e não o de ajudar ou opinar durante o desenvolvimento da atividade.

Fernandez e Yoshida (2004) realçam que no Japão, geralmente, existem profissionais específicos pertencentes ao que corresponderia à Secretaria de Educação brasileira, que são responsáveis por irem às escolas e acompanharem o Lesson Study praticado nelas. Outro fato que vale destacar é que professores de diferentes escolas são convidados à participar dos ciclos do Lesson Study. Na etapa de Discussão/Avaliação, que ocorre no Lesson Study, o professor regente e os observadores reúnem-se imediatamente após o acontecimento da aula. Nesse momento, são discutidos e refletidos aspectos positivos e negativos da prática de ensino do professor, que serão, inclusive, base para o replanejamento e a reexecução da aula, reiniciando o ciclo planejamento, execução e discussão/avaliação. Além disso, é objeto de discussão nessa reunião, os impactos da ação do professor sobre a aprendizagem, ingrediente igualmente importante para a reformulação da aula. Todos os observadores (professores-pesquisadores) e os professores (alunos-professores) do Lesson Study, são convidados a discorrer sobre suas observações e sugestões para o aprimoramento da atividade. Isoda e Olfos (2009) sustentam que os principais pontos a serem observados na execução da aula são com relação à efetividade das situações de aprendizagem propostas aos estudantes; se o que foi planejado contribuiu para a aprendizagem dos alunos; se será necessário alterar os objetivos básicos estabelecidos e os princípios didáticos que orientaram as ações.

Nessa etapa, ao se analisar a execução da aula planejada, o professor tem a oportunidade de refletir sobre sua própria prática, por meio das contribuições dos observadores. Ao ouvi-las atentamente, é possível identificar acertos e falhas que poderiam não ser observados, caso não houvesse observadores na aula. Além disso, por meio das discussões e reflexões conjuntas, é possível reformular o planejamento inicial, com o objetivo de aperfeiçoar tanto a aula, quanto a prática do professor atuante. Outro ponto importante a ser destacado é que por meio dessa

reflexão, o professor adquire maior compreensão dos diferentes processos de raciocínio dos alunos, bem como aperfeiçoa os saberes necessários para a prática docente.

Sendo assim, Isoda e Olfos (2009) ressaltam que o Lesson Study contribui para o ensino em duas esferas. A primeira refere-se à esfera epstemólogica do professor, que ao integrar um Lesson Study, poderá aperfeiçoar seus conhecimentos acerca dos elementos que emanam da prática educativa, tais como: conceitos do conteúdo lecionado, metodologias a serem utilizadas no ensino da disciplina ministrada, orientações curriculares e demais elementos pedagógicos e, também, didáticos. Para além, o docente pode ampliar sua habilidade em: observar e compreender o raciocínio e as produções dos estudantes; de utilizar essas produções para potencializar a ação didática e de conectar seu planejamento de aula aos objetivos estabelecidos a longo prazo. A segunda vale-se dos resultados que o método oferece à comunidade escolar, que se estimula em melhorar o trabalho docente, por meio da colaboração, a projetar o Lesson Study como um trabalho inserido às ações da escola, além do caráter avaliativo que se torna uma prática compartilhada.

É válido evidenciar a importância da etapa da reelaboração do plano de aula antes aplicado levando em consideração as observações realizadas pelos participantes. Ao percorrer as quatro etapas (planejamento, execução, discussão/avaliação e replanejamento) expostas, o professor e os demais participantes são levados a refletir sobre diversos aspectos do ensino permitindo, assim, que os participantes confrontem a teoria com a prática e que explorem pontos divergentes com intuitode buscar um equilíbrio entre ideias.

Mediante as informações coletadas em Fernandez e Yoshida (2004) e Isoda e Olfos (2009), nós entendemos o Lesson Study não como um ciclo, mas como etapas que se repetem em níveis de conhecimento diferenciados e avançados. Dessa forma, nosso entendimento do Lesson Study assume uma estrutura em forma de espiral – representada pela Espiral do Lesson Study - pois é uma configuração que transmite a ideia de que a cada nova edição da aula planejada/executada/refletida, experiências da(s) edição(ções) anterior(es) são incorporadas às antigas, elevando o nível de maturidade como em um continuum, conforme a Figura 4.

Figura 4 - Representação do Lesson Study conforme o entendimento dessa pesquisa

Fonte: Souza; Wrobel e Gaigher (no prelo) tradução nossa

Para efeito deste trabalho, não tomaremos todos os aspectos originais do Lesson Study. O estudo acerca do currículo e a definição de um conteúdo matemático central para o efetivo ciclo do método não serão utilizados por nós. Aqui contamos apenas com a estrutura ciclíca do Lesson Study, da Resolução de Problemas como eixo orientador das aulas e aspectos colaborativos e reflexivos ligados à prática do profissional docente. No entanto, conteúdos matemáticos estarão incorporados na resolução de cada problema.