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Método

No documento TEORIA GERAL DO DIREITO (páginas 49-53)

LIVRO I PRESSUPOSTOS DO CONSTUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO

3. CONHECIMENTO CIENTÍFICO

3.2. Pressupostos de uma teoria

3.2.2. Método

A palavra “método” é derivada do grego méthodos que significa “caminho para se chegar a um fim”. Neste trabalho, adotamos a concepção de “método científico” como sendo a forma lógico-comportamental investigatória na qual se baseia o intelecto do pesquisador para buscar os resultados que pretende (construir suas proposições científicas – ou seja, o objeto formal).

Constituem-se, os métodos, em instrumentos regentes da produção da linguagem científica. É importante que o cientista siga as mesmas regras, desde o início até o final de sua atividade cognoscitiva, para que suas proposições tenham sentido e coerência, caso contrário põe em risco a ordenação lógico-semântica de suas idéias e a própria construção de seu objeto. É, por isso que não existe conhecimento científico sem método e que este influi diretamente na construção do objeto.

O método, no entanto, pode consubstanciar-se em diferentes técnicas. O signo “técnica” é aqui entendido como o conjunto diferenciado de informações reunidas e associadas instrumentalmente para realizar operações intelectuais. Ao aproximar-se do objeto, o cientista vale-se de outras teorias e de seu conhecimento em diversos setores, aplicando tais informações para construir formalmente seu objeto e testar suas proposições, tudo isso dentro de uma forma lógico- comportamental própria. Assim, método e técnica não se confundem. Uma teoria pode ter um método próprio, mas valer-se de diferentes técnicas para reduzir as complexidades de seu objeto52.

CARLOS COSSIO, ao desenvolver sua doutrina egológica do direito, retomou a teoria husserliana sobre os objetos, identificando o ato gnoseológico e o método por meio do qual aproximamo-nos de cada uma das quatro regiões ônticas53.

De acordo com a estruturação do autor, sintetizada na obra de MARIA HELENA DINIZ, os objetos classificam-se em: (i) naturais (ex: plantas, animais, rochas, mineirais, etc.); (ii) ideais (ex: formas geométricas, equações matemáticas, fórmulas lógicas, etc.); (iii) culturais,

52 O direito positivo, por exemplo, tomado como corpo de linguagem prescritiva, tem como método próprio, de acordo com

as premissas filosóficas fixadas neste trabalho, o hermenêutico-analítico. Mas, dentro desta forma lógico-comportamental, podemos nos valer de várias técnicas para estudá-lo, como a Semiótica, a Lógica, a Axiologia, etc.

construídos pelo homem tendo em vista certa finalidade (ex: martelo, casa, cadeira, mesa, livro, etc.); e (iv) metafísicos (ex: milagres, unicórnios, fadas, deuses, anjos, etc.)54.

Os objetos naturais são reais, têm existência no tempo e no espaço, estão na experiência e são neutros de valor, a explicação é o ato gnosiológico utilizado para sua aproximação científica e o método é o empírico-indutivo. Os objetos ideais são irreais, não têm existência no espaço e no tempo, não estão na experiência e são neutros de valor, a intelecção (intuição intelectual) é o ato gnosiológico utilizado para sua aproximação científica e o método é o racional-dedutivo. Os objetos culturais55 são reais, têm existência no tempo e no espaço, estão na experiência e são valiosos (positiva ou negativamente), o ato gnosiológico de aproximação científica é a compreensão e o método o empírico-dialético. Os objetos metafísicos são reais, têm existência no tempo e no espaço, não estão na experiência e são valiosos (positiva ou negativamente), porém, não apresentam possibilidade de serem estudados cientificamente.

Apesar de considerarmos tal classificação elucidativa no que tange à variação do domínio dos objetos (quando entendidos em sentido amplo), a acolhemos com certa ressalva, pois adotamos a premissa de que nada existe fora da linguagem. De acordo com a concepção a qual nos filiamos, as coisas (objeto do conhecimento – em sentido estrito), sejam elas naturais, ideais, culturais e metafísicas, são constituídas proposicionalmente pelo homem como conteúdo de um ato de consciência, por meio de abstrações na continuidade-heterogênea de sensações ou intuições por ele experimentadas.

Não temos acesso ao empírico (físico), apenas à linguagem que o constitui, ou seja, a sua significação. Construímos e conhecemos os objetos mediante atribuição de sentido aos conteúdos que nos são perceptíveis e tal atribuição é condicionada por nossos referenciais culturais (conhecimentos anteriores). Nestes termos, a forma de aproximação, por excelência, de qualquer objeto é a interpretação (considerado por nós como método em sentido amplo).

Conforme já frisamos, em diversas passagens deste trabalho, tudo que sabemos do mundo resume-se a sua interpretação. Nesta perspectiva GADAMER assevera: “a forma de realização da compreensão é a interpretação, todo compreender é interpretar e toda interpretação se desenvolve

54 Compêndio de introdução à Ciência do Direito, p. 124.

55 Cossio divide os objetos culturais em: (i) mundanais, cujo suporte físico constitui-se de dados materiais (ex. carro,

canteta, telefone, etc.); (ii) egológicos, cujo suporte físico constitui-se numa conduta humana (ex. compra e venda de um bem, casamento, atropelamento, etc.).

em meio a uma linguagem que pretende deixar falar o objeto e ao mesmo tempo a linguagem própria de seu intérprete”56. Conhecemos algo quando lhe atribuímos algum sentido, isto é, quando o interpretamos. Nestes termos, conhecer é interpretar e, como toda interpretação é condicionada pelas vivências do intérprete que, enquanto ser humano, encontra-se num mundo cultural encravado de valores, nenhum objeto é livre de valoração.

Sob estes pressupostos, não trabalhamos com a distinção, formulada por autores como DILTHEY, MAX WEBER e SPRANGER entre “compreender” e “explicar”, como ato gnosciológico próprios para apreensão dos objetos culturais e naturais (respectivamente), pois, para nós, todo explicar pressupõe um compreender. Quando o cientista estuda um fenômeno natural, não descobre sua realidade, nem o reproduz, atribui-lhe um sentido. Por mais aperfeiçoado que se encontrem os processos de raciocínio e os instrumentos de aproximação, sublinha MIGUEL REALE, “permanece sempre um resíduo na pesquisa científica, que se subordina ao coeficiente pessoal do observador, que não parte jamais de fatos brutos, mas sim de fatos sobre os quais já incidiram interpretações e teorias. Mesmo nas Ciências chamadas exatas existe a presença do homem de ciência, em virtude de uma perspectiva e não de outra, de uma forma ou não de outra na observação do fato” 57.

É claro que, em algumas circunstâncias, de acordo com a materialidade do objeto, a valoração mostra-se mais presente na forma comportamental de sua aproximação, com a necessidade da implementação de preferências ideológicas e axiológicas. É o que acontece, por exemplo, quando da compreensão de uma obra de arte, de uma poesia, ou de um livro (objetos culturais – tomados em sentido estrito: construídos pelo homem para alcançar cartas finalidades). Em outros casos, no entanto, tais preferências se mostram irrelevantes, quando não, até atrapalham. É o que ocorre, por exemplo, na compreensão dos fenômenos naturais, como a composição da água, a decantação de resíduos, a mistura de gases, ou dos objetos ideais como as fórmulas lógicas, as figuras geométricas, etc. Mas, de acordo com a proposta filosófica por nós adotada, fazemos este parênteses para salientar que o interpretar é desde o início e a valoração encontra-se sempre presente.

O método, bem como as técnicas utilizadas, está intimamente ligado às escolhas epistemológicas do cientista e influi diretamente na construção de seu objeto, demarcando o caminho percorrido para justificação de suas asserções. É nesse sentido que MIGUEL REALE afirma ser “o problema do método correlato ao problema do objeto”58.

56 Verdade e método, p. 467. 57 Filosofia do direito, p. 246. 58 Idem, p. 77.

O fato de trabalharmos com os pressupostos do Neopositivismo Lógico de que o discurso científico é construído mediante a depuração da linguagem natural, alcançada através do denominado método analítico, o qual se consubstancia na decomposição (significativa) do discurso ordinário, não nos distancia em momento algum do modelo hermenêutico.

Analiticamente, o comportamento científico exigido na aproximação do objeto é a redução da linguagem ordinária que o constitui, numa linguagem mais elaborada conceitualmente, denominada científica. Quanto mais decomposta significativamente (analisada), mais precisa a linguagem se torna. O método analítico, assim, reduz-se na tradução da linguagem natural para uma linguagem cada vez mais precisa.

Seguindo as lições de VILÉM FLUSSER (aludidas nos itens acima), a tradução ocorre mediante o aniquilamento intelectual da língua traduzida e a construção de novas categorias significativas na língua tradutora. Pressupõe, portanto, um processo interpretativo, através do qual um novo sentido é atribuído. Nestes termos, toda análise supõe uma interpretação e toda nova linguagem é uma construção (cria uma nova realidade) o que só fortalece ser (dentro dos pressupostos filosóficos aos quais nos filiamos) este o modo de aproximação, por excelência, de qualquer objeto.

Nestes termos, insistimos neste tópico que a base para qualquer conhecimento, seja ele ordinário, técnico, científico, filosófico, lógico ou artístico, é a interpretação. Esta visão reducionista, no entanto, não afasta outras formas comportamentais, que podem ser utilizadas pelo intérprete para estruturá-las (as quais denominamos de método – no sentido estrito da palavra), como por exemplo: a analítica (decomposição do sentido), a indução (onde parte-se de sentidos específicos para se chegar a sentidos gerais), a dedução (onde parte-se de dois sentido para se chegar a um terceiro como conclusão dos dois), a dialética (contraposição de sentidos), a dogmática (fixação de dogmas para construção do sentido), a hermenêutica (valoração como forma de fundamentação/legitimação do sentido), etc.

Tais formas comportamentais consubstanciam-se em modelos de aproximação específicos (métodos em sentido estrito), implantados por decisões unilaterais do sujeito cognoscente que determinam as regras do jogo a serem jogadas na produção da linguagem científica, ou seja, ditam o caminho e o processo a ser seguido pelo cientista na construção de seu objeto-formal. Mas, em todo momento o interpretar está presente.

No documento TEORIA GERAL DO DIREITO (páginas 49-53)