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5 O LEGADO DE CHOMSKY PARA OS ESTUDOS DA LINGUAGEM

No documento SUMÁRIO ISBN 978-65-5608-074-1 (páginas 32-38)

Cícera Tayana Francelino Fernandes

5 O LEGADO DE CHOMSKY PARA OS ESTUDOS DA LINGUAGEM

Entre a teoria behaviorista, voltada para os estudos do comportamento, e a teoria gerativista, que é mais relacionada ao funcionamento da mente humana, Noam Chomsky foi a figura principal.

Avram Noam Chomsky nasceu no dia 7 de dezembro de 1928, na Pensilvânia, e embora seja muito conhecido na área da política, ele é considerado o pai da linguística moderna2. Esse título é consequência da criação da teoria gerativa, que revolucionou os estudos da linguagem na década de 1950. Ele é autor de várias obras importantes para as discussões acerca da linguagem, nas quais se destacam:

Estruturas Sintáticas (1957), Reflexões sobre a linguagem (1975), Linguagem e mente (1968), Linguagem e o estudo da mente (1982), Estudos de Semântica em Gramática Generativa, (1972) dentre outras de papel fundamental para pesquisas e aquisição de conhecimentos direcionados ao meio linguístico (FERNANDES, 2019).

Antes da década de 1950, a área da ciência da linguagem havia avançado em outros pontos, mas, antes disso, os principais acontecimentos foram os de caráter grego, ou seja, as tradições clássicas que foram o início de tudo, sendo analisados apenas textos escritos para comparar com outras línguas. Somente no século XIX, com os estudos de Ferdinand Saussure, em uma perspectiva sincrônica, passou-se a ter uma visão estruturalista, que observa o sistema da língua. Há ainda a perspectiva funcionalista, que se fundamenta nas interpretações do Curso de Linguística Geral, atribuído ao mestre genebrino, já na década de 1928, em que se analisava a estrutura da língua e seu uso efetivo (FERNANDES, 2019).

Com a chegada de Chomsky, o cenário da Linguística mudou totalmente, pois ele trouxe algo inovador que surgiu em oposição ao Behaviorismo, que é a chamada teoria gerativa que sucede o Estruturalismo e tem como principal ideia a competência do falante.

No Gerativismo, Chomsky propõe que o falante possui a capacidade inata tanto de produzir como de compreender a estrutura das frases produzidas ou ainda frases inéditas. Isso explica o motivo da sua crítica ao Behaviorismo, já que essa teoria era baseada no estímulo-resposta, não havendo condições de ser adicionado nada de novo, pois o indivíduo aprenderia por meio apenas de repetição (KENEDY, 2011;

CEZARIO; MARTELOTTA, 2011).

Apesar de sua base ser estruturalista, ele a crítica, já que procurava algo que além de explicar as sentenças existentes, explicasse também as que ainda iriam ser formuladas, tendo em vista que o ser humano tem habilidade e competência suficientes para isso. Além desse fator, o indivíduo, a partir de suas habilidades, sabe distinguir se a frase é gramatical, ou seja, sentença que possui as normas

2 As informações biográficas aqui descritas se baseiam em: FERNANDES, Nathan. Noam Chomsky: entenda sua teoria linguística e seu pensamento político. In: Revista Galileu. 2019. Disponível em:

https://revistagalileu.globo.com/Sociedade/noticia/2019/01/noam-chomsky-entenda-sua-teoria-linguistica-e-seu-pensamento-politico.html. Acesso em: 22 out. 2020.

gramaticais ou agramatical, enunciado que não segue as regras sintáticas da gramática normativa, conforme observamos no trecho:

Em um contexto profundamente antimentalista, dominado pelos modelos behavioristas, que consideravam a mente humana tabula rasa inacessível, Chomsky propõe, ao contrário, que a mente humana seja rica de estrutura, lançando o desafio de que a intuição linguística do falante possa servir de meio para acessar o conhecimento linguístico internalizado, permitindo estudar esta faculdade mental humana, que nos capacita a produzir e a compreender, criativamente, frases nunca antes ouvidas (MAIA, 2015, p.

07).

Ao criar a teoria gerativa transformacional, Chomsky associa à sintaxe, o ponto principal da teorização e analisa a linguagem como uma faculdade natural do ser, portanto, observado como algo que está ligado diretamente à mente humana. As ciências cognitivas deixam de lado o empirismo e o tradicionalismo fazendo análise apenas das questões mentais e atribuindo regras que descrevem como as sentenças são formadas.

Para analisar essas descrições detalhadamente foi criado o sistema arbóreo na década de 1960. Esse nome é atribuído ao fato de a estrutura parecer ramificações, sendo também chamadas de árvores. No diagrama arbóreo são trabalhados conceitos que servem para organizar esse sistema. Esses conceitos são denominados sintagmas nominais e verbais. A partir disso, a oração é analisada totalmente de acordo com a classe gramatical que cada palavra pertence.

Em todas as línguas há uma sequência lógica de ordem, portanto, para ter sentido todas as palavras devem seguir a estrutura para assim o sistema ser construído. Observa-se, no exemplo abaixo, uma oração representada através do sistema arbóreo com as palavras que formam a frase e os elementos necessários da gramática para ter sentido:

Figura 02 – Análise arbórea

Fonte: Kenedy (2011, p. 131).

Noam Chomsky, por sua vez, despreza o adestramento visto no Behaviorismo, dando crédito à criatividade humana de produzir algo inédito e aos estudos mais aprofundados da mente. Por essa razão, ele trouxe a influência de outras disciplinas para a linguagem, tais como: a Psicologia, a Filosofia, a Biologia e, até mesmo, a Matemática para a elaboração de seus resultados. Quanto à criatividade humana, Chomsky aponta que

A linguagem não apenas congrega informação; ela não é um mecanismo de gravação. Sabemos disso por introspecção – podemos pensar sobre como o mundo seria se escolhêssemos esse caminho e não outro. Na verdade, podemos imaginar as coisas que nem ao menos podem ter uma realização física. Há todo um leque disponível de atividades criativas – até certo ponto, temos essa capacidade disponível a partir de outros sistemas internos também: com visão, podemos imaginar figuras, esse tipo de coisa –, mas é muito mais rico quando podemos realmente formular expressões internas (CHOMSKY, 2014, p. 128).

O inatismo trata, exatamente, dessa revolução científica, tendo como principal base as ideias de Descartes. Na Linguística que se convencionou chamar de

“cartesiana”, Chomsky retoma o “problema de Platão”, que consiste na capacidade de construção da própria competência do indivíduo em que Descartes já abordava sobre esse poder do ser humano de dominar a linguagem há algum tempo (KENEDY, 2011).

Diante disso, ele diz que, quando um indivíduo é criado com lobos, quando voltar a um ambiente em que haja a linguagem verbal, ele começará a utilizá-la normalmente. Já um animal, poderá conviver sempre com humanos que ele não conseguirá falar, pois isso é uma especificidade humana. Portanto, há muito tempo, esse assunto é objeto de reflexão, Chomsky trouxe apenas estudos mais avançados que comprovassem tal teoria/pensamento.

Por outro lado, como Chomsky está engajado em questões políticas, ao criar essa teoria, ele estava pensando também no domínio de classes, pois para ele o foco é sempre no poder de cada um, algo interno, e esse conhecimento ninguém pode comandar a não ser o próprio indivíduo sem haver dominante/dominado.

Depois desse sucesso com a teoria Gerativa, após alguns anos de estudos, Chomsky evolui mais uma vez nas suas pesquisas e cria um modelo chamado de princípios e parâmetros na década de 1980. Esse modelo consiste em uma releitura da gramática gerativa transformacional e trata de leis relacionadas à língua de modo que os princípios são os aspectos comuns a todas as línguas, e os parâmetros são as divergências entre elas, ou seja, suas particularidades.

De acordo com os postulados da teoria chomskyana, existe uma gramática universal com pontos comuns e diferentes, que se desenvolve desde o nascimento da criança como uma habilidade inata, sendo modificadas de acordo com o input, ou seja, entrada de informações. A partir desse input, será definida a L1 que a criança irá utilizar, dependendo do ambiente em que estará inserida, sendo atribuídos valores paramétricos ao uso dessa linguagem (KENEDY, 2011).

Outro momento importante foi a criação do Programa Minimalista (PM), desenvolvido nos anos 90, e que é usado atualmente como base para pesquisas em aquisição da linguagem seguindo os estudos da Gramática Universal. Não se trata de

uma nova teoria, mas, sim, de um complemento que aprofunda a teoria gerativa, ou seja, o gerativismo na sua versão atual.

Esse programa se insere nas leis apresentadas anteriormente com específicos e novos conceitos apresentados, sendo excluídos aspectos que não apresentam uma legitimação em relação a sua essência. Em suma, é um programa, por não se apresentar ainda como uma nova teoria, e é minimalista por se tratar de algo mais simples comparado ao que já foi apresentado.

É notória a contribuição de Noam Chomsky para os estudos linguísticos, observando-se o seu prestígio a nível mundial. Com sua formulação de estrutura profunda e superficial, inserida na teoria transformacional, ele permitiu uma maior análise nas estruturas gramaticais e postulou a língua como detentora de estruturas inatas que são comuns a todos os seres humanos.

Com todas essas informações, ele conseguiu inserir a Psicolinguística como uma área da Linguística, que se tornou uma disciplina autônoma após a década de 1950. A Psicolinguística é conceituada como o estudo das conexões entre linguagem e mente, e abrange todo o campo da comunicação em que haja esse envolvimento de ambos, desde a aquisição da linguagem até os distúrbios causados pela incapacidade que o indivíduo possui tanto de compreensão quanto de produção da fala.

Imaginemos, por um instante, como seria a Linguística sem a contribuição de Chomsky. Segundo Oliveira (2010), sem essa investigação e o surgimento dessa teoria, a Linguística teria se rompido apenas em ciências sociais, ou apenas num sistema computacional. A presença de Descartes foi fundamental para a criação do método, ajudando a se nortear no embasamento da negatividade vindo do falante para o estudo das línguas naturais.

A questão é que a ciência da linguagem não teria evoluído se não fossem todos os anos de pesquisa que tiveram como consequência a modificação de quase tudo o que foi apresentado até então. Além disso, muito do que é mostrado recentemente, ou seja, assuntos mais contemporâneos, como o Programa Minimalista, talvez não tivessem existido sem a abordagem chomskyana, pois está tudo conectado diretamente a ela.

Em suma, sua atuação foi e é muito relevante, uma vez que Chomsky se mostra atualmente ativo no cenário de pesquisas, sendo considerado um dos maiores intelectuais vivos do mundo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao expor o presente trabalho, buscou-se elucidar as principais teorias que envolvem o processo da aquisição da linguagem, de modo que houvesse uma comparação entre ambas, no sentido de evidenciar o histórico de estudos que envolveram tais acontecimentos que foram cruciais para a evolução da Linguística como ciência.

Ao apresentá-las, o leitor pôde compreender melhor como acontece o desenvolvimento da linguagem no indivíduo, notando, principalmente, como o ambiente a que a criança está submetida atua no desenvolvimento da sua capacidade linguística, mostrado na perspectiva tanto do Behaviorismo quanto no Gerativismo.

Valendo-se da pesquisa bibliográfica, percebeu-se o vasto uso do tema, justamente pelo fato de ser um assunto que sempre está no alvo das pesquisas por apresentar características complexas e que sempre surgem indagações a respeito.

Desse modo, nota-se que o Behaviorismo foi essencial para o início das investigações, já que foi a primeira a ser testada. Depois, com os questionamentos a partir dela, surge o Gerativismo, que foi primordial para que a Psicologia e outras áreas do conhecimento fossem inseridas no campo linguístico. Além disso, a teoria gerativa é considerada a mais contemporânea através do Programa Minimalista de Noam Chomsky, sendo capaz de relacioná-la com a mente.

No que se refere à contribuição, não poderia deixar de apontar o legado de Avram Noam Chomsky, por ser considerado o pai da Linguística moderna e o principal nome em se tratando da evolução da Linguística desde 1957. A partir de seus estudos e obras, foi possível explicar a relação da mente com a linguagem e toda a estrutura da língua como aspecto universal.

Ele contribuiu muito, sobretudo com a criação do sistema arbóreo, e todos os processos de transformação da gramática gerativa, até chegar no programa minimalista, usado atualmente. Com todas essas questões e descobertas, Chomsky deixa de lado o empirismo e foca no funcionamento tanto da estrutura superficial quanto profunda da língua de um modo mais considerável para a contemporaneidade.

É preciso perceber, no entanto, que ambas as teorias apresentam argumentos relevantes para as comprovações a respeito do cognitivismo, salientando-se que o cérebro sofre influência tanto do ambiente quanto da genética, concluindo, assim, que as duas têm sua parcela de cooperação. Para os estudiosos mais recentes, porém, a teoria gerativa é mais eficiente por revelar dados e informações mais significativos.

Desse modo, as pesquisas e as informações obtidas neste trabalho abrem espaço para novas vertentes que podem agregar valores positivos, podendo resultar novos trabalhos com base em estudos mais aprofundados sobre essas questões. Não se pode deixar de perceber, porém, que tal investigação nos permitiu uma ampla discussão e obtenção de conhecimento sobre essa maravilhosa e complexa manifestação chamada linguagem.

REFERÊNCIAS

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ASPECTOS LINGUÍSTICOS DA LÍNGUA BRASILEIRA

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