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O exercício de revisão da literatura efetivado sintetizou dez anos de pesquisa (2009- 2019) a respeito da interlocução entre o PNAE e a agricultura familiar, o que contribui para injetar evidências teóricas e práticas no debate entre a inclusão dos gêneros alimentícios desta categoria social na alimentação escolar dos alunos matriculados na rede pública de ensino brasileira, favorecendo insights a respeito de algumas particularidades desta interlocução, gerando implicações teóricas e práticas.

As implicações teóricas estão associadas à formação de cinco categorias analíticas referentes à interlocução do PNAE com a agricultura familiar. A Figura 3 evidencia que as categorias se relacionam, pois, a trajetória e o marco legal influenciam na geração dos aspectos políticos e institucionais, uma vez que estes aspectos trazem que a institucionalização do PNAE como um mercado para a agricultura familiar no ano de 2009 ocorre dentro da trajetória do programa, visto que as ações direcionadas para a alimentação escolar no Brasil existem desde a década de 1940. A interface do PNAE com a agricultura familiar leva a uma nova configuração desta para acessar a política pública, como por exemplo, a organização em cooperativas e associações, o que envolve fatores de sucesso e barreiras, que podem contribuir para a retroalimentação da trajetória e dos aspectos políticos e institucionais.

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Figura 3 – Relação entre as categorias analíticas da interlocução do PNAE com a agricultura

familiar

Fonte: Elaboração própria. Resultados da pesquisa, 2020.

As categorias surgidas são úteis a análises teóricas, epistemológicas e empíricas e convêm, também, à definição de agendas de pesquisas, não exclusivamente no âmbito do PNAE, mas, também, a outras políticas públicas no segmento produtivo da agricultura familiar a exemplo do PAA anteriormente referido. Além disso, os elementos elencados como códigos das categorias analíticas servem igualmente para orientar diferentes atores sociais no propósito de qualificação do que vem sendo efetivado incluindo pontos de agenda para a atuação das representações da agricultura familiar junto às entidades executoras.

Para a Ciência Administrativa, as categorias geradas ampliam possibilidades de ensino, pesquisa e extensão junto ao segmento produtivo da agricultura familiar. Nesse sentido, torna-se oportuno referenciar o exercício de sistematização realizado por Calazans et al. (2019), no qual os autores expõem aspectos de integração da pesquisa e do ensino, a partir da extensão universitária, como estratégia para materializar a qualidade da formação acadêmica em Administração em direção aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). A experiência narrada toma como base atividades acadêmicas com agricultores familiares de UMA comunidade indígena, o que incluiu o propósito de fomentar acesso ao PNAE. Além disso, relata a atuação de estudantes e docentes do Curso de Administração da UFRN com pares dos cursos de Nutrição, Arquitetura, Design, Engenharia Agronômica,

45 Serviço Social, Psicologia, Zootecnia, Turismo, Ciências Contábeis e Gestão de Cooperativas em uma proposta de desenvolvimento integrado e sustentável.

As implicações práticas dessa pesquisa surgem a partir da análise das dificuldades encontradas pelos agricultores familiares para o acesso e execução do PNAE mencionadas pelos artigos. As barreiras sanitárias, que desencadeiam entraves relacionados, por exemplo, à adequação para comercialização de alimentos de origem animal, indica que são necessárias ações complementares por parte de outras políticas públicas para o assessoramento dos agricultores familiares para a produção animal, o que esbarra também no gargalo da assistência técnica. O conjunto de ações voltadas para o gerenciamento entra nas dificuldades relatadas pelos artigos, como carência da capacitação aos agricultores que fazem parte da diretoria de associações e cooperativas. Estes elementos indicam que, não basta incentivar que a agricultura familiar alcance novos mercados, como os mercados institucionais, são necessários conjuntos de atividades voltadas para a produção e para o gerenciamento das propriedades rurais e das organizações formais da agricultura familiar.

Outras dificuldades se referem a gargalos de infraestrutura, como problemas de logística e de transporte para escoamento dos produtos; precariedade na infraestrutura para processamento, armazenamento e transporte das mercadorias e inexistência de infraestrutura para a criação de agroindústrias. Estes fatores levam à necessidade de maior disponibilidade de recursos financeiros, o que se pode ser melhorado com a articulação de políticas públicas de crédito rural, como o PRONAF. Se esses obstáculos são mais presentes em organizações formais da agricultura familiar do que no âmbito da propriedade individual, conforme foi possível perceber pelos resultados das pesquisas, torna-se relevante o fomento a linhas de crédito rural específicas para associações e cooperativas da agricultura familiar com maior assessoramento por parte dos órgãos governamentais para que os projetos de infraestrutura sejam realizados corretamente conforme as necessidades destas organizações.

Ademais, cabe aos órgãos governamentais maior divulgação das chamadas públicas do PNAE para aquisições da agricultura familiar e adequação do preço pago pelos gêneros alimentícios condizentes com a qualidade exigida. Se o que está em jogo é a substituição das licitações por chamadas públicas, o poder público deve levar em consideração as particularidades da agricultura familiar que fazem com que os produtos sejam diferentes do que alimentos industriais que anteriormente à Lei nº 11.947/2009 eram adquiridos por meio de licitações. Além do retorno financeiro que a compra institucional do PNAE gera para a agricultura familiar, tem-se um retorno para os alunos beneficiários da alimentação escolar em

46 termos não só da garantia de do direito à alimentação, mas, também, do direito a uma alimentação saudável, conforme os princípios da SAN.