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8. Concelho de Elvas

08.18. São Romão CMP

Sítio também dado a conhecer pelo Padre Louro, que mencionou, entre a ribeira homónima e o marco geodésico de Serra Branca, a existência de “vestígios de edifícios” e de um “túmulo em mármore”.424

Efectivamente o sítio encontra-se nesta área, em plataforma mesmo junto à linha de água. Foi inclusivamente alvo de uma intervenção arqueológica que terá decorrido a partir de uma indicação do grupo de arqueologia de Vila Fernando, que alertou para uma descoberta fortuita no decurso de trabalhos agrícolas. Então, “[...] Em Novembro de 1987 o Serviço Regional de Arqueologia do Sul iniciou uma escavação de emergência, durante uma semana, com o intuito de retirar o máximo de informações arqueológicas e de averiguar o estado de conservação da ‘villa’.”425 Previa-se a continuação dos trabalhos para

o ano seguinte, mas uma carta enviada em Fevereiro de 1989, pela referida agremiação local, dava conta do estado de profundo abandono a que as ruínas estavam sujeitas e ao extravio dos materiais então encontrados. Efectivamente, ainda hoje no local é visível uma pequena área de escavação, que colocou à vista dois muros paralelos. Em volta, ao longo de cerca de um hectare, a boa visibilidade, propiciada por uma lavra recente, permitiu observar grande quantidade de tegulas, fragmentos de dolium e alguma escória, além de alguns fragmentos de cerâmica comum. Parece existir uma plataforma que separa a zona de concentração de achados do curso de água. Poderá existir uma barragem no cruzamento das linhas de água.

422 Louro, 1961: 9; Louro 1966: 5.

423 Em Vila Fernando esteve sedeado um grupo de interessados pelo património local que chegou mesmo a

realizar algumas escavações em sítios arqueológicos da região e a incentivar as autoridades públicas a interessarem-se pela realidade local. Ver a ficha de sítio de S. Romão.

424 Louro, 1966: 5.

Outras referências: Processo IGESPAR S-2530; Almeida, 2000: nº 38.

08.19. Carrão

CMP 413 / CNS 4600

Notável sítio arqueológico, emblemático das vicissitudes que impendem sobre o património arqueológico da região. Aqui chegaram a realizar-se escavações, deixando ainda hoje à vista algumas estruturas, mas o estado de abandono e as mutilações levadas a cabo pela inflexibilidade de alguns proprietários fazem com que o local não esteja valorizado ou aproveitado. Quanto aos resultados dos trabalhos, nunca foram devidamente publicados.

Aqui decorreu uma descoberta casual, na sequência de trabalhos agrícolas. Em 1942 Dias de Deus acorre ao local, pois havia sido informado de um achado de uma cabeça de estátua426. Conjuntamente com Luís Agostinho, o então responsável da Colónia

Correcional de Vila Fernando realiza escavações no local, situação que, conjugada com o aparecimento da contígua necrópole da Herdade da Chaminé, irá motivar a deslocação ao local de Manuel Heleno427. Observando o valor científico e patrimonial do local, o então

Director do actual Museu Nacional de Arqueologia irá tentar impedir Dias de Deus de prosseguir os trabalhos alegando a sua ausência de qualificações428, situação que motivará a

chegada de Abel Viana e o início do seu interesse e trabalho na arqueologia de Elvas. Desta forma, o sítio torna-se conhecido pelas notas que dele deixam Heleno e Viana, em sentidos claramente opostos, pelo que se torna complexo perceber o que efectivamente foi descoberto no local429.

Aparentemente, teríamos aqui uma villa áulica de peristilo, intervencionada na sua pars

urbana e em parte do edifício termal. O sítio seria muito extenso, com vários

compartimentos, um deles com planta absidal. Os pavimentos em mosaico apresentavam seis painéis distintos (um deles com uma figuração de Epona), em “quatro planos de nível diferente”430, o que pode indicar uma construção em patamares avançando na direcção da

linha de água. No edifício termal, mais próximo da linha de água431, foram postas a

descoberto três salas, uma com pavimento em mosaico “decorado com bolotas, mas já muito destruído, passava-se a outra divisão toda pavimentada a mosaico, e com um ralo de

426 Viana, 1950: 296.

427 Cuja motivação inicial para a visita se centrou na descoberta dos mosaicos de Carrão, que seguramente o

alertou, dado o recente aparecimento dos mosaicos de Torre de Palma em 1947. Embora Heleno indique que já visitara o local em 1939 e que “Pensei mesmo em esplorá-la em 1945, obtendo para isso a promessa de pessoal gratuito da Colónia Penal de Vila Fernando, mas outros serviços mais urgentes se antepuseram” (1951: 92), na prática não existem indicações de um projecto nesse sentido. Todavia, o que efectivamente irá captar a atenção heleniana será o campo de urnas da Chaminé, por dois motivos: possibilitar o preenchimento de uma lacuna no conteúdo expositivo do Museu, que não apresentava testemunhos deste tipo de realidade crono-cultural, e possibilitar ao autor a prossecução das suas teses celtizantes sobre a originalidade do povo português que na altura, também por motivos exteriores à temática arqueológica, crescentemente o interessavam.

428 “Pois foi nesta região que o falecido António Luís Agostinho e o sr. António Dias de Deus realizaram, nos

últimos anos, com interesse e cuidado, mas sem os conhecimentos técnicos requeridos […]” (Heleno, 1951: 83). Será esta ausência de enquadramento metodológico que Heleno irá invocar, mas na prática a sua vontade assentava na apropriação das urnas da Chaminé, dado que o próprio lastimava a ausência deste tipo de espólio na exposição do então Museu Etnológico. A sua intenção passou então pela realização de escavações na Chaminé em nome próprio, tendo para tal feito diligências: “Fizemos um reconhecimento [descrito em Heleno, 1951: 86] no campo de urnas da Chaminé (Vila Fernando), cuja exploração iniciada por Dias de Deus, pensamos continuar; […]” (Heleno, 1956a: 231), situação que nunca se verificou.

429 Ver Heleno 1951: 91-94; sintética descrição dos achados em Deus, Louro & Viana 1955: 568-569 e lam. 4

e 5; Viana 1950: 295-296; Viana 1955a: 550-551.

430 Deus, Louro & Viana 1955: 577. Estão descritos em artigo de Manuel Heleno (1951).

431 Que Manuel Heleno, nos seus apontamentos e no artigo de 1951 (p. 92-94), designa de “Mosaico da

Chaminé (poço)”, indicando que está a cinquenta metros da necrópole da Chaminé. Portanto, o conjunto de seis mosaicos do Carrão, da provável pars urbana, encontram-se a oeste da casa, em local onde ainda hoje se ergue a construção absidada, e os três mosaicos “da Chaminé”, pertencentes às termas, entre a casa e a necrópole, junto à linha de água.

pedra, de forma de roseta, a um dos cantos”, e com motivos pisciformes432. Ainda um

outro pavimento de mosaico, com motivos geométricos, e um compartimento absidado, “talvez tanque”433. Em outro ponto, uma construção que poderá pertencer à pars rustica,

dado o achado de muitos fundos de ânfora sobre um pavimento de tijolos quadrados, por baixo do qual existiria um canal de drenagem em tijoleira.

O local teria duas barragens. Uma ainda se encontra parcialmente conservada, no pequeno curso de água que passa no sopé das estruturas, e poderia funcionar como um espelho de água que criasse um ambiente de amoenitas em frente ao edificado. A segunda, maior, estava na ribeira da Colónia, mas foi destruída recentemente.

Analisando estes dados soltos e fragmentados, parece-me possível afirmar que estaríamos perante uma villa áulica de grande qualidade e requinte decorativo (com pavimentos musivos e estatuária, recorrendo a terraços para criar níveis descontinuados, tirando partido da contemplação da paisagem envolvente), inserida em contexto muito modificado pelo Homem, de modo a poder realçar a estrutura arquitectónica e a vivência do local. Os restos ainda hoje visíveis, do paredão de uma barragem e de uma estrutura absidada, são imponentes e reveladores do que seria o ambiente do sítio.

Outras referências: RP 6/211; Heleno 1951: 91-94; Louro 1966: 5; Gorges 1979: 467; Quintela, Cardoso & Mascarenhas 1987: 70-71; Almeida, 2000: nº 40; Reis, 2004: nº 90; Mourão, 2008: 106-107.

08.20. Herdade da Chaminé