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4 A NOVA LEI DA TV A CABO E SEUS REFLEXOS NO SETOR

Nos últimos cinco anos, algumas questões sobre a regulamentação da relação do cinema com a TV voltaram à tona no debate público, movidas sobretudo por novos fatores políticos, econômicos e sociais. Devido às medidas de fomento implantadas desde 1991 pelo governo federal21, o setor cinematográfico brasileiro registrou números favoráveis a um maior crescimento, criando um cenário propício para um salto em relevância social e econômica. Alguns destaques desse crescimento, de 2009 a 2013, foram: um aumento de 72,7% no público dos títulos brasileiros, que passou de 16,1 milhões para 27,8 milhões; um acréscimo de 51,2% no número de filmes nacionais lançados no mesmo período, de 84 para 127 títulos; a quantidade de filmes brasileiros exibidos com mais de um milhão de espectadores passou de quatro para dez; o número total de salas de cinema aumentou de 2.110 para 2.679, sendo que as regiões Nordeste e Norte apresentaram as maiores taxas de expansão, com crescimento de 44,4% e 67,9% respectivamente22.

Ao mesmo tempo, o mercado de TV por assinatura no Brasil também cresceu e vive atualmente o seu período de maior expansão. Em 2013, totalizava 18,0223 milhões de assinaturas, mais que o dobro de 2009, e, para 2016, a previsão é de que alcance o total de 30 milhões de assinantes. Apesar de, segundo a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), o serviço de TV paga estar presente apenas em 28 de cada 100 domicílios brasileiros até o final de 2013, o segmento vai se consolidando cada vez mais como uma importante janela de exibição para o cinema brasileiro.

Associadas ao crescimento desses dois segmentos – TV por assinatura e cinema –, as novas oportunidades do setor audiovisual geradas pela convergência digital e a política geral adotada pelo governo Lula (2003-2010) e mantida no governo seguinte tiveram reflexos na política pública para o cinema no Brasil. Uma das medidas efetivamente adotadas de acordo com essa nova visão foi a Lei 12.485, em 2011, “a nova lei da TV a cabo”, que estabeleceu

21 Nesse caso, citam-se principalmente, a Lei Rouanet (8.313/91), que possibilitou que pessoas jurídicas ou físicas financiassem projetos culturais de um modo geral; a Lei do Audiovisual (Lei 8.685/93), que, baseada no modelo de renúncia fiscal, incentiva o investimento em obras audiovisuais e passou a ser utilizada, muitas vezes, em conjunto com a Lei Rouanet; e a MP 2.228/01, que criou a Agência Nacional do Cinema (Ancine) de fomento e regulação ao setor em específico.

22 Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual – Ancine - Informe de Acompanhamento do Mercado. Salas de Exibição. Informe Anual Preliminar 2013, Semanas 1 a 52 de 2013 (04 de janeiro de 2013 a 02 de janeiro de 2014).

23 Anatel: http://www.anatel.gov.br/Portal/exibirPortalNoticias.do?acao=carregaNoticia&codigo

um novo marco regulatório para a comunicação audiovisual de acesso condicionado – conceito que unifica as diferentes modalidades de prestação de serviços de TV paga (cabo, MMDS e DHT), antes regidas por normas diferentes. Para começar, com o objetivo de garantir a presença de mais conteúdo nacional e independente nos canais por subscrição, a nova lei determinou o conceito de “espaço qualificado”, que serviu de parâmetro para a regulamentação de vários dos seus dispositivos.

Assim, considerando-se espaço qualificado “o espaço total do canal de programação, excluindo-se conteúdos religiosos ou políticos, manifestações e eventos esportivos, concursos, publicidade, televendas, infomerciais, jogos eletrônicos, propaganda política obrigatória, conteúdo audiovisual veiculado em horário eleitoral gratuito, conteúdos jornalísticos e programas de auditório ancorados por apresentador”, as principais inovações trazidas pela lei como resultado dessa mudança na política brasileira para o audiovisual foram:

1 – Nos canais de espaço qualificado24, no mínimo 3 horas e 30 minutos semanais dos conteúdos veiculados no horário nobre (18h às 24h) devem ser brasileiros e integrar espaço qualificado, e metade deve ser produzida por produtora brasileira independente, sem vínculo com radiodifusoras ou programadoras25;

2 - Em todos os pacotes ofertados ao assinante, a cada três canais de espaço qualificado existentes no pacote, ao menos um deve ser canal brasileiro de espaço qualificado (a); dessa parcela mínima de canais brasileiros de espaço qualificado, pelo menos um terço deve ser programado por programadora brasileira independente (b); dos canais brasileiros de espaço qualificado a serem veiculados nos pacotes, ao menos dois26 deverão veicular, no mínimo, 12 horas diárias de conteúdo audiovisual brasileiro produzido por produtora audiovisual independente, três das quais em horário nobre27;

24 De acordo com a Instrução Normativa 100 da Ancine, que regulamenta a Lei 12.485/2011,

obras audiovisuais que constituem espaço qualificado são aquelas, seriadas ou não, dos tipos ficção, documentário, animação, reality show, videomusical e de variedades. Já os canais de espaço qualificado são aqueles que, no horário nobre, veiculam obras audiovisuais de espaço qualificado em mais da metade da grade de programação.

25 Lei 12.485/11, Art. 16.

26 Apesar de a exigência da lei ser de um canal brasileiro de espaço qualificado a cada três canais

de espaço qualificados existentes por pacote, entende-se que todos os pacotes sempre terão mais de um canal brasileiro de espaço qualificado, já que todos os pacotes básicos ofertados pelas operadoras no Brasil contêm no mínimo seis canais de espaço qualificado não brasileiros.

3 – A permissão para que as concessionárias de telefonia utilizem suas redes para fornecer serviços de TV paga, além de tornar o setor de TV por assinatura mais competitivo, aumentou a arrecadação da Ancine por meio da Condecine com entrada de novos agentes no mercado, gerando mais recursos para a indústria audiovisual brasileira28;

4 - Numa indicação em direção a uma política cinematográfica mais integrada com o setor televisivo, a mesma lei também transferiu a regulação do exercício das atividades de produção, programação e empacotamento29 de conteúdo audiovisual nesse segmento para a Ancine. Essas atividades, antes, eram reguladas pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que passa a regular, nesse caso, somente a distribuição30.

Em relação à primeira medida citada acima, a Lei nº12.485/11 estabeleceu que sua implantação ocorresse de forma gradual. Sendo assim, no primeiro ano a partir de sua publicação, os canais deveriam exibir 1 hora e 10 minutos por semana de programação nacional, metade dela independente, no horário nobre; no segundo ano, 2 horas e 20 minutos; a partir do terceiro ano, 3 horas e 30 minutos. Apesar da aprovação da referida norma ter acontecido em 12 de setembro de 2011, as chamadas cotas de conteúdo brasileiro entraram em vigor quase um ano depois, dia 2 de setembro de 2012, após sua regulamentação pela Instrução Normativa nº100 da Ancine e, por isso, quando já estava em vigor a exigência de 2 horas e 20 minutos por semana. Assim, o ano de 2013 representou o primeiro exercício completo de vigência desse dispositivo. Nesse ano ainda, a aplicação dos dispositivos da Lei 12.485/2011 referente às obrigações de veiculação de conteúdo brasileiro teve, até a semana iniciada em 15 de setembro, a indicação de um mínimo de 2h20min durante o horário nobre nos canais de espaço qualificado, passando para 3h30min após essa data.

Todas essas medidas já trouxeram benefícios para a indústria audiovisual brasileira. Numa análise realizada pela Ancine em 14 canais31, constatou-se que, de 2011 para 2013, houve um aumento de 285,6% no total de horas de conteúdo brasileiro exibido por eles (de

28 Lei 12.485/11, Art. 37, inciso 18º.

29 Empacotamento, de acordo com a Lei 12.485/2011: atividade de organização, em última instância, de canais de programação, inclusive nas modalidades avulsa de programação e avulsa de conteúdo programado, a serem distribuídos para o assinante.

30 Lei 12.485/11, Art. 9, parágrafo único.

31 AXN, Cinemax, HBO, HBO Family, HBO Plus, Maxprime, Sony, Telecine Action, Telecine Cult, Telecine Pipoca, Telecine Premium, Telecine Touch, TNT e Warner Channel.

1.007 horas e 30 minutos para 3.884 horas)32. A comprovação de que esse acréscimo foi mesmo provocado pela nova regra está no salto do número de horas de conteúdo brasileiro exibido por mês no conjunto desses 14 canais de agosto para setembro de 2012, quando a lei passou a vigorar, passando de 173 para 275 horas, um aumento de quase 60%. A terceira medida citada, por sua vez, impulsionou o aumento da arrecadação da Condecine em 17 vezes no mesmo período (ALCÂNTARA, 2013), gerando mais recursos para investimentos diretos no fomento ao cinema e ao setor audiovisual como um todo33.

A lei também causou mudanças relevantes nos pacotes ofertados. Em virtude do segundo dispositivo em destaque, o Canal Brasil, que antes era diferencial de vendas das operadoras, ofertado em pacotes mais caros, passou a integrar os pacotes mais básicos – e, por isso, mais baratos –, o que ampliou o seu alcance. Com 98,6% de sua programação anual constituída por conteúdo brasileiro, o Canal Brasil encontra-se apto a cumprir a obrigação de empacotamento (medida 2 acima) na condição de canal brasileiro de espaço qualificado.

O monitoramento da Ancine indicou também que o número de canais brasileiros de espaço qualificado (a), em virtude das novas exigências, aumentou de 13 para 2034, de 2012 para 2013, sendo que, dos sete novos canais, seis são programados por programadoras brasileiras independentes; e a quantidade de canais brasileiros de espaço qualificado que devem ser programados por programadoras brasileiras independentes (b) passou de sete para 13 no mesmo período.

A cota de conteúdo audiovisual estipulada pela Lei 12.485/11 foi sem dúvida uma revolução no marco regulatório do setor, mas ainda será preciso fazer mais para fomentá-lo de fato. Apesar do acréscimo evidente na quantidade de conteúdo audiovisual brasileiro exibidos nos canais analisados, a presença de obras nacionais nesse conjunto ainda é pequena,

32 As fontes utilizadas para o levantamento foram as grades de programação e as sinopses divulgadas pelos próprios canais monitorados. Revistas de programação disponibilizadas pelas operadoras, jornais de circulação nacional, sites especializados na Internet e textos jornalísticos foram utilizados para complementar as informações disponíveis. Devido ao fato de as grades e as sinopses elaboradas pelos canais serem divulgadas previamente à veiculação, eventuais alterações na programação não foram levadas em consideração nos dados apresentados.

33 O produto da arrecadação da Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional (Condecine) compõe o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), que aplica esses recursos em programas e projetos especiais de fomento voltados para o desenvolvimento das atividades cinematográficas e audiovisuais.

34 De acordo com a Ancine (Informe de Acompanhamento de Mercado – TV Paga – 2013), apesar do número de canais brasileiros de espaço qualificado ser de 23 em 2013, até junho de 2014, três deles ainda não estavam em operação e, por isso, não estão sendo considerados aqui.

correspondendo a apenas 3,5% da programação total de 2013. Alguns canais, mesmo tendo que cumprir a cota de conteúdo audiovisual, exibiram em 2013 menos de sete filmes brasileiros – em alguns casos o equivalente a 0,7% da quantidade total de longas-metragens exibidos nesse ano. Estão entre eles os canais Cinemax, Maxprime, HBO, HBO Plus e HBO Family35.

Os impactos da lei no fomento à produção independente podem ser avaliados de certa forma ao se observar os longas metragens brasileiros que tiveram dez ou mais exibições ao longo de 2013, que foram 98 no total. Com 69 exibições totais num conjunto de seis canais, todos pertencentes ao mesmo grupo de empresas programadoras36, o filme Cilada.com (2010) foi o brasileiro mais exibido na TV paga em 2013. O título é o 18º em público no cinema, com quase 3 milhões de espectadores. Trata-se ainda de uma comédia realizada em coprodução com a Globo Filmes. Na segunda posição, com 68 exibições, está outra comédia Globo Filmes – O Homem do Futuro (2010), que atingiu 1,2 milhão de espectadores nas salas de cinema.

Numa análise da relação direta entre o resultado de público em salas de cinema e o total de exibições programadas nos canais monitorados, o estudo da Ancine37 constatou que nenhuma obra com menos de 100 mil espectadores nos cinemas ultrapassaram a marca de 30 exibições programadas. Como no caso de O Mistério do Samba (2008), que foi transmitido 26 vezes no Canal Brasil e na GNT e teve um pouco mais de 34 mil de público no cinema. Por outro lado, Se Eu Fosse Você 2 (2009) e E Aí... Comeu? (2012), que atingiram, respectivamente, 6,1 milhões e 2,5 milhões, foram exibidos 55 e 49 vezes. Ambos são comédias Globo Filmes. Alguns filmes, no entanto, fogem dessa tendência, como Billi Pig (2011) e Gonzaga – De Pai pra Filho (2012), respectivamente com 46 e 20 exibições, mas com público no cinema de 257,7 mil e 1,5 milhão.

Os dados demonstram, portanto, que a exibição das obras brasileiras motivada pela vigência da Lei 12.485/2011, de certo modo, vem refletindo o resultado dessas obras nas salas de cinema ao invés de levar aos telespectadores títulos de produtoras independentes que pouco interesse despertaram nas telonas. O motivo pode ser óbvio: a venda de espaço

35 ANCINE – Superintendência de Acompanhamento de Mercado, Informe de Acompanhamento de Mercado, TV Paga, Monitoramento de Programação em 2013.

36 Megapix, Multishow, Telecine Action, Telecine Fun, Telecine Pipoca, Telecine Premium.

37 ANCINE – Superintendência de Acompanhamento de Mercado, Informe de Acompanhamento de Mercado, TV Paga, Monitoramento de Programação em 2013.

publicitário pelas programadoras de acordo com a previsão de audiência para determinado horário. Já em relação à produção dos filmes mais exibidos, percebe-se que, dos dez com mais exibições programadas em 201338, apenas um não é coprodução Globo Filmes (Tropa de Elite, de 2007), outro reflexo das salas de cinema, já que os títulos da produtora vinculada à maior rede de televisão do Brasil são os responsáveis pelas maiores bilheterias brasileiras desde 199539.

É possível observar que, dos 98 longas-metragens brasileiros com dez ou mais programações em 2013, 58 são coproduzidos ou apoiados pela Globo Filmes, o que representa quase 60% dos títulos mais exibidos. O dado mostra que, no que diz respeito ao mercado audiovisual brasileiro, a hegemonia dessa produtora nas telas de cinema do Brasil se reflete também na TV por assinatura, consequência natural do mercado, considerando-se que as Organizações Globo controla alguns dos principais canais de programação do país, como a rede Telecine, os canais Universal Channel, SyFy, Studio Universal e o SportTV.

Percebeu-se ainda no mesmo estudo que, de um modo geral, as obras de longa-metragem exibidas se restringem a canais de uma mesma programadora ou grupo de empresas programadoras. Dos 98 títulos nacionais com dez ou mais programações em 2013, apenas 30 estiveram presentes em diferentes grupos de programadores. Ou seja, com apenas uma pequena quantidade de filmes brasileiros, eles conseguem cumprir a sua cota de exibição semanal, veiculando-os repetidas vezes em distintos canais seus.

É certo que, se o objetivo de tal determinação é aumentar a produção e a circulação de conteúdo audiovisual brasileiro diversificado e de qualidade, deveria ser estabelecida primordialmente para a TV aberta para que fosse mais efetiva, como explicam Mecchi e Valente:

[...] num país como o Brasil (onde o acesso geral ao homevideo e à TV a cabo ainda é insipiente – mesmo que em aumento no primeiro caso), a exibição em TV aberta seria um primeiro e fundamental passo para a

divulgação do cinema nacional. O Homem que Copiava40, por exemplo, teve

38 Cilada.com (2010), O Homem do Futuro (2010), Não se Preocupe, Nada vai dar Certo! (2011), As Aventuras de Agamenon, o Repórter (2011), Qualquer Gato Vira-Lata (2011), Se Eu Fosse Você 2 (2008), E Aí, Comeu? (2012), Billi Pig (2011), Tropa de Elite (2007) e O Palhaço (2011).

39 Numa comparação dos dados da Ancine com as informações do site da produtora, observa-se que, das 61 obras nacionais que alcançaram mais de um milhão de espectadores nos cinemas, apenas nove não são produção ou coprodução da Globo Filmes.

40 Filme brasileiro lançado em 2003, que atraiu 664,7 mil espectadores às salas de cinema

em recente exibição na Rede Globo uma medição de 41 pontos no Ibope – o que significa um público aproximadamente cinco vezes maior do que aquele que atingiu nos cinemas. No entanto, o espaço dado pela Globo (e outras redes abertas) ao cinema nacional ainda é ínfimo e sazonal dentro de sua grade, amplamente tomada pela sua própria produção – e ousar mencionar qualquer coisa parecida com uma cota de telas na TV, como se sabe, costuma terminar em briga midiática e lobby político (Mecchi e Valente, 2006).

Enquanto a penetração da televisão por assinatura ainda é de 28% no total de casas com TV no país, tendo alcançado 18,0241 milhões de assinantes em 2013, a TV aberta atinge mais de 60 milhões de domicílios no Brasil. Nos canais abertos de TV, apesar de 78,9% do tempo de programação ser de obras brasileiras, apenas 5,21% dos programas exibidos correspondem a filmes e a maior parte deles é estrangeira: os longas-metragens estrangeiros representam 86,21% do total de filmes exibidos42. Nesse sentido, explica Jambeiro:

A TV por subscrição é ainda muito jovem no país e, dadas as condições socioeconômicas dos brasileiros, não conseguiu atingir suficiente número de assinantes para concorrer com a TV aberta. Além disso, sua programação segue o caminho do entretenimento, tal qual as emissoras que usam o espectro eletromagnético, deixando apenas alguns canais para programas específicos, geralmente de baixa audiência. Como a assinatura é muito cara para o nível de renda da maioria esmagadora da população brasileira, pelo menos até agora não parece ser este o caminho para que se assegure possibilidade real de diversidade de programação para os telespectadores (Jambeiro, 2008, p. 101).

Para estimular a concorrência, a nova lei autorizou a atuação das concessionárias de telefonia no fornecimento de serviços de TV paga. No entanto, não há nenhum impedimento para que essas empresas continuem formando parcerias entre si, possibilitando o controle de poucos canais por apenas um grupo de mídia, como o que ocorre no caso da Globo. Como as fusões, incorporações e associações entre as empresas são comuns nos negócios de comunicação, seria preciso que a regulamentação nesse setor tratasse também das estratégias comerciais, a fim de preservar a pluralidade de fontes e, com isso, incentivar a diversidade cultural.

Além disso, outro ponto crítico é que a autorização dada pela lei permite que as concessionárias de telefonia utilizem suas redes para fornecer serviços de TV paga, ampliando a estrutura de distribuição e possibilitando, com isso, que mais brasileiros tenham acesso ao

41 Anatel: http://www.anatel.gov.br/Portal/exibirPortalNoticias.do?acao=carregaNoticia&codigo

=33184.

42 ANCINE. Informe de acompanhamento do mercado da TV aberta. Monitoramento de

serviço talvez por um preço mais em conta. Esse serviço, no entanto, apesar de mais barato para o consumidor, seguirá sendo oferecido pelos mesmos grandes grupos de mídia que já o oferecem atualmente porque, mais uma vez, como tem acontecido na história da regulação dos meios de comunicação no Brasil, a norma tratou do suporte tecnológico e da ampliação da rede, deixando de lado questões como a formação de oligopólios, que, neste caso, podem atuar simultaneamente nas atividades de produção, programação, empacotamento e distribuição. Bolaño e Manso reforçam esse argumento:

O resultado efetivo do processo (de democratização da cultura) depende da ação dos atores hegemônicos no mercado e só poderia ser contrarrestada pela ação decisiva do Estado através de políticas públicas anticoncentração, promotoras da diversidade cultural e da produção local, regional e independente. Na ausência disso, são os grandes capitais que se beneficiarão inclusive da expansão da pequena produção, na medida em que, no setor audiovisual, a tendência atual parece ser de uma dominância do momento da distribuição/difusão, como já ocorre com a indústria cinematográfica há décadas (Bolaño e Manso, 2009, p. 97).

5 CONCLUSÕES

No que diz respeito ao fomento da produção cinematográfica nacional, a TV, tanto aberta quanto por assinatura, pode ser uma boa parceira, não só investindo na produção direta de filmes, como ajudando a divulgá-los, aquecendo o público para as salas de cinema e gerando, assim, um efeito multiplicador. No entanto, aqueles que elaboraram a legislação adotada até hoje para a atividade das emissoras de televisão no Brasil o fizeram de forma a atender aos interesses políticos e econômicos de grandes corporações e de congressistas, ao invés de atender aos interesses sociais, o que permitiu a formação de um oligopólio por parte da TV Globo, beneficiada financeiramente e politicamente pela ditadura militar no país até o final dos anos 80. No que diz respeito ao conteúdo, a formação do mercado com essas características geraram a homogeneização da estética e do discurso – que, depois da criação da Globo Filmes, em 1995, alcançou também as salas de cinema.

O poderio político praticado pelas redes televisivas, sobretudo a TV Globo – que, por conta do seu alcance faz o governo quase refém de suas imposições –, é um dos fatores que dificulta a implantação de uma política cinematográfica que envolva também os canais