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O signo

No documento TEORIA GERAL DO DIREITO (páginas 129-132)

CAPÍTULO V- SEMIÓTICA E TEORIA COMUNICACIONAL DO DIREITO

1.1. O signo

Semiótica e direito; 3. Teoria comunicacional do direito; 4. O direito como texto; 4.1. Texto e conteúdo; 4.2. Dialogismo - contexto e intertextualidade.

1. LÍNGUA, LINGUAGEM E FALA

Os conceitos de “língua”, “linguagem” e “fala”, tornam-se indispensáveis à Teoria do Direito quando tomamos seu objeto como um corpo de linguagem produzido dentro de um contexto comunicacional.

Sem a pretensão de uma análise mais rigorosa, mesmo porque esta não é a finalidade deste trabalho, dentre outras várias acepções, consideramos a língua como um sistema de signos em vigor em determinada comunidade, isto é, o código aceito e utilizado numa sociedade como instrumento de comunicação entre seus membros. Este código pode ser idiomático (ex: o português, o francês, o inglês, o alemão, etc.) ou não-idiomático (ex: expressão corporal, vestuário, mobiliário, arquitetura, pintura, música, etc.), desde que se preste à comunicação entre sujeitos154.

Enquanto sistema convencional de signos, a língua é uma instituição social, isto significa que atos individuais isolados não têm o condão de modificá-la, sua alteração pressupõe uma evolução histórica155. Apesar de ser social, a língua é um depósito que está dentro de nós, imerso no inconsciente humano como um sistema de signos e de regras de utilização destes signos.

A diferença entre língua e fala aparece na obra de FERDINAND DE SAUSSURE. Segundo o lingüista, consiste a fala num ato individual de seleção e atualização da língua156. Seleção

154 Para o estudo do direito interessa-nos a língua idiomática.

155 Diferente da língua é a sua gramática (da língua idiomática), consistente nas regras que a convencionam. A gramática de

uma língua pode ser alterada de um dia para outro, não a língua.

porque por meio dela o homem escolhe, dentre a infinidade de signos e regras contidos em seu inconsciente (língua), as palavras e as relações a serem estabelecidas entre elas, de forma que lhe parece mais apropriada. E atualização porque ao utilizar-se deste ou daquele signo, bem como desta ou daquela estruturação, os mantém presentes, como elementos de uma língua.

Enquanto a língua caracteriza-se como uma instituição social, depositada no nosso inconsciente dentro de um processo histórico-evolutivo, a fala tem caráter pessoal, ela traz consigo a “individualidade” manifesta nas escolhas daquele que se utiliza da língua. A língua é algo estático que se movimenta (transforma) por meio da fala. Já a fala é algo dinâmico, ela é a língua em movimento.

É com a prática da fala que a língua vai sendo depositada dentro de nós e que ela se mantém viva no seio de uma sociedade. Enquanto a língua com suas regras e signos determina a fala, as seleções da fala vão consolidando e modificando as convenções sígnicas da língua, de modo que é impossível compreendê-las dissociadamente.

A linguagem é o produto da fala, é o resultado da utilização da língua por um sujeito. De modo mais abrangente podemos dizer que ela é a “capacidade do ser humano para comunicar-se por intermédio de signos, cujo conjunto sistematizado é a língua”157. Neste sentido, língua, fala e linguagem são conceitos conexos, tão interligados que por vezes utilizamos o termo “linguagem” para referirmo-nos tanto à língua, quanto à fala. Mas, por apreço à diferenciação, em termos mais simples, sintetiza-se que a língua é a linguagem sem a fala e a fala é a linguagem sem a língua.

1.1. O signo

Falar em língua, linguagem e fala remete-nos a outro termo: o signo. Num conceito mais genérico, o signo é tudo que representa algo para alguém, um objeto, um desenho, um dado físico, um gesto, uma expressão facial, etc. Num conceito mais específico, adotando-se as terminologias de EDMUND HUSSERL, o signo é uma relação triádica entre: (i) um suporte físico; (ii) um significado; e (iii) uma significação158.

157 Direito tributário, linguagem e método, p. 32.

158 Há um grande descompasso entre os autores a respeito das denominações atribuídas aos termos (elementos) do signo e

ao fato de ser tal relação triádia ou bilateral. CARNAP utiliza-se da terminologia indicador e indicado; SAUSSURE significante e significado; UBERTO ECO significante, referente e significado; PIRCE signo, objeto e interpretante; MORIS veículo sígnico, denotatum e designatum (PAULO DE BARROS CARVALHO, Apostila de Lógica Jurídica do Curso de Pós-Graduação da PUC-SP, p. 12-13).

significação

O suporte físico é a parte material do signo, apreendida pelos nossos sentidos, aquilo com o qual temos contato fisicamente (ex: os gestos da mímica; as ondas sonoras da fala, as marcas de tinta no papel da escrita, as roupas do vestuário, etc.). Ele refere-se a algo que está no mundo (concreto, imaginário, subjetivo, empírico, atual, passado ou futuro), denominado de seu significado, entendido como a representação individualizada do suporte físico. E, suscita na mente de quem o interpreta uma noção, idéia ou conceito, que é sua significação159.

A palavra “gato”, por exemplo, é um signo: As marcas de tinta “G A T O” gravadas no papel é o seu suporte físico. Este suporte físico refere-se a uma realidade individualizada, por nós conhecida como “um mamífero, domesticado, da espécie dos felinos” – seu significado. E, suscita na mente de quem o lê e o interpreta um conceito (idéia), variável de pessoa para pessoa, de acordo com os valores inerentes a cada um, que é a sua significação.

A ilustração abaixo ajuda-nos a visualizar melhor esta noção de signo:

Explicando: A palavra “GATO” que está no papel é o suporte físico; o “gato” animal ( ) é seu significado; e o “gato” que aparece na nossa cabeça quando lemos a palavra é sua significação. O signo, nesta concepção, é um suporte físico que se associa a um significado e que suscita uma significação, compondo o que se denomina de triângulo semiótico, uma relação entre esses três elementos.

Trabalhando com os pressupostos do giro-lingüístico (fixados no capítulo I deste trabalho) a idéia de significação e significado se misturam, pois a realidade a que se refere qualquer suporte físico é construída pelo intérprete e, portanto, sempre condicionada as suas vivências160. Da mesma forma, tanto o significado, quanto a significação, materializam-se noutros suportes físicos, já

159 PAULO DE BARROS CARVALHO, Direito tributário linguagem e método, p. 33-34

160 O significado de “fazenda”, por exemplo, depende da minha significação de “fazenda”, pois sem ela, a fazenda (objeto

representado pelo signo) não existe para mim.

“GATO”

suporte físico

significado Signo

que nenhuma realidade existe senão pela linguagem. Mas, justamente, por ser o signo uma relação todos estes conceitos estão intimamente ligados, de modo que um influi diretamente na existência do outro161. Todo suporte físico suscita uma interpretação (significação), que constitui uma realidade como seu significado, esta realidade, por sua vez, é também uma linguagem, materializa-se num suporte físico, que suscita outra interpretação (significação), numa semiose sem fim162.

Os signos podem ser de várias espécies. Muitos são os autores e inúmeras são as classificações empregadas para diferenciá-los. Dentre elas, destaca-se a proposta de CHARLES S. PEIRCE, que separa os signos em três tipos de acordo com a relação estabelecida entre o suporte físico e seu significado: (i) índice; (ii) ícone; e (iii) símbolo163. O índice mantém vínculo físico (natural) com o objeto que indica (ex: fumaça é índice de fogo; febre é índice de infecção). O ícone tenta reproduzir o objeto que representa (ex: foto; caricatura; filme; pintura). E, o símbolo é um signo arbitrariamente construído, a relação que seu suporte físico mantém com o objeto que representa é imposta de forma convencional pelos membros de uma sociedade (ex: placas de trânsito; palavras; sinais luminosos; bandeiras; brasões de família). Para nós, interessa os signos desta última espécie (os símbolos), pois são eles, na forma idiomática escrita (palavras164), que constituem nosso objeto de estudo, o direito positivo.

Mas, o que nos interessa fixar neste tópico é a premissa de que toda linguagem compõe-se, invariavelmente, por estes três elementos: suporte físico, significado e significação, inerentes aos signos que a constitui. Imersos na concepção do giro-lingüístico de que vivemos num mundo de linguagem, sendo o signo uma relação (entre um suporte físico, um significado e uma significação) e a linguagem um conjunto estruturado de signos, em última instância, podemos afirmar que vivemos num mundo de relações, relações entre significados, significações e suporte físico.

No documento TEORIA GERAL DO DIREITO (páginas 129-132)