• Nenhum resultado encontrado

INFECÇÕES UTERINAS

No documento SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA (páginas 174-178)

MANEJO REPRODUTIVO EM REBANHO LEITEIRO

INFECÇÕES UTERINAS

Esta sendo destacado esse tópico, pois as infecções uterinas são a causa mais importante de infertilidade em rebanhos leiteiros. Elas são de ocorrência comum, e afetam novilhas e vacas no puerpério ou após o puerpério. Os índices de infecções genitais variam de 5 a 40% em vacas de leite. Por isso esse distúrbio deve ser tratado com bastante preocupação, pois a maioria dos profissionais que trabalham com reprodução continuam a diagnosticar de forma inadequada os catarros genitais. Afirmamos isso pois o diagnóstico na grande maioria das vezes é realizado com a prova do muco, no momento da inseminação ou via palpação retal, ou quando a fêmea já foi inseminada duas ou três vezes. Farei uma justificativa dessa minha afirmação. Primeiro a prova do muco e da palpação retal são eficientes apenas para fazer diagnóstico de CGIII, será explicado abaixo sobre as diferenças nos níveis de catarros, com isso apenas 20% dos catarros são diagnosticados. Os outros 80% são os catarros de I e II graus, os quais apenas pela palpação são muito difíceis de serem diagnosticados. Outra forma de se fazer o diagnóstico é quando a fêmeas já foram inseminadas 2, 3, 4 vezes e retornaram ao cio. Nesse momento, geralmente, os técnicos optam por uma infusão, mas nesse momento o prejuízo já está determinado, com as perdas das doses de sêmen e do tempo.

Portanto, o que preconizamos é o uso da vaginoscopia para o diagnóstico precoce dessas infecções. A vaginoscopia é um procedimento rápido, eficaz e extremamente barato, cujo os equipamentos que um técnico treinado precisa possuir consistem em um tubo metálico (R$ 40,00) e uma fonte de luz (lanterna comum). Um exame vaginoscópico não demora mais do que 5 minutos. Portanto, o que estamos querendo aconselhar é que os técnicos comecem a utilizar essa ferramenta importante para se obter melhores resultados reprodutivos em uma propriedade. A vaginoscopia tem um custo-benefício extremamente favorável. Para entender melhor os fatores que estão envolvidos com as infecções uterinas é importante o entendimento da sua patogenia.

As infecções genitais são alterações importantes capazes de afetar uma exploração leiteira, pois resultam em perdas econômicas consideráveis. Essas perdas decorrem da baixa eficiência reprodutiva devido às taxas de natalidade reduzidas, ao maior número de inseminações por concepção, a menor produção de leite, ao aumento do intervalo entre partos, bem como de descarte de vacas e gastos com medicamentos e descarte de leite (Nakao et al., 1992; Neves et al., 1995; Sá, 1996). A baixa fertilidade ocorre, pois o processo inflamatório promove lesões no endométrio e alterações no ambiente uterino, o que leva a dificuldade no transporte e sobrevivência espermática e, principalmente, a impossibilidade do desenvolvimento embrionário (Neves et al., 1995).

As infecções puerperais têm como etiologia os puerpérios patológicos com atonia uterina, prolapso uterino (hipertonia uterina), paralisia das parturientes, perturbações metabólicas e como fatores predisponentes a retenção das membranas fetais, lesões traumáticas da mucosa, higiene deficiente, partos distócicos e estresse (Blood & Radostits, 1989; Fernandes, 1995; Neves 1995; Sá, 1996). Os agentes causadores mais comuns são:

Actimomyces pyogenes, Staphylococcus sp., Escherichia coli, Streptococcus sp., e os ocasionais são: Pseudomonas aeruginosa, Clostridium spp., Difteroides, Nisseria,

Bacilus, Proteus spp., Enterobacter (Blood & Radostits, 1991; Sá, 1996). A flora bacteriana mista é comum nos casos de infecções uterinas puerperais (Blood & Radostits, 1991), sendo que as mais graves estão associadas a presença de A. pyogenes (Sá, 1996). Para se realizar o diagnóstico das infecções uterinas devem ser considerados o tamanho do útero (involução), conteúdo, contração, secreção, viscosidade e odor, bem como manifestação estral e atividade ovariana (Rosemberger, 1990).

As infecções uterinas podem ocorrer em novilhas e em vacas no período pós- puerperal (geralmente com curso crônico). Essas infecções são chamadas de catarros genitais inespecíficos e se caracterizam por processo inflamatório que atinge útero, cérvix e vagina. Os catarros genitais inespecíficos podem surgir como seqüelas de infecções puerperais e retenção de placenta, como outras etiologias, pode-se citar a deficiência nutricional, desequilíbrios alimentares, podem ser secundárias as enfermidades debilitantes, inseminações sépticas, ferimentos nas mucosas, pneumovagina, falhas no manejo, infeções venéreas como a campilobacteriose e a tricomonose. O exame clínico, por exame retal e vaginoscópico, é suficiente para se efetuar o diagnóstico adequadamente (Nakao et al., 1992). Os catarros genitais são classificados em CGI, CGII, CGIII e CGIV; sendo denominados de cervicite e endometrite pós-puerperal catarral crônica, mucopurelenta crônica, purulenta crônica e piômetra, respectivamente.

Os catarros genitais possuem as seguintes características:

CGI: intervalo de cios regulares; exame retal S/A (sem alteração), podendo apresentar aumento de volume do cérvix na porção vaginal; vaginoscopia: hiperemia; hipersecreção turva ou clara, podendo apresentar prolapso de primeiro anel cervical (Figura 2).

UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ - CAMPUS DOIS VIZINHOS

1 2 3

Prolapso de primeiro anel cervical

Figura 2. Inspeção por vaginoscopia de catarro genital de primeiro grau (CGI). Imagens 1 e 2 mostram dois casos de CGI, enquanto a foto número 3 é de um animal sem alterações/normal. Fotos cedidas pelo Prof. Dr. Jairo Pereira Neves.

CGII: retorno ao cio com intervalos regulares; exame retal - S/A, podendo apresentar aumento de volume do cérvix na porção vaginal; inspeção - pode haver a presença de hiperemia do vestíbulo e secreções; vaginoscopia – hiperemia, secreção turva ou mucopurulenta, prolapso de primeiro anel.

CGIII: retorno ao cio regular ou irregularmente; exame retal – útero e cérvix firmes, espessos ou S/A; vaginoscopia – hiperemia mais acentuada, secreção purulenta (Figura 3), prolapso de primeiro anel.

CGIV: aciclia; exame retal – útero aumentado, simétrico, atônico, parede grossa com conteúdo líquido, CL pseudo-gravídico; vaginoscopia – colo fechado, mucosa rosada ou aberto com secreção purulenta. Em piômetras consolidadas 99% dos animais se tornam inférteis e em iniciais 10% se recuperam. Podemos ter, ainda, como infecções uterinas as endometrites sub-clínicas, metrites, perimetrites e parametrites.

Cérvix

Secreção purulenta

Figura 3. Duas imagens demonstrando quadro característico de CGIII. Imagens cedidas pelo Prof. Dr. Jairo Pereira Neves.

As terapias utilizadas para infecções uterinas são via intra-uterinas (com anti- séptico ou antibiótico) e/ou parenterais (com antibiótico ou com hormônio). Existem fatores que reduzem a eficácia da maioria das drogas usadas intra-uterinamente, por exemplo: o útero, após o parto, é um compartimento anaeróbico, com isso não há atuação dos antibióticos dos grupos aminoglicosídeos (gentamicina, kanamicina, estreptomicina, neomicina) que necessitam de oxigênio para sua atividade. Muitos microorganismos no útero são capazes de produzir enzimas (penicilinase) que inativam ou degradam certos antibióticos. Os produtos com sulfonamidas, aminoglicosídeos e nitrofurazona podem ter seu efeito inibido pela presença de secreção purulenta e outras substâncias orgânicas nos fluídos uterinos. Em vacas com endometrite, logo após o parto, a absorção de medicamentos é reduzida e quando essa absorção é pequena, o tratamento intra-uterino, não atinge as camadas mais profundas do útero e outras partes do trato genital. Talvez, a causa mais importante da falha do tratamento intra-uterino seja a alteração da função leucocitária decorrente do tratamento, os anti-sépticos de uso intra-uterino, também, causam o impedimento da fagocitose por vários dias. O uso de antibacterianos irritantes, intra-uterino, tem sido contra indicado em vacas no pós-parto e piômetra. A antibióticoterapia parenteral apresenta as seguintes vantagens: a concentração de antibiótico encontrada na cavidade e tecido uterino é similar aos níveis séricos; as concentrações atingidas não interferem com a função leucocitária no útero; a absorção e eliminação são rápidas; a via de administração é prática e não apresenta riscos de levar novas infecções (Sá,1996). Como antibióticos parenterais os mais utilizados são a penicilina, as quinolonas e as tetraciclinas, deve-se manter níveis sangüíneos altos por mais de 10 dias e a realização de uma revisão após 20 ou 30 dias do tratamento é recomendável. O uso de prostaglandina, juntamente com antibióticoterapia parenteral, é uma boa opção, pois ela irá induzir ao estro, e nessa fase o canal cervical está mais aberto e há o aumento dos níveis de estrógenos e esse, sabidamente, aumenta a contratilidade uterina e a quantidade de secreções com células fagocitárias no útero. A aplicação de prostaglandina auxilia, significativamente, no tratamento, pois as recuperações das infecções uterinas podem ocorrer com a aplicação exclusiva de prostaglandina com a indução de 2 a 4 ciclos curtos (short cycle), com aplicações sucessivas de prostaglandina, 9 dias após o cio.

A fundamentação do tratamento com prostaglandina se deve ao fato de que o animal encurtando o seu ciclo estral fica mais tempo em fases estrogênicas do ciclo (estro, metaestro e pró-estro), isso faz com que a vaca faça um combate à infecção, pois com o estrógeno alto, o cérvix se abre e o útero se contrai, isso facilita a eliminação dos catarros, e principalmente, ocorre uma grande migração leucocitária, ou seja as células de defesa do organismo migram em grande quantidade para combater a doença, facilitando assim a sua cura.

A associação de short cylce com antibioticoterapia parenteral é a que fornece os melhores índices de cura.

Com relação às formas de tratamento de infecções uterinas faremos um relato das vantagens e desvantagens de cada um:

Antibiótico parenteral:

Vantagens: fornece altos resultados de recuperação desde que se mantenham altos níveis de antibiótico no sangue por vários dias. É de fácil entendimento por parte do produtor.

Desvantagens: torna-se caro em vacas de alta produção devido ao descarte do leite por muitos dias. No caso da tetraciclina, o aspecto nos locais de aplicação não é bom devido aos inchaços. É dolorido para o animal. O produtor começa a medicar por conta própria.

Hormônio parenteral (short cycle):

Vantagens: fornece bons resultados desde que se obtenha 3 a 4 ciclos curtos. É ecologicamente correto, pois é um tratamento quase que “natural”. Não há descarte do leite e não há problema com a indução de resistência bacteriana.

Desvantagens: é demorado, pois para se fazer 4 ciclos curtos são necessários pelo menos 36 dias. É de difícil compreensão pelo produtor.

Tratamento intra-uterino com antibiótico:

Vantagens: valoriza o trabalho do técnico, pois há necessidade de treinamento especial para se fazer esse processo. Fornece resposta rápida.

Desvantagens: dá descarte de leite por período não bem estabelecido. Cabe aqui uma ressalva, pois muitos técnicos e produtores optam por essa modalidade de tratamento pois crêem que não há descarte de leite. Isso é um erro grave; há necessidade de descarte de leite sim e esse é um problema grave de saúde pública. Outro porém, e que esse procedimento pode levar a lesões ginecológicas se não for bem executado.

Tratamento com anti-sépticos:

Vantagens: não dá descarte de leite, valoriza o trabalho do técnico, resposta rápida.

Desvantagens: são irritantes e causam cólicas fortes no animal. Devido ao efeito irritante podem levar a lesões irreversíveis do endométrio.

Em conclusão com relação ao tópico de infecções uterinas, é importante que fique a mensagem de que essas patologias devem ser diagnosticadas corretamente, para se lançar mão de tratamentos adequados. Como foi visto existem várias opções de tratamentos, nenhuma é superior a outra, no entanto elas possuem aplicabilidade específica, dependendo do caso. O conhecimento do perfil de cada tratamento é importante para a tomada de decisão no sentido da escolha do tratamento para o caso específico, no entanto algumas observações ainda se fazem necessárias. É importante a variação dos princípios ativos dos antibióticos, trocar a forma de tratamento quando um não der resultado, levar em consideração as condições financeiras do produtor, saber que as vezes um CGIII com uma aplicação de tetraciclina é curada, enquanto em outros casos, 5 aplicações de tetraciclina em intervalos de 3 em 3 dias para curar uma CGI não são eficazes. Em conclusão, não existe o melhor tratamento para catarros genitais, o que existem são possibilidades que quando bem aplicadas auxiliam a minimizar o impacto negativo que essas infecções têm no rebanho de leite.

No documento SISTEMAS DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA (páginas 174-178)