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5 ANÁLISE DE PRINCÍPIOS APLICADOS AO IPI

5.3 Princípio da anterioridade

O princípio da anterioridade compõe o sistema tributário nacional e impõe que a lei que institui ou majora tributo aguarde determinado lapso de tempo para ter vigência,

209 CARRAZZA, Roque Antonio; BOTTALLO, Eduardo Domingos. IPI, Seletividade e Alteração de

de modo que os administrados tenham tempo hábil para conhecer a carga tributária. O professor Roque Antonio Carrazza destaque que, em verdade, esse princípio salvaguarda o sobreprincípio da segurança jurídica e ensina: “o princípio da anterioridade é o corolário lógico do princípio da segurança jurídica. Visa a evitar surpresas para o contribuinte, com a instituição ou majoração de tributo no curso do exercício financeiro”210.

Segundo o mestre, a observância ao princípio da anterioridade visa suprimir a tributação de surpresa. O contribuinte, no exercício de suas atividades econômicas, precisa fundamentalmente realizar planejamentos que comumente resultam na adoção de medidas, que devem se dar dentro de uma previsibilidade estipulada.

O avanço de todos os setores da vida moderna nunca impôs tanto a necessidade do planejamento no desenvolvimento das atividades empresariais, dentre elas, sem dúvida, a tributária é uma das mais importantes. O contribuinte tem que conhecer a tributação incidente sobre a atividade que desenvolve para que possa planejar a vida econômica de sua empresa ou mesmo o contribuinte pessoa física que pretenda alterar seu patrimônio.

O princípio da anterioridade constante da Constituição Federal tem o condão de salvaguardar essa necessidade de segurança e previsibilidade que todas as atividades dos contribuintes demandam; eis que, ao impor o aguardo de lapso tempo para iniciar a cobrança dos tributos, ele evita que o contribuinte seja surpreendido com a nova carga tributária.

O princípio da anterioridade é garantia posta pelo sistema ao contribuinte. A nossa Carta Magna não traz o princípio em apenas um dispositivo, mas o formata a partir dos arts. 150, III, “b” e “c”, 150 § 1º e 195, § 6º, apresentando uma anterioridade revelada pela não exigência do tributo no mesmo exercício financeiro em que a lei foi publicada e noventa dias após publicação da lei, com aplicação diferenciada aos tributos.

Conjugando essa garantia com os dispositivos que tratam da matéria é que a professora Regina Helena Costa concluiu que o princípio da anterioridade vem se tornando cada vez mais complexo, tudo com o fim de oferecer maior proteção ao contribuinte. Na

210 CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 19. ed. São Paulo:

aplicabilidade do princípio da anterioridade, segundo a referida professora, é possível identificar diferentes regimes jurídicos:

1) observância de ambos os princípios – anterioridades genérica e especial, que constitui o padrão do sistema tributário;

2) não sujeição a nenhuma modalidade de anterioridade: empréstimo compulsório para atender a despesas extraordinárias, decorrentes de calamidade pública, de guerra externa ou sua iminência (art. 148, I); Imposto de Importação (art. 153, I); Imposto de Exportação (art. 153, II); IOF (art. 153, V); e impostos extraordinários (art. 154, II);

3) aplicação da anterioridade genérica, mas não da especial: IR (art. 153, III), fixação da base de cálculo do IPVA (art. 155, III); e IPTU (art. 156, I);

4) aplicação da anterioridade especial, mas não da genérica: IPI art.

153, IV); bem como ao ICMS incidente sobre operações com

combustíveis e lubrificantes (art. 155, § 4º, IV, c), e à contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação ou comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados e álcool combustível (art. 177, § 4º, I, b), por força da EC n. 33, de 2001;

5) aplicação da anterioridade nonagesimal, específica para contribuições sociais destinadas ao financiamento da seguridade social (art. 195, § 6º).211 (grifo nosso).

A disciplina do princípio da anterioridade, como bem colocou a citada professora, apresenta-se com diversidade de regimes. No que se refere ao IPI, a Constituição o excepciona da anterioridade anual, mas impõe a necessidade de se observar a anterioridade nonagesimal, de modo que a possibilidade de haver as alterações da alíquota por meio de Decreto do Executivo não afasta a necessidade de que seja observada a anterioridade nonagesimal.

Em caso recente, houve a majoração da alíquota dos veículos importados pelo Decreto 7.567 de 15 de setembro de 2011, sem a observância da anterioridade nonagesimal. O Poder Executivo, em sua defesa, afirma que o Decreto-lei 1199/71, que estabelece os limites da majoração, foi recepcionado como lei e, portanto, não haveria majoração; eis que a alíquota variou dentro da previsão legal.212

211 COSTA, Regina Helena. Curso de Direito Tributário. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 67-68.

212 Art. 4º O Poder Executivo, em relação ao Impôsto sôbre Produtos Industrializados, quando se torne

necessário atingir os objetivos da política econômica governamental, mantida a seletividade em função da essencialidade do produto, ou, ainda, para corrigir distorções, fica autorizado:

I - a reduzir alíquotas até 0 (zero);

Não andou bem o Poder Executivo em sua justificativa, já que, embora haja um parâmetro de alteração das alíquotas do IPI, a mesma só pode ocorrer com observância das disposições do sistema jurídico tributário, dentre elas o respeito à anterioridade, que evitará que os contribuintes sejam surpreendidos com o aumento da carga tributária, seja por lei ou por decreto.

No caso do IPI, não houve exceção pela Carta Magna, devendo, portanto, ser respeitada a anterioridade nonagesimal, conforme restou reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4661.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal concedeu liminar para afastar a vigência do Decreto 7.567/2011, que aumenta a alíquota do IPI para automóveis importados e reduz a alíquota desse imposto para os fabricados no país. O relator, Ministro Marco Aurélio, entendeu que o princípio da anterioridade deve ser observado no caso, decidindo que o decreto fica suspenso até que tenha transcorrido o prazo de noventa dias da sua publicação.

O art. 16 do referido Decreto previa a sua vigência imediata, a partir da publicação que se deu em 16 de setembro de 2011. Com a decisão do STF, o aumento da tributação somente surtirá efeitos após obedecido o prazo constitucional de 90 dias, nos termos do que dispõe o art. 150, inciso III, letra c, da Constituição Federal, consolidando o entendimento de que ao IPI se aplica a anterioridade nonagesimal:

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – DECRETO – ADEQUAÇÃO. Surgindo do decreto normatividade abstrata e autônoma, tem-se a adequação do controle concentrado de constitucionalidade. TRIBUTO – IPI – ALÍQUOTA – MAJORAÇÃO – EXIGIBILIDADE. A majoração da alíquota do IPI, passível de

ocorrer mediante ato do Poder Executivo – artigo 153, § 1º –, submete-se ao princípio da anterioridade nonagesimal previsto no artigo 150, inciso III, alínea “c”, da Constituição Federal. AÇÃO

DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE – IPI – MAJORAÇÃO DA ALÍQUOTA – PRINCÍPIO DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL – LIMINAR – RELEVÂNCIA E RISCO CONFIGURADOS. Mostra-se relevante pedido de concessão de medida acauteladora objetivando

II - a majorar alíquotas, acrescentando até 30 (trinta) unidades ao percentual de incidência fixado na lei; […]

(BRASIL. Presidência da República. Decreto-Lei nº 1.199, de 27 de dezembro de 1971. Altera a Nomenclatura Brasileira de Mercadorias (NBM), a Tarifa Aduaneira do Brasil (TAB), a legislação do Impôsto sôbre Produtos Industrializados e dá outras providências. Brasília: 27 dez. 1971).

afastar a exigibilidade da majoração do Imposto sobre Produtos Industrializados, promovida mediante decreto, antes de decorridos os noventa dias previstos no artigo 150, inciso III, alínea “c”, da Carta da República.213 Destacamos.

O art. 150 § 1º do texto constitucional expressamente excepcionou os tributos não submetidos à anterioridade nonagesimal; dentro dessa exceção, não se incluiu o IPI, concluindo-se pela sua aplicação para essa espécie tributária, conforme se posicionou o Supremo Tribunal Federal.