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O apóstolo Pedro prega à multidão (3:11-26)

No documento A Mensagem de Atos - John-Stott (páginas 100-105)

Apegando-se ele a Pedro e a João, curado mas se agarrando a eles,

ainda não muito confiante, todo o povo correu atônito para junto deles, e se reuniram no pórtico chamado de Salomão (v. 11). Esse "pórtico" ou "alpendre" (BLH) era formado por duas fileiras de colunas de mármore com um telhado de cedro, que percorria toda a parede oriental do átrio externo. O próprio Jesus andara e ensinara ali, algumas vezes.7

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Pedro aproveitou a oportunidade para pregar. Da m esm a form a que o incidente do Pentecoste serviu de tema para o seu sermão, a cura do coxo tomou-se o pretexto para o segundo. Os dois acontecim entos eram obras poderosas do Cristo exaltado. Ambos eram sinais que o proclamavam como Senhor e Salvador. Am bos deixaram a multidão atônita.

Pedro começou atribuindo todo o crédito a Jesus. Israelitas, por

que vos m aravilhais disto?, perguntou (v. 1 2), p ro v av elm en te apontando para o coxo curado. E por que fita is os olhos em nós, provavelmente apontando para si mesmo e para João, como se pelo

nosso próprio poder ou piedade o tivéssemos feito andar? (v. 12). O que ele fez foi redirecionar o olhar daquela multidão para Jesus, em cujo nom e acontecera aquele poderoso milagre. Pois o Deus de

Abrãao, de Isaque e de Jacó, o Deus de nossos pais, glorificou a seu Servo Jesus (v. 13a). Com essa referência a Deus, Pedro expressou a

co n vicção de que o que era novo em Jesus gozava de um a co n tin u id ad e d ireta com o A ntigo T estam en to. E n tão, em co n traste com a honra que Deus dera a Jesu s, P edro é extremamente direto ao descrever a desonra quádrupla com que os habitantes de Jerusalém trataram o Mestre: 1) vós (o) traístes e 2)

negastes perante Pilatos (assim como Pedro o havia "negado" diante

de um a criada e de outros8), quando este havia decidido soltá-lo (v. 13b), 3) Vós negastes o Santo e o Justo, e pedistes que vos concedessem

um homicida (v. 14), exigindo assim "a condenação do inocente" e

"o perdão do culpado".9 4) Matastes o Autor da vida, um paradoxo p ertu rb ad o r, em que o próprio p ion eiro ou doador da v id a

(archegos, tem os dois significados) é privado da vida, a quem Deus,

revertendo maravilhosamente essa quádrupla rejeição, ressuscitou

dentre os mortos, e dessa grandiosa ressurreição nós (os apóstolos) somos testemunhas (v. 15). Assim, então, é pela f é em o nome de Jesus,

do Jesus antes rejeitado mas agora ressurreto e reinante, que foi fortalecido este coxo que agora vedes e reconheceis. Pedro continua, repetindo para enfatizar melhor, dessa vez, separando o nom e e a fé em questão. Pois foi o nome de Jesus (tudo o que ele é e fez), juntamente com a f é que vem dele, sendo despertada naqueles que entendem as implicações do seu nome, que deu a este saúde perfeita

na presença de todos vós (v. 16).

O aspecto mais notável no segundo sermão de Pedro, tal como do primeiro, é o seu fator cristocêntrico. Ele desviou os olhos da multidão do coxo curado e dos apóstolos e os fixou em Cristo, a quem os homens haviam rejeitado, matando-o, mas a quem Deus

vindicou, ressuscitando-o dentre os mortos, e cujo nome, uma vez ad o tad o pela fé, era poderoso o bastante para curar completamente o homem. Além disso, em seu testemunho acerca de Jesu s, Pedro lhe atribu i vários títulos sign ificativo s. Ele começou chamando-o de "Jesus Cristo, o Nazareno" (v. 6), mas, continuando, chamou-o de "Servo" de Deus (v. 13), que primeiro sofreu e depois foi glorificado, em cumprimento de Isaías 52:13ss. (cf. 18 e 26; 4:27,30). Depois, chamou-o de "o Santo e o Justo" (v. 14) e "o Autor [ou Pioneiro] da vida" (v. 15), enquanto que, na con clu são do serm ão, ele o id en tifico u com o o "p ro fe ta " prometido por Moisés (v. 22) e, diante do Sinédrio, como a pedra rejeitada que se tornou a pedra angular (4:11). Servo e Cristo, Santo e fon te da vid a, Profeta e Pedra — esses títulos exp ressam a singularidade de Jesus em seu sofrimento e glória, seu caráter e missão, sua revelação e redenção. Tudo isso está contido em seu "N om e" e ajuda a explicar o seu poder salvador.

Tendo exaltado o nome de Jesus, Pedro encerra seu serm ão desafian d o os ouvintes (irm ãos, ele os cham a), faland o da necessidade e das bênçãos do arrependimento. Eu sei, diz ele, que

o fizestes por ignorância, como também as vossas autoridades (v. 17). O

seu propósito, ao dizer isso, não era desculpá-los do pecado, nem dar a entender que o perdão era desnecessário, mas m ostrar a razão pela qual ele era possível. Pedro estava repetindo a distinção v etero testam en tária entre os pecados por "ig n o râ n c ia " e os pecados por "atrevim en to".10 E, embora não soubessem o que estavam fazendo, Deus sabia o que ele estava fazendo. Pois o que aconteceu a Jesus foi o cum prim ento da profecia: Deus assim

cumpriu o que dantes anunciara por boca de todos os profetas que o seu Cristo havia de padecer (v. 18). Entretanto, nem a ignorância, nem a

p red ição de D eus lhes ju stificav a. Eles p recisav am de arrependimento e conversão (v. 19a). Então, viriam três bênçãos sucessivas.

A primeira bênção é serem cancelados os vossos pecados (v. 19b), até mesmo o pecado de terem matado o Autor da vida. Exaleipho significa lavar, apagar. Ela é usada em Apocalipse, em referência ao ato de Deus limpar as nossas lágrimas11 e de Cristo se recusar a apagar os nossos nom es do livro da v id a.12 W illiam Barclay explica que "os escritos antigos eram feitos em papiros e a tinta usada continha ácido. Portanto, não se infiltrava no papiro como a tinta m oderna; ela sim plesmente 'repousava' sobre ele. Para apagar o escrito, bastava pegar uma esponja molhada e passar por

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cim a".13 Igualm ente, quando Deus nos perdoa os pecados, ele esquece o passado.14

A segunda bênção prometida é que da presença de Deus venham

tempos de refrigério (v. 20). A palavra grega anapsyxis pode significar

repouso, alívio ou refrigério. Nesse contexto, ela está se referindo ao co m p lem en to do perdão, pois Deus não apaga os n o sso s pecados sem dar o seu refrigério para as nossas almas.

A terceira bênção prometida é que envie ele o Cristo que já vos fo i

designado, Jesus (v. 20). Embora, nesse ínterim, ele continue nos

dando o seu perdão e refrigério, é necessário que o céu o receba até

aos tempos da restauração de todas as coisas, de que Deus falou por boca dos seu s san tos profetas desde a an tigu idade (v. 21). A lguns

comentaristas acreditam que o pronome "to d as", nessa frase se refere não ao universo que Deus "restaurará", mas às prom essas que "estabelecerá". Assim, uma versão inglesa traduz: "até aos tempos de estabelecer tudo o que Deus falou por boca dos seus santos profetas ..." Mas é mais natural entender apokatastasis como a "re sta u ra çã o " escato lógica, que Jesus- cham ou de "re g e n e ra çã o",15 quando a n atureza será lib ertad a de sua escravidão à dor e decadência16 e Deus fará um novo céu e uma nova terra.17 Essa perfeição final espera pela volta de Cristo.

Essas prom essas cristocêntricas - de perdão total (pecados apagados), refrigério espiritual e restauração universal - estavam todas contidas no Antigo Testamento. Assim, Pedro encerra com citações e alusões mais significativas. Ele se refere às três grandes co rren tes p ro féticas associad as a M oisés, Sam u el (e seus sucessores) e Abraão. Primeira: Disse, na verdade, M oisés: O Senhor

Deus vos suscitará dentre vossos irmãos um profeta semelhante a mim; a ele ouvireis em tudo quanto vos disser (v. 22). Acontecerá que toda alma que não ouvir a esse profeta, será exterminada do meio do povo (v. 23).18

Segunda: todos os profetas, a começar com Samuel, assim como todos

quantos depois falaram , também anunciaram estes dias, os dias do

Messias (v. 24). Embora essa seja uma afirmação muito genérica, talvez se refira principalmente à promessa de Deus, que começou com Samuel, de estabelecer o reino de Davi.19 Em todo caso, Pedro assegurou aos seus ouvintes, vós sois os filhos dos profetas e da aliança

que Deus estabeleceu com os vossos pais (v. 25a). É im pressionante

com o Pedro considera as várias correntes proféticas do Antigo Testam ento com o um testemunho único, aplicando-as a "estes d ias" porque se cum priram em Cristo e seu povo. Em terceiro lu g ar, D eus d isse a A braão: "N a tua d escen d ên cia serão

aben çoad as todas as nações da terra" (v. 25 b).20 Essa era a promessa básica do Antigo Testamento. Considere os beneficiados e a natureza das bênçãos prometidas. Quanto aos beneficiados,

tendo Deus ressuscitado ao seu Servo, enviou-o prim eiramente a vós outros para vos abençoar (v. 26a), os descendentes físicos de Abraão,

com o Paulo enfatiza várias vezes.21 M ais tarde, porém , Paulo argumenta, especialmente em suas cartas aos romanos e gálatas, que a bênção prometida é para todos os que crêem, incluindo os gentios que, pela fé, tornaram-se filhos espirituais de Abraão. E qual é a bênção? Não é somente o perdão, mas também a retidão. Pois Deus enviou seu servo Jesus Cristo para vos abençoar, no sentido

de que cada um se aparte das suas perversidades (v. 26).

R even d o esse serm ão de Pedro, é su rp reen d en te que ele ap resen te C risto à m ultidão "d e acordo com as E scritu ra s", sucessivam ente com o o servo sofredor (vs. 13, 18), o profeta semelhante a Moisés (vs. 22-23), o rei davídico (v. 24) e a semente de A braão (vs. 25-26). E se acrescen tarm os seu serm ão do Pentecoste e derm os uma olhada em seu discurso no Sinédrio (4:8ss.), veremos que é possível tecer uma tapeçaria bíblica que form a um retrato com pleto de C risto. O rg an izad os cro n olog icam en te de acordo com os aco n tecim en tos de su a carreira salvífica, os textos do Antigo Testamento declaram que ele é descendente de Davi (SI 132:11 = 2:30); que ele sofreu e m orreu por nós como servo de Deus (Is 53 = 2:23; 3:18); que a pedra que os construtores rejeitaram, ainda assim se tornou a pedra angular (SI 118:22 = 4:11), pois Deus o ressuscitou dentre os mortos (Is 52:13 = 2:25ss.), já que a morte não podia segurá-lo e Deus não permitiria que ele se deteriorasse (SI 16:8ss. = 2:24, 27, 31); que Deus então o exaltou à sua destra, para esperar o seu triunfo final (SI 110:1 = 2:34-35); que nesse ínterim, através dele seria derramado o Espírito Santo (J1 2:28ss. = 2:16ss., 33); que agora o evangelho deve ser pregado no mundo inteiro, até aos confins da terra (Is 57:19 = 2:39), apesar de ter sido profetizada uma oposição a ele (SI 2:lss. = 4:25­ 26); que as pessoas devem ouvi-lo ou receber o castigo pela sua desobediência (Dt 18:18-19 = 3:22-23); e que aqueles que ouvirem e atenderem herdarão a bênção prom etida a Abraão (Gn 12:3; 22:18 = 3:25-26).

Esse am plo testem unho acerca de Jesu s — aqu ele que foi rejeitado pelos homens mas aceito por Deus, em cumprimento da p ro fecia do A ntigo Testam ento; aquele que exig e o arrependimento e promete a bênção; aquele que é o autor e doador

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da vida, em nível físico ao coxo curado e espiritual àqueles que crêem - provocou a indignação e o antagonismo das autoridades. O diabo não pode suportar a exaltação de Jesus Cristo. Por isso ele in stig ou os m em bros do Sin éd rio para que p erseg u issem os apóstolos.

No documento A Mensagem de Atos - John-Stott (páginas 100-105)