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Nas áreas da saúde e do serviço social, D. Moisés viabilizou a vinda das Irmãs de Nossa Senhora da Caridade do Bom Pastor para atuarem no asilo do Bom Pastor e no Centro de Reeducação Feminina; das Salesianas que se encarregaram da Casa de Saúde Frei Martinho e das Vicentinas para prestarem serviço na Maternidade Cândida Vargas e no Hospital São Vicente de Paula. Somam-se ainda, ao seu conjunto de obras sociais, a instituição dos Círculos Operários com a criação da Federação Estadual dos Operários e o incremento à obra social do clero sob sua direção, tanto na capital como no interior do Estado, com destaque para as obras do cônego Ruy Vieira, pároco de Areia. A opção pelos humildes conferiu ao seu episcopado um caráter diferenciado em relação ao seu antecessor.

Em síntese, podemos afirmar que, na Paraíba, a instalação da República (1889), de extinção do padroado (1890) e de expansão da estrutura eclesial, com a criação da diocese (1892), viabilizaram a incorporação da ortodoxia romana centralizada no episcopado de D. Adauto (1892-1934), e sua continuidade com o episcopado de D. Moisés (1935-1959), preparado por D. Adauto em todos os estágios de sua vida religiosa para consolidar a reforma ultramontana no território paraibano.

2.4 REPRESENTATIVIDADE EM AREIA

Antes mesmo de conquistar sua emancipação política que se daria em 1815, Areia alcançou sua emancipação eclesiástica, quando, desmembrada da freguesia de Mamanguape, tornou-se, em 1813, a mais nova paróquia da diocese de Olinda, tendo como primeiro vigário o português frei João de Santa Tereza e, sequencialmente, os padres Antonio José de Brito e José Gonçalves de Medeiros. Precocemente, a nova paróquia recebeu as influências de Roma, através do seu quarto vigário, Manoel Cassiano da Costa Pereira que, antecedendo-se a D. Adauto, foi o primeiro areiense a se formar em curso superior em Roma, e no ano de 1821 rezou sua primeira missa na terra natal.

No paroquiato do padre Francisco de Holanda Chacon (1834-1886), seu coadjutor Padre Joel Esdras Lins Filho, implantou a devoção a Santa Rita, seguido pelo Pe. Sebastião Bastos que atuou de 1886-1888. O ministério de Odilon Benvindo de Almeida e Albuquerque (1888-1912) foi, em parte, coetâneo ao episcopado de D. Adauto. Destacando-se dos vigários de então, acomodados na sacristia e no batistério de suas matrizes, Benvindo mereceu o maior respeito e acatamento do seu bispo, pois morreu pugnando pela elevação cultural e pela

moralização dos costumes dos seus paroquianos, nos moldes ultramontanos. Foi ele o responsável imediato pela ereção da matriz de Nossa Senhora da Conceição e da capela de Santa Rita no colégio do mesmo nome, para o qual diligenciou a vinda das irmãs da congregação francesa da Sagrada Família.

Seu sobrinho e sucessor Francisco Coelho de Albuquerque foi igualmente operoso em dois paroquiatos (1912-1925 e 1929-1933), intercalados pela gestão do padre Emiliano de Cristo (1925-1928). Em seguida, assumiu a paróquia o padre João Coutinho (1933-1937), um dos responsáveis pela reforma do Colégio Santa Rita e pela vinda das irmãs franciscanas de Dillingen, em substituição às irmãs francesas da Sagrada Família que, não obtendo no Colégio Santa Rita o apoio e o sucesso alcançados por suas co-irmãs do Colégio Nossa Senhora das Neves, em João Pessoa, deixaram Areia em 1920, sendo redistribuídas para outras casas da congregação.

Sucedendo ao padre Antonio Costa (1937-1940) destacou-se o padre Francisco Gomes de Lima (1941-1948), que fora preparado por D. Adauto e assumira a função de seu secretário particular. À frente da paróquia de Areia, o padre Lima (Ilustração 07) acumulou as funções de diretor e professor no Colégio Santa Rita, vindo depois a consagrar-se como expoente da historiografia eclesial paraibana.

Ilustração 07 - Pe. Francisco Gomes de Lima

Pároco de Areia, professor e Diretor do Colégio Santa Rita (1942-1948) Fonte: Arquivo Eclesiástico da Paraíba

No interregno 1948-1949, revesaram-se o Monsenhor João Antonio de Melo, vigário de Esperança, e frades franciscanos, que entregaram, em outubro de 1949, a paróquia ao padre Ruy Barreira Vieira, arquiteto de uma rede educacional, cultural e social nas zonas rural e urbana do município, e autor de sólido trabalho como professor em quatro instituições educacionais na cidade de Areia (TORRES, 1990).

Dos párocos acima mencionados, todos os que sucederam ao padre Sebastião Bastos, incluindo coadjutores e capelães, estiveram sob o comando de D. Adauto Aurélio de Miranda Henriques e de D. Moisés Coelho, responsáveis diretos pela implementação e consolidação do catolicismo ultramontano na Paraíba. A paróquia de Areia foi, por muitos anos, o epicentro do episcopado de D. Adauto, que se empenhou para tornar frutuoso o múnus de pastor em sua terra natal.

Inspirado no exemplo de D. Antonio de Macedo Costa, que liderava a Reforma Ultramontana no Brasil, o cônego Adauto reuniu privativamente os onze sacerdotes presentes na cidade de Areia por ocasião da festa da padroeira em dezembro de 1890, para discutirem a posição da Igreja no novo regime republicano. O conclave foi censurado pelo jornal areiense “A Verdade”, (número de 11 de dezembro de 1890), que alertou ficassem os padres convencidos de que os fins puros, como devem ser, e são os da religião do Nazareno, não se resolvem em conciliábulos, e sim no lugar público como deu exemplo o mártir sublime do Calvário. Foi dirigida a D. Adauto, e teve lugar em sua terra natal, a primeira das muitas reações hostis ao centralismo da Igreja paraibana. Todavia, esta hostilidade não chegou a obstacular a reforma ultramontana em Areia, município paraibano onde se observou mais claramente o consórcio entre a representação eclesial e a elite política, favorecendo as pretensões de Roma e o cumprimento da função pedagógica de manutenção da ordem e correção dos costumes desejada pelo Estado.

Quando da visita do núncio apostólico D. Júlio Tonti à Paraíba, em 1906, Areia, como berço dos estadistas paraibanos, acolheu com quatro dias de festa a comitiva de quatrocentos cavaleiros que subiram a Borborema acompanhando o diplomata pontifício. A representatividade do município era tal que o presidente do Estado (Monsenhor Walfredo Leal), os representantes nas Câmaras estadual (Coelho Lisboa), Federal (Simeão Leal) e no Senado (Álvaro Machado) representavam Areia, assim como o arcebispo (D. Adauto). Todos compunham a comitiva montada, recebida no topo da serra pelo vigário (Odilon Benvindo) também filho de Areia (LIMA, 2007a).

Pela identificação de afinidades entre a elite política e religiosa de então, forjada a partir de vínculos de nascimento e de escolarização e consolidada na mentalidade oligárquica que era marca da cultura política no Estado e particularmente no município, as estratégias expansionistas ultramontanas atingiram seu ponto ótimo em Areia, em uma convergência de propósitos acolhidos pelos senhores de engenho e pelas famílias tradicionais saudosistas de um passado aristocrático que distinguira o município no contexto político e cultural paraibano.

A ação ultramontana encetada por D. Adauto, especialmente na paróquia de Areia, patenteou-se através de múltiplos mecanismos, sempre que possível atuando ele mesmo, como zeloso pastor, em sua terra natal. Durante dez anos pregou os “Sermões da Imaculada” por ocasião da festa da padroeira, em elaboradas prédicas, ao estilo da retórica agostiniana, que conforme seu biógrafo Cônego Lima (2007a), eram revelações do seu espírito construído nos lastros da verdade que adquiriu e solidificou em Roma. Igualmente digna de nota foi a série de conferências que, apontando o catolicismo como único caminho para imprimir significado à vida e alcançar a vitória sobre a morte, empreendeu contra o espiritismo, cujos luminares eram em Areia, relativamente destacados, contando com bacharéis, professores, jornalistas e funcionários públicos.

Consoante com o caráter clerical da reforma ultramontana segundo o qual somente ao clero competia gerir os negócios eclesiais, a Igreja de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos foi, em Areia, praticamente desativada, porque administrada pela irmandade do Rosário. Esta “deposição dos leigos” foi adotada na Paraíba, com tal rigor, que no episcopado de D. Adauto foram demolidas na capital as Igrejas “Mãe dos Homens”, “das Mercês” e “do Rosário dos Pretos”, justamente as que eram geridas por irmandades, suscitando reclamações à Santa Sé contra o centralismo do Arcebispo (LIMA, 2007b).

No episcopado de D. Moisés, menos afeito às questões políticas e mais voltado para a obra evangelizadora, observou-se extraordinária ampliação do ministério católico através da Ação Católica, da obra catequética, das missões, da obra das Vocações Sacerdotais, das Semanas Eucarísticas, da interiorização da imprensa católica, da ereção de capelas nos distritos e municípios e das obras sociais implantadas nas paróquias (TAVARES, 1997; TRINDADE, 2004).

Quanto à formação da juventude feminina, em princípio de inspiração francesa (1911- 1919), e de inspiração alemã, a partir de 1937, respectivamente pelas irmãs da Sagrada Família e Franciscanas de Dillingen, reverberou na preparação das senhoritas para atuarem no

espaço social que a República lhes reservava, em tríplice efeito: como esposas, como mães e como educadoras dos filhos da nação. Para a contraparte masculina, o Ginásio Coelho Lisboa, dirigido pelo padre coadjutor Letício de Azevedo Costa, funcionava em regime de internato e externato, no caráter cívico-religioso então exigido.

Mas não se limitava aos educandários católicos a atuação da Igreja em Areia. Também o Ginásio Estadual e a Escola de Agronomia, primeira instituição superior do Estado depois do Seminário Diocesano36 em João Pessoa, receberam os efeitos da ação paroquial pela atividade docente e de extensão do padre Ruy Barreira Vieira. Quanto às classes populares, eram atendidas com o ensino religioso no Grupo Escolar Álvaro Machado e nas escolas paroquiais.

A solidez da estrutura eclesiástica ultramontana fez perdurar a influência ideológica e cultural do catolicismo, de sorte que Areia foi, talvez, o município paraibano mais fortemente impactado com o esgotamento do modelo de educação católica. O laicismo e a invasão da cultura de massa tiveram efeito de avalanche na vida cultural da cidade, com a mudança radical dos valores e dos costumes até então adotados. É pela resistência heróica das franciscanas, em sua quase totalidade brasileiras, que funciona, atualmente, no Colégio Santa Rita o ensino fundamental, no sistema de co-educação para menos de trezentos alunos. Após vários anos sendo custeado pela Alemanha, o Curso Colegial Normal foi extinto em 2004.

2.5 INGERÊNCIAS NA EDUCAÇÃO FEMININA

A condição feminina no Brasil Colônia e no Brasil-Império tem sido contemplada em importantes estudos37 a partir dos quais podemos reunir traços que remetem a uma identidade comum: de modo geral, a mulher deveria preservar sua virgindade como selo de pertença exclusiva ao marido, submetia-se a múltiplas gravidezes, convivia com elevado risco de morte