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CAPÍTULO IV – INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS Nova

7.2 Group Litigation Order do Direito Inglês

líderes (Musterkläger ou o Musterbeklagte) não recorram, ou desistam dos recursos por ventura interpostos, a lei prevê a nomeação de outros líderes.

7.2 Group Litigation Order do Direito Inglês

No direito inglês há três formas de resolução de litígios de massa. Um deles é pelo Group Litigation Order, o segundo é por meio de ação representativa e o terceiro por meio de legislação fragmentada sobre diferentes problemas490. Ater-nos-emos à primeira das formas.

No direito inglês, em meados da década de 80 surgiu uma multiplicidade de demandas, sem que houvesse sequer regra específica para tutela coletiva de direitos individuais491. A doutrina cita o caso do benzodiazepínicos como exemplo dessa litígio de massa492. Antes desse caso, cita-se o problema da focomelia (má formação) causada pela talidomida, tendo sido necessárias duas décadas para resolver os problemas decorrentes desse medicamento, o que teve início nos idos de 1960493.

A regulamentação legal da GLO494 ocorreu com a edição do Código de Processo Civil

Inglês (CPR).

De acordo com o Código Inglês, a GLO é considerada uma ação de grupo. As ações de grupo são diferentes das ações de classe, porque nas ações de grupo cada membro do grupo é considerado litigante495. Por conta disso, ao contrário do que ocorre no direito americano, aqui

490 MULLENIX, Linda. Os processos coletivos nos países de civil law e common law: uma análise de direito

comparado. São Paulo: RT, 2008, p. 260

491

Apesar de as class actions terem origem nas ações representativas da Inglaterra, ainda no século passado houve grande restrição às demandas indenizatórias, porque elas poderiam ser ajuizadas individualmente.

492 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 11

493 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 11. No direito

brasileiro criou-se a Lei 7.070/1982 para conceder pensão especial aos portadores da “síndrome da talidomida”. Talidomida era um medicamento indicado para náuseas que acabou causando efeitos colaterais gerando má formação fetal.

494 Group Order Litigation

495 “Group actions are different from class actions because each group litigant is a member of a procedural class

as a party, rather than as a represented non–party. (ANDREWS, Neil. Multi-party proceedings in England: representative and group actions. Duke Journal of Comparative & International Law, vol. 11. Durham: 2001, p. 249)

estaremos diante do ingresso de terceiros na demanda e não da exclusão (mecanismo do opt in, diferentemente das class actions em que se adota o opt out)496.

As questões que poderão dar ensejo à formação do grupo poderão ser tanto de direito como de fato, semelhantemente ao que acontece no direito alemão e diferentemente do previsto no incidente de resolução de demandas repetitivas brasileiro.

Na GLO, os poderes dos juízes são mais amplos para controle eficiente do julgado497.

A “Multi-party action” difere-se das “class actions” do sistema norte americano, pois nestas há vinculação de todos os membros daquele grupo ao resultado da demanda498.

A doutrina cita como casos passíveis se serem enfrentados por meio desse procedimento os decorrentes de responsabilidade civil499. Citam-se problemas decorrentes do

manuseio de amianto por trabalhadores, bebidas quentes servidas pelo Mc Donald’s, remoção de órgãos de crianças falecidas, trombose decorrente de voos longos etc500.

Por admitir a análise de questões de fato, o julgamento afeta apenas as partes de outras demandas já propostas que fizeram parte do registro da GLO ao tempo do julgamento, salvo se a corte decidir de forma diferente.

Aqui adota-se o sistema opt in, pois o Tribunal estabelece uma data final para que novos litigantes façam parte da demanda e possam se beneficiar com o resultado do processo501. Os indivíduos deverão aderir ao processo em grupo. Pode também o Tribunal determinar que as ações individuais ajuizadas separadamente sejam agrupadas numa GLO502.

496 MULLENIX, Linda. Os processos coletivos nos países de civil law e common law: uma análise de direito

comparado. São Paulo: RT, 2008, p. 260; ANDREWS, New. Multi-party litigation in England: current arrengements and proposals for change. Revista de processo. vol 167. São Paulo: RT, 2009, p. 271 e ss

497 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 12 498 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 13 499 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 24 500

Para informação sobre as GLO: http://www.justice.gov.uk/guidance/courts-and-tribunals/courts/group- litigation-orders.htm Acesso em 19.11.2011, às 9h50

501 Há certa semelhança com o chamado litisconsorzio aggregato do direito italiano, pois lá a parte poderá optar

por aderir à demanda e assim o fazendo, sua sorte dependerá do resultado da demanda coletiva. E, segundo Tarrufo, a decisão coletiva terá caráter persuasivo sobre a ação individual futura. TARUFFO, Michele.

Precedente e giurisprudenza. Rivista Trimestrale di diritto e procedura civile. 2007, p. 712.

502 ANDREWS, Neil. O moderno processo civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na

No sistema Inglês há a previsão do julgamento de uma ação teste (Rule 19.15), que vinculará as demais demandas previamente registradas, salvo se a Corte decidir de forma diferente (Rule 19.12.1.a).

Não há vinculação com as demandas futuras (as partes podem aderir à demanda, sendo estabelecida uma data de corte – cut of date). Apesar de haver uma data limite para a afetação daqueles que optaram pelo seu ingresso, o resultado da ação deverá ser considerado pelo Tribunal como leading case para o julgamento das ações futuras. De acordo com a sistemática, haverá a vinculação apenas daqueles que aderiram ao grupo. Não há vinculação para casos futuros, diferente do que é previsto para o incidente de resolução de demandas repetitivas. Não obstante, anota Christopher Hodges que o fato de não vincular causas futuras não significa que as partes podem ajuizar demandas sem que tragam fatos novos. Permite-se o ajuizamento de novas ações porque se houver novas provas o Tribunal poderá julgar de forma diferente503. Ao que tudo indica, a questão seria similar à formação da coisa julgada num

processo coletivo e não a efeito vinculante da decisão. Ocorre que a coisa julgada nesse caso seria formada não secundum eventum litis, mas secundum eventum probationis, não impedindo o manejo de ação individual, porque a parte poderá trazer elementos novos; todavia, se não os trouxer, poderá estar praticando um abuso no direito de demandar.

No total, até 19/11/2011 as Group Litigation Orders que tramitavam perante Queen’s Bench somavam o total de 75 demandas504.

A instauração do procedimento poderá decorrer de iniciativa de qualquer das partes ou mesmo de ofício pelo juiz505 (difere-se do sistema alemão, na qual o juiz não poderá dar início

ao Musterverfahren).

As GLO são registradas e esse registro é mantido pelo Senior Master e pela Law Society. Na High Court há previsão de uma audiência para tentativa de acordo, da qual poderão participar até 100 advogados, representando 3.400 autores e 3 réus. “Pode haver até seis Silks na linha de frente e grupos de Junior Barristers e solicitors atrás delas” 506.

503 HODGES, Christopher. Multi-Party Actions. Oxford: Oxford University Press, 2001, p. 43-46

504 http://www.justice.gov.uk/guidance/courts-and-tribunals/courts/group-litigation-orders.htm Acesso em

19.11.2011, às 9h50

505 CONSOLO, Claudio; RIZZARDO, Dora. Due modi di mettere le azioni collettive alla prova: Inghilterra e

Germania. Rivista Trimestrale di Diritto e Procedura Civile. vol. LX, n. 3. Milão: Giuffrè, 2006, p. 899

506 ANDREWS, Neil. O moderno processo civil: formas judiciais e alternativas de resolução de conflitos na

De acordo com o então507 Senior Master da Queen’s Bench Division (que seria como um órgão da High Court criado para casos maiores, fazendo parte do Tribunal em 1º Grau), nas ações em que ele esteve envolvido foi possível a realização de acordo ou prolação de decisões em cerca de um terço ou metade do tempo previsto para o trâmite de uma demanda comum508.

Verifica-se outra diferença em relação ao incidente de resolução de demandas repetitivas brasileiro: no direito inglês há a possibilidade de transação. Pensamos que no direito brasileiro, em razão de defendermos o posicionamento de que o incidente formará precedente sobre a forma com a qual a lei deva ser interpretada e aplicada, não poderão as partes transacionar sobre isso509.