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6. Concelho de Castelo de Vide

06.24. Monte do Mascarro CMP 335 / CNS

Um dos mais curiosos testemunhos epigráficos desta área regional: [...] / MAR[CI F(ilius)] (?) / EX CO[NS(ulto)] (?) / ANDAIECQ / P(ius?) P(osuit?), indicando um culto de carácter oracular, mais interessante ainda porque se trata de uma divindade indígena, neste caso a primeira menção conhecida a Andaieco. Documenta-se assim uma prática cultual estruturada já de acordo com a formatação latina, apesar de o provável dedicante e a divindade serem autóctones. Na zona existem “vestígios de alinhamentos” relacionados certamente com o próprio santuário. A memória oral localiza aqui uma antiga igreja.

Referências: Carneiro, 2009-2010; Encarnação, 1995a (FE 49, nº 221).

06.23. Monte do Mouratão CMP 335

Referência muito imprecisa sobre sítio romano nas proximidades do monte agrícola.

Referência: Inédito a partir de informação oral de Jorge de Oliveira.

06.24. Monte do Mascarro CMP 335 / CNS 531

Um sítio dotado dos mais relevantes conteúdos, essencial para compreendermos diversas dinâmicas (culturais, temporais, funcionais...) e que por isso necessita de uma reavaliação atenta. As informações sobre as realidades identificadas são confusas, por isso necessitará de uma leitura muito cuidada. Tentemos analisar os dados em questão.

A descoberta do sítio verifica-se a partir do achado de uma moeda visigótica em ouro cunhada por Egica (687-702). A visita de Conceição Rodrigues ao local indica que “Depois de percorrermos uma área de cerca de 6000m2 no local onde a moeda tinha sido encontrada constatámos, pelos numerosos fragmentos de tegulae, imbrices, dolias, alinhamentos de paredes e fragmentos de colunas de granito [...]”, o potencial do sítio.264

Segue-se uma escavação, “junto a um dos alinhamentos de paredes”, cuja estratigrafia parece ser a seguinte: a trinta centímetros de profundidade “um pavimento feito de tijolo moído que assentava sobre uma camada de seixos dispostos regularmente”, seguramente o seu alicerce. A referência seguinte menciona uma sepultura, descoberta por “um operário” enquanto a autora procedia a prospecções. De inumação, aparentemente não apresentava espólio. A fotografia apresentada265 não mostra qualquer relação com a anterior ou com

outras estruturas, mas depreende-se que estaria próximo do referido pavimento.

Entretanto havia sido descoberto “um muro de alvenaria de pedra e cal, opus

mixtum” que no ano seguinte viria a ser escavado. Aqui, a dez centímetros de profundidade

“apareceu um pavimento formado por argamassa de tijolo moído”, ou seja, de opus signinum, sendo que a estampa CVII mostra um pavimento com meia cana. Da referência a “um fragmento de tijolo que se supõe ter pertencido ao estabelecimento de banhos” e a este pavimento depreendeu Pilar Reis266 que estaríamos perante um edifício termal, mas tal não

é necessariamente relacionável. Deverá tratar-se de um tanque, sobreposto a “outro pavimento, mas diferente do primeiro”, pois a setenta centímetros surgiram “grandes ladrilhos”, ou seja, um piso de tijoleiras. A autora dos trabalhos imediatamente conclui a existência de “duas correntes culturais diferentes, uma de base romana outra visigótica”, certamente não pelas estruturas, todas absolutamente romanas, mas pelas moedas, a que, acrescento, poderemos juntar a sepultura.

Na escavação não surge menção a nenhum tipo de materiais. Os que a autora apresenta são de achados de superfície – colunas de granito, “vários fragmentos de ladrilho

264 1975: 168. Moeda descrita na página 188. A moeda surge na listagem de Almeida, 1971: 224 a 226. 265 Est. CVIII, fig. 1 e 2.

calcinados e vidrados”267 e algumas moedas romanas em colecção particular (bronzes de

Teodósio, Galieno, Macrino, Quietus, Teodósio (?), Magnêncio e Constâncio, ou seja, uma colecção muito coerente entre o início do século III e os finais do IV), a que se junta uma outra visigótica, de ouro, entretanto vendida268.

Resta-nos ainda um elemento cultural do maior interesse: “próximo do local anteriormente descrito”, ou seja, em propriedade vizinha, foi recolhida uma ara votiva. Desta forma, não é tão seguro que seja proveniente do lararium doméstico, como anteriormente supus269, mas de algum templo situado nas imediações, eventualmente no fundus. Dedicada a uma divindade não mencionada, o que indica a sua inclusão em estrutura

cultual própria, o aspecto mais interessante reside no contraste entre o cuidado suporte pétreo, irrepreensivelmente esculpido, e a fruste gravação, desalinhada e imperfeitamente desenhada, o que mostra que a peça foi comprada algures e gravada no local por indicação do proprietário.

Em 1983 regressaram os trabalhos de escavação ao sítio, mas de modo tão desarticulado que motivaram uma intervenção a cargo do então SRAZS270. Seguiram-se

duas campanhas no local, momento em que se procede, pela primeira vez, à obtenção de um levantamento topográfico do sítio e de uma sequência estratigráfica mais rigorosa.

No sector A definiu-se uma primeira camada de derrube, sobretudo de cerâmica de construção271, sobreposta a um outro, por sua vez sobre uma camada de terra arenosa, com

mais um bronze de Constantino e um fundo de ânfora. Aqui se situa um piso estreito, lajeado, nas proximidades de um tanque com meia-cana anteriormente detectado (na campanha de 1972?), o que leva o autor da escavação a propor “uma construção relacionada com a obtenção de vinho ou azeite”.

No sector C predominou uma camada de cinzas, escória de ferro e “borra de vidro”. Definiram-se duas pequenas estruturas rectangulares com pavimento em tijoleira, muito fracturado por contínua sobre-exposição a altas temperaturas. Nesta zona haveria uma entrada para o interior de uma estrutura não descrita, com uma soleira de porta, recolhendo-se na zona vários fragmentos de uma canalização em chumbo.

No sector D procedeu-se à limpeza da zona anteriormente intervencionada por Conceição Rodrigues, com “uma extensa divisão habitacional” que apresenta um “piso de tijolo moído sobre um nível de calhaus rolados”. É então que temos a informação sobre a existência, não de uma, mas de duas sepulturas, “sobre o piso de tijolo moído”, a um dos extremos do compartimento. Foram ainda detectados muros sob este pavimento, e um piso de tijoleiras onde assentaria uma coluna visigótica, da qual ainda não havíamos tido notícia. As sepulturas, rompendo o piso de cima, tinham a sua base nestas tijoleiras. Salienta-se a ausência de “cerâmica fina” (sigillata ou paredes finas) e de mosaicos, apontando-se como possível localização para a pars urbana o próprio monte de Mascarro.

A campanha de 1985 apenas acrescenta detalhes e confirmações ao sítio: no sector A um outro reservatório para líquidos, com opus signinum em meia cana, e uma canalização de granito. Nesta área, sob derrubes, recolheram-se seis moedas de Constantino. No sector C, confirmou-se a presença de escórias de ferro, cinzas e cerâmicas com excessiva cozedura, apontando-se uma “oficina ou anexos de ferreiro”.

Desta forma, temos uma estrutura fundiária, provavelmente uma villa com alguma monumentalidade que nos é conferida desde logo pelas colunas em granito. Temos duas estruturas relacionadas com a água, estando uma delas sobreposta a um momento mais

267 Rodrigues, 1975: 170. 268 Estampa CXV. 269 Carneiro, 2009-2010.

270 Relatório de Trabalhos Arqueológicos na Herdade de Mascarro, dir. Jorge de Oliveira, Castelo de Vide,

Agosto de 1984 [dactilografado], constantes no processo do IPPAR e entregue aos Serviços Regionais de Arqueologia da Zona Sul.

271 Referem-se “grande número de fragmentos de tijoleira com marca de pata de cão”, o que será certamente

fruto da secagem destes materiais em eiras ao ar livre, antes da cozedura no forno. Esta menção deve ser relacionada com os materiais vidrados e sobre-cozidos que indicam um forno de produção de cerâmica.

antigo, constituído por um pavimento de laterae. As cerâmicas calcinadas indicam uma estrutura de produção cerâmica, e o relativamente numeroso espólio monetário mostram que o sítio estaria plenamente inserido nos circuitos comerciais. Todavia, não há qualquer referência a outros elementos de importação. É legítimo concluir que nas proximidades estaria um templo privado inserido na propriedade. Em momentos finais o espaço (produtivo?) necropoliza-se mas o local mantêm a sua vitalidade nas correntes de âmbito comercial e em economias monetarizadas, com duas moedas de ouro visigóticas a marcarem uma continuidade de ocupação (agora em perfil funerário) até tempos muito tardios. O espaço continuará a ser ocupado, conhecendo-se uma sepultura escavada na rocha nas imediações.

Por tudo o que fica dito, e pelo que se entrevê em dados tão fragmentados, merece que se dedique ao sítio de Mascarro uma atenção especial, dada a relevância dos conteúdos culturais e diacrónicos aqui existentes.

Outras referências: Proc. IPPAR nº 4.05.002; Processo IPA 86/1(113) e S – 00531; Almeida, 1971: 224-226; Gorges, 1979: 463; IRCP nº 613; RP 6/57.

06.25. Santa Marinha (= Santo Amarinho)