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Lágrimas pelo Passado

No documento Graham Hancock - As Digitais Dos Deuses (páginas 130-136)

Com os olhos velados pela ignorância, fanatismo religioso e cobiça, os espanhóis, ao chegarem ao México, apagaram uma herança preciosa da humanidade. Ao assim proceder, privaram o futuro de qualquer conhecimento detalhado sobre as civilizações brilhantes e notáveis que outrora floresceram na América Central.

Qual, por exemplo, a história real do "ídolo" resplandecente que respousava em um santuário sagrado em Achiotlán, a capital misteca? Sabemos da existência desse curioso objeto graças a uma testemunha ocular do século XVI, o padre Burgoa:

O material era de maravilhoso valor, pois era uma esmeralda do tamanho de um polpudo cacho de pimenta [capsicum], sobre a qual uma pequena ave fora gravada com a maior habilidade possível e, com a mesma perícia, uma pequena serpente, enroscada e pronta para dar o bote. A pedra era tão transparente que brilhava a partir de dentro com o fulgor de uma chama de vela. Era uma jóia muito antiga e não há qualquer tradição remanescente sobre a veneração e o culto que lhe eram propiciados.

O que não aprenderíamos se pudéssemos examinar hoje essa jóia "antiqüíssima” E qual, realmente, sua antiguidade? Jamais saberemos, porque frei Benito, o primeiro missionário a chegar a Achiotlán, tomou-a dos índios. "Ele mandou moê-Ia, embora um

espanhol lhe oferecesse três mil ducados pela pedra, dissolveu o pó em água, derramou-a na terra e pisou em cima...".

Igualmente característico do desperdício criminoso das riquezas intelectuais ocultas no passado mexicano foi o destino compartilhado por dois presentes dados a Cortés por Montezuma, o imperador asteca. Foram dois calendários circulares, do tamanho de rodas de carroça, um de prata maciça e, o outro, de ouro, também maciço, detalhadamente gravados com belos hieróglifos que podem ter contido material de grande interesse. Cortés, na hora, mandou derretê-Ios e transformá-Ios em lingotes.

De forma ainda mais sistemática, em toda a América Central, imensos repositórios de conhecimentos acumulados desde tempos antigos foram laboriosamente reunidos, empilhados e queimados por religiosos fanáticos. Em julho de 1562, por exemplo, na praça principal de Mani (que se situa imediatamente ao sul da moderna Mérida, na província de Yucatán), frei Diego de Landa queimou milhares de códices, histórias ilustradas e hieróglifos maias inscritos em pergaminhos de pele de cervo. Destruiu também incontáveis "ídolos" e "altares", todos os quais descreveu como "obras do demônio, criados por Satanás para enganar os índios e impedir que aceitem o

cristianismo... Em outro contexto, voltou a discorrer sobre o mesmo tema:

Descobrimos grande número de livros [escritos nos caracteres usados pelos índios], mas, como eles nada continham, exceto superstições e falsidades do demônio, queimamos todos, o que os nativos receberam muito mal e lhes causou grande dor.

Mas não foram apenas os "nativos" que sofreram essa dor, mas todos - na ocasião como agora - que gostariam de saber a verdade sobre o passado.

Numerosos outros "homens de Deus", alguns ainda mais implacavelmente eficientes do que Diego de Landa, participaram da satânica missão espanhola de apagar os bancos de memória da

América Central. Entre eles, destacou-se Juan de Zumárraga, bispo do México, que bravateava ter destruído 20.000 ídolos e 500 templos índios. Em novembro de 1530, condenou à fogueira um aristocrata asteca cristianizado por ter ele supostamente voltado à adoração do "deus da chuva", e mais tarde, na praça do mercado em Excoco, mandou construir uma imensa fogueira de documentos sobre astronomia, pinturas, manuscritos e textos hieroglíficos que os conquistadores haviam confiscado dos astecas nos onze anos precedentes. Enquanto esse tesouro insubstituível de conhecimentos e história subia nas chamas, a humanidade perdia para sempre uma oportunidade de sacudir, pelo menos, parte da amnésia coletiva que ora turva nossa compreensão.

O que resta dos registros dos povos antigos da América Central? A resposta, graças aos espanhóis, é menos de vinte códices e pergaminhos originais.

Ouvimos nas lendas que numerosos documentos reduzidos a cinzas pelos frades continham "registros de passadas eras".

O que diziam esses registros perdidos? Que segredos guardavam?

Gigantes de Desmesurada Estatura

Enquanto continuava a orgia de queima de livros, alguns espanhóis começaram a compreender que "uma civilização realmente grandiosa existira no México, antes dos astecas". Estranhamente, um dos primeiros a agir, ao compreender esse fato, foi Diego de Landa. Aparentemente, ele passou por uma "experiência de conversão, do tipo experimentado por Paulo na estrada para Damasco" após ter montado seu auto-da-fé em Mani. Anos depois, decidido a salvar o que pudesse da sabedoria antiga, que tanto fizera para destruir, tornou-se colecionador apaixonado das tradições e histórias orais dos povos nativos do Yucatán.

É grande nossa dívida para com Bernardino de Sahagun, frade franciscano e historiador da época. Consumado lingüista, conta-se

que ele "procurou os nativos mais cultos e, freqüentemente, os mais velhos, e lhes pediu que, utilizando a escrita pictográfica, contassem tudo de que pudessem lembrar-se com clareza da história, religião e lendas astecas". Dessa maneira, Sahagun conseguiu acumular informações detalhadas sobre a antropologia, a mitologia e a história social do antigo México, que mais tarde transcreveu em uma culta obra em doze volumes, obra esta destruída pelas autoridades espanholas. Por sorte, sobreviveu uma cópia, embora incompleta.

Diego de Durán, colecionador consciencioso e corajoso de tradições indígenas, foi outro franciscano que lutou para recuperar o conhecimento perdido do passado. Visitando Cholula no ano 1585, em uma época de mudança rápida e catastrófica, entrevistou um ancião, venerado na cidade, que se dizia contar mais de 100 anos de idade, e que lhe contou a história seguinte sobre a construção do grande zigurate:

No começo, antes de ser criada a luz do sol, este lugar, Cholula, era coberto por escuridão e trevas, todo o terreno era plano, sem uma colina ou elevação, cercado d'água por todos os lados, sem árvores ou qualquer coisa criada. Imediatamente depois de surgir a luz e subir o sol no leste, apareceram gigantes de estatura desmesurada, que se apossaram da terra. Apaixonados pela luz e a beleza do sol, resolveram construir uma torre tão alta que chegasse ao céu. Tendo reunido materiais para este fim, descobriram uma argila e betume fortemente adesivos e começaram a construir rapidamente a torre... Tendo eles levado a construção à maior altura possível, conseguindo que ela tocasse o céu, o Senhor dos Céus, enfurecido, disse aos habitantes do céu: "Observastes como eles da terra construíram uma alta e arrogante torre para chegar até aqui, tendo ficado apaixonados pela luz do sol e sua beleza? Vinde e destruam-nos, porque não é certo que eles da terra, vivendo na carne, devam misturar-se conosco." Imediatamente, os habitantes do céu atacaram como se fossem raios, destruíram o edifício e dividiram e espalharam os construtores por todas as partes da terra.

E foi essa história, parecida mas não idêntica à história bíblica da Torre de Babel (em si a refundição de uma tradição mesopotâmica muito mais antiga), que me trouxe a Cholula.

Essas lendas da América Central e do Oriente Médio guardavam, evidentemente, uma estreita relação. Na verdade, ninguém podia deixar de notar as semelhanças, mas havia também diferenças importantes demais para ser ignoradas. Claro, as semelhanças poderiam ser devidas a contatos pré-colombianos, não registrados em quaisquer anais, entre culturas do Oriente Médio e do Novo Mundo, embora houvesse maneira de explicar, em uma única teoria, as semelhanças e as diferenças. Suponhamos que as duas versões da lenda evoluíram separadamente durante vários milhares de anos, mas que, antes disso, ambas provieram do mesmo ancestral muito antigo.

Sobreviventes

Vejamos o que o Livro do Gênesis diz sobre a "torre que chegou ao céu":

Ora em toda a terra havia apenas uma linguagem e uma só maneira de falar. Sucedeu que partindo eles do Oriente, deram com uma planície na terra de Sinear; e habitaram ali. E disseram uns aos outros: "Vinde, façamos tijolos e queimemo-Ios bem”. Os tijolos serviram-Ihes de pedra e, o betume, de argamassa. Disseram: "Vinde, edifiquemos para nós uma cidade, e uma torre cujo topo chegue até os céus, e tornemos célebre nosso nome, para que não sejamos espalhados por toda a terra”.

Então desceu o Senhor [lavé, o Deus hebreu] para ver a cidade e a torre, que os filhos dos homens edificavam, e disse: "Eis que o povo é um, e todos têm a mesma linguagem. Isto é apenas o começo; agora não haverá restrição para tudo que intentam fazer. Vinde, desçamos, e confundamos ali sua linguagem, para que um não entenda a

linguagem do outro”. Destarte, o Senhor os dispersou dali pela superfície da terra.

O versículo que mais me interessava sugeria, com grande clareza, que os antigos construtores da Torre de Babel queriam construir um monumento duradouro a si mesmos, de modo que seu nome não fosse esquecido - mesmo que isso acontecesse com sua civilização e linguagem. Seria possível que as mesmas considerações se aplicassem a Cholula?

Segundo os arqueólogos, apenas um punhado de monumentos no México tem mais de 2.000 anos. Cholula era indiscutivelmente um deles. Na verdade, ninguém podia dizer com certeza em que época remota seus contrafortes começaram a ser construídos. Durante milhares de anos, antes que o desenvolvimento e prolongamento da estrutura começassem a todo vapor no século 300 a.C., parecia que alguma outra estrutura, mais antiga, poderia ter existido no local em que, nesse momento, estava sendo construído o grande zigurate de Quetzalcoatl.

Um precedente reforçava ainda mais a intrigante possibilidade de que restos de uma civilização realmente antiga pudessem estar ainda ocultos na América Central, à espera de descoberta. Imediatamente ao sul do campus da universidade, na Cidade do México, ao lado da estrada principal que liga a capital a Cuernavaca, existe uma pirâmide escalonada circular de grande complexidade (com quatro galerias e uma escadaria central). Parcialmente escavada, sob um manto de lava, na década de 1920, geólogos foram chamados ao local para ajudar a datar a lava e efetuar um exame detalhado do sítio. Para surpresa geral, concluíram eles que a erupção vulcânica que cobrira inteiramente três lados da pirâmide (e que se espalhara e cobrira cerca de 155 quilômetros quadrados do terreno em volta) deveria ter ocorrido há pelo menos sete mil anos.

Aparentemente, a prova geológica foi ignorada por historiadores e arqueólogos, que não acreditam que qualquer civilização capaz de ter construído uma pirâmide possa ter existido no México em data tão

remota. Vale lembrar, porém, que Byron Cummings, o arqueólogo americano que inicialmente escavou o sítio por conta da National Geographical Society, convenceu-se, à vista de estratificação claramente demarcada de camadas acima e abaixo da pirâmide (depositadas antes e depois da erupção vulcânica), que aquele era "o templo mais antigo até agora descoberto no continente americano". E foi ainda mais longe do que os geólogos, declarando que esse templo "transformou-se em ruínas há cerca de 8.500 anos".

No documento Graham Hancock - As Digitais Dos Deuses (páginas 130-136)