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2. VALOR E CONCEITOS DE SOLIDARIEDADE, AMIZADE, DIREITO E JUSTIÇA

2.5. A TEORIA MODERNA DE JUSTIÇA

2.5.2. Os defensores do Contrato Social

2.5.2.3. Jean Jacques Rousseau

Jean Jacques Rousseau, natural de Genebra (1712-1778), escreveu três notáveis obras, que revolucionaram a história de todo o pensamento humano:

“Emile”, na qual induziu o retorno da educação da infância ao Naturalismo ou

“Estado de Natureza”, com o abandono de tudo quanto fosse falso ou fictício; “Discours sur l’orgine et les fundamets de l’ inelalité parmi les hommes” (1753) e

“Contrat Social” (1762), obras, aliás, entre si conexas.

No “Emile”, Rousseau disserta a história do gênero humano, de uma forma toda original e consoante suas próprias conjecturas. Diz ele que os homens eram originariamente livres e iguais, vivendo com extrema simplicidade e seguindo apenas os ditames da natureza. Viviam naquele estado que denominou de “estado de natureza” – o homem ignorava a corrupção e a degenerescência, a que somente a civilização conduz.

O homem era, então, naturalmente bom, como tudo aquilo que sai da Natureza, e era feliz.

Questiona-se: Mas como veio a perder esse estado natural de felicidade? Rousseau, então, passa a trilhar o terreno das hipóteses, cuidando de explicar, primeiro, a origem da civilização, que, para ele, se resume numa corrupção do estado de natureza.

Rousseau, em O Contrato Social, sugere a hipótese da passagem de um estado de natureza, de liberdade natural, para um estágio societário. Diz ele: "O homem nasce livre, mas em toda parte está aprisionado!"

Convém notar que, como Locke, Rousseau acredita que o homem surge num estado de liberdade absoluta, chamado estado de natureza, no qual, também, a felicidade seria absoluta.

Ao surgir a vida em sociedade, o homem perde tal liberdade e se corrompe. Tais idéias de Rousseau encontram-se bem expostas em seus livros “O Contrato Social”, “Discurso sobre a Origem da Desigualdade Entre os

O homem, diz ele, é um bom selvagem, sua natureza é sadia, mas a sociedade o corrompe. Ora, é a liberdade dos bons tempos que o faz bondoso; portanto, a sociedade política conveniente é aquela que garante a mais ampla autonomia individual.

Perdida a liberdade natural, a restauração do caráter do homem se faz com a liberdade civil, ideal maior do Estado. Passa a liberdade, então, a ser um fim em si mesma, e a própria sociedade nada mais é do que o objeto de um contrato, fruto da vontade e não de uma inclinação natural. A própria família somente se mantém unida em razão de laços contratuais. O individualismo rousseauniano reduz, então, o casamento a um contrato que, como qualquer outro, pode ser rescindido ou resilido pelas partes. Daí, o divórcio.

O Estado só é legítimo, conforme a doutrina de Rousseau, quando protege os direitos naturais do homem, em especial a liberdade. Grande, destarte, a influência de Rousseau na elaboração da "Declaração dos Direitos do Homem e

do Cidadão".

Importante reproduzir a concepção que Rousseau125 tem da Justiça

(Contrato Social – Livro VI – Das Leis):

Pelo pacto social demos existência e vida ao corpo político. Trata-se agora de dar-lhe o movimento e a vontade pela legislação. Pois o ato primitivo, pelo qual esse corpo nunca se forma e se une, nada determina ainda daquilo que lhe cumpre fazer para conservar-se.

O que é bom e conforme à ordem o é pela natureza as coisas e independente das convenções humanas. Toda a justiça provém de Deus, só ele é a sua fonte; mas se soubéssemos recebê-la de tão alto, não necessitaríamos nem de governo nem de leis. Há, por certo, uma justiça universal que emana unicamente da razão, porém essa justiça, para ser admitida entre nós, precisa ser recíproca. Se considerarmos humanamente as coisas, desprovidas de sanção natural, as leis da justiça são vãs entre os homens. Produzem somente o bem do malvado e o mal do justo, quando este as observa para com todos sem que ninguém as observe para com ele. Por conseguinte, tornam-se necessárias convenções e leis para unir os direitos aos deveres e conduzir a justiça ao seu fim. No estado da natureza, em que tudo é comum, nada devo àqueles a quem nada prometi, e não reconheço como de outrem senão o que me é inútil. O mesmo não se passa no estado civil, no qual todos os direitos são estabelecidos pela lei. [grifos nossos]

125 ROUSSEAU, Jean Jacques. O contrato social. [tradução Antonio de Pádua Danesi] – 3ª ed. – São Paulo:

Cumpre examinar, por fim, a questão da vontade geral, segundo fundamento da reconstrução do Estado (primeiro fundamento é o pacto social), que nada mais é do que a expressão decisória da coletividade, manifestada pelo chefe do Estado.

A vontade geral distingue-se das vontades particulares, não pela quantidade de sufrágios, mas pela qualidade de suas decisões.

Via de regra, há muita diferença entre a vontade de todos e a vontade geral, esta se refere somente ao interesse comum, enquanto a outra diz respeito ao interesse privado, nada mais sendo que uma soma das vontades particulares. Quando, porém, se retiram dessas mesmas vontades os mais e os menos que se destroem mutuamente, resta, como soma das diferenças, a vontade geral.126

Por conseguinte, se não houvesse interesses diferentes, mal se perceberia o interesse comum, que nunca haveria de encontrar obstáculo. O que “generaliza” a vontade, portanto, é menos o número de votos que o interesse comum a uni- los.127 Em outras palavras, a vontade geral impõe a supremacia do interesse

público sobre o interesse privado.

Rousseau afirmava que: “há no Estado uma força comum, que o sustém,

uma vontade geral, que dirige essa força, e é a aplicação de uma à outra que constitui a soberania”.

Posta assim a questão, conclui-se que é da combinação dessas duas idéias fundamentais – contrato social e a vontade geral – que deriva todo o pensamento do filósofo Jean-Jacques Rousseau sobre o contrato social.

A Escola do Direito Natural, também chamada Escola Clássica do Direito Natural, exerceu notável influência nas grandes codificações do início do séc. XIX, bastando lembrar que o Código Civil francês de 1804, também chamado Código de Napoleão, por ter sido encomendado pelo próprio Napoleão Bonaparte, afirma em sua introdução: "Existe um direito universal, imutável, fonte de todas as leis

positivas, e que não é mais do que a razão natural enquanto diretora de todos os povos da terra".

126Ibidem, p.37.

127 ROUSSEAU, Jean Jacques. O contrato social. [tradução Antonio de Pádua Danesi] – 3ª ed. – São Paulo:

Modernamente, negando a existência do direito natural, surge a Escola de Viena, tendo à frente o neopositivista Hans Kelsen, criador da célebre doutrina pura do direito, para a qual o direito positivo deve estar a salvo de qualquer juízo de valor.

Indubitável é a influência de Hans Kelsen no pensamento filosófico-jurídico; todavia, desnecessário será o exame de seus ensinamentos, como já mencionado anteriormente, pois o filósofo não reconhece a inter-relação entre a justiça e o direito.