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III- Enquadramento da Prática Profissional

4.3. Realizar o planeado: ensinar

4.3.4. Os Modelos de Ensino que balizaram a minha intervenção

4.3.4.3. Modelo de Educação Desportiva

De acordo com Siedentop (1994), o Modelo de Educação Desportiva (MED) é um modelo instrucional que no contexto da EF é criado para proporcionar aos alunos experiências desportivas ricas e autênticas, indo ao encontro da necessidade de conferir um cunho afetivo e social às aprendizagens. Este é um modelo curricular que oferece um plano compreensivo e coerente para o ensino do desporto na escola, preservando e reavivando o seu potencial educativo. Inclui três eixos fundamentais que se revêm nos objetivos educativos da EF sendo eles, o da competência desportiva, o da literacia desportiva e o entusiasmo pelo desporto, na senda do propósito central de formar pessoas desportivamente cultas, competentes e entusiastas.

O autor supracitado integrou, neste modelo, seis características do desporto no sentido de garantir a autenticidade das experiências desportivas,

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sendo elas a época desportiva, a filiação, a competição formal, o registo estatístico, a festividade e os eventos culminantes.

As épocas desportivas substituem as unidades didáticas e foram criadas com o argumento que quanto maior for a diversidade das atividades oferecidas, mais bem informado estará o aluno, maior é a probabilidade de ir ao encontro das suas preferências pessoais, logo maior é a probabilidade de este incluir, voluntariamente, uma atividade desportiva na sua vida diária.

No contexto da EF, face à habitual curta duração da generalidade das unidades didáticas, para não falar em todas, é muito difícil a construção de uma época desportiva e, consequentemente, não permite que os alunos tenham tempo suficiente para adquirir aprendizagens significativas específicas de uma matéria.

“Apesar de todas estas boas características do MED, que comprovei, penso que ao nível da aprendizagem dos conteúdos específicos das matérias deixa um pouco a desejar. Penso que o facto de as unidades didáticas serem demasiado pequenas e de o modelo requerer que os alunos vão à descoberta daquilo que devem aprender, dificulta o processo. Penso que se as unidades didáticas fossem maiores a aprendizagem poderia ocorrer de forma mais significativa. O facto de existirem muitas matérias a ensinar em pouco tempo torna difícil atribuir muito tempo para uma das matérias. (Reflexão das aulas 70 e 71). Outra característica marcante do modelo é a filiação. Para Hastie (1998), a preocupação em diminuir os fatores de exclusão, lutando por harmonizar a competição com a inclusão, por equilibrar a oportunidade de participação e por evitar que esta se reduza ao desempenho de papéis menores por parte dos alunos menos dotados, constitui uma característica que ilustra a particularidade do MED. Este facto tem ainda mais relevância porque os alunos menos aptos sentem que têm menos atenção por parte do professor e são mais criticados pelos colegas (Portman, 1995). Assim, a formação de equipas heterogéneas serve para desenvolver relações de cooperação e entreajuda na aprendizagem a partir da promoção da integração e, consequentemente, do sentido de pertença a um grupo.

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“Desde o início da época desportiva, unidade didática, que sinto uma melhoria na inclusão de todos os alunos nas respetivas equipas. Todos os alunos, progressivamente, foram entendendo que qualquer elemento da sua equipa era importante e que, portanto, o sucesso de um seria o sucesso de todos, independentemente do nível de habilidade de cada um” (Reflexão do dia 21/03/2017).

Para as matérias de futebol e andebol, a competição formal, quadro competitivo, foi projetado logo no início da época, sendo que, para além dos resultados das competições, são atribuídas pontuações às equipas que tenham fair-play, realizem os registos estatísticos individuais e de equipa, adotem comportamentos promotores de um bom ambiente de aprendizagem e outros fatores que o professor e os alunos considerarem relevantes. No que respeita a esta característica estrutural do MED, considero que foi a que tive mais dificuldades em incrementar. Os meus alunos, nas primeiras aulas, tiveram dificuldade em preencher as fichas de estatísticas e em distribuir funções pelos elementos das suas equipas. Penso que foi atribuída demasiada liberdade aos alunos levando a que se sentissem um pouco perdidos. Contudo, após começar a utilizar mecanismos de controlo de autonomia, o problema foi resolvido.

Na última aula foi realizado um evento culminante onde a festividade e a aprendizagem foram as “palavras de ordem”. Nos momentos que antecederam a aula estava cético relativamente à postura dos alunos nesta aula, mas o facto foi que estes surpreenderam e aderiram efusivamente à aula demonstrando uma grande evolução na capacidade de se organizar, de incutir festividade na aula e de ajudarem-se mutuamente, mesmo alunos de equipas opostas.

Para Mesquita & Graça (2011b), a elevada autonomia conferida aos alunos com a utilização deste modelo exige boas competências de organização e gestão. O conjunto de excertos das minhas reflexões que se apresenta de seguida ilustra a evolução que fui sentindo ao longo desta época desportiva relativamente à capacidade de se organizarem e gerirem.

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Numa fase inicial percebi que os alunos eram demasiado desorganizados e que tinham muitas dificuldades em, sozinhos, encontrarem soluções para os desafios que surgiam.

“Quanto aos conceitos psicossociais penso que acertei exatamente naquilo que os alunos necessitam de desenvolver, a autonomia. Tenho a perceção de que estes alunos sempre foram habituados com modelos que não atribuem uma importância tão grande à autonomia como o Modelo da Educação Desportiva. Penso que é um ótima oportunidade para desenvolver esse valor nos meus alunos” (Reflexão do dia 21/10/2016).

Na aula seguinte, verifiquei uma ligeira melhoria na organização e percebi que o facto de ser a segunda aula com as mesmas características ajudou os alunos a organizarem-se, pois a informação transmitida e as tarefas a serem realizadas eram exatamente as mesmas.

“…penso que os alunos continuam a demonstrar dificuldades em ser autónomos no entanto verifico que estão empenhados em melhorar. Este modelo é muito favorável ao desenvolvimento da autonomia pelo que penso que estamos no caminho certo” (Reflexão do dia 28/10/2016).

Nas aulas seguintes reparei que os capitães de duas das três equipas existentes já estavam a demonstrar comprometimento face à disciplina de EF. Na aula de cidadania, no dia anterior, tinha constatado que os alunos relembravam sistematicamente os elementos da sua equipa e os outros colegas para chegarem atempadamente à aula e com a documentação necessária à sua realização.

Duas das alunas “têm vindo a demonstrar comprometimento face à disciplina, pois não só se fazem acompanhar constantemente de todo o material necessário para a aula, como também relembram os seus colegas, mesmo os das equipas adversárias, para o trazerem…” (Reflexão do dia 08/11/2016).

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A partir deste momento fui observando algumas melhorias nos alunos, ao nível da capacidade de utilizarem a autonomia e de se ajudarem uns aos outros, embora numa das aulas os alunos não o tenham demonstrado, talvez porque nesse dia a sua pré-disposição para realizar a aula não fosse muita.

“Concluindo, penso que esta aula, no geral, decorreu bem e que consegui facilmente atingir o meu objetivo. Os alunos estão a melhorar a sua capacidade de trabalhar em cooperação e já apresentam mais facilidade em utilizar a autonomia que lhes é dada” (Reflexão do dia 15/11/2016).

Após adotar mecanismos de controlo da autonomia, como entregar alguns exercícios num skill card para os alunos escolherem os conteúdos que queriam exercitar em função daquilo que necessitavam, e utilizar um estilo mais diretivo verifiquei que a aula decorria com mais fluidez e que os alunos realizavam as tarefas de forma mais segura, isto é, como mais certeza daquilo que faziam.

“Penso que o modelo de ensino que estou a tentar implementar desde o início da unidade didática, o Modelo de Educação Desportiva, está a ganhar corpo. Este facto deve-se sobretudo, na minha opinião, à mudança da forma como estou a interagir com os meus alunos. O facto de ser mais diretivo em alguns momentos da aula ajuda-os a orientar-se. Às vezes, pequenas dicas podem fazer toda a diferença… Comparando esta aula com as aulas anteriores verifico que os alunos já têm mais capacidade de utilizar a autonomia que lhes é dada. Por iniciativa própria já ajudam, corrigem e ensinam os colegas sejam eles companheiros de equipa ou não” (Reflexão do dia 10/03/2016).

Na aula seguinte comecei a observar que os alunos já estavam a sentir- se como parte de um grupo, a sua equipa, e já conseguiam realizar as tarefas administrativas com maior eficiência.

“Nesta aula foi notória uma evolução do Modelo de Educação Desportiva. Apesar de parte dos alunos demonstrarem muitas dificuldades na

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execução dos conteúdos técnicos e táticos, a verdade é que senti que a filiação, a realização dos registos estatísticos e a festividade já tiveram mais visibilidade” (Reflexão do dia 21/03/2017).

Na última aula desta unidade didática pude finalmente observar as características do modelo. Foi uma aula de avaliação sumativa onde os alunos sabiam que estavam a ser avaliados. Este facto pode por um lado ter influenciado o comportamento dos alunos. Não obstante, penso que provaram que conseguiam aplicar todas as características do modelo sem a minha ajuda. “No entanto, com o tempo, os alunos começaram a compreender melhor o processo de ensino que caracteriza o MED e foram aderindo progressivamente. Nesta última aula, surpreendentemente, os alunos conseguiram organizar-se sem a minha ajuda e contribuíram de forma autónoma para que todas as características do MED estivessem presentes” (Reflexão do dia 27/03/2017).

Por fim, e refletindo sobre a minha prestação, penso que o facto de ter atribuído uma autonomia exagerada aos meus alunos e ter lecionado mais do que uma matéria, utilizando este modelo, levou a que muito tempo de aula se perdesse em questões organizativas entre grupos, o que prejudicou a aprendizagem no que respeita ao domínio motor. Apesar de, numa fase mais adiantada da época desportiva, ter utilizado mecanismo de controlo da autonomia penso que não fui a tempo de contribuir significativamente para a aprendizagem dos meus alunos, em termos da execução dos conteúdos técnicos específicos.

Face ao exposto concluo que o MED promove a formação de alunos autónomos, responsáveis, cultos e comprometidos, no entanto é necessário saber utilizá-lo. Penso que o facto ter utilizado este modelo com duas matérias e sem ter nenhuma experiência não foi uma boa opção. Por outro lado, penso que a adoção de mecanismos de controlo de autonomia é fundamental para que os alunos e eu, enquanto professor, possamos controlar o trabalho que está a ser realizado e verificar se os objetivos estão a ser atingidos.

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“No cômputo geral penso que os alunos melhoraram bastante os aspetos associados à cultura desportiva e aos conceitos psicossociais no entanto, é necessário trabalhar mais os aspetos associados às habilidades motoras pois estes ainda não apresentaram melhorias significativas” (Reflexão do dia 17/03/2017).

“Após o término destas épocas desportivas penso que, numa próxima oportunidade, devo melhorar o seguinte:1) Aplicar apenas uma matéria. A aprendizagem de duas matérias aliada ao facto de os alunos iniciarem a época desportiva sem saber utilizar a excessiva autonomia que lhes foi dada tornou as primeiras aulas um pouco confusas devido ao excesso de informação a reter; 2) Logo na primeira aula, adotar mecanismos de controlo da autonomia por exemplo, entregar uma folha, a cada equipa, com exercícios padrão para exercitar alguns conteúdos sendo que cada equipa seleciona o que entender; 3) Entregar uma ficha que as regras básicas dos jogos destinados à matéria lecionada;” (Reflexão do dia 27/03/2017).