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7. Concelho de Crato

07.29. Mosteiros CMP 347 / CNS

Em primeiro olhar, mais uma das superlativas descrições de Mário Saa: “As casas, as habitações destruídas, mantêem-se aí em montijos, sobre os quais se adensam os fragmentos de tègula, as soleiras das portas e cantarias várias, apesar do muito que dali tem sido retirado. É difícil achar em qualquer outro ponto do país um tal alfobre de material romano, de construção, de entulhos, de que muito se poderia aproveitar para novas construções. Era, no dizer dos habitantes limítrofes, a «cidade» dos Mosteiros.”329 Todavia,

mais nenhum autor se refere a este sítio.

A massa construída do sítio de Mosteiros ainda hoje se ergue no meio da planície, demonstrando um dos mais impressionantes sítios do Alto Alentejo. Na realidade, no silêncio a que tem estado votado, exemplifica bem o que tem sido a dinâmica da investigação regional: estando no terreno, observando as construções, não é fácil compreender com um sítio com esta monumentalidade tem passado despercebido à investigação, pois, se exceptuarmos o autor que se radicou em Ervedal, não existe qualquer outra referência ao local. Mesmo a indicação do PDM indica que o seu autor não localizou o sítio, pois a indicação cartográfica está deslocada para norte, junto à menção toponímica.

Encontra-se voltado a oeste, em pequena plataforma junto a uma linha de água. Este curso de água subsidiário da ribeira da Espadaneira deve ter sido represado, notando-se ainda um alinhamento de pedras. Aqui temos vários moroiços, todos eles quase inteiramente cobertos com uma enorme densidade de cerâmica de construção dos mais variados tipos, e pedras aparelhadas e trabalhadas de várias formas. Note-se que todos os materiais cerâmicos estão muito bem preservados e são de excelente qualidade de fabrico. É ainda evidente a existência de dois patamares entre a ribeira e o sítio principal, indicando que deveriam existir terraços, talvez com construções.

Topograficamente um pouco mais acima, distingue-se uma massa constituída por um acumulado contínuo de pedras de consideráveis dimensões, certamente ocupando uma área de meio hectare, que cobre um ou mais edifícios, que parcialmente vão aflorando. O sítio tem uma entrada voltada para oeste, onde ainda se encontra uma coluna tombada330.

Entrando para o interior, temos um largo pátio, liberto de pedras, e de ambos os lados estão panos de construções, relativamente estreitas, e perfeitamente definidas por um muro exterior que corre a toda a área do complexo e que o limita. Este muro apresenta na face este uma larga ábside, que remata todo o conjunto edificado. Aqui, a altura de muros conservados aflora em cerca de meio metro face ao solo, mas a diferença altimétrica para o terreno exterior envolvente é de mais de metro e meio, indicando a conservação das estruturas no subsolo. Nesta face este encontramos, entre o pátio e a ábside, um conjunto de grandes compartimentos, sempre cobertos por blocos de pedra solta que, aliás, estão em enorme quantidade em toda a área edificada. Neste bloco este, no topo sul, aflora um canto de um compartimento rectangular, que deverá ter sido objecto de uma violação, pois é o

329 Saa, 1967: 89; menção também em pp. 76-77. Mosteiros encontra-se classificado no Endovelico como

“Achado(s) Isolado(s)”.

330 Uma peça única notável, de granito, com 252cm de altura visível por diâmetro de 32cm, embora se

único local onde se vê o pano de muro: com cerca de meio metro de profundidade, este buraco permite ver uma estrutura extremamente bem construída, revestida por um estuque que, por estar coberto de líquenes, não permite perceber se terá sido colorido.

Este amplo conjunto estrutural é perfeitamente ortogonal e parece ser simétrico: entrada rigorosamente a meio do edificado, pátio largo marginado por dois blocos construídos de cada lado, e um conjunto residencial rematado por uma larga ábside. Uma planimetria perfeitamente clássica, que necessitaria de um levantamento topográfico urgente, antes que maiores danos a atinja. Toda esta zona está repleta de blocos de pedra, que, amontoados sobre as estruturas, impedem uma percepção clara do conjunto, confirmando a descrição de Saa. Neste acumulado foi recolhido um capitel em mármore brando, possivelmente visigótico. Encontram-se ainda silhares, alguns deles almofadados.

Por trás, no sentido este, os frondosos silvados escondem uma grande estrutura rectangular, que certamente terá sido um tanque, dadas as paredes de opus signinum arrancadas e tombadas. Todavia, o espaço, que hoje tem uma horta, terá tido outras funcionalidades: também sobre-elevado em relação ao solo envolvente, encontram-se troços de muros, uma soleira de porta que sinaliza uma passagem, e degraus de tijoleira ainda in situ. A percepção destas estruturas não é fácil, dada a vegetação, as silvas e o amontoado de pedras e/ou arames que por aqui se encontram. Todavia, a área geral é muito extensa, talvez duplicando o conjunto edificado já mencionado.

Entre os materiais observados no local enumeram-se cinco mós, um tijolo de quadrante, um bordo de dolium com decoração penteada, laterae com pegadas de animais, vários tijolos de suspensura e um tambor de coluna em granito. A cerâmica comum é escassa, o que indica um bom nível geral de preservação, e não foram detectadas cerâmicas de importação (exceptuando-se uns bojos claros que poderão pertencer a contentores anfóricos) nem outras incidências de registo. Todavia, o acumulado de materiais em moroiços é digno de nota.

Outras informações foram deixadas por Mário Saa: um fragmento de ara em mármore branco, encontrado “na encosta, entre restos de construções”, o que pode indicar mais núcleos, pois o sítio está em relevo genericamente plano. Além disso, o autor distingue dois pontos, pois em seguida afirma que “A poucas centenas de metros do local [da ara] vemos o Alcarial dos Mosteiros”331, não sendo assim de excluir a existência de mais

elementos que se encontrem ainda por identificar.

Torna-se necessário conhecer melhor este monumental sítio, que tem permanecido discretamente longe do olhar da investigação. Não restam dúvidas de que se trata de uma edificação romana que prolonga a sua existência para o período posterior (dado o capitel visigótico), podendo a ressonância toponímica indicar uma ainda maior perduração. Localiza-se em ponto axial de caminhos, muito próximo de dois eixos viários, um no sentido longitudinal, que segue de Braguinas para Fortios, e outro vertical, que desce da zona de Ammaia e Alagoa para os territórios do Crato. Todavia, Mosteiros não se encontra junto a qualquer um destes caminhos, mas a uma prudente distância.

Quanto ao conjunto construído, apresenta-se com uma planta perfeitamente simétrica e ortogonalizada, com um amplo pátio interior rematado por dois blocos laterais e com o complexo da ábside na extremidade oposta à da entrada, sendo que aliás o remate da ábside termina no ponto diametralmente oposto. Existe portanto um rigoroso planeamento construtivo, com o que terá sido o complexo residencial a ser reforçado com uma presumida barragem, e com um outro conjunto de edificações que apresentam uma leitura mais complexa, mas que poderiam estar vinculados a funções agro-pecuárias.

A interpretação do local como villa parece-me evidente, dados os sinais de monumentalidade (desde logo a impressionante coluna tombada na entrada), as estruturas de contenção de água e os sinais indirectos de termas e de áreas produtivas.

Outras referências: PDM 67; RP 6/79.

07.30. Couto dos Guerreiros