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Implicações da Teoria Triárquica da Inteligência para a Educação e para a Avaliação da Inteligência

Dois tipos de estudos são descritos na literatura tendo em vista a valida- ção da Teoria Triárquica da Inteligência: 1) os estudos de validação externa, geralmente envolvendo a aplicação da teoria ao planeamento e à avaliação de intervenções em contextos educativos; e 2) os estudos de validação inter- na, que pressupõem a medição da Inteligência Funcional e a análise da compatibilidade entre a estrutura das medidas e o modelo teórico subjacen- te.

1) Um dos propósitos do desenvolvimento da Teoria Triárquica da Inteli- gência foi, desde as suas primeiras formulações e de maneira manifesta, o de criar um quadro de referência conceptual que permitisse a articulação entre a avaliação das aptidões, o ensino e a avaliação dos conhecimentos. Tradicionalmente, esta ligação aptidões-instrução-avaliação não é nem com- pletamente explícita nem solidamente fundamentada na teoria psicológica, algo que contribui para perpetuar um ciclo fechado (Sternberg, 1996, 1997a, 2000) em que as competências avaliadas pelos testes de inteligên- cia geral, promovidas pela escola e valorizadas na avaliação dos alunos se validam mutuamente de um ponto de vista empírico, ainda que cubram ape- nas um espectro limitado do funcionamento cognitivo: o pensamento analíti- co e a memória. Por exemplo, as correlações entre os resultados dos testes de inteligência e as classificações escolares, que foram em geral interpreta- das como evidência de validade empírica dos testes (Neisser, 1996), consti- tuíram ao mesmo tempo evidência de validade de construto das avaliações

escolares, no quadro da docimologia (Miranda, 1981); mas, na ausência de uma conceptualização teórica explícita que reúna ambas as formas de avaliação reportando-as ao funcionamento da cognição humana, tais evi- dências empíricas resultam conceptualmente vazias e, por consequência, de duvidoso valor pragmático.

A Teoria Triárquica propõe-se exactamente constituir um tal quadro de re- ferência conceptual, entre outros que o autor reconhece poderem servir o mes- mo propósito (Sternberg, 1997a): por um lado, ao remeter para uma teoria psicológica, qualquer modelo psico-pedagógico que ligue aptidões-instrução- avaliação encontra fundamento, justificação e possibilidades de validação; por outro lado, ao ampliar a gama de funcionamento cognitivo abrangida pe- la avaliação da inteligência, pelo ensino e pela avaliação de conhecimentos, outras competências – para além da memória e do pensamento analítico, tam- bém a inteligência criativa e a inteligência prática – poderão vir a ser valori- zadas pela escola e pela sociedade, aumentando o número dos que alcançam um grau satisfatório de adaptação ou sucesso, na escola e na vida quotidiana (Sternberg, 2002b; Sternberg e Clinkenbeard, 1995; Sternberg, Torff e Gro- gorenko, 1998).

Os estudos de validação externa da Teoria Triárquica da Inteligência no domínio da educação (ver Sternberg, 1999, 2002b, 2003; Sternberg e Gri- gorenko, 1997; Sternberg, Torff e Grigorenko, 1998) apoiam-se nesta perspectiva: a avaliação das aptidões, a instrução e a avaliação dos conhe- cimentos contemplam, cada uma, as três áreas de processamento mental identificadas pela teoria – as inteligências analítica, prática e criativa; os es- tudos envolvem uma de duas estratégias de inserção curricular, a de adição e a de infusão; e os programas de instrução, já implementados e em curso, abrangem uma gama variada de destinatários, desde o ensino básico ao universitário, e de conteúdos, desde a aprendizagem da leitura ao ensino da psicologia. Os resultados desta linha de investigação têm sido franca- mente favoráveis do ponto de vista da validação da teoria e promissores do ponto de vista da inovação psico-pedagógica: quando a instrução contem- pla áreas de processamento mental diferenciadas – a memória, a inteligên- cia analítica, a inteligência prática e a inteligência criativa – mais estudan- tes encontram possibilidade de capitalizar as suas potencialidades e de corrigir e compensar os seus défices cognitivos, de onde decorrem níveis su- periores de aproveitamento escolar e de satisfação pessoal (numa palavra, níveis superiores de “sucesso”). A ideia nuclear não é a de adequar os mé- todos e conteúdos do ensino às aptidões de cada estudante, facilitando-lhe a aprendizagem de modo artificial porque não representativo das situações

Inteligência, educação e sucesso: As abordagens diferencial e sistémica da inteligência humana e suas implicações para a educação

concretas do quotidiano, que geralmente exigem uma combinação das di- versas áreas de processamento; a ideia é antes a de proporcionar a todos os estudantes oportunidades de desenvolvimento mais diversificadas, porque mais amplas no espectro do funcionamento cognitivo que abrangem, abrin- do a mais estudantes a possibilidade de “sucesso” através de um desenvolvi- mento equilibrado, apoiado nas áreas de potencialidade e tendo em vista a correcção ou compensação das áreas de défice. Neste sentido, têm vindo a ser desenvolvidos princípios gerais e sugestões metodológicas para a imple- mentação de práticas educativas formalmente fundamentadas na Teoria Triárquica da Inteligência (ver Sternberg, 1998a,b; Sternberg e Grigorenko, 1997).

2) A validação interna da teoria, em grande parte baseada em análises factoriais exploratórias e confirmatórias, pressupõe a construção de méto- dos de medida da Inteligência Funcional. O Sternberg Triarchic Abilities Test (STAT) (Sternberg, 1992, 2002c), foi o primeiro instrumento construído para a medição da inteligência funcional: assume o formato de um teste de pa- pel-e-lápis, composto por nove partes de resposta por escolha múltipla – re- sultantes da aplicação das inteligências analítica, prática e criativa a três Áreas de Conteúdo, verbal, quantitativa e figurativa – e uma 10ª parte com três itens de resposta aberta – itens ensaio – um para cada aspecto da inte- ligência.

Os estudos de análise factorial confirmatória e exploratória relatados na literatura (Sternberg, 1999, 2003a, 2003c; Sternberg et al., 2000, 2001) têm fornecido resultados não completamente consistentes, quer ao longo do tem- po, quer internacionalmente: ainda que em geral estes resultados, de acordo com o autor (Sternberg, 2003c), pareçam suportar em larga medida a teoria e a sua operacionalização – o STAT, actualmente na sua versão revista (2002c) – é de assinalar também que têm suscitado, juntamente com outras vertentes da teoria e da investigação empírica, acesa contestação por parte de alguns especialistas [ver, por exemplo, número especial da revista Intelli- gence (2003), 31(4)]. As dificuldades subjacentes à medição da inteligência criativa e da inteligência prática, por contraste com a inteligência analítica medida desde há muito pelos testes tradicionais de inteligência, decorrem em parte de se adequarem mal ao formato de resposta por escolha múltipla (Sternberg, 2003c); um formato de resposta aberta e de classificação dos pro- dutos por juízes, de acordo com critérios pré-estabelecidos com base na teo- ria, tem vindo a ser por isso ensaiado nos estudos mais recentes de validação da Teoria Triárquica da Inteligência (ver, por exemplo, Grigorenko e Stern- berg, 2001).