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1.3 IMPACTOS DAS MUDANÇAS CLIMÁTICAS GLOBAIS: O

1.3.1 Impactos das mudanças climáticas no Brasil

Ainda conforme Marengo (2007), no Brasil, os pesquisadores priorizam dois dos cenários do IPCC quanto aos impactos das mudanças climáticas na segunda metade deste século: o A2, mais pessimista, prevê emissões maiores e uma elevação global de temperatura de 5,8oC (variável conforme a região do mundo); o B2, mais otimista, antecipa emissões menores e um aumento de temperatura de 1,4oC.

Com base nos prognósticos do IPCC, chegou-se à constatação de que o semi-árido nordestino será uma das regiões brasileiras mais afetadas pelas mudanças climáticas globais. Marengo (2007, p.8) explica que:

A área, já carente em recursos hídricos, econômicos e sociais, parece ameaçada por mais uma má notícia: os estudos revelam que, no processo de aquecimento global, não só choverá menos e as secas serão mais intensas, mas há outro perigo – alguns indicadores apontam que o processo de aquecimento global também significará uma redução no nível de água dos reservatórios subterrâneos.

O autor mostra que esta redução de água nos aquíferos nordestinos pode chegar a 70% até o ano 2050, quadro que se agrava por outro fato: a diminuição prevista entre 15% a 20% na vazão do rio São Francisco. Tal impacto sobre o chamado "rio da integração nacional" se revela potencialmente significativo, dada a importância ambiental, econômica e social de sua bacia, que abrange 504 municípios brasileiros, nos quais habitam cerca de treze milhões de pessoas, segundo o Ministério da Integração Nacional.

Num efeito mais direto, a redução na vazão do rio São Francisco, no curso do qual existem cinco usinas hidrelétricas – Paulo Afonso, Itaparica, Moxotó, Xingó e Sobradinho –, ilustra a afirmação de Nobre (2008, p.7), para quem a economia brasileira é "potencialmente vulnerável a mudanças climáticas que possam eventualmente diminuir a utilização de recursos naturais renováveis". O autor registra a forte dependência do país a estes recursos, cuja associação ao Produto Interno Bruto do país chega a mais de 50%, principalmente por intermédio da agricultura, hidroeletricidade, biocombustíveis, bionenergia, energia eólica e solar, entre outros segmentos.

Especificamente no que concerne à agricultura, estudo da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA, 2008, p.9) resultou na expectativa de que a

elevação de temperatura promoverá um "crescimento da evapotranspiração (perda de água por evaporação do solo e transpiração das plantas)", tendo por conseqüência

"aumento na deficiência hídrica, o que vai provocar um aumento de áreas com alto risco climático".

O trabalho estabelece ainda que, à exceção dos locais que hoje sofrem com geadas, como a região Sul do país e alguns pontos do Sudeste e a Sudoeste do Brasil, portanto tendentes a auferir vantagens com o aquecimento global, todas as demais terão uma diminuição de áreas de baixo risco para a maior parte das culturas.

Afora a clara ameaça de maior escassez na oferta de produtos do campo, o abalo econômico é também de preocupante magnitude. A Embrapa (2008, p.8) concluiu que "o aquecimento global pode comprometer a produção de alimentos, levando a perdas que começam com até R$ 7,4 bilhões em 2020, podendo atingir R$ 14 bilhões em 2070", sendo a soja a cultura potencialmente mais afetada.

Nos espaços urbanos, investigações científicas também denotam a necessidade de providências para a adaptação aos impactos previstos das mudanças climáticas.

Estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) et al. (2010) situa os eventos extremos relacionados à precipitação intensa entre os mais alarmantes. Um problema cujos danos ganham maior escala nas chamadas megacidades:

As regiões metropolitanas de São Paulo (RMSP) e do Rio de Janeiro (RMRJ), que nas últimas estimativas concentram mais de 30 milhões de habitantes (cerca de 16% da população do país), sofrem constantemente os efeitos dos extremos de precipitação, que causam enchentes, deslizamentos de terra e perdas de vida. Entre 1950 e 2003, a frequência e intensidade das chuvas têm aumentado nas regiões Sudeste e Sul do Brasil, incluindo as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro (INPE et al., 2010, p.8).

Nesse aspecto, é interessante ressaltar a questão levantada por Deschamps, Lima e Mendonça (2011) sob o argumento de que apenas as repercussões negativas das mudanças climáticas costumam ser evocadas pelo IPCC e pela grande mídia.

Os autores procuram esmiuçar o lastro de "preocupações sociais gerais, a partir de um cenário construído em boa parte pelos conteúdos midiáticos", admitindo duas hipóteses antagônicas:

- Estaria realmente havendo uma intensificação de eventos climáticos relacionados com catástrofes socioambientais nos últimos anos? Ou, - Estaria havendo uma intensificação de outros processos, tais como a

urbanização que, independentemente daqueles, estaria derivando em intensificação dos riscos socioambientais urbanos? (DESCHAMPS; LIMA;

MENDONÇA, 2011).

À parte do questionamento científico, os eventos climáticos extremos, especialmente nas megacidades, são preconizados no estudo do Inpe et al. (2010, p.27) como geradores de impactos severos na esfera da saúde humana, tendo em vista que "alterações na temperatura e na umidade do ar podem contribuir com a proliferação de agentes infecciosos". Ao mesmo tempo, prossegue o estudo, as inundações favorecem que roedores saiam de suas tocas; a reprodução de mosquitos e o crescimento de fungos nas casas, além de despejar patógenos, nutrientes e substâncias químicas nos cursos d'água.

Passando aos efeitos da elevação de temperatura sobre a biodiversidade brasileira, Joly (2007, p.170) desenha um panorama de devastação, haja vista a

"crescente discrepância entre a velocidade das mudanças climáticas e a do processo evolutivo". O autor cita espécies longevas, a exemplo do jatobá e do jequitibá que, conforme situa, podem viver mais de 200 anos, antecipando que "não terão condições de responder evolutivamente a estas mudanças ou migrar para novas áreas, tendendo a desaparecer" – um resultado em larga escala que, conforme prevê, implica em "um aumento exponencial nas taxas de extinção de espécies, particularmente na região Neotropical" (p.170). Da Floresta Amazônica à Mata Atlântica, passando pelo Cerrado, Joly (2007) elenca estudos cuja perspectiva de redução de remanescentes desses ecossistemas figura unânime, variando apenas em seu grau, a depender dos cenários mais otimistas ou pessimistas que venham a se concretizar.

Embora este panorama se origine nos efeitos das mudanças climáticas, a degradação florestal até hoje observada parece derivar do modelo econômico ainda vigente. O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (IBAMA/PNUMA, 2004) estabelece como principais causas diretas da derrubada e degradação de florestas a expansão de áreas agrícolas, a superexploração de madeira para fins industriais, lenha e outros produtos florestais, além do excesso de pastagem.