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A função mediadora do micromundo Tarta

No documento MARIA DA CONCEIÇÃO MONTEIRO DA COSTA (páginas 171-174)

5.2. Dimensão sócio-cultural do pensamento visual-espacial

5.2.3. A função mediadora do micromundo Tarta

Vejamos como condições interactivas com o micromundo Tarta possibilitaram que o discurso fosse partilhado, um nível potencial mais elevado de cooperação entre alunos e o desencadear dos modos de pensamento visual-espacial dos alunos. Ainda, adequando-me às ideias de Clements e Sarama (1997), quero realçar o uso do micromundo Tarta como um veículo para o desenvolvimento e conexões de ideias em matemática e assim ser tomado como uma metáfora para pensar visual-espacial, produzindo metáforas interelacionadas: o uso do TARTA como ambiente geométrico, o uso do TARTA como robot, o uso do TARTA como diversão, o uso do TARTA como ligação.

Retomemos o episódio 28 onde as interacções dos alunos com o micromundo Tarta envolveram acção (na medida que os alunos através dos comandos primitivos do micromundo e fundamentalmente relacionados com o movimento deslizar movimentavam o Tarta) e percepção, mediação do TARTA relacionada com um modo de pensar PVP (parágrafos 12 a 36). Contudo o contexto externo na sala de aula, determinado pelo micromundo, gestos, figuras, folha de tarefas, diálogos, por si, parecia não serem suficientes para os alunos avançarem na resolução da flor e a intervenção da professora parecia necessária ao grupo. Mais tarde (descrição entre os parágrafos 35 e 36) o micromundo apoiou o Delfim na percepção da mudança do passo do Tarta, mediação semiótica. Assim uma nova figura foi construída. O Delfim e o micromundo actuaram como mediadores suportando o pensamento visual-espacial do Abel (parágrafos 36 e 37).

Vamos agora examinar outra vez o episódio 9. Delfim parecia que estava a fazer ventriloquismo, pois limitava-se a fazer o que Abel lhe tinha mandado (parágrafo 51), mas quando construiu T15, percepcionou que a figura construída não estava embutida na estrutura da flor. O micromundo Tarta apoiou o Delfim na percepção da estrutura da flor e na comparação da figura construída. Isso obrigou-o a chamar o colega e a partilhar o seu discurso interior evidenciando assim o seu modo de pensar visual-espacial, modo PVP (linha 52). Novamente Abel indicou ao Delfim o que devia fazer e este fê-lo sem se saber se Delfim estava a perceber ou não. Contudo depois da sua construção T16 (usando o micromundo Tarta) e do Abel dizer apa, foi despoletado no Delfim a compreensão do que estava a fazer e a antecipação de como deveria continuar, ou seja um pensar visual-espacial resultante da manipulação mental de imagens começou a ser vivido, modo PVMM e que se traduziu em verbalização, num gesto social (parágrafo 55) e nas construções T17 e T18. Parece que os papéis desempenhados pelo micromundo e pelo colega Abel nesta altura foram fundamentais para o Delfim, ambos foram mediadores no desencadear do pensamento visual-espacial ligado à manipulação mental de imagens. Assim talvez possamos referir que o computador e o Abel actuaram como suportes para trabalhar a ZDP do Delfim, apoiando-lhe a vivência e apropriação do modo PVMM e as construções T17 e T18. Repare-se ainda que neste excerto das interacções vividas pelos alunos do grupo 1, não havia propriamente um diálogo entre os alunos, o Abel era a voz da autoridade e por tal tinha saber e poder. O Delfim apropriou-se dos significados do Abel e fez a correspondente internalização (parágrafo 55). A dinâmica mental de Abel foi sempre apoiada ou seja mediada pelo uso do micromundo Tarta onde abstracções elaboradas baseadas nas relações percebidas foram evidenciadas (parágrafo 53).

O micromundo Tarta constitui um ambiente geométrico onde os comandos do TARTA ao serem usados, manipulam ideias matemáticas de deslizar, virar e rodar. Os alunos

observam os resultados e reflectem sobre eles. Os alunos começam a consciencializar-se informalmente das propriedades das transformações geométricas. Ao focarem a sua atenção nas componentes dos movimentos rígidos, eles não só trazem ao consciente movimentos físicos como vão melhorando as suas compreensões sobre ângulo, recta, perpendicularidade, direcção horizontal, direcção vertical, simetria, formas, medida (ângulos, lados). Abstracções são encorajadas a serem construídas do visual, não tanto de percepções mas mais da organização de acções sobre os objectos e incluiem imagética dinâmica. Voltemos ao episódio 9, Delfim consegue abstrair organizando acções (eliminar um Tarta) para a construção de T17 e imaginar o movimento virar do Tarta para a construção T18. Para a primeira construção T17, Delfim usufruiu não só da mediação do micromundo como também da mediação do colega Abel.

55 Abel: apa.

56 Delfim: apa (indicando com o dedo que estava a perceber) . Agora sou eu que faço. (Faz a construção T17.)

(Abel chama a Professora para lhe mostrar o que tinham feito enquanto Delfim continua a construir a

flor, mudando o passo, para “o passo1”, identificando a linha em torno da qual iria virar o Tarta, e

procurando os respectivos pontos para a linha de viragem ser traçada).

57 Delfim: Ora Vira, vira, vira. (Cantarolando e fazendo gestos com a mão fez a construção

T18.)

O uso do micromundo Tarta é uma diversão porque mudar os comandos ao TARTA revelam-se actividades motivantes para a maior parte dos alunos. Criar uma figura é geralmente fonte de considerável orgulho. Reparemos por exemplo, no episódio 29, na grande motivação dos dois alunos durante todo o episódio para construir as diferentes figuras da tarefa espinha acompanhada por gestos sociais (baterem as palmas das mãos).

25 Delfim: Vira seguido de enter. (Aparece no ecrã T10.

Delfim bate a palma da sua mão com a outra palma do colega e disse:) Agora outra vez linha. (Abel começa a falar e apontar para o ecrã e a mexer nas teclas, não se percebe o que faz, mas no ecrã está a figura T11.)

26 Abel: Ó professora, agora que íamos também olhe o que aconteceu !! (Ninguém lhes ligou e

Abel apaga tudo com limpatudo e rapidamente começam tudo de princípio e ora um aluno ora outro constróem a figura T10, depois alternadamente as figuras T12, T13 e T14 sem qualquer dificuldade). 27 Delfim: (Construiu T12

e no fim bateu uma palmada na palma do colega como a passar a tarefa seguinte.)

28 Abel: (Construiu T13

e ... até acabar a tarefa).

O uso do micromundo Tarta é como um robot, os objectos (Tarta e Azulejo) do TARTA executam comandos. Fazem exactamente o que os mandam fazer. A linguagem do TARTA dá feedback que pode ser usado para reflectir de forma natural sobre as ideias, intuições, estratégias de alguém. O Abel e o Delfim ao construírem a tarefa espinha, episódio 29, no seu contentamento pelo sucesso na execução trocaram os movimentos deslizar por virar (agora outra vez linha). A figura construída no ecrã assinalou essa confusão, mostrando o Tarta virado em torno de uma linha vertical escolhida pelo micromundo. Os alunos não o perceberam, não relacionaram as várias imagens, e apressadamente apagaram tudo e recomeçaram a tarefa (parágrafo 25 e 26).

O uso do micromundo Tarta com uma ligação que faz a transição do pensamento geométrico visual para o geométrico descritivo. Os comandos do micromundo e as figuras produzidas no ecrã ajudam então a fazer conexões mentais entre diferentes representações e diferentes conhecimentos. No TARTA, a ênfase é dada não tanto às figuras construídas mas mais às acções físicas (movimentos rígidos) e conexões dinâmicas mentais desenvolvidas entre as representações o que obriga o envolvimento por parte dos alunos em imagética dinâmica.

No documento MARIA DA CONCEIÇÃO MONTEIRO DA COSTA (páginas 171-174)