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Especialmente no que concerne ao jornalismo ambiental, Bueno (2007, p.35) identifica na atividade o que ele chama de três funções: a informativa, a pedagógica e a política. A informativa, expõe o autor, contempla as necessidades dos cidadãos em acompanhar os principais temas relacionados à questão ambiental, de modo a considerar os impactos de posturas, processos e modelos sobre o meio ambiente e, por extensão, sobre sua qualidade de vida. A função pedagógica, segundo ele, se expressa pelo elucidar das causas e soluções para os problemas ambientais e à indicação de caminhos para a superação destes, processo que, no entendimento de Bueno (p.36), não pode prescindir da participação dos cidadãos. Por fim, remetendo-se à função política, ele ressalva que esta não remetendo-se limita à instância da política-partidária, mas sim, num sentido amplificado, à "mobilização dos cidadãos para fazer frente aos interesses que condicionam o agravamento da questão ambiental".

Para o autor, o compromisso do jornalismo ambiental – "antes de tudo, jornalismo" – é com o interesse público, com a democratização do conhecimento e com a ampliação do debate; assim, "não pode ser utilizado como porta-voz de segmentos da sociedade para legitimar poderes e privilégios" (BUENO, 2007, p.36).

Rigo e Moraes (2008, p.107) também registram os múltiplos papéis da imprensa, sinalizando dois pontos basilares em sua atuação. Em primeiro lugar, a divulgação dos fatos, "de forma clara e honesta", possibilitando que os cidadãos entendam "o que a sociedade está construindo por si". O segundo papel, que as autoras situam como "mais complexo e pouco visto", se refere à educação informal,

"essencial para preparar leitores de notícias para a leitura do mundo". Defendem elas que "a educação ambiental pela imprensa deveria ser tarefa constante, até porque as pessoas não param de poluir e destruir" (p.107).

Em território brasileiro, a dimensão pedagógica da mídia é oficialmente preconizada na Lei n.o 9.795 de 1999, que institui a Política Nacional de Educação Ambiental. Em seu artigo terceiro, a norma legal estabelece que "como parte do processo educativo mais amplo, todos têm direito à educação ambiental" e incumbe, em seu inciso IV, "aos meios de comunicação de massa, colaborar de maneira ativa e permanente na disseminação de informações e práticas educativas sobre meio ambiente e incorporar a dimensão ambiental em sua programação".

A rigor, tal incumbência já fora anteriormente admitida, e mais, defendida, por profissionais da indústria midiática na "Carta de Belo Horizonte". O documento, extraído ao fim do Encontro Internacional de Imprensa, Meio Ambiente e Desenvolvimento (Green Press), evento na capital mineira a integrar a agenda oficial da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio 92), elenca entre seus princípios éticos:

São deveres da imprensa: informar sobre as práticas lesivas ao meio ambiente, alertar quanto aos seus efeitos sobre os ecossistemas e contribuir para a educação da sociedade.

O trabalho jornalístico deve estar comprometido com a promoção da qualidade de vida planetária nas diversas fases de produção e veiculação da notícia (CARTA DE BELO HORIZONTE, 1992).

O efetivo exercício desse comprometimento demanda, contudo, uma formação profissional qualificada sob parâmetros curriculares mais ousados do que os ainda predominantes. Moraes (2008, p.9) coloca que, "para fornecer informação útil e prática sobre os aspectos ambientais que rodeiam a atualidade", é preciso "ir além da resposta às questões do lide", de modo a viabilizar ao leitor a compreensão de cada tema e a subseqüente reflexão "sobre seu cotidiano e sua relação com a ecologia".

Trata-se de um entendimento compartilhado por Frome (2008, p.62), quando afirma que o jornalista ambiental "não pensa em termos de quem, o que, quando, onde, por que e como". Para escrever com amplitude e perspectiva, prega o autor, deve examinar sistemas interconectados a tocarem "cada aspecto da vida: ciência, botânica, biologia, economia, história, política, ética e religião", sem que, porém, precise ter completo domínio sobre eles.

No fomento ao debate ambiental, portanto, seria determinante a capacidade do profissional de imprensa em aplicar o que Ângelo (2008, p.33) chama de

"interdisciplinaridade dos eventos ecológicos". Como exemplo dessa abordagem holística – a seu ver, fundamental no jornalismo –, ele sugere que uma matéria sobre lixo seja "incrementada com populações que vivem nos bolsões de pobreza, incluindo os lixões, e também famílias que conseguem sobreviver graças aos materiais recicláveis" (p.33).

No processo de "alfabetização ecológica dos jornalistas", Campos (2006, p.219) estabelece uma relação ensino-aprendizagem de inspiração sistêmica como a única "capaz de 'libertar' o futuro profissional de preconceitos e dos condicionamentos

dominadores que traz de origem", dada a condição do Brasil "como país periférico"

que, conforme o autor, inscreve a "dominação em nosso DNA sócio-cultural".

O estudante de jornalismo, defende, "não pode se render a fórmulas que enquadram o mundo no rol das coisas simples" e é na sala de aula que "temos a oportunidade de ensinar os alunos a julgarem o mundo, ao invés de acatá-lo" (p.219).

Verifica-se, dessa forma, um estímulo ao jornalismo engajado, em detrimento da suposta isenção ainda encarada como alicerce no exercício ético da profissão.

Ao questionar tal cobrança, Frome (2008, p.67) diz que o repórter ativista, pessoalmente envolvido em algum tema, é considerado "vulgar e impróprio", abala sua imagem como profissional, o que potencialmente resultaria em perda de credibilidade. Mas, para o autor, "a estrita separação dos fatos e opinião editorial leva à incompreensão". E sustenta que "leitores e espectadores necessitam de vozes interpretativas para guiá-los através de uma selva de fatos" (p.71).

Para Bueno (2007, p.36), desde a graduação até as redações, é preciso ser trabalhado que o jornalista ambiental "tem um compromisso que se estende além da jornada de trabalho". Dotado de consciência e capacitação, diz o autor, este profissional

"será militante sempre", num cenário que, de outra forma, "conduz inevitavelmente à capitulação".

Ao situar o alcance dos meios de comunicação e a importância do jornalismo enquanto mediador dos processos de produção de sentido nas sociedades modernas, Girardi, Massierer e Schwaab (2006, p.2) atribuem à atividade a função de gerar conhecimento, mas, também e sobretudo, a de provocar o debate. Essa provocação, apontam os autores, "ganha uma carga extra de responsabilidade"

quando lida com o tema ambiental, haja vista a imposição predominante nesse campo de questões de caráter múltiplo, não raro contraditórias.

A defesa clara ao engajamento dos profissionais da área parte também de Trigueiro (2005, p.1), ao afirmar que:

Quando se discute a função social do jornalista, é importante abrir espaço no meio acadêmico para o questionamento pontual e contundente do chamado "movimento de manada", alienado e insano, na direção do imediatismo, do lucro fácil e rápido, do projeto individual em detrimento do coletivo, da globalização assimétrica (que privatiza o lucro e democratiza o prejuízo), da indiferença à lenta agonia de um planeta que dá evidentes sinais de saturação.

É esse "movimento de manada", segundo o autor, que "nos projeta na direção do abismo sem que haja espaço para a reflexão" no que concerne ao questionamento do modelo, à revisão dos conceitos já estabelecidos "que se cristalizam como dogmas de uma fé tragicamente cega" (TRIGUEIRO, 2005, p.1).

Tais reflexões, pondera Moraes (2008, p.5), precisam se deter sobre as escolhas da própria sociedade, da qual o jornalista e o jornalismo fazem parte:

"estamos todos convencidos de que é preciso mudar nosso modelo de consumo?".

Nesse sentido, ela advoga que, na atuação docente, é preciso "abrir espaço para que os acadêmicos revejam seus conceitos, ensaiem outras práticas e modos de pensar e fazer jornalismo" (p.6).

O jornalismo ambiental, sustenta a autora, demanda o desenvolvimento de um senso crítico capaz de questionar "as essências", posicionando-se "um passo além da divulgação e da decodificação de discursos", por meio de uma abordagem ampla e contextualizada de engajamento a uma "prestação de serviço para as futuras gerações" (MORAES, 2008, p.3).

Da mesma forma, Loose e Girardi (2009, p.2) caracterizam o jornalista ambiental como um educador que, indo além da denúncia, auxilia a "formação da opinião pública em prol da sobrevivência planetária", à medida que proporciona visibilidade às questões ambientais e argumentos para cobranças ao poder público.

Verifica-se um processo no bojo do qual a cobertura dos fatos relacionados ao meio ambiente se recobre de um viés mobilizador, conforme expõem as autoras:

A sustentabilidade da vida relaciona-se profundamente com o caráter ético e cidadão que é construído, representado e descolado do coletivo social pelo campo da mídia. Nesse sentido, os meios de comunicação de massa atuam de forma predominante nas legitimações de atitudes que determinarão um rol de movimentos dentro de diferentes comunidades (LOOSE; GIRARDI, 2009, p.3).

A mobilização promovida pela sociedade civil organizada por intermédio da mídia – ou de novas vitrines constituídas pela cibercultura – reveste-se assim de centralidade no campo político. Com base nesse entendimento, Morais e Rezende (2008, p.268) apontam uma inversão nas táticas de manifestação dos movimentos sociais e ambientais, a partir da "apropriação de espaços midiáticos para a articulação de militâncias de contraordem". Isso se expressa, defendem, pela "substituição da militância radical dos discursos inflamados e barricadas" por novas formas de

protesto cuja característica está em "práticas discursivas midiáticas de espetacularização e aglutinação de espectadores/militantes" (MORAIS; REZENDE, 2008, p.268).