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Maffesoli e a sociologia compreensiva

No documento Corpo, contemporaneidade, juventudes e escola (páginas 161-164)

Dentro dessa abordagem weberiana, Maffesoli “cria” sua noção do método

compreensivo. Destacamos que enfatiza que as questões econômicas da sociedade não podem ser tratadas como se fossem determinantes e únicas. Maffesoli parte de uma espécie de cesura entre a sociologia positivista, para a qual cada coisa é apenas um

sintoma de outra coisa e a sociologia compreensiva “que descreve o vivido naquilo que

é, contentando-se, assim, em discernir as visadas dos diferentes atores envolvidos” (MAFFESOLI, 2007, p.23).

O que o autor propõe é que a sociologia compreensiva seja o que ele costuma

chamar de a “sociologia do lado de dentro”. “O pensador”, afirma Maffesoli, “não se

deve abstrair sendo ele que faz parte daquilo que descreve e, situado no plano interno, é

capaz de manifestar certa visão de dentro, uma intuição” (MAFFESOLI, 1986, p.26).

Na sociologia compreensiva, o autor utiliza a noção de formismo como metodologia, ou seja, a prática também utilizada por G. Simmel que estuda as formas da vida social. Maffesoli defende esse recurso metodológico, especialmente quando se pretende dar conta da força de estruturação de uma socialidade.

Em 1986, em seu livro “O conhecimento comum: compêndio da sociologia

compreensiva”, em vez de se reduzir um determinado problema ao menor denominador

comum, propõe compreender os entrecruzamentos de paixões e razões, de sentimentos e cálculos, de devaneios e ações que se chama sociedade.

Cada forma tem a sua especificidade. A sociologia compreensiva está mais interessada em compreender do que explicar, já que cada forma tem sua especificidade.

Assim, compreender o social é mostrá-lo como ele se apresenta e não como gostaríamos que fosse. Desse modo, a sociologia compreensiva, a partir do conhecimento comum, evita desviar, não estabelecendo um dever-ser ao objeto social para não mudar seu curso, em uma analogia ao leito de um rio feita pelo autor.

A utilização da fenomenologia com a abordagem de Maffesoli se deve ao fato de considerarmos que a compreensão do corpo é considerá-lo como algo capaz de produzir sentidos, de produzir representações sobre o mundo.

Talamoni (2008) aponta que o adolescente tem necessidade de reajustar sua autoimagem e que essa pode representar marcas que o incluem ou excluem de determinados grupos. Assim, o estabelecimento de relações no âmbito de um grupo passa pelas formas de apresentação do corpo. Maffesoli (1999) argumenta que o corpo imprime marcas que legitimam sua pertença a determinadas tribos ou agrupamentos que nos remetem à existência de representações corporais compartilhadas por grupos específicos. Assim, o estudo sobre a constituição dos grupos a partir do referencial das representações e ou apresentações do corpo no âmbito da escola se faz necessário para compreensão do jovem no âmbito escolar que se converterá em assertivas na formação do professor que irá lidar nesse ambiente.

Para Maffesoli, uma nova cultura estaria nascendo, na qual a lógica da identidade que prevaleceu durante toda a modernidade vem sendo substituída por uma lógica da identificação. A ética da estética se resume no experimentar juntos, por qualquer que seja o motivo. Seus estudos voltam-se para a compreensão dos laços sociais estabelecidos na modernidade e sua transfiguração na pós-modernidade em que experimentar com os outros é primordial. Isso significa compreender a redução entre razão e sensibilidade enfatizada na modernidade. Na atualidade haveria um retorno do corpo, do sensível e da intensidade, em uma criatividade da existência. “A vida como

obra de arte”, a estetização do social, compreendendo a estética como compartilhamento

das emoções. As novas tecnologias e o arcaico convivendo no cotidiano.

Para Maffesoli, as análises político-econômicas não dão conta de todas as explicações que justifiquem a compreensão social, como se pretendeu na lógica da modernidade, que prometeu que chegaríamos a uma sociedade perfeita. Houve, nessa lógica, a invenção de que seríamos sujeitos individuais se associando aos demais contratualmente, noção esta que se saturou, ocorrendo um deslize para outras noções.

Assim, no presenteísmo, a conversa fiada, as questões afetivas, o trabalho, a família, a sorte no horóscopo, a banalidade do cotidiano, tudo isso são fatores de reunião e acabam em um retorno ao tribalismo, ocorrendo a desindividualização em oposição ao individualismo gerado na modernidade. Existiria no neo-tribalismo uma contraposição aos grupos sociais, contratuais, da modernidade. No paradigma estético vale o sentido de vivenciar ou sentir em comum. Isso superaria a dicotomia sujeito/objeto ao enfatizar muito mais o que une do que o que separa. A tônica é a estética, na qual se cristalizam as agregações de toda ordem, tênues, efêmeras, de contornos indefinidos (MAFFESOLI, 1997, p. 101-102).

O método compreensivo, para Maffesoli (2007, p. 19), possibilita uma abordagem indutiva, feita de discernimento e rica em matizes. O conhecimento ordinário faz emergir o abalo e a surpresa que constituem os fundamentos das obras de

pensamento. Essa abordagem indutiva aponta elementos da “vida em seu eterno recomeço, a vida em sua dimensão eterna”.

Segundo o autor, pelo método compreensivo, faz-se uma reversibilidade entre afeto e razão que se conjugam, mesclam-se e se confundem, sendo uma “razão que

emerge da vida vivida, a qual, por seu turno, não pode subsistir sem a razão”

(MAFFESOLI, 2007, p.19). Isso é o que estaria em jogo na conjugação entre saber e ação no conhecimento e na socialidade.

Maffesoli (2007), ao discutir a sociologia compreensiva e seu método, aponta que há representações intelectuais que repousam na abstração e outras que remetem à empatia. Uma dá ênfase na crítica, no mecanismo e na razão, enquanto a outra enfatiza a natureza, o sentimento, o orgânico e a imaginação. Pela dicotomia apresentada entre ambas, o autor chama de construção paranoica em substituição ao metanoico.

Também Maffesoli lembra que, nas ideologias, algumas são transcendentes, com perspectivas críticas, utópicas e outras congruentes, que legitimam a ordem estabelecida. Com estes e outros pressupostos discutidos como os paradigmas interacionista e determinista, entre cesura da intencionalidade nomotética e a ideográfica, o autor parte para a cesura entre a “sociologia positivista, onde cada coisa é apenas um sintoma de uma outra coisa, e uma sociologia compreensiva, que descreve o vivido naquilo que é/está, contentando-se, assim, em discernir visadas de distintos atores envolvidos (MAFFESOLI, 2007, p.30). Para ele, o pensador é “aquele que diz o

mundo”, não devendo ser motivo de abstração, fazendo daquilo que é descrito, situado

no plano interno, ter a capacidade de manifestar certa visão de dentro, uma autêntica

“intuição”, ou seja, é essa sociologia do lado de dentro que se propõe com a sociologia

compreensiva.

Nessa perspectiva, é necessário contar com o pressuposto da forma ou do que se chamou de formismo (já descrito anteriormente nesta pesquisa). O segundo pressuposto é de uma sensibilidade relativista, que estabelece as tipicalidades ou comparatismo em que se destacam dois aspectos: um em relação às formas, não havendo novidades na história humana, já que há um modo cíclico de retorno dos valores, apresentando alterações tecnicistas; outro de que há diversidade nas abordagens em que o valor dominante do momento se acentua, ocorrendo a oscilação pendular entre Dionísio e Prometeu. Não há realidade única, mas maneiras diferentes de concebê-la e o contraditorial se apresenta de modo operante no dado social.

Esses agrupamentos remetem à existência de representações corporais compartilhadas por grupos específicos, sendo necessário compreender como o estético remete a uma ética das situações no atual vitalismo social.

No documento Corpo, contemporaneidade, juventudes e escola (páginas 161-164)