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Prescrição e decadência na ação por improbidade

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 127-130)

6 DA PRESCRIÇÃO DA AÇÃO POR IMPROBIDADE

6.2 Prescrição e decadência na ação por improbidade

Neste ponto, cabe questionar se as sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92 estão sujeitas à prescrição ou decadência.

Considerando os critérios estabelecidos por Agnelo Amorim Filho, aqui acolhidos, as sanções por improbidade estão algumas (as de natureza condenatória) sujeitas a prazo prescricional e outras (as de caráter constitutivo) a prazo de decadência.

São consideradas de natureza condenatória as sanções de ressarcimento, de perda de

bens e de multa, visto que, sem dúvida alguma, cominam prestação a ser cumprida pelo réu. Nestes termos, estão sujeitas a prazo prescricional, com todos os corolários que disso decorrem, como a possibilidade de impedimento, interrupção e suspensão do prazo (art. 197 a 201 do Código Civil).

De outra parte, têm caráter constitutivo as sanções de perda função pública e de

suspensão dos direitos políticos por configurar um direito potestativo do Estado de submeter à sua vontade a situação jurídica de outrem, independentemente do consentimento deste.

Haverá, sem dúvida, com a perda do cargo ou com a suspensão dos direitos políticos,

modificação substancial na situação jurídica do réu da ação por improbidade, em caso de procedência do pedido. Em sendo assim, o prazo da ação, nestas hipóteses, é decadencial, não estando sujeito a impedimento, interrupção e suspensão.

Ponto que gera dúvidas sobre a submissão à prazo decadencial ou prescricional é a proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais e creditícios.

Ao discorrer sobre a natureza das sanções previstas no art. 12 da Lei 8.429/92, Ada Pellegrini Grinover176 considera tipicamente constitutivo o provimento judicial que contém a proibição de contratar ou receber benefícios, assim como a perda de função pública e a suspensão de direitos políticos, na medida em que opera modificação de estado jurídico.

Quer parecer, todavia, que a proibição de contratar ou receber benefícios tem natureza

mandamental para o Poder Público e obrigacional (obrigação de não fazer) para o réu.

Segundo Pontes de Miranda177, na ação mandamental pede-se que o juiz mande, não

só que declare (pensamento puro, enunciado de existência), nem que condene (enunciado de fato e de valor).

Ressalta Arruda Alvim178 que as determinações mandamentais, portanto, necessitam

vir acompanhadas da correlata conseqüência intimidadora do destinatário da ordem, para a hipótese de recalcitrância [...] para a consecução ou o cumprimento da ordem ou do mandamento.

Há que se notar que na sentença que interdita ao réu a contratação com o Poder Público ou o recebimento de benefícios fiscais ou creditícios, há uma condenação do réu à obrigação de não fazer.

Simultaneamente, há uma ordem geral e abstrata ao Poder Público de não contratar com o réu. Trata-se, evidentemente, de ordem com efeitos erga omnes, não se restringindo ao ente público que sofreu os danos por improbidade, detalhe que pode, inclusive, dificultar o cumprimento efetivo da condenação, na falta de um cadastro único de interdições decorrentes de sentença judicial.

De todo modo, estas sanções não têm natureza constitutiva, porque o juiz emite um comando proibitório que somente poderá produzir efeitos ex nunc, sob pena de afronta à

176 Ação de improbidade administrativa – decadência e prescrição, p. 69-71.

177 Comentários ao Código de Processo Civil, p. 48-49.

garantia constitucional do direito adquirido e do ato jurídico perfeito, inscrita no art. 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal de 1988.

Ou seja, a sentença não poderá determinar que contratos lícitos vigentes com a Administração sejam imediatamente resolvidos. A proibição somente poderá valer para negócios futuros.

Poder-se-á cogitar da eventual invalidade do contrato atual, mas cumpre lembrar que a ação por improbidade não está pedindo a invalidação de ato ou contrato administrativo, mas apenas buscando a imposição de sanção àquele que praticou ato ímprobo.

A declaração de invalidade parcial ou total do ato ou contrato ocorrerá incidenter

tantum, como premissa para a aplicação de sanção por ato de improbidade. No entanto, é preciso lembrar que a invalidade não é o objeto do processo, mas somente a sua causa de

pedir.

Pela natureza dos provimentos buscados na ação por improbidade, o objeto da lide é limitado à punição do ato ímprobo, eventualmente veiculado por meio de ato ou contrato administrativo.

A declaração do juiz, no entanto, sobre esta invalidade, tem efeitos limitados ao objeto da ação, não acarretando a automática invalidação do ato ou contrato, que ficará sujeita à apreciação de sua validade no âmbito administrativo ou ação de outra natureza, como a ação popular (Lei 4.717/65) e a ação civil pública (Lei 7.347/85), cujo objeto poderá ser, aí sim, a invalidação do ato ou contrato.

Mas a ação por improbidade tem objeto delimitado pela punição do ato ímprobo, não podendo transbordar os seus limites.

Tal interpretação é autorizada pela mens legis e até mesmo pelo disposto no art. 21 da Lei 8.429/92, cujo inciso II deixa entrever a autonomia de outras instâncias para resolver especificamente sobre a validade do ato ou contrato que deu origem à ação, ao dispor que a aplicação das sanções por improbidade independe da aprovação ou rejeição das contas pelo

órgão de controle interno ou pelo Tribunal ou Conselho de Contas.

Resulta disso que na ação por improbidade não se estará discutindo a invalidação do ato ou contrato, propriamente dito, mas exclusivamente a punição do desvio de conduta formalizado através dele.

Acaso a sentença aplique a sanção de proibição de contratar com o Poder Público ou de receber benefícios fiscais ou creditícios, estará se referindo a eventos futuros e não àqueles já consumados, em relação aos quais deve prevalecer a garantia constitucional do ato jurídico perfeito e do direito adquirido.

Portanto, na proibição de contratar, não haverá sentença de natureza constitutiva, pois não se criará nova relação jurídica e nem se modificará ou extinguirá relação jurídica preexistente. Haverá apenas a ordem para que não se constitua nova relação jurídica, o que traz ínsito o provimento judicial de natureza mandamental para o Poder Público e

obrigacional para o réu (obrigação de não-fazer).

Nesta qualidade, a sanção de proibição de contratar com o Poder Público ou de obter benefícios fiscais ou creditícios estará sujeita a prazo prescricional e não a prazo decadencial.

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 127-130)