• Nenhum resultado encontrado

Ideias dos educadores sobre critérios de qualidade

CAPÍTULO II: Educação e cuidados de elevada qualidade para crianças com idade inferior a

4. Ideias dos pais e dos educadores sobre a qualidade dos contextos de educação e cuidados

4.2 Ideias dos educadores sobre critérios de qualidade

Se os estudos que abordam as ideias dos pais sobre qualidade em contexto de creche e/ou jardim-de-infância são raros, os estudos que abrangem as ideias dos educadores são praticamente inexistentes. Relativamente às ideias dos educadores de infância sobre a creche, Coelho (2004, p. 2) desenvolveu um estudo em Portugal que pretendeu “explorar as conceptualizações (crenças e teorias) que os educadores organizam através da sua experiência com crianças com menos de três anos em contexto de creche, nomeadamente as suas crenças e teorias em relação a esse contexto, às crianças e ao processo educativo”. Os dados recolhidos através de entrevistas a 14 educadoras de infância permitiram definir quatro temas: (1) a agenda das educadoras, (2) desenhando o currículo, (3) (re)definindo a profissionalidade e (4) (re)formulando as concepções acerca da creche. Coelho (2004, p. 254) explica que a agenda das educadoras corresponde “aos princípios que as educadoras formularam prontamente como orientações para a sua acção em creche” e que os restantes “correspondem essencialmente aos processos através dos quais as educadoras foram, ao longo do processo de investigação, conferindo significado às diversas dimensões da sua actuação e do contexto em que a desenvolvem”. Relativamente aos princípios que orientam a sua acção em creche, foram criadas quatro categorias: (1) centrar-se na afectividade, (2) individualizar a intervenção, (3) desenvolver e socializar a criança e (4) articular com as famílias. Coelho (2004) verificou que todas as educadoras exprimiam a convicção de que devem, antes de mais, considerar as necessidades emocionais da criança como orientação para a sua acção, isto é, a afectividade ocupava um lugar central. No entanto, também a promoção do desenvolvimento da criança ocupava lugar de destaque, tendo sido referida por todas as educadoras. No estudo de Coelho foi evidenciada a falta de um referencial que oriente as práticas em contexto de creche, sendo que a “organização de orientações de natureza curricular, à semelhança do que foi elaborado para a educação pré-escolar, é considerada

Capítulo II

116

como ‘bem-vinda’, não só pela instrumentalidade do documento em si mesmo, mas também porque as educadoras veriam nessa iniciativa um indicador do reconhecimento da dimensão profissional da sua intervenção em contexto de creche (Coelho, 2004, p. 302).

Alguns estudos debruçaram-se, simultaneamente, sobre as ideias dos pais e dos educadores de infância acerca da qualidade deste tipo de contextos. Num estudo realizado por Pierrehumbert, Ramstein, Karmaniola, Miljkovitch e Halfon (2002), foram definidas sete dimensões relativas aos cuidados: disponibilidade (paciente, disponível, competente, atento), estimulação, firmeza, relações calorosas, autonomia, desempenho e organização, a partir de entrevistas realizadas a mães, prestadores de cuidados, investigadores, legisladores. Relativamente a estas sete dimensões, os prestadores de cuidados extrafamiliares pareciam valorizar mais o aspecto “profissional” dos cuidados, como a disponibilidade e a organização, enquanto que as mães valorizavam mais os aspectos relacionais.

Um dos objectivos do estudo ECCE era também descrever as orientações educacionais (atitudes e opiniões) dos pais e dos educadores de infância de crianças em idade pré-escolar, o que incluía as concepções do adulto sobre a criança em desenvolvimento, as suas expectativas em relação ao desenvolvimento das crianças, as suas crenças acerca do impacto da educação nos comportamentos e características das crianças, os seus objectivos educativos e ideias acerca das condições adequadas em termos da educação das crianças, bem como as ideias relativas ao papel da família e do contexto formal na educação e cuidados da criança. Pretendia estudar-se também as concepções de mães e de educadores sobre o que é importante em termos da qualidade de um jardim- de-infância e quais deveriam ser as principais funções destes centros (ECCE Study Group, 1997). Este estudo encontrou muitas semelhanças entre os resultados dos países participantes. As principais conclusões foram: (1) os educadores e as mães dos quatro países tinham expectativas semelhantes relativas à idade em que as crianças deveriam adquirir determinadas competências (linguagem, autonomia, competências motoras, desenvolvimento social) e havia acordo em relação à sequência do desenvolvimento (o que é esperado primeiro e o que se segue); (2) a maioria dos participantes partilha uma perspectiva moderna sobre o desenvolvimento, percebendo que é a combinação da hereditariedade e da educação que tem efeito nas diferenças individuais das crianças; (3) em geral, as mães e os educadores consideram que os pais têm um efeito mais forte no desenvolvimento das crianças do que têm os educadores de infância; (4) a criança é vista pelos educadores e pelas mães como um indivíduo que deve ser educado de forma a encorajar e promover o desenvolvimento, valorizando a iniciativa da criança e vendo a educação como um impulso para que a criança construa o seu próprio desenvolvimento; (5) as mães e os educadores deram maior importância ao papel do

Educação e cuidados de elevada qualidade

jardim-de-infância no desenvolvimento pessoal da criança, seguido pela função de socialização e atribuíram menor importância à função de supervisão; (6) as mães e os educadores consideravam que o facto de haver profissionais treinados e competentes era o factor mais importante de um centro, seguido pelos materiais educativos adequados e, finalmente, pelos aspectos organizacionais relacionados com os cuidados (e.g., horário de funcionamento) (ECCE Study Group, 1997). As mães portuguesas tendiam a ser mais directivas nas suas abordagens à educação das crianças e esperavam que determinadas tarefas desenvolvimentais acontecessem mais tarde do que as mães dos outros países. As mães portuguesas e espanholas tendiam a valorizar mais do que as mães dos outros países os aspectos relacionados com a saúde e a segurança e menos os aspectos relacionados com o bem- estar das crianças e a adequação do programa e dos materiais. As diferenças entre países nas respostas dos educadores eram muito ténues, o que, segundo esta equipa de investigação, se pode dever aos efeitos da formação, que cria crenças e valores semelhantes. De qualquer modo, os educadores de infância portugueses esperavam um desenvolvimento da criança, em geral, mais tardio, mas esperavam o desenvolvimento da linguagem mais cedo do que os educadores da Alemanha e da Áustria (ECCE Study Group, 1997). Comparando educadores de infância e mães, verificou-se que (1) os educadores tendiam a considerar-se mais importantes no desenvolvimento das crianças do que as mães os consideravam; (2) os educadores tendiam a revelar atitudes relacionadas com a educação das crianças menos directivas e menos orientadas academicamente, dando maior ênfase ao desenvolvimento social, do que as mães; (3) os educadores tendiam a valorizar mais, no jardim-de- infância, as tarefas promotoras do desenvolvimento das crianças, enquanto que as mães valorizavam mais as tarefas relacionadas com as regras sociais , com a saúde e com a segurança (ECCE Study Group, 1997).