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9. Concelho de Estremoz

09.16. Senhora dos Mártires CMP 425/426 / CNS

Local onde se indicam “cerâmicas romanas e medievais” supostamente pertencentes a uma provável “necrópole [que] deverá ter coexistido no mesmo espaço” com uma anta e com a capela homónima626. Na visita ao local confirmou-se que existe uma densa mistura

de materiais de diversas épocas, não sendo possível definir um núcleo central, ou uma tipologia, para um sítio com excelente amplitude visual para sul e oeste.

09.15. Fonte do Imperador CMP 425 / CNS 31490

Ponto de povoamento recentemente identificado. Dadas as particularidades do trabalho – um estudo de impacto ambiental627 prevendo a minimização de impacto causada

pela rectificação de um nó viário – não foi efectuada uma completa caracterização do sítio, que se prevê de “valor patrimonial elevado.” Apenas foram realizadas sondagens em zona muito marginal da mancha de vestígios, e em área anteriormente afectada pela construção da E.N. nº 4, tendo sido recolhidas moedas romanas, mas sem contexto arqueológico. O sítio implanta-se em pequena elevação que domina o traçado da via XII. É complexo propor uma interpretação, pois não existem indicadores de monumentalidade que corroborem a ampla mancha de vestígios de superfície, com cerca de meio hectare, podendo tratar-se de um casal agrícola ou de um ponto relacionado com a via (uma

mansio?).

09.16. Senhora dos Mártires CMP 425/426 / CNS 5680

Sítio muito complexo, que exige uma ampla sistematização da informação. Deve ser entendido em contexto mais amplo, abrangendo elementos que lhe estão próximos, como o Tanque dos Mouros e os antigos vestígios da área de Santo António.

Comecemos por aqui. Em torno ao antigo convento, em área hoje perfurada por pedreiras de extracção de mármore, existiu um manancial de água que “procedia de duas fontes, uma das quais próximo da Cerca de Santo António, bem como um riacho que as alimentava, sendo essas origens de água que corriam em caudal para o grande tanque, e

626 Oliveira, Sarantopoulos & Ballesteros, 1997: 31-33.

627 Rectificação da intersecção da EN4 com o acesso ao lugar da Fonte do Imperador nas proximidades de

Estremoz, Archeoestudos (Responsável científico Tânia Falcão), Alter do Chão, Julho 2009, Proc. IPA 2009/1(479), Processo de sítio S-31490. A Heloísa Santos e a Tânia Falcão agradeço a informação prestada e o acesso ao documento.

foram obstruídas por um terramoto em 1531.628” Aparentemente aqui existiria uma fonte,

de mergulho, bastante ampla, e que até meados do século XX era usada como lavadouro público. Dela partiam canais em direcção do “grande tanque”, a estrutura localmente designada como Tanque dos Mouros, com abastecimento reforçado por outro caudal proveniente de “um riacho que nascia na barreira do baluarte de Santa Bárbara”629, também

desviado pelo mesmo terramoto. Eventualmente por aqui estaria o aqueduto referido por Henriques da Silveira630.

O grande complexo hidráulico de Tanque dos Mouros, infelizmente amputado pela E.N. nº 4, é uma das mais monumentais estruturas de contenção de água do território português. Foi descrito por diversos autores631, sendo evidente a sua vocação de tipo

industrial, certamente relacionado, não com fins agrícolas, mas com o armazenamento de água indispensável à extracção e trabalho do mármore que aflora nas imediações. Os sistemas de conduta de água que daqui partem ainda hoje são observáveis nas fotografias aéreas, ajudando a compartimentar o regime de propriedade em torno do local. Desta forma, o tanque era um espaço de captação, armazenamento e condução para novos pontos, como aliás fica expresso pelos arcos e orifícios do canto sudoeste, onde terão funcionado máquinas de elevação de água, que assim permitiriam a redistribuição para os pontos de consumo testemunhados pelos canais.

A enorme dispersão de restos de talhe de mármore que se encontram por todas estas extensões podem ser um indicador do tipo de actividade económica que aqui se processou. Perceber o próprio sítio, contudo, é tarefa mais complexa, exigindo prospecções sistemáticas na área.

Os vestígios estendem-se por vários hectares. Para sul, até à “Quinta de Santo Antão, vulgarmente chamada Quinta da Berlica. Situada na estrada vicinal da Glória [...]. No seu subsolo tem-se feito abundante colheita, através dos tempos, de objectos arqueológicos: um marco miliário de caracteres latinos, cerâmica, vidraria e moedas de ouro e cobre, de cunhagem romana.”632 No extremo oposto, os indicadores rodeiam o próprio Tanque dos

Mouros, seja ainda hoje pela numerosa cerâmica de construção e blocos pétreos que se encontram à superfície, seja pelas notícias antigas que mencionam descobertas de sepulturas633. Para oeste é difícil perceber a extensão, devido à construção da E.N. nº 4 e de

loteamentos recentes na área, mas para poente acompanha o núcleo urbano até à saída para a Glória. No total podemos estimar em quatro ou cinco hectares a mancha de dispersão de vestígios, mesmo considerando os remeximentos derivados de construções e a intensa prática agrícola.

O epicentro, contudo, parece ser em torno do monumento gótico de N. Sr.ª dos Mártires. Já notícias antigas advogam este facto: “Neste Século se tem descobrido na vizinhança desta Igreja muitas medalhas Romanas, muitas sepulturas, que são claros indicios, de que não longe esteve alguma grande povoação Romana. Todas estas sepulturas paresem Gentilicas, e tinhão à cabeseira huma Almotolia de Barro, com hum prego dentro; [...].”634 A descoberta de sepulturas em torno da igreja é um padrão recorrente nas várias

notícias existentes: “Em volta da igreja dos Mártires - freguesia de Santa Maria - têm-se

628 Crespo, 1950: 8. 629 Espanca, 1975: 92.

630 “Das fontes vizinhas se emcaminhava a sua ágoa para este lago, e ainda hoje se descobrem alguns vestigios

do aqueducto. Eu vendo que as Fontes vizinhas são pobres de ágoa, me persuado que as nacentes se attenuarão com os Terremotos, e particularmente com o de 7 de Janeiro de 1531 [...].” (Fonseca, 2003: 180).

631 Espanca, 1975: 92, que o atribui ao século XIV; Crespo, 1950: 6-8; sobretudo Quintela, Cardoso &

Mascarenhas, 1986: 135-138 e fotog. 102 a 107.

632 Espanca, 1975: 111.

633 “[...] muitas sepulturas, e das Medalhas Romanas, que frequentemente se vão descobrindo nos campos

vizinhos do dito lago.” (referindo-se ao tanque, “hum antiquissimo Lago, quadrado, que tem duzentos e vinte e sinco palmos por lado, vinte de altura, e dez de largura das paredes sustentadas por Gigantes tanto da parte do Sul, como da do Occidente e junto delle se estão vendo os arranques das Abobedas das Cazas, em que se recolhião as pessoas que nelle tomavão Banhos.” Para ambas as passagens, Fonseca, 2003: 180).

encontrado muitas provas de que ficaram alguns romanos aí sepultados: pelas caracteristicas das suas sepulturas, pelos vestígios de ruínas de casas de habitação, ou mesmo parcelas de arruamentos de edifícios de grande antiguidade. [...] Essas ruínas mostram ter ali existido qualquer «vila agrícola romana». Muitos alicerces das suas construções se encontram na Quinta da Berlica, e também ali se têm encontrado moedas romanas em grande quantidade. É mais de crer, porém, que sejam restos de uma aldeia a que chamavam, e ainda hoje lhe chamam, Aldeia dos Mártires.”635 Ou ainda: “Últimamente

encontraram-se ainda naquele mesmo sítio, umas sepulturas romanas tendo uma delas uma campa com letreiro ilegível por apagado em parte. [...]. Outra campa achada denota ter sido serrada de um bloco, conhecendo-se esse corte nessa pedra feito por serração. De dentro dessa sepultura tiraram - no dizer de uma testemunha ocular - uma espécie de garrafa de barro, uma tigela e uma garrafa de vidro a desfazer-se de «podre» e que teria a capacidade de uma garrafa vulgar. Seria este um lacrimatório que era de uso os parentes do defunto e as carpideiras encherem de lágrimas, que derramavam como justificação do seu carpir e sepultavam como último preito junto das cinzas do falecido?”636 E finalmente: “Durante as

vultuosas obras de 1732 e 1744, nos terrenos envolventes, descobriram-se dois túmulos romanos, de mármore, anepígrafos e objectos de adorno, da mesma civilização.”637

Todavia, as várias valências do local não se esgotam na dimensão funerária. Do sítio conhece-se uma epígrafe de especial relevância, dado o facto de ser o único documento do culto à Deusa Cíbele, a Magna Mater propiciadora de prosperidade, que foi encontrado nesta região: M(atri) D(eum) S(acrum) // I(ulius) MAXIMI/ANVS A(nimo) L(ibens) P(osuit) / PRO H(uius) M(onumenti) N(umini) E(rectionem) / PECVLIVM638. Trata-se de um raro

testemunho de um acto ervegético, visto que o dedicante – Iulius Maximianus, certamente um liberto com invejável poder financeiro – erigiu o monumento às suas custas, embora a interpretação do conteúdo epigráfico apresente algumas dúvidas. Possivelmente também pertencente a este monumento, conhece-se uma peça escultórica algo bizarra e exótica, figurando um símio. Sabendo-se que nas imediações transitava o itinerário da via XII, seria possível que o testemunho público da invocação à Magna Mater se destinasse a estar colocado junto do itinerário, até para maior ostentação do nome do ofertante.

Finalmente, as evidências de um ponto de povoamento. Enquanto a bibliografia tem valorizado mais os achados fortuitos de sepulturas, sempre mais espectaculares para os leigos, os indicadores de terreno são numerosos e remetem para um local ocupado. Numerosa cerâmica de construção é visível à superfície, com variadas tipologias e em geral de fabrico cuidado; escasseiam outros elementos, ou encontram-se misturados com as cerâmicas resultantes da contínua ocupação do local. Encontram-se os já referidos canais de rega, e também os blocos de mármores talhados e informes que já foram mencionados.

Pela implantação, pelos indicadores e pela relação com a rede viária, o sítio parece de dimensões superiores a uma villa, estando também ausentes os elementos de monumentalidade. A hipótese de um vicus marmorarius, de um povoado dedicado à laboração e exportação do mármore, pode ser considerada, ou então a existência de um sítio de grandes dimensões em íntima relação com a via.

Outras referências: RP 6/208; Processo IGESPAR S-00989

09.17. São Marcos