• Nenhum resultado encontrado

Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos

CAPITULO IV: Método

2. Instrumentos

2.1 Qualidade das salas de creche avaliada por observadores externos

Os observadores externos avaliaram a qualidade das salas de creche, utilizando (1) a Escala de Avaliação do Ambiente de Creche - ITERS-R (Harms et al., 2003), (2) o Registo do Envolvimento de Grupo - Check II (McWilliam, 1998) e (3) uma grelha de registo de características estruturais da creche/sala.

2.1.1 Escala de Avaliação do Ambiente de Creche – ITERS-R

A ITERS-R é a versão revista da ITERS - Infant/Toddler Environment Rating Scale (Harms et al., 1990). A primeira edição da ITERS resultou de uma adaptação da Early Childhood Environment Rating Scale - ECERS (Harms & Clifford, 1980) e da Family Daycare Rating Scale – FDCRS (Harms & Clifford, 1989), tendo sido concebida para permitir uma avaliação global da qualidade de centros educativos para crianças com menos de 30 meses de idade. Foi utilizada a versão portuguesa da escala, elaborada no âmbito deste trabalho.

Os autores da ITERS-R basearam-se em três fontes principais, para o seu desenvolvimento: (1) evidências da investigação de várias áreas relevantes (saúde, desenvolvimento e educação), (2) perspectivas dos profissionais acerca das melhores práticas e (3) constrangimentos da vida real nos contextos de educação e cuidados para crianças (Harms et al., 2003). Os requisitos da ITERS-R baseiam-se naquilo que estas fontes indicam como sendo condições importantes para obter resultados positivos ao nível do desenvolvimento das crianças.

Esta escala é constituída por 39 itens, que se encontram agrupados em 7 áreas ou subescalas: Espaço e mobiliário, Rotinas de cuidados pessoais, Escuta e conversação, Actividades, Interacção, Estrutura do programa e Pais e pessoal. Os itens, distribuídos pelas respectivas subescalas, encontram-se representados no Quadro 6.

Capítulo IV

148

Quadro 6. Subescalas e itens da ITERS-R

Subescalas Itens

I. Espaço e mobiliário 1. Espaço interior

2. Mobiliário para cuidados de rotina e jogo 3. Condições para relaxamento e conforto 4. Arranjo da sala

5. Material exposto para as crianças

II. Rotinas de cuidados pessoais 6. Chegada/ partida

7. Refeições/ refeições ligeiras 8. Sesta

9. Mudança de fraldas/idas à sanita 10. Práticas de saúde

11. Práticas de segurança

III. Escuta e conversação 12. Ajudar as crianças a compreender a linguagem

13. Ajudar as crianças a usar a linguagem 14. Utilizar livros

IV. Actividades 15. Motricidade fina

16. Jogo físico activo 17. Arte

18. Música e movimento 19. Blocos

20. Jogo dramático 21. Jogo de areia e água 22. Natureza/ciência

23. Uso de TV, vídeo e/ou computador 24. Promover a aceitação da diversidade

V. Interacção 25. Supervisão do jogo e da aprendizagem

26. Interacção entre pares 27. Interacção adulto-criança 28. Disciplina

VI. Estrutura do programa 29. Horário

30. Jogo livre

31. Actividades de grupo

32. Medidas para crianças com incapacidades

VII. Pais e pessoal 33. Iniciativas para envolver os pais

34. Condições para satisfazer as necessidades pessoais do pessoal 35. Condições para satisfazer as necessidades profissionais do pessoal 36. Interacção e cooperação entre o pessoal

37. Continuidade do pessoal

38. Supervisão e avaliação do pessoal

39. Oportunidades para desenvolvimento profissional

Cada item (ver exemplo na Figura 1) é apresentado numa escala de 7 pontos, com descritores ou indicadores para 1 (inadequado), 3 (mínimo), 5 (bom) e 7 (excelente). Inadequado descreve serviços que não satisfazem as necessidades relacionadas com cuidados básicos de guarda; mínimo descreve serviços que dão resposta a necessidades de guarda e, em pequeno grau, a necessidades de desenvolvimento básicas; bom descreve dimensões básicas de cuidados de carácter desenvolvimental; e excelente descreve cuidados personalizados de elevada qualidade (Pinto & Grego, 1994). As cotações de inadequado (1) e mínimo (3) geralmente correspondem à provisão de materiais básicos e precauções de saúde e segurança; as cotações de bom (5) e excelente (7) requerem

Método

interacção positiva, planeamento e cuidados personalizados, bem como bons materiais (Harms et al., 1990). Na folha de cotação, deve ser assinalado se cada indicador se verifica ou não na sala ou creche que está a ser observada, sendo, portanto, assinalado Sim (S) se esse indicador é verdadeiro para a situação observada e Não (N) se o indicador não é verdadeiro. Os autores sugerem que, para cada indicador, o observador pergunte a si mesmo: “Isto é verdadeiro ou não?” (Harms et al., 1990).

Para cotar cada item, o observador deve começar a ler e a preencher os indicadores da cotação 1. Esta cotação é dada se qualquer um dos indicadores de 1 estiver presente, ou seja, se for assinalado o Sim. Uma cotação de 3 é atribuída quando todos os indicadores de 1 são cotados Não, ou seja, não estão presentes, e todos os indicadores da cotação 3 estão presentes. As cotações de 5 e 7 são dadas quando todos os requisitos destas cotações e das inferiores estão presentes e todos os indicadores de 1 são cotados Não. As cotações 4 e 6 são aplicadas quando os indicadores da cotação imediatamente inferior estão todos presentes, mas da pontuação imediatamente superior apenas são preenchidos em parte (pelo menos metade dos indicadores). A partir do momento em que o observador tem informação suficiente para cotar o item, não é necessário verificar os indicadores das cotações superiores. Por exemplo, se houver algum indicador da cotação 1 assinalado com Sim, a cotação será 1 e, portanto, não é necessário verificar se há indicadores de 3, 5 ou 7 preenchidos pela sala ou creche. É possível, contudo, efectuar uma cotação considerada “alternativa” pelos autores da escala (Harms et al., 1990), continuando a cotar os indicadores para além do nível de qualidade atribuído ao item. Dito por outras palavras, utilizando o sistema de cotação acima descrito, os indicadores apenas são lidos e assinalados até que se atinja a cotação da qualidade para aquele item. Para fins de investigação ou melhoria do programa, pode ser pertinente adquirir informação adicional das áreas fortes para além da cotação do nível de qualidade e, nesse caso, o observador deve continuar a cotar todos os indicadores do item. Quando se opta pela cotação alternativa e todos os indicadores são cotados, o tempo de observação requerido precisa de ser consideravelmente prolongado. Para completar todos os indicadores, serão necessários (1) uma observação de aproximadamente 3 horas e meia ou 4 horas e (2) um período de aproximadamente 45 minutos para colocar questões à pessoa responsável pela sala (Harms et al., 1990).

É possível atribuir a cotação NA (Não Aplicável) aos itens Jogo de areia e água (se todas as crianças da sala tiverem menos de 18 meses de idade), Uso de TV, vídeo e/ou computador (se não são utilizados), Actividades de grupo (se não são utilizadas actividades em grupo preparadas pelo educador), Medidas para crianças com incapacidades (se não houver crianças com incapacidades na sala) e Interacção e cooperação entre o pessoal (se houver apenas um adulto com o grupo de crianças).

Capítulo IV

150

Figura 1. Exemplo de um item da Escala de Avaliação do Ambiente de Creche

Inadequado Mínimo Bom Excelente

1 2 3 4 5 6 7

INTERACÇÃO

26. Interacção entre pares 1.1. Pouca ou

nenhuma possibilidade de interacção apropriada entre pares (e.g.: crianças separadas em berços, baloiços ou cadeiras altas quando acordadas; espaços pequenos com muitas crianças e poucos brinquedos). 1.2. Interacção negativa entre pares ignorada ou encarada de uma forma rude.

3.1. A interacção entre os pares é possível em grande parte do dia (e.g.: os bebés que não andam podem brincar, com supervisão, perto dos outros; as crianças podem formar grupos naturais).

3.2. O pessoal geralmente pára as interacções negativas entre pares (e.g.: quando estão a bater, morder ou disputar brinquedos).

5.1. O pessoal facilita interacções positivas entre pares, com todas as crianças (e.g.: coloca os bebés onde eles podem observar e reagir aos outros; ajuda as crianças a encontrar brinquedos em duplicado; inclui crianças com incapacidades em brincadeiras com outros). 5.2. O pessoal modela interacção social positiva (e.g., caloroso e afectuoso; utiliza o toque suave, é delicado com as crianças e não “mandão”).

7.1. O pessoal explica as acções, as intenções e os sentimentos das crianças às outras crianças (e.g.: ajuda as crianças a reconhecer expressões faciais de alegria ou tristeza, explica que a outra criança não tinha a intenção de magoar; reforça a criança por encontrar um brinquedo duplicado). 7.2. O pessoal assinala e fala sobre exemplos de interacção social positiva entre crianças ou entre adultos e crianças (e.g.: ajuda as crianças a reparar no consolo/ conforto; sorri e fala com o bebé que repara nas outras crianças; reforça as crianças de 2 anos por trabalharem juntas).

Os autores da escala efectuaram estudos no sentido de verificarem as características de fidelidade e validade dos dados recolhidos com o instrumento. Foram encontrados bons índices de fidelidade, tendo sido obtidos acordos interobservadores médios de 83% ao nível dos itens (com um ponto de diferença) e os valores do coeficiente kappa ponderado com média de .58 (Harms et al., 2003). Ao nível da cotação global da escala e das subescalas, foram encontrados valores do coeficiente de correlação intraclasses de .92 para a escala global e entre .67 e .92 para as subescalas (coeficiente alfa de .73, .67, .77, .91, .78, .87, .92, .92, .92, respectivamente). Foi também analisada a consistência interna para a escola global e para cada uma das subescalas. O valor do coeficiente alfa de Cronbach para a escala global foi de .93 e para as subescalas variou entre .47 e .93.

Os resultados do estudo da aplicação desta escala às creches portuguesas (distrito do Porto), considerando as observações efectuadas em 160 salas, podem ser consultados no Capítulo V (Estudo e adaptação do instrumento ITERS-R). Relativamente às 110 salas, que constituem a amostra principal deste estudo, foram obtidos valores adequados de consistência interna. Alguns itens da ITERS-R podem ser cotados como Não Aplicável, o que traz algumas dificuldades ao nível da análise da consistência interna, uma vez que constituem dados omissos. Quando se calculou o coeficiente alfa de

Método

Cronbach incluindo todos os itens, o SPSS automaticamente excluiu 107 participantes da análise (aqueles que apresentavam dados omissos em algum item). Tendo em consideração este facto, o coeficiente alfa de Cronbach foi calculado para 38 itens, excluindo o item 32 (Medidas para crianças com incapacidades), que era aquele que apresentava mais valores omissos, e para 34 itens, excluindo todos os itens com valores omissos, que eram o 21 (Jogo de areia e água), o 23 (Uso de TV, vídeo e/ou computador), o 31 (Actividades de grupo), o 32 (Medidas para crianças com incapacidades) e o 36 (Interacção e cooperação entre o pessoal). O coeficiente alfa de Cronbach foi de .80 quando calculado para 38 itens e .82 quando calculado para os 34 itens. Estes valores indicam que a escala avalia, com grande probabilidade, um único constructo.

Quadro 7. Coeficiente alfa de Cronbach de cada uma das subescalas

N Número de

itens α

I. Espaço e mobiliário 110 5 .40

II. Rotinas de cuidados pessoais 110 6 .33

III. Escuta e conversação 110 3 .67

IV. Actividades 65 10 .54

Actividades sem itens 21 e 23 110 8 .55

V. Interacção 110 4 .79

VI. Estrutura do programa 8 4 .50

Estrutura do programa sem item 32 84 3 .10

Estrutura do programa sem itens 31 e 32 110 2 .35

VII. Pais e pessoal 93 7 .48

Pais e pessoal sem item 36 110 6 .53

Foi calculada ainda a consistência interna de cada uma das subescalas (Quadro 7), tendo o coeficiente alfa de Cronbach variado entre .10 na subescala 6 (Estrutura do programa), quando excluindo apenas o item 32, e .79 na subescala 5 (Interacção). Estes resultados suscitam a necessidade de ter precaução quando se efectuam análises ao nível das subescalas.

2.1.2 Registo do Envolvimento de Grupo - Check II

O Registo do Envolvimento de Grupo - Engagement Check II (McWilliam, 1998) é uma modificação do Planned Activity Check (Risley & Cataldo, 1973 como citados em Raspa, McWilliam, & Ridley, 2001). Este instrumento é utilizado para avaliar o envolvimento de grupo, constituindo um indicador da qualidade do programa da creche. Determina a percentagem de crianças envolvidas durante as actividades da sala e tem sido referido como um instrumento válido de avaliação da

Capítulo IV

152

qualidade (Ridley, McWilliam, & Oates, 2000).

O envolvimento tem sido definido como atenção a ou participação activa nas actividades da sala, manifestando-se através do olhar fixo, da manipulação, da vocalização, da aproximação ou da expressão afectiva (Raspa et al., 2001, pp. 215-216). É necessário que o comportamento seja simultaneamente adequado ao desenvolvimento (adequado à idade desenvolvimental e competências da criança) e adequado ao contexto (adequado à actividade que está a ser levada a cabo e de acordo com as expectativas da situação). A codificação do envolvimento do grupo consiste em contar o número de crianças visíveis numa passagem/momento e depois contar o número de crianças não envolvidas (vagueando, chorando, lutando) numa segunda passagem. A partir daqui, é calculada a percentagem de crianças envolvidas em cada observação. O resultado da sessão consiste na média dos resultados das observações realizadas numa sessão. Para fins de investigação, as verificações devem ser efectuadas a cada 15 segundos durante 15 minutos, totalizando 60 observações por sessão. A duração de cada sessão de observação foi determinada por um estudo realizado por McWilliam e Ware (1994). O número de sessões foi determinado com base num estudo prévio realizado por Barros, Aguiar, Pinto, Mascarenhas e Bairrão (2005), no âmbito do projecto de investigação “Qualidade das interacções da criança em contexto familiar e de creche e o seu impacto no seu desenvolvimento sócio-cognitivo”, no qual se verificou que duas sessões de observação de 15 minutos seriam suficientes para se obter um coeficiente intraclasses superior a .80.

2.1.3 Grelha de registo de características estruturais da creche e da sala

Foi elaborada uma grelha para facilitar o registo das características estruturais das salas e das creches consideradas importantes para este estudo: tamanho do grupo, número de adultos na sala, tipo de instituição (IPSS ou lucrativo), faixa etária da sala (para crianças de 1-2 anos, 2-3 anos ou 1-3 anos) e formação (grau de ensino) do responsável pela sala.