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4 A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO IPI SOBRE A IMPORTAÇÃO

4.4 Critério Pessoal

4.4.2 Sujeito passivo: a figura do importador e as indevidas equiparações e o

4.4.2.3 Importações para consumo próprio

Outra questão que tem gerado discussões trata-se da importação de produto industrializado por pessoa física que adquire produto industrializado para uso próprio. O STF, no caso de importação de veículo para uso próprio de pessoa física, decidiu que em tais casos não há que se falar em cobrança de IPI; eis que em não sendo contribuinte não terá como repassar o ônus tributário, de modo que se violaria o princípio da não cumulatividade. Nesse sentido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULO PARA USO PRÓPRIO. NÃO INCIDÊNCIA. AGRAVO IMPROVIDO. I – Não incide o IPI em importação de veículo automotor, por pessoa física, para

178 Art. 13. Equiparam-se a estabelecimento industrial os estabelecimentos, atacadistas ou varejistas, que

adquirirem produtos de procedência estrangeira, importados por encomenda ou por sua conta e ordem, por intermédio de pessoa jurídica importadora. (BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.818, de 23

de agosto de 1999. Cria o Fundo de Garantia à Exportação - FGE, e dá outras providências. Brasília: 23

uso próprio. Aplicabilidade do princípio da não cumulatividade. Precedentes. II - Agravo regimental improvido179.

Com fundamentação no desrespeito ao princípio da não cumulatividade, o STF tem reconhecido que não é cabível a cobrança de IPI sobre a importação de bens industrializados, quando importados por pessoas físicas ou jurídicas que não sejam contribuintes do IPI, considerando que no caso não haveria a possibilidade de se aplicar o referido princípio, já que as etapas subsequentes inexistirão e, consequentemente, não haveria como tais sujeitos se creditarem dessa exação.

Parece-nos que o fundamento utilizado pela Suprema Corte para afastar a incidência, qual seja, o princípio da não cumulatividade não está em consonância com a diretriz instituidora do IPI sobre os produtos importados.

Já discorremos oportunamente e em concordância com a professora Misabel Derzi que a tributação por meio do IPI sobre os produtos importados é hipótese tributária autônoma e inteiramente possível. Por ela coloca-se a salvo o princípio da igualdade e da livre concorrência, já que tem o condão de tratar igualmente a incidência sobre produtos nacionais e importados.

A força motriz propulsora dessa tributação é manter a equivalência dos preços entre produtos nacionais e os importados, objetivo esse que só se realiza ao manter-se a mesma carga tributária para os importados que aquela existente para os produtos nacionais, eis o princípio da igualdade que conduz o escopo dessa exigência fiscal. Diante disso, não importa se a “importação se destine à nova industrialização, ao comércio ou ao consumo do importador”180.

Vale destacar, como o faz Marcus de Freitas Gouvêa, que o tratamento tributário dos produtos industrializados importados possuem duas etapas que não se excluem, sendo uma delas “voltada à proteção do mercado interno, denominada

179 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 550170. Agravo Regimental não

provido. Relator Min. Ricardo Lewandowski. Julgamento: 07 jun. 2011. Órgão Julgador: Primeira Turma. Publicação: DJe-149, 04 nov. 2011, p. 291.

180 BALEEIRO, Aliomar. Direito Tributário Brasileiro. 11. ed. Atualizado por Misabel Abreu Machado

nacionalização do bem (incidência dos tributos internos), e outra relacionada à proteção do mercado interno (incidência do imposto de importação)”181.

Além de tais perspectivas e sobre as quais deve-se compreender a tributação por meio do IPI sobre a importação de bens industrializados, é preciso destacar que, contrariamente ao que foi exposto no julgado acima transcrito, não houve violação ao princípio da não cumulatividade, tendo os julgadores, equivocadamente, desconsiderado questão essencial, ou seja, que a incidência é monofásica.

No caso da aquisição de veículos por pessoas físicas para o consumo final, o fundamento utilizado pela Suprema Corte para afastar a incidência do IPI foi o de que, por não haver etapas posteriores de comercialização, a aplicação do princípio ficaria prejudicada, o que impunha a não incidência do IPI sob pena de violar o referido princípio.

O princípio da não cumulatividade impõe que não haja cumulatividade do tributo durante as etapas do ciclo produtivo, vale dizer que se efetiva quando o produto necessariamente percorre mais de uma etapa. O princípio da não cumulatividade visa em última instância não onerar o produto que chega ao consumidor em decorrência de sucessivas ocorrências.

Ocorre que, quando a operação jurídica se implementa em uma única fase, sendo nessa que se chega ao consumidor final, não há que se falar em desrespeito ao princípio da não cumulatividade; eis que esse seria violado em caso de haver várias etapas sem o respectivo abatimento e sem que houvesse a translação ao contribuinte de fato quanto ao ônus fiscal.

Em não havendo mais de uma etapa, não há violação do princípio, já que não haverá cumulação das exações, mas uma única incidência a cargo do consumidor final. Marcus de Freitas Gouvêa assevera:

A observância do princípio da não-cumulatividade exige que não se tribute cumulativamente mais de uma etapa do processo produtivo.

181 GOUVÊA, Marcus de Freitas. A incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados na importação de

Veículos Automotores Destinados a Consumidor Final. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Dialética, n. 195, 2011, p. 89.

Contudo, se a tributação ocorre em uma única etapa do processo, seja ela a primeira ou a última, não haverá cumulatividade182.

André Mendes Moreira também discorre sobre a impropriedade de se adotar o fundamento de que não se atenderia ao princípio da não cumulatividade: “A importação de mercadorias é uma situação atípica na qual há a concentração, em uma única pessoa (natural ou jurídica), das figuras do contribuinte de jure e de facto”183.

Podemos concluir, portanto, nada obstante o posicionamento do STF de afastar a incidência do IPI para as importações de produtos industrializados por quem não seja contribuinte, que há um equivoco nesse entendimento, não havendo impedimento para sua exigência, sendo que, para esses casos, o tributo é de incidência única se compatibilizando com o princípio da não cumulatividade, já que as figuras do contribuinte de fato e de direito se concentram na mesma pessoa.