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Lacunas importantes

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 72-74)

3 CRÍTICA DA ESTRUTURA FORMAL DA LEI 8.429/92

3.3 Lacunas importantes

Em que pese tenha o mérito de fornecer um importante instrumental para o combate aos desvios de conduta na administração pública, a Lei 8.429/92 apresenta algumas lacunas que prejudicam a sua maior efetividade, na medida em que lançam dúvidas sobre o procedimento.

Uma destas lacunas foi suprimida por meio da Lei 12.120, de 15 de dezembro de 2009, que alterou o caput do art. 12 para explicitar que as sanções ali previstas podem ser aplicadas isoladas ou cumulativamente, algo que vinha sendo objeto de muitos debates.

Mas persistem outras lacunas merecedoras da atenção do legislador, se quiser aperfeiçoar a aplicação da lei.

Uma grave omissão é a inexistência de regras de determinação da competência

territorial fazendo com que se busque a aplicação supletiva daquelas existentes no Código de Processo Civil ou, como fazem alguns, no rito da Ação Civil Pública da Lei 7.347/85 ou da Ação Popular da Lei 4.717/65.

Pode ser apontada, ainda, a inexistência de regras sobre a concorrência com outras

ações que tenham o mesmo pedido ou a mesma causa de pedir. Não havendo a reunião de processos por conexão, como determina o § 5º do art. 17, certamente haverá dúvidas sobre a aplicação das sentenças proferidas em duas ações por improbidade ou em mesmo em ações de reparação ou ações populares.

Também não há qualquer alusão quanto aos efeitos da coisa julgada, o que pode causar sérios problemas, visto que o réu poderá, eventualmente, ser condenado em duas ações a ressarcir os cofres públicos pelo mesmo fato. Ou poderá ser condenado em uma ação e ser eximido em outra sob a mesma acusação. Isso demonstra a importância de haver alguma previsão neste sentido, como há, por exemplo, no art. 16 da Lei 7.347/85 e no art. 18 da Lei 4.717/65.

Em face das manifestações jurisprudenciais, inclusive do Supremo Tribunal Federal102, também seria bem-vinda a inclusão de parágrafo no art. 12, no sentido de que ser inaplicável a perda da função ou a suspensão dos direitos políticos aos agentes políticos para quem a Constituição Federal prevê regras específicas para isso, como é o caso do Presidente da República (art. 86 e 87), os ministros de estado (art. 102, I, “c”) e parlamentares (art. 55 e §§).

A Lei 8.429/92 também é omissa quanto à conduta de autoridade administrativa em relação à hipótese de denúncia anônima de ato de improbidade, visto que o § 1º do art. 14 induz a pensar que somente pode ser aceita representação escrita e assinada pelo delator.

O fato, porém, é que a autoridade não pode simplesmente ignorar uma denúncia apócrifa, sem verificar se ela tem alguma pertinência, conforme será analisado alhures, de modo que seria salutar alguma previsão a respeito disso, possivelmente com a inclusão de um parágrafo no art. 14.

Seria bem-vinda, ainda, a previsão de ser possível, além do seqüestro, o arresto de bens do réu, no caput do art. 16 da Lei 8.429/92. Ainda que essa medida possa decorrer do

poder geral de cautela do magistrado (art. 798 do CPC), a clareza do texto legal sempre vem a proporcionar menos incidentes e impugnações no processo, contribuinte para maior rapidez em sua solução.

Nota-se também a ausência de qualquer previsão em relação à execução da sentença, exceção feita ao art. 20 da lei em foco, que cuida, especificamente, da perda da função pública e da suspensão dos direitos políticos.

O ressarcimento aos cofres públicos ou a perda de bens ilicitamente adquiridos não constituem problemas, porque o próprio Código de Processo Civil oferece procedimentos para isso.

Todavia, não há qualquer previsão sobre o destino da multa civil eventualmente aplicada na sentença, nem da forma como deve ser aplicada a proibição de contratar com o Poder Público. O que dizer, então, da vedação ao recebimento de benefícios ou incentivos fiscais.

Sentenças com estas imposições enfrentariam dificuldades para o seu cumprimento, justamente pela ausência de previsão a respeito.

A lei também não diz quais os efeitos da sentença em relação ao ato ou contrato que constituiu o veículo formal para a prática do ato administrativo. Este ato estará

automaticamente anulado ou subsistirá? A declaração de sua invalidade, como pressuposto da condenação por improbidade, terá efeito pleno iuris ou sua invalidação dependerá de ação própria?

Este questionamento é de grande relevância, posto que a lei só diz que será punido o ato (leia-se: a conduta) do agente público ou do terceiro que for considerado ímprobo. È o que se deduz do teor do art. 1º: “Os atos de improbidade... serão punidos na forma desta lei”. Em sentido parecido o art. 18: “A sentença que julgar procedente ação... determinará o

pagamento ou reversão dos bens, conforme o caso, em favor da pessoa jurídica prejudicada pelo ilícito”.

O art. 21 da lei sugere a desvinculação entre a invalidação do ato e sanção por improbidade, ao proclamar que a aplicação das sanções é independente “da aprovação ou

rejeição das contas pelo órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas”. Seria bom se a lei fosse mais clara sobre os efeitos da sentença, de modo a extirpar ou reduzir dúvidas desta natureza.

Também se fazem ausentes no texto da Lei 8.429/92 normas sobre os ônus da sucumbência, matéria que é objeto freqüente de impugnações recursais.

A tendência jurisprudencial tem sido a de eximir qualquer uma das partes destes ônus, principalmente nas causas ajuizadas pelo Ministério Público, seja qual for o resultado da ação, pois se entende que o Parquet não tem a obrigação de pagá-los se improcedente o pedido e nem o direito de recebê-los no caso de procedência.

A omissão de regras sobre os ônus de sucumbência é particularmente injusta no caso de improcedência do pedido, em que o réu, além de ter sofrido todo o desgaste psicológico e social da acusação, ainda tem que arcar sozinho com as despesas processuais efetuadas, inclusive os honorários advocatícios do seu defensor, sem direito a nenhum tipo de ressarcimento, o que é muito questionável em face do princípio do devido legal substantivo.

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 72-74)