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Requisitos da representação contra ato de improbidade

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 85-88)

4 A FASE ADMINISTRATIVA DA PERSECUÇÃO

4.4 Requisitos da representação contra ato de improbidade

Ao cuidar do controle interno dos atos administrativos ímprobos, o art. 14 da Lei 8.429/92 dispõe que isso deverá acontecer através de representação de qualquer pessoa que deles tenha conhecimento, mediante o atendimento dos requisitos ali discriminados.

O texto da lei elege vários requisitos para a formulação da representação, como a forma escrita, qualificação e assinatura do representante, informações sobre o fato e a sua autoria e a indicação das provas de que tenha conhecimento.

E fulmina com a rejeição de plano aquela representação que porventura não atenda a todos esses requisitos (§ 1º do art. 14).

O rigor devotado pelo legislador à ausência de algum dos requisitos da representação pode causar a impressão de estar o denunciante agindo em seu próprio interesse ou realizando negócio jurídico com a Administração.

Entretanto, a representação é feita, sobretudo, no interesse da Administração Pública, de modo que as exigências do art. 14 e seus parágrafos, da Lei 8.429/92, não são condições

sine qua non para a abertura da investigação, mas simples prescrições indicadas para a formalização do ato.

Sendo verossímeis os fatos, caberá a sua investigação, ainda que a representação não atenda a todos os requisitos previstos na Lei de Improbidade.

Importante notar que esta representação constitui um desdobramento do direito de

petição115 que a Constituição Federal de 1988 assegura a todos na alínea “a” do inciso XXXIV do seu art. 5º.

A Carta Magna assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder.

Exercido direito de representação, nasce para a autoridade a obrigação de recebê-la, no âmbito de sua competência, e pronunciar-se a respeito, após seu exame em período razoável, seja para indeferi-la, com fundamentos, seja para acolhê-la.116

Cabem aqui algumas considerações sobre os reflexos que essa garantia constitucional produz na representação em comento.

A primeira delas é que a denúncia do ato de improbidade não pode ficar condicionada ao pagamento de qualquer taxa ou figura equivalente. Deve ser absolutamente gratuita, desde

115 Marcelo Figueiredo, Probidade administrativa, p. 175.

que, obviamente, o denunciante se limite a comunicar a ocorrência do fato que considera irregular.

O direito à gratuidade não terá lugar se ele pretender que algum serviço seja prestado pela Administração. Havendo, paralelamente à representação, a pretensão de obter algum serviço público, como, v.g., a emissão de uma licença, será devida a taxa legalmente instituída para o ato.

Outra observação é que a representação não estará limitada a fatos que digam respeito ao interesse direto do denunciante, pois o direito de petição serve à defesa contra qualquer ilegalidade ou abuso de poder, não importando se a irregularidade é praticada contra o autor da representação, contra terceiro ou em prejuízo exclusivo do próprio interesse público.

Conforme assinala José Afonso da Silva117, há no direito de petição uma dimensão coletiva consistente na busca ou defesa de direitos ou interesses gerais da coletividade. Pode se cuidar de uma simples queixa ou pode revestir-se do caráter de uma informação dirigida à autoridade, de forma a reunir também o que antes era chamado de direito de representação. Petição e representação, no atual regime constitucional, são direitos agregados no direito de

petição, sobre o qual a autoridade não pode deixar de se pronunciar.

Assim, qualquer pessoa do povo, tendo conhecimento de alguma irregularidade na gestão dos bens ou serviços públicos, estará autorizada a formular a representação para denunciá-la, mesmo não tendo interesse direto no caso.

Diante destes pressupostos, seria absolutamente ilegal um eventual despacho de rejeição da representação calcado exclusivamente no fato dela ter sido formulada por quem não é diretamente interessado no assunto.

Assentadas essas premissas, cabe voltar a atenção diretamente ao § 1º do art. 14 da Lei 8.429/92, segundo o qual a representação deverá conter os seguintes requisitos formais: a) indicação da autoridade competente; b) forma escrita; c) qualificação e assinatura do denunciante; d) informações sobre o fato e a sua autoria; e) indicação das provas de que tenha conhecimento.

A indicação da autoridade tem a finalidade de conferir uma direção ao pedido, de forma a permitir o seu incontinenti encaminhamento a quem de direito. Não havendo este direcionamento, a maior demora na tentativa de identificar o destinatário da representação poderá redundar em prejuízo da própria investigação, pois crescem as chances de se apagarem vestígios da conduta ímproba.

Havendo erro na indicação da autoridade, hipótese bastante plausível em face da complexidade de alguns órgãos públicos, não deve ser rejeitada a representação. A autoridade, por ato de ofício, deverá encaminhar a denúncia à autoridade competente, para que esta dê seguimento ao procedimento de investigação.

Assim, atenderá aos princípios da legalidade, da moralidade e da indisponibilidade do interesse da Administração.

No que toca a este ponto, questão relevante diz respeito a eventuais medidas emergenciais que devam ser tomadas em defesa do interesse público e que poderiam ficar prejudicadas pela dilação provocada pelo envio da representação à autoridade competente. Nessa situação, e na medida do possível, deve a autoridade que se julga incompetente tomar as providências cabíveis para que se evite a consumação do prejuízo e só então enviar a representação a quem de direito.

A representação deve assumir a forma escrita para documentar com mais eficiência e precisão os fatos denunciados. Poderá ser oferecida já na forma escrita pelo seu autor ou, se este preferir, de forma oral, circunstância em que a autoridade deverá providenciar para que a representação seja reduzida a termo e em seguida firmada por ela, pelo denunciante e pelas eventuais testemunhas do ato.

A identificação do autor da denúncia, através da sua qualificação, tem importância na medida em que ele poderá ser convocado posteriormente a prestar depoimento no inquérito civil ou mesmo em procedimento criminal, o que torna indispensável sua perfeita qualificação. Além disso, caso se verifique que eram falsas as imputações atribuídas ao agente público, ele poderá arcar com as conseqüências civis e penais da falsa imputação.

O autor da denúncia deverá, sempre que possível, assinar a representação ou o termo a que ela é reduzida.

Evidente que, em alguns casos, não será possível a aposição da assinatura em função do analfabetismo ou até mesmo de alguma impossibilidade física do denunciante, hipótese em que a autoridade fará consignar este fato no termo. Sublinhe-se que, por analogia à Lei 10.054, de 07 de dezembro de 2000, na falta da assinatura não se deve fazer identificação datiloscópica do autor da denúncia, se ele apresentar documento de identidade reconhecido pela legislação. Caberá, neste caso, manter anexa à representação uma cópia do documento apresentado (art. 4º da Lei 10.054/2000).

Outra possibilidade, para o caso da testemunha não poder assinar a representação ou termo, é que alguém o faça em seu lugar, a rogo, conforme solução adotada pelo art. 216 do Código Penal.

Absolutamente fundamental é que a representação contenha a descrição do fato ímprobo, pois sem isso ela não será mais do que imprecação de ordem pessoal do denunciante contra o agente público, passível, inclusive, de sanção criminal pelo crime de Injúria (art. 140 do Código Penal).

O fato que se considera irregular é o cerne ou núcleo da representação, sem o que ela perderia o seu sentido. Nenhum outro requisito previsto pela lei se equipara em importância com o fato reputado ímprobo.

Mesmo a autoria do fato, conquanto relevante, não se ombreia em importância com o próprio fato, pois ele, por si só, constitui motivo para levar adiante a apuração, seja ou não conhecido o seu autor.

Portanto, é imprescindível que o fato supostamente ímprobo seja narrado de forma substancial, o que exige o detalhamento das circunstâncias de tempo, modo e lugar em que teria ocorrido, permitindo, assim, o seu perfeito conhecimento.

Tais circunstâncias são importantes não apenas para o juízo liminar de admissibilidade da representação pela autoridade administrativa, mas também para que o agente denunciado tenha pleno conhecimento das acusações que lhe são atribuídas e assim tenha oportunidade de se defender adequadamente, com o que estarão atendidos os princípios do contraditório e da

ampla defesa, que a Constituição Federal garante a todos os litigantes nos processos administrativos e judiciais (art. 5º, inciso LV).

Diz o § 1º do art. 14, da Lei de Improbidade, que o autor da representação também deverá indicar as provas de que tenha conhecimento.

Note-se que não se exige que denunciante apresente as provas à autoridade administrativa, bastando indicá-las, ou seja, dizer quais são e onde podem ser encontradas. Se as tiver consigo, certamente que deverá apresentá-las.

Mas, se não for esse o caso, as indicará à autoridade para que esta tome as providências necessárias para obtê-las, valendo-se, se necessária, de autorização judicial para ter acesso a elas.

No documento DOUTORADO EM DIREITO SÃO PAULO 2010 (páginas 85-88)