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A institucionalização de uma direção política dos militares no contexto democrático

No documento Democracia e Forças Armadas no Cone Sul (páginas 103-115)

O objetivo aqui é analisar o conjunto de temas e relações entre o poder político nacional, representado pelo presidente da República e pelo Congres- so Nacional, e o aparelho militar na vigência da Constituição de 1988. A hi- pótese que orienta a análise é que o Congresso Nacional oferece significativa resistência ao estabelecimento do “controle civil objetivo”, sem tampouco

19 Shain & Linz (1995). 20 Linz & O’Donnell (1996).

reivindicar ou exercer esse controle, ao passo que existem evidências de que o governo brasileiro tem procurado estabelecer uma condução política sobre as Forças Armadas, com resultados parcialmente favoráveis.

A Assembléia Nacional Constituinte funcionou como uma espécie de ímã que atraiu todo tipo de visão sobre as Forças Armadas e as finalidades e missões dos militares. De um lado, embora com pouca repercussão, mani- festaram-se teses sobre a falta de necessidade do aparelho militar. Em ou- tras palavras, as Forças Armadas poderiam ser extintas pelo bem do Brasil. Não havendo prosperado na Constituinte, poucos anos depois voltou com alguma expressão em conseqüência da vitória dos Estados Unidos na Guer- ra Fria. Se não mais havia uma divisão no mundo, o Brasil poderia prescin- dir da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, destinando-se para políticas de forte conotação social os recursos antes empregados na defesa. Essa posi- ção de pacifistas associava-se, voluntariamente ou não, à perspectiva norte- americana segundo a qual o Brasil (a exemplo de muitos outros países) de- veria deixar sua defesa aos cuidados do Ocidente, isto é, das estruturas mili- tares vitoriosas na Guerra Fria. Essas teses são bastante conhecidas e pro- pugnam uma função especificamente de “policiais de fronteiras” ao apare- lho militar, o qual destinar-se-ia ao combate ao narcotráfico, ao contrabando e ao crime organizado. É como se os Estados Unidos se imaginassem cerca- dos por um cinturão policial-militar formado pelas Forças Armadas dos de- mais países do continente (com a exceção do Canadá, seguramente), cujo combate ao narcotráfico teria o sentido especial de levantar obstáculos ao ingresso das drogas no amplíssimo mercado norte-americano, no qual a po- lítica repressiva do governo é reconhecidamente frágil e pouco operante.

Teses análogas à “falta de necessidade histórica” indicaram as Forças Armadas para realizar a reforma agrária, defender o meio ambiente, alfabe- tizar adultos, prestar assistência social aos menores infratores, oferecer en- sino profissional aos jovens e várias outras modalidades de substituição dos serviços públicos ineficientes (até mesmo inexistentes) pelo aparelho mili- tar. O fato de não haverem prosperado tais teses na Constituinte configura um sinal interessante do reconhecimento das forças políticas, com menor ou maior convicção, do caráter definitivo das Forças Armadas enquanto ins- tituições do Estado nacional. O realismo da análise sugere ainda o reconhe- cimento da clareza de posições e do labor político profícuo dos ministérios militares, que patrocinaram a preservação da tradicional vertente interven- cionista do papel constitucional das Forças Armadas.

Essa vitória do tradicionalismo militar não foi acompanhada do incre- mento da cultura estratégica (uma expressão cara ao almirante Mário César Flores) dos partidos, dos parlamentares, da imprensa e da sociedade civil. Se no Congresso Nacional já não se pensa em extinguir as Forças Armadas, ainda há parlamentares e grupos políticos que pretendem empregá-las em obras sociais, segundo o sentido apontado. Pouco atua o Congresso com o significado de enfocar com propriedade o tema central das relações civis- militares: ou seja, o preparo militar do Brasil em razão de sua dimensão es- tratégica e de seus interesses nacionais e compromissos internacionais. Considerando-se a ordem internacional e dadas as nossas dimensões territo-

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riais, populacionais, políticas, diplomáticas, econômicas, educacionais, cul- turais etc., governo (incluindo as Forças Armadas), sociedade e Congresso devem definir os interesses nacionais (por exemplo, a preservação da inte- gralidade do território, a manutenção da América Latina e do Atlântico Sul como zonas militarmente desnuclearizadas, a ampliação da presença brasi- leira nos principais processos decisórios mundiais etc.) sobre os quais se funda a política de defesa nacional, em razão da qual as Forças Armadas se- rão dimensionadas e preparadas.

Vale lembrar que é comum às formas institucionais das relações civis- militares no Brasil o perfil acentuadamente tímido, ineficiente e irresponsá- vel mesmo do Congresso Nacional no tocante à temática militar. A sociedade civil manifesta-se de modo semelhante. Passadas as circunstâncias especiais da Constituinte, uma espécie de pacto de silêncio condiciona o comportamen- to da mídia: eventuais escândalos, suspeitas de procedimentos inadequados, vantagens inaceitáveis e outros temas negativos merecem a sua atenção. Even- tualmente, matérias de grande relevância militar e/ou política são publicadas, até porque algumas temáticas impõem-se pela força das circunstâncias: guer- ras nas proximidades das fronteiras brasileiras, perspectivas de um esquema regional de defesa, algo em torno da pauta das relações civis-militares nacio- nais etc. No entanto, nada disso confronta ou nega o pacto de silêncio sobre as Forças Armadas, as quais, no entanto e paradoxalmente, continuam gozan- do de elevado prestígio junto à opinião pública.

Em suma, na vigência da Constituição de 1988, a representação polí- tica da nação reconhece a necessidade histórica e militar das Forças Arma- das, mas o Poder Legislativo pouco se ocupa de tudo que diga respeito ao aparelho militar e à defesa nacional. Quando o faz substantivamente, en- contra-se em geral na dependência de iniciativa do Executivo; quando opera no plano da generalidade, prende-se a uma visão equivocada do aparelho militar como provedor de atendimento social.

Qual deveria ser a explicação para essa situação efetivamente parado- xal, se considerarmos as Forças Armadas, segundo uma boa tradição jurídi- ca, como “garantes materiais da subsistência do Estado e da perfeita realiza- ção dos seus fins”?21

Ou: considerando que a Marinha, o Exército e a Aeronáutica foram relegados a definir por conta própria seus objetivos particulares, “os meios dos seus preparos particulares, por vezes concorrentes, na ausência de uma coordenação efetiva que o Estado-Maior das Forças Armadas não tem podi- do suprir”, cabe perguntar por que “a sociedade civil, o governo e o Legisla- tivo relegam o aparelho militar ao seu próprio cuidado, como se os temas militares fossem ‘coisas de milicos’, não merecendo um tratamento efetiva- mente nacional.” 22

21 Silva (1995:703).

22 Oliveira, Eliézer Rizzo de. O presidente, o Congresso e a defesa nacional. Correio Popular, 25- 6-1996, p. 3.

Duas hipóteses sobressaem entre parlamentares e militares, as quais são aqui denominadas como a teoria da inexistência de risco iminente e a tradi- ção jurídica brasileira. Segundo a teoria da inexistência de risco iminente, o sistema político responderia a necessidades bem definidas. Se não existem pressões para o governo federal definir e implementar uma efetiva política militar, não há respostas nesta direção, a exemplo de um sistema político em interação com o seu meio ambiente social. De maneira algo funcionalista, dizem muitos parlamentares brasileiros que não podem reconhecer uma alta prioridade às questões militares quando inexistem ameaças de guerra. Não havendo ameaças, ou se não são percebidas enquanto tais, elas não se trans- formam em questões políticas; portanto, não sensibilizam os partidos e os eleitores. Por não fazerem parte do cotidiano do sistema político nem de suas preocupações de médio prazo, os temas militares não chegam até a opi- nião pública, não fazem parte das agendas eleitorais, não “dão votos” aos candidatos nem aos partidos. Tornar-se atuante na temática militar não acar- reta vantagens para um candidato nas eleições. Ao contrário, significa desvan- tagens e prejuízo, exceto em circunstâncias especialíssimas e em ambientes castrenses.

Trata-se de um círculo vicioso, como se vê: a falta de uma questão perceptível de defesa nacional (inexistência de risco iminente) desobriga o sistema político a pensar mais do que em termos imediatos. Porém, este cír- culo vicioso simboliza também a percepção que os militares têm de sua pró- pria condição: funcionários públicos dedicados mas não reconhecidos, cuja missão externa (a defesa do país contra um inimigo estrangeiro) é mal per- cebida e cuja dimensão da missão interna (a defesa do país contra o inimigo interno) é mal-acolhida, embora estimulada em situações de crise política.

A teoria da inexistência de risco iminente parte de uma constatação com base real na percepção do sistema político, mas é falsa enquanto explicação. O tema talvez mais associado à temática militar é a política externa, que também pouco sensibiliza eleitorado, partidos e políticos. Seria inimaginável uma campanha eleitoral em torno de política externa nas atuais condições de paz nas fronteiras e baixíssima probabilidade de o Brasil envolver-se em um conflito bélico. Tampouco este tema ocupa um espaço amplo e prestigiado no Congresso Nacional e na vida dos partidos políticos. Assim, é preciso con- siderar a hipótese de que os partidos políticos rejeitam política e ideologica- mente a temática militar e sua razão mais evidente refere-se ao regime mili- tar. Se os militares tiveram responsabilidades centrais nesse regime, então eles também são autoritários e não devem ter espaço na democracia. Essa ex- plicação também é falsa, pois os valores e as perspectivas democráticas não constituem monopólio numa linha horizontal (da esquerda para a direita) nem numa linha vertical (dos civis aos militares) do espectro político.

No entanto, essas percepções encontram abrigo na estrutura estatal que não foi corretamente equacionada na Constituição de 1988 no tocante às missões militares, à natureza das Forças Armadas e à direção política sobre elas. Nada está previsto no plano da co-responsabilidade do Executivo e do Legislativo, mas tudo conduz a uma acomodação entre Forças Armadas e es- ses poderes. Em resumo, cabe exclusivamente ao presidente da República,

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comandante supremo das Forças Armadas, deliberar sobre o seu emprego de- rivado de declaração de guerra apreciada pelo Legislativo (art. 84, XIX, da Constituição) e para a garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem no plano nacional (Lei Complementar nº 97/99). Quanto ao Legislativo, além

de deliberar sobre os recursos orçamentários destinados às Forças Armadas, cabe-lhe a iniciativa não exclusiva do referido emprego militar no plano na- cional, a deliberação sobre a decretação do Estado de Defesa (art. 136, §§4º a

6º), a constituição de comissão de acompanhamento para fiscalizar a execu-

ção do Estado de Sítio ou Estado de Defesa (art. 140) e a autorização para a declaração de guerra e a celebração da paz (art. 84, XIX e XX).

A definição da política de defesa nacional pelo presidente Fernando Henrique Cardoso decorre desse quadro de relações entre o Executivo e o Le- gislativo, e o reforça. Não é possível se provar hoje, com as informações e co- nhecimento disponíveis, que o presidente da República teria tomado a inicia- tiva que conduziu à definição de tal política de defesa nacional se não tivesse enfrentado a pertinaz intenção do ministro da Marinha de adquirir aviões de ataque, a qual provocou intenso mal-estar na Aeronáutica. Não se dispondo a bater o martelo entre um e outro ministério, o presidente aproveitou a opor- tunidade para determinar estudos de uma política geral aos ministérios mi- litares, política que deveria “explicitar” as orientações correntes da defesa nacional. Daí por que a política de defesa nacional incorpora os conceitos de certo modo prevalecentes nas Forças Armadas, sem impor às instituições militares mudanças radicais em relação ao seu preparo em curso.23

Em nome da exclusiva relação de comando presidencial sobre as For- ças Armadas (que não aparece com clareza no art. 142 da Constituição), o presidente é a única autoridade responsável por aquele documento. O Poder Legislativo foi mantido alheio de qualquer participação efetiva e formal. No entanto, é possível vislumbrar um quadro de co-responsabilidade desejável que, ao mesmo tempo, preserve a univocidade da autoridade presidencial e as condições de sigilo da participação parlamentar. O quadro de co-responsa- bilidade do Congresso e do governo federal sobre a política de defesa nacio- nal exige duas atribuições adicionais do presidente da República: “remeter ao Congresso Nacional a política de defesa nacional” e “autorizar a participação do Brasil em operações de paz patrocinadas por organização interestatal de que o Brasil seja membro”, mediante autorização prévia ou referendo do Congresso Nacional. Finalmente, o Conselho de Defesa Nacional passaria a “opinar sobre a política de defesa nacional”. De modo complementar, o Con- gresso teria duas novas responsabilidades: “aprovar a política de defesa nacio- nal” e representar-se no Conselho de Defesa Nacional, além dos membros hoje efetivos, pelos presidentes das comissões de defesa nacional do Senado e da Câmara dos Deputados. Em decorrência, o presidente submeteria periodi- camente ao Legislativo o seu projeto de política de defesa nacional, o que exi- giria dos parlamentares e dos partidos uma dedicação ao tema que hoje eles não demonstram. As comissões de defesa nacional da Câmara e do Senado

seriam elevadas a um nível de reconhecimento e responsabilidade de que ja- mais gozaram. Conforme já destacado, o Legislativo deliberaria sobre o em- prego militar em missões internacionais de paz, em diversas das quais o país tem acertadamente participado. Finalmente, a co-responsabilidade significará fiscalização e controle: o presidente prestará contas ao Legislativo do cumpri- mento efetivo da política de defesa nacional, o mesmo valendo quanto ao em- prego militar no plano nacional e à intervenção nas polícias militares.

Dois outros aspectos deveriam merecer a atenção dos dois poderes: a especialização da Justiça Militar federal no julgamento de delitos militares co- metidos por funcionários militares das Forças Armadas, excluindo-se a apre- ciação de delitos políticos em tempos de paz, e a deliberação do Congresso para a intervenção do Exército em polícias militares: atualmente o processo deliberatório restringe-se ao governador e aos ministérios da Justiça e do Exército.24

Tal quadro de co-responsabilidade na condução política civil das For- ças Armadas aqui desenhado está longe de vigorar na democracia brasileira. Existe uma larga confusão no tocante à Justiça Militar, que, no plano federal, julga delitos militares cometidos por militar mas poderá ser incumbida do julgamento de delitos cometidos por civis, pois assim estabelece o Código Pe- nal Militar. As justiças militares dos estados são encarregadas do julgamento de policiais militares com resultados freqüentemente contestados em razão da tendência a amenizar penas de crimes contra a vida humana.

No entanto, o aspecto que talvez seja menos conhecido (embora for- temente intuído) é a “defesa interna”. Tradicionalmente, defesa interna tem significado o emprego da força militar para o controle de situações extremas e contrárias à preservação do Estado, associando-se a outro conceito repu- blicano profundamente enraizado na mentalidade militar do “Poder Mode- rador”: a obediência nos limites da lei. Assim, por iniciativa de comandos superiores ou de comandantes de menor expressão, forças militares foram empregadas contra movimentos sindicais, em repressão política etc. Dado que a Constituição de 1988 define como uma das missões militares a “ga- rantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem” (art. 142), a força arraigada do preceito “lei e ordem” sugere o preparo militar para o controle social.

Não se pense que apenas os militares se orientam por tal formulação. Pode parecer espantoso, mas ela aparece também em discurso presidencial de improviso, o que significa um pronunciamento destituído de eventual suges- tão de assessorias militares. O tema do discurso presidencial? Os movimentos sociais e a ordem jurídica. Naquela ocasião, o presidente Fernando Henrique Cardoso denunciou “com indignação, o comportamento cada vez mais ofensi- vo de setores inconformados, no fundo, com a sua própria falta de alternativas às nossas políticas”. A quais forças e ações referia-se o presidente? Seguramen- te, aos movimentos pela reforma agrária que promovem “abusos antidemocrá-

24 Oliveira, Eliézer Rizzo de. O presidente, o Congresso e a defesa nacional. Correio Popular, 25- 6-1996, p. 3.

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ticos”. Ou seja, “invasões repetidas de prédios públicos e de propriedades par- ticulares (...), incitamentos à desordem, inclusive por parte de lideranças na- cionais de alguns movimentos que suscitariam simpatia da sociedade não fosse sua agora óbvia vinculação político-sectária”. O presidente elaborou três conceitos acerca desses movimentos. Primeiro: embora simpática à causa da reforma agrária, “a sociedade brasileira exige um basta a esse clima de bader- na. A sociedade não quer a desordem”. Segundo: a tolerância e a paciência po- líticas do presidente são delimitadas pela democracia, que “exige respeito e or- dem. Sem ordem legítima não há democracia”. Terceiro: o governo dispõe de força mais poderosa do que as forças antidemocráticas: “Pedras, paus e coque- téis-molotov são argumentos tão pouco válidos quanto as baionetas. Só que menos poderosos”. Não sendo as baionetas armas típicas das polícias, mas das Forças Armadas e principalmente do Exército, a sua alusão apontava para a possibilidade de o presidente empregar a força militar para dar “um basta a este clima de baderna”. Então, por que os argumentos das baionetas seriam pouco válidos, embora mais poderosos do que as armas-argumentos das for- ças antiordem? Seriam as baionetas inadequadas para o emprego na seguran- ça pública? Ou seriam adequadas, desde que o presidente, visando a “impedir que a desordem corrompa a liberdade”, atuasse estritamente “dentro da lei, mas sem hesitação”? Finalmente, seriam inadequadas apenas se, como no pas- sado recente, fossem usadas fora das leis democráticas? O presidente não ameaçou o país com uma intervenção militar contra a democracia, mas aludiu ao emprego da força militar para defender o regime democrático. Tal é o pon- to mais difícil, duro e cheio de conseqüências deste discurso sobre a ordem pronunciado pelo presidente da República. O emprego militar na ordem pú- blica representa uma opção-limite que, de um lado, expressa a falência do ins- trumento policial tradicional e, de outro, estimula uma dependência do presi- dente com relação à área de força militar do Estado. Esta hipótese apontaria para a tutela castrense sobre a maior expressão do poder civil.25

Outro ponto relativo à direção política sobre o poder militar é a efeti- vação de uma estrutura e de instituições que façam valer essa orientação. É o caso do Ministério da Defesa. Sua criação deu-se por iniciativa presiden- cial, já no início do primeiro mandato do presidente Cardoso, sendo encar- regado do planejamento o Estado-Maior das Forças Armadas, com a partici- pação de outros ministérios e órgãos do Poder Executivo.

Após um longo processo de maturação, que durou todo o primeiro mandato, o ministério foi efetivamente criado em junho de 1999, após um período de cinco meses em caráter extraordinário, concomitante à existên- cia dos demais ministérios militares. Sua criação deu-se por medida provisó- ria, e mais uma vez a participação do Congresso Nacional foi mínima. À co- munidade acadêmica foram apresentadas as propostas em estudo,26 porém também esta participação não pode ser considerada relevante.

25 Oliveira, Eliézer Rizzo de. O presidente e as baionetas. Correio Popular, 13-6-1996, p. 3. 26 Exposição do general Benedito Onofre Bezerra Leonel, ministro-chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, no IV Encontro Nacional de Estudos Estratégicos, Unicamp, 14-5-1999.

Do ministério enfatizam-se dois significados: a) no plano político, tra- ta-se de uma adequação necessária e oportuna para a sedimentação da dire- ção política sobre o poder armado. Modifica-se sobremaneira a existência de ministros militares representantes das forças frente ao Poder Executivo, pela vigência de um ministro que desempenha e age de acordo com as dire- trizes oriundas do presidente da República; b) no plano estrutural-organiza- tivo, é a resposta pertinente à racionalização de recursos e meios de defesa. A tradição das relações entre as Forças Armadas e o sistema político orientou-se, ao longo da República, por uma tendência, inclusive em situa- ções constitucionais — a exemplo do regime vigente entre 1946 e 1964 —, que comporta dois aspectos relevantes da presença militar. O primeiro as- pecto, vigente no campo das forças políticas representadas no Congresso Nacional, é a consideração da área militar como uma espécie de poder à parte dos poderes da República. A segunda é o acolhimento da representa- ção militar no governo através de uma multiplicidade de ministérios milita- res, mas, sobretudo, pela lógica da escolha dos respectivos ministros segun- do critérios funcionais castrenses.

A representação das Forças Armadas nos governos no interior de um modelo que comporta um grau elevado de autonomia militar consolidou a ex-

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