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2. De onde começamos e como nos formamos

2.5. A terceira onda do ambientalismo: profissionalização

2.5.4. A importância do PT na arena legislativa

Apesar da importância de Fábio Feldmann e sua militância ambiental na arena legislativa, inicialmente junto ao PMDB e posteriormente com o PSDB, é inescapável reconhecer o papel fundamental que o Partido dos Trabalhadores exerceu nesse período da história do ambientalismo. Na análise de Hochstetler e Keck (2007, p. 110/11)

For many environmentalists, the Worker’s Party became a political home not so much because of its socialism (though many environmentalists were also socialists) but because it espoused radical democracy, direct participation, and grassroots organization (Keck, 1992). Although the PT generally treated environmental protection as one laundry list of social demands, it was still the only party in which programmatic questions were debated seriously by party members, who could vote to change party positions (…).

Durante a década de 1980, o PT se constituiu como partido preferencial de candidatos da lista verde e, nos anos 1990, continuava a oferecer uma estrutura de suporte político para o ambientalismo que era importante. A identificação dos ambientalistas com o partido parecia se dar mais no diapasão da democracia participativa, da estratégia e formato de articulação política do que no conteúdo ecológico. Entretanto, na leitura de militante antigo do partido, em determinado momento, o PT tinha mais ambientalistas do que o PV e os mais relevantes deles estavam dentro do PT (Entrevista 18, 28/11/2013). Ele argumenta que, no PT, o ambientalismo foi se constituindo aos poucos. A realização da Eco-92 teve grande influência nesse processo. Tanto que os militantes petistas organizaram um manifesto e, no ano de 1993, o partido fundou a Secretaria de Meio Ambiente e Desenvolvimento (SMAD). Era o único

partido que tinha uma instância direcionada para a pauta de meio ambiente e isso tem um poder simbólico importante.

Quando o PT começou a administrar governos e prefeituras, os quadros do partido, dentre eles os ambientalistas, assumiram cargos nos órgãos públicos e começaram a ter experiência administrativa. Secretarias estaduais e municipais de meio ambiente foram criadas e, nos governos do PT, elas sempre foram administradas por petistas, não eram cedidas a partidos da coalizão (Entrevista 12, 21/7/2014). Em complemento, militantes do partido com ideias verdes ou sensíveis a elas também eram eleitos a cargos do poder Legislativo, os quais construíam pontes com o movimento ambiental em diferentes estados, como o fez parlamentares no Rio Grande do Sul que eram próximos à AGAPAN (Hochstetler e Keck, 2007).

Sobre as características do PT, entrevistado reforça que o partido não é ambientalista, é um partido vermelho, porém, pelo formato da luta política que travava, atraía os ambientalistas. Ao diferenciar a pegada do PT com a do PV, o que reforça sua estratégia e formato de luta como elementos de aproximação inicial entre ambientalistas e partido, o entrevistado esclarece o seguinte:

O discurso do PV era mais ideológico que político. Não tinha capacidade de fazer reformulação na política. O discurso do PT veio mais pela política do que pelo ideológico. Essa é uma visão mais estratégica. O pessoal que era ligado ao PT, seja filiado ou que tinha ligação política, estava numa luta concreta e muito diversa e o PT era um partido político que disputava agressivamente. O PV nunca disputou agressivamente, nunca teve um apoio muito grande porque a origem dele sempre foi muito elitista. (...) Quando se tem um debate nacional de política ambiental, o PT era o interlocutor das ONGs e não o PV. É porque o PT fazia política com mais amplitude, então, enfrentava os conflitos com mais amplitude (...) você tinha uma visão no PT que dialogava com as ONGs e outra que era contra, porque o PT é um partido muito amplo. Isso está ligado ao segmento da classe trabalhadora que fundou o PT. (Entrevista 18, 28/11/2013)

Apesar dos partidos políticos se formarem com base em ideologias como formas de identidade, o entrevistado faz diferença de um ser mais ideológico que o outro no sentido da prática política. O PV, em sua narrativa, parece ser um partido de retórica, ao passo que o PT tem uma prática mais contundente na arena política, de enfrentar disputas e marcar trincheiras. Ademais, a narrativa reforça o caráter político da causa ambiental, ou seja, a disputa ambiental é também uma disputa política, e o PT parecia oferecer mais recursos para

o embate. A questão do parlamentar especializado e sensível à causa ambiental também faz sentido para esse petista. A defesa da causa ambiental não dependia apenas de partido, mas especialmente de pessoas dentro dos partidos. Apesar disso, o que se apreende do que foi até aqui analisado é que o PT foi se configurando como uma importante representação política para ambientalistas, porque militantes aguerridos à causa faziam parte de seus quadros e se conectavam aos movimentos sociais.

Um ativista ambiental, cuja trajetória no movimento e em ONGs data desde os anos 1980, argumentou, em entrevista realizada anos atrás, que havia uma identificação forte do ambientalismo com o PT, apesar do PV já existir. Além das críticas sobre criar um partido essencialmente ambientalista, o que, no geral, não era totalmente aceito pelo movimento, a representação política feita pelo PT lhes parecia mais completa, no sentido de ser mais ampla (Entrevista 44, 1990). Para analista político, especializado nessa temática, no período de surgimento e consolidação dos partidos, o PT e o PSDB tinham um importante comitê ambientalista. Apesar de o PV ser um partido que surge em função dessa bandeira, ele reconhece que foi no PT que o ambientalismo cresceu em importância e se destacou. À medida que havia crescimento da pauta ambiental na legenda petista, no PSDB, de Fábio Feldmann, o ambientalismo foi perdendo cada vez mais importância e se tornou irrelevante já no começo do século XXI (Entrevista 14, 7/7/2014).

Almeida (2006) retrata que, no Brasil, o PT foi importante aliado dos movimentos sociais durante a década de 1990, quando aqui imperava a corrente neoliberal. Em sua interação com os movimentos, o partido fazia a defesa de seus projetos nas administrações e legislações em que tinha seus membros e militantes em cargos políticos. Não carecia às lideranças sociais serem filiadas ao partido, elas tinham ligações informais com o PT (Gómez-Bruera, 2015) ou constituíam o que Sawicki (1997) chamou de meio partidário. Conforme trabalhado por Almeida (2006), os partidos de esquerda na América Latina tiveram importância nevrálgica para os movimentos sociais no período do neoliberalismo, por fazerem oposição a essa lógica política e econômica e defenderem politicamente as bandeiras dos movimentos sociais, sendo, de certa forma, seus representantes políticos e oferecendo membros de suas bases para apoiarem protestos na sociedade e, assim, fortalecer

Ainda que houvesse críticas ao PT ou à associação direta de ONGs com partidos políticos, o movimento ambientalista constituiu sua representação política em torno de partidos, especialmente do PT. Ainda que se esforçassem para tentar dissociar sua identidade e entidade de questões partidárias – especialmente porque os doadores exigiam que as ONGs não tivessem vínculos partidários como condição para receberem recursos – o histórico de desenvolvimento desse movimento o interliga a partidos políticos na luta por poder, para influenciar políticas públicas. Ambientalistas trabalharam em campanhas do PT em diferentes momentos e em diferentes níveis da federação, auxiliando na organização de campanhas e também no desenvolvimento de programas de governo (Entrevista 44, 1990; Entrevista 2, 27/4/2013; Entrevista 25, 7/2014). De certa forma, essa interação se tornou simbiótica em alguns momentos e, conforme demonstrado nesta tese, também apresenta traços de uma relação interessada de ambas as partes. Mas, nesse primeiro momento, a identificação entre ambientalistas e partidos políticos, especialmente o PT, envolve questões mais simbólicas de compartilhamento da luta política, da conquista de espaços políticos para agendas caras a eles. O socioambientalismo, que se fortalece na Amazônia e tem o suporte do PT, é elemento identificador para movimentalistas e para partidários.