• Nenhum resultado encontrado

PARTE I: A DINÂMICA DOS DIREITOS HUMANOS E A ESTÁTICA DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS

1.3 CARACTERIZAÇÃO DOS DIREITOS ECONÔMICOS, SOCIAIS E CULTURAIS NA ORDEM INTERNACIONAL

1.3.6 A natureza jurídica propriamente dita

Alguns estudiosos apontam que a diferença quanto à natureza entre os grupos de Direitos Humanos estaria no fato de que os direitos civis e políticos derivam do direito natural, por sua relação com autonomia e liberdade do indivíduo, sendo que tal justificativa não poderia ser aplicada aos direitos sociais, visto que carecem de elementos de universalidade e de valores absolutos, os quais são

132 Artigo 2º:

(1) Os Estados-parte no presente Pacto comprometem-se a garantir a todos os indivíduos que se encontrem em seu território e que estejam sujeitos à sua jurisdição os direitos reconhecidos no presente Pacto, sem discriminação alguma por motivo de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de qualquer outra natureza, origem nacional ou social, situação.

(2) Na ausência de medidas legislativas ou de outra natureza destinadas a tonar efetivos os direitos reconhecidos no presente Pacto, os Estados-parte comprometem-se a tomar as providências necessárias, com sitas a adotá-las, levando em consideração seus respectivos procedimentos constitucionais e as disposições do presente Pacto.

133

“[...] The expression ‘inherent right to life’ cannot properly be understood in a restrictive manner, and the protection of this right requires that States adopt positive measures […]”.ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. Comentário Geral n. 6, parágrafo 5º.

134“In most cases, however, the measures to be adopted are not specified in the Covenant and it is for

each State to determine them in the light of the protection needs of children in its territory and within its jurisdiction. The Committee notes in this regard that such measures, although intended primarily to ensure that children fully enjoy the other rights enunciated in the Covenant, may also be economic, social and cultural. [...]”. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Humanos. Comentário Geral n. 17, parágrafo 3º.

135

“The obligation to respect requires States parties to avoid measures that hinder or prevent the enjoyment of the right to education […].” ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Comentário Geral n. 2, parágrafo 6º; Comentário Geral n. 12, parágrafo 15; Comentário Geral n. 13, parágrafo 47.

essenciais para a compreensão dos Direitos Humanos, assumindo, assim, naturezas jurídicas distintas136.

Nesse sentido, aduzem que, como uma das principais características do direito natural seria o individualismo, este acaba por influenciar a autonomia pessoal e, por conseguinte, sua liberdade diante da não interferência do Estado. Entretanto, tal característica encontra ferrenhos oponentes pela corrente que preconizava um excessivo radicalismo do individualismo alcançado por Nozick137, que concebe direitos de forma negativa, enquanto liberdades negativas, e entende que os direitos econômicos, sociais e culturais não fazem parte do rol de Direitos Humanos, pois além de demandarem distribuição de riqueza, correspondem à uma interferência infundada na liberdade individual138.

Para Matthew Craven, a International Bill of Rights representa a tentativa de se obter consenso sobre problemas políticos e morais que contextualizavam aquele momento, abstraindo qualquer divergência filosófica sobre a questão. Para ele, a afirmação de que o texto da própria Declaração Universal teria sido influenciado pela filosofia de Hobbes e de Locke não passaria de uma mera especulação. A expressão Direitos Humanos teria sido a melhor opção para manifestar a pluralidade que se vivia naquela época; fundá-los na imutabilidade ou no individualismo seria condená-los a falência139.

Mesmo que se conceba a influência de Hobbes e de Locke para a redação da DUDH, lembra o autor que Locke possui um extenso trabalho acerca do direito de propriedade, entendido de forma irrefutável com um exemplo de direito social. Ademais, mesmo que se considere que os Direitos Humanos tenham se fundado no direito natural, em atenção ao artigo 1º da DUDH140, deve se admitir tal assertiva, entendendo-a como algo derivado da natureza humana e não propriamente do direito costumeiro ou positivo.

A par da influência das teorias clássicas do Direito que também são usadas por alguns para fracionar os Direitos Humanos, Matthew Craven considera que as teorias modernas já se baseiam em características moralmente importantes do ser

136 CRAVEN, Matthew. The international covenant on economic, social and cultural rights: a

perspective on its development. Oxford: Clarendon, 1998. p. 34.

137 NOZICK, Robert. Anarchy, state and utopia. Oxford: Blackwell, 1974. p. 22 e ss. 138 CRAVEN, op. cit., p. 10-11.

139 Id.; Ibid., p. 11.

140 Artigo 1º: todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão

humano ou em condições humanas, assim tem-se o exemplo de necessidades humanas, respeito igualitário e razoabilidade. No entanto, a teoria acerca da natureza dos direitos, que foi adotada, reflete o reconhecimento dos tipos de direitos consagrados, o que para Donnelly não há nada de errado em reconhecê-la, visto que “[...] o conteúdo é estipulado pela teoria particular da natureza humana que foi adotada”141.

Para Matthew Craven, há duas justificativas para a existência dos DESCs enquanto Direitos Humanos, a primeira está relacionada ao fato de que constituem condições essenciais para a própria realização dos direitos civis e políticos. Os aspectos materiais devem ser admitidos como instrumentos importantes para a liberdade do indivíduo. A segunda justificativa encontra assento no fato de que são direitos sem qualquer restrição, servindo, além disso, como elementos valiosos para a satisfação integral dos direitos civis e políticos, assim, por exemplo, tais direitos devem ser considerados universais, pois, em certa medida, estão relacionados à elementos essenciais da natureza física dos indivíduos, quer estes demonstrando necessidades físicas ou possibilidades fáticas de gozar de benefícios materiais e sociais142.