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A modernidade apresenta também a transformação da configuração política com o fim da aristocracia, das monarquias, ganhando o Estado a função de cuidar do corpo social. Dentre suas funções e com o exercício de seu poder, é o responsável pela educação desse corpo e, para isso, também utiliza a escola, massificando-a.

A escola se constituiu na modernidade com toda uma arquitetura que atua sobre o corpo. Para Foucault (1979), a ideia do corpo na República se diferenciou da Monarquia. Enquanto na Monarquia o corpo do rei era uma realidade política, com sua presença física sendo necessária, na República ela se desloca para o corpo da sociedade, tendo, no século XIX, tornado-se um princípio. Constituiu-se, assim, na República, um corpo simbólico, criando-se métodos de assepsia: a criminologia, a eugenia, a exclusão dos degenerados etc.

O corpo social emerge a partir da materialidade do exercício do poder sobre os corpos dos indivíduos. O poder investiu sobre o corpo através da ginástica, do exercício, do desenvolvimento muscular, da exaltação do belo com intenção de dominá-lo e conscientizá-lo, conduzindo ao desejo do próprio corpo “através de um trabalho insistente, obstinado, meticuloso, agindo sobre o corpo das crianças, do soldado e do

corpo sadio” (FOUCAULT, 1979, p.146). Isso fez com que nascessem exigências e

reivindicações de seu próprio corpo contra o poder, a saúde, a economia, o prazer, as normas morais da sexualidade, do casamento, do pudor.

Para Foucault, há uma luta constante entre o poder e o domínio do corpo. A sexualidade tornou-se alvo de controle e, ao mesmo tempo, passou a produzir a intensificação dos desejos de cada um sobre seu próprio corpo.

O poder reagiu, por meio da exploração econômica e, talvez ideológica, da erotização, manifestada em produtos para bronzear, em filmes pornográficos, passando

de uma forma de controle-repressão para uma forma de controle estimulação: fique nu, ... mas magro, bonito, bronzeado (FOUCAULT, 1979, p.147). Assim, “nada é mais

material, mais físico, mais corporal do que o exercício do poder” (idem).

Do século XVII ao século XX, o investimento do poder sobre o corpo foi denso, rígido, constante, meticuloso, o que ocasionou regimes disciplinares, rígidos nas escolas, nas casernas, nos hospitais, nas oficinas, nas cidades, nas famílias. No século XIX foi feito um grande esforço de disciplinarização e de normalização com mecanismos que penetram nos corpos, nos gestos, nos comportamentos. Juntamente com o início das sociedades industriais, instaurou-se um aparelho punitivo, um dispositivo de seleção entre normais e anormais. Também a arquitetura escolar se baseou no modelo do convento e se impôs nas escolas, distribuindo os indivíduos no espaço que tem, como uma de suas propostas, possibilitar a vigilância. Para essas afirmações, Foucault observa que, na sociedade disciplinar, busca-se a vigilância pela ideia do “Panopticon”, presente na arquitetura, com o qual, silenciosamente, tem-se visibilidade sobre o indivíduo e sobre o coletivo.

Foucault (1979) destaca que o saber sobre o corpo foi constituído através de um conjunto de disciplinas militares e escolares e que, a partir desse poder, sobre ele foi possível constituir-se um saber fisiológico, orgânico. A partir dos anos 1960, o controle sobre o corpo se tornou mais brando e tomou outras formas.

As sociedades de controle estão substituindo as sociedades disciplinares. Desse modo, a modernidade fez emergir novas formas de representação sobre o corpo, que surgem com o contexto histórico e político que se inserem na escola. Para Foucault, nasce o biopoder ou a biopolítica. A própria política tem no corpo seu objeto de ação, de controle, produzindo novas disciplinarizações.

Para Machado, segundo Muchail (2009), os modernos sistemas de vigilância na sociedade de controle passam pela comunicação virtual. Exacerbados pela sociedade midiática, sugerem o que seria uma atualização do panóptico. O gesto do mostrar-se e deixar-se ver poderia significar um modo despojado do desvelamento da verdade de cada um, ou o desnudamento de si mesmo, que não seria uma injunção, encobrindo a imposição de regras que regem nosso modo de produção da verdade.

Para Tucherman (1999, p. 94), temos um corpo que foi inventado, mas que também é imposto por uma “vontade de forma”, totalizada, singularizada e

reconhecível. A autora cita o grande brinde que Latour nos oferece, que indica uma nova política do corpo. Latour afirma que temos obrigação dietética austera, temos que nos contentar com uma salada, temos que correr da mesa para a ginástica. Isso se deve aos conhecimentos gerados na modernidade, produzidos pela ciência. Entretanto, com isso, a política funcionou no sentido de passar responsabilidades ao indivíduo, de modo que doença, saúde, morte passam a depender do sujeito.

No que se refere à política e à escola, nos anos 1960 e 1970, as metodologias de ensino espelhavam-se nos rigores da disciplina militarista, que tem o domínio do corpo como alvo de ação.No Brasil, a partir do final dos anos 1970, com a “abertura” política e, posteriormente, o fim do regime militar, inicia-se outra fase política no país. Concomitantemente aos acontecimentos políticos, uma rediscussão educacional passa a ser mobilizada e surgem outras concepções metodológicas que fazem sua crítica aos

modelos tradicionais, surgindo, com isso, as tendências “progressistas” na educação.

No âmbito da educação, novos professores, que passaram a se formar sob novas perspectivas, hoje, atuam no cotidiano escolar. Esses fatos nos fazem afirmar que novas políticas do corpo estão presentes no cotidiano escolar.

2.4Saberes corporais: o individualismo moderno e o corpo coletivo