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Foto 21 – Moldes vazados de letras e números

2.2 A DEFICIÊNCIA SENSORIAL VISUAL E A COMUNICAÇÃO

2.2.3 O comunicar e o conhecer pertence a cada um

A etimologia da palavra ‘percepção’ vem da raiz indo-europeia weid e significa ‘olhar para tomar conhecimento’. O termo ‘ver’ é originado do grego e significa ver, observar, conhecer, saber, informar. De acordo com Jorge (2011, p. 19), a filosofia foca a questão do olhar sobre dois prismas: a ideia de que a visão depende dos objetos, que é a base da teoria perceptiva. Nesta teoria há os seguidores Demócrito, Epicuro e Lucrécio. E a ideia de que a visão depende dos olhos que captam as formas dos objetos. Nesta teoria estão os seguidores Empédocles, que oferece base a uma teoria emissista, Pitágoras, Platão e os neoplatônicos.

Aristóteles (384-322 a.C) já defendia a ideia de que o estudo sobre as experiências dos sentidos pode revelar finalidades práticas. Ou seja, é de fundamental importância ter domínio sobre os fenômenos da natureza para transformá-los segundo às necessidades humanas. Nesse sentido, mais precisamente a partir do século XVI, em vários segmentos sociais e áreas de estudo inicialmente no campo das artes, revelam-se preocupações com o órgão da visão e com o sistema visual. Nos séculos XVII e XVIII, as imagens captadas pelo olhar estavam vinculadas às leis da Física. Falava-se de ‘câmaras escuras’ (o próprio homem), e o olho tinha como referencial as lentes. Pensava-se, então, que as imagens que se projetavam no fundo

escuro dessa câmara foram entendidas como luz natural e que o corpo humano não interferia nessa percepção.

No século XIX, as imagens são percebidas como produto de um olho fisiologicamente complexo. Estudos correlatos sobre o olho fizeram com que ele se tornasse o objeto de estudo sobre a visão. Todavia, outros estudos muito mais complexos, não mais sobre a visão, mas sobre a ausência da visão, apareceram nos séculos XIX em diante. No século XX, como resultado dos estudos de muitos anos, surge, no campo da psicologia do desenvolvimento, o estudo Fundamentos de Defectologia, escrito pelo médico, historiador e literato L. S. Vygotsky. A partir dos seus estudos, instituiu-se a concepção sociointeracionista, na qual se defende a ideia de que o ser humano se constitui por meio da interação com o meio em que está inserido. Todavia, vale à pena ressaltar que esta interação é dialética e complexa, e não uma somatória de aspectos biológicos inatos e adquiridos. Para Vygotsky, o indivíduo aprende em qualquer lugar e com todos.

Vygotsky afirma que a linguagem produz-se numa relação sociointeracionista e que a escrita é um sistema de representação simbólica da realidade, mediada pela relação dos homens com o mundo. A primeira tarefa, então, de uma investigação científica sobre língua e linguagem é revelar essa pré-história da linguagem escrita, mostrar o que leva as crianças a escrever, mostrar os pontos importantes pelos quais passa esse desenvolvimento pré-histórico e qual a sua relação com o aprendizado escolar (VYGOTSKY, 1997, p. 141). No que se refere à comunicação a partir desses estudos, pode-se concluir que: a fala é o modo de organizar o pensamento, e o desenvolvimento do pensamento é determinado pela linguagem. Isto é, pela experiência sociocultural do indivíduo; o crescimento intelectual da criança depende de seu domínio dos meios sociais de pensamento. Isto é, da linguagem constitutiva, própria do ser humano, que funciona como organizadora e planejadora do pensamento e da conduta, além de ter uma função comunicativa.

No que se refere ao sistema visual, que participa e é responsável fundamentalmente pelo processo de recepção e de captação de representações no contato sócio-interacionista dos indivíduos entre si e com o ambiente que os rodeia, Vygotsky, em sua obra Fundamentos da

Defectologia, dedica seus estudos às crianças cegas. Para Vygotsky (1997), as pesquisas

científicas e as opiniões sobre a DSV, mais precisamente sobre a cegueira, têm levantado falsas concepções e desvios sobre o assunto desde os primórdios, conduzindo a uma noção psicológica e social em diversos campos científicos e áreas de estudos, nos afastando da verdade.

Conforme Vygotsky (199ι, p. 99): “A cegueira não é meramente a ausência da visão (o fracasso de um órgão isolado). A cegueira causa uma total reestrutura de todas as potencialidades do organismo e personalidade [...]”. Essa assertiva implica em concluir que a criação, a personalidade, a organização, a criatividade, as novas ideias do indivíduo com DSV são extremamente prejudicadas pelo não funcionamento do sentido da visão. Para o autor, a cegueira não é um mero ‘defeito’ orgânico, muito menos, apenas a fraqueza de um dos órgãos dos sentidos, mas sim o comprometimento de habilidades que compõem o desenvolvimento do indivíduo. Por causa dessas dicotomias e estágios sobre o domínio do assunto DSV, se desenvolveram várias concepções e teorias sobre o tema.

De acordo com Vygotsky (1997), várias tendências embasaram as concepções sobre a cegueira. Segundo ele, as concepções sobre a DSV estiveram demarcadas por três grandes períodos históricos e sociais, conforme a descrição a seguir:

- O primeiro período – o mítico – refere-se à Antiguidade, à Idade Média e uma parte significativa da Idade Moderna. A DSV, nesse período, estava ligada às lendas, às histórias populares, às supertições, às crendices, aos medos e ao respeito pelo desconhecido. A pessoa com DSV estava, nesse sentido, desamparada, indefesa e abandonada. Como contraponto a essa situação, alguns grupos humanos nesses períodos consideravam os cegos como portadores de sabedoria, luz e talentos. Temos como exemplos: Homero30 e Demócrito31. As pessoas acreditavam que um dom se aportou no lugar da deficiência. Pois, se os cegos são últimos aqui, serão os primeiros no reino dos céus. Os espíritos dessas pessoas também eram considerados intangíveis.

- O segundo período – o ingênuo biológico – refere-se ao período da Renascença em diante. Nesse período, a preocupação com o desenvolvimento das ciências e com a instrução e educação para os cegos receberam atenção e qualificação. Acreditava- se que um órgão que não funcionava no corpo humano seria compensado por outro, em substituição. Como exemplo dessa concepção, com a falta da visão, a audição é aguçada. A natureza, nesse caso, é entendida como benevolente, que tira de um lado e repõe de outro. Outra explicação sobre a cegueira é que graças a essas compensações, explica-se o fato de inúmeros cegos serem músicos, artistas

30 Foi um poeta épico da Grécia Antiga, ao qual tradicionalmente se atribui a autoria dos poemas épicos Ilíada e

Odisseia.

e/ou cientistas e, por sua excepcional capacidade de audição parece ter um ‘sexto sentido’.

- O terceiro período – o moderno – refere-se a um período que é considerado estágio científico ou sociopolítico. Ou seja, pesquisas e investigações identificaram falhas e desvios na concepção ingênuo-biológica. Evidenciaram que, na falta de funcionamento do sentido da visão, as sensações tátil e auditiva são frequentemente desenvolvidas em grau inferior, e não em substituição como pensado até então. Não existe, dessa forma, reposição ou substituição de órgãos debilitados. A abordagem ingênua biológica, nesse caso, deve ser substituída por outra.

Entre o final do século XVIII e o início do século XIX, o fundador da educação para os cegos, V. Hauy, deixou marcas significativas no trabalho sobre o conhecimento e a educação formal para as pessoas com DSV. A sua teoria esclareceu não apenas as dúvidas do terceiro período, como também as demais questões surgidas nas ciências a partir do terceiro período, definido por Vygotsky. O trabalho de V. Hauy deu muitos exemplos para as teorias que foram se formando sobre o funcionamento dos sentidos e a aprendizagem. No que se refere aos estudos de Vygotsky (1997) sobre as pessoas com DSV, a partir deles foram se desmistificando as concepções sobre ‘o sistema compensatório’, e as pesquisas avançaram para entender como ocorre o processo psico-sociológico dessas pessoas.

Conforme explica Vygotsky (1997), o funcionamento do sistema nervoso e o aparelho mental assumem a tarefa da compensação. Ou seja, a função afetada do órgão em mau funcionamento e o organismo humano lutam para ancorar esse organismo em seus pontos enfraquecidos e ameaçados. Isto porque, o contato externo com o ambiente pelas pessoas com DSV causa conflitos e disparidades entre órgãos e função. Contudo, esse mesmo processo conduz organicamente e psicologicamente a pessoa com DSV a motivar-se pela luta de oportunidades.

Nesse sentido, a deficiência se transforma em competência, a fraqueza em força e a inferioridade em superioridade. Para exemplificar esse pensamento, pode-se citar o autor N. Saunderson (1682-1739), matemático cego que compilou um livro de geometria, e Alfred Adler32, que nas duas décadas iniciais do século XX, depois de muitas atividades em favor

32 Adler começou a sua carreira médica como um oftalmologista, mas logo mudou para a prática geral e

estabeleceu seu escritório em uma parte menos abastada de Viena, frente ao Prater, um parque de diversões, uma combinação com o circo. Seus clientes incluíam pessoas do circo, e tem sido sugerido que as forças incomuns e fracas dos artistas levaram a seus insights sobre ‘inferioridade de órgãos’ e ‘compensação’.

dos desfavorecidos e da superação de seus próprios limites físicos, evidenciou a superação de pessoas com DSV, inclusive entre os estudantes de Artes. Para A. Adler, e segundo Vygotsky (1997), com a deficiência na fala e na visão, por exemplo, as habilidades motoras se desenvolvem. Ou seja, os conflitos e os sentimentos de inferioridade social para as pessoas com deficiências podem funcionar psicologicamente com força e ação inversa.

De acordo com essa concepção, a pessoa com DSV percebe que não tem o sentido da visão e se sente inferior. Mas a sua luta não é para recolocar a capacidade da visão, mas, sim, para vencer o conflito social e o impulso para superar a cegueira. Nesse sentido, a superação passa a ter outra vertente, a de que esse fenômeno tem uma correlação com questões da psicologia social. A explicação para o sistema compensatório, que ocorre nesses casos, conforme afirma Vygotsky (1997), tem como parâmetro e embasamento os estudos psicossociais.

De acordo com essas afirmações, a atenção e a memória podem ser desenvolvidas, não porque essas habilidades sejam compensadas pela audição à falta do funcionamento do sistema visual, mas sim porque a não dispersão da visão por movimentos e imagens e a tendência global para superação e compensação da cegueira são desenvolvidas pelas pessoas com DSV. O uso da linguagem e da oralidade são exemplos de instrumentos usados para vencer as consequências da cegueira. Esse empenho e esforço do indivíduo com DSV se deve, também, à expectativa de manter contato com o mundo exterior. A psicologia, nesses casos, vence a fisiologia.

Dessa forma, a compensação passa a não ser mais entendida como era no segundo período histórico delineado por Vygotsky (1997), como se fosse possível um órgão substituir ou superar a falta do funcionamento de outro. No entanto, a compensação passa a ser uma superestrutura psicológica e orgânica desenvolvida por uma pessoa com DSV para superar os obstáculos e as frustrações criadas no contexto social. Embora o conceito de compensação não seja científico, pode explicar a cegueira como um problema social e psicológico. Ou seja, a compensação por uma deficiência acontece de forma tão harmoniosa para o indivíduo que torna-se a base de sua personalidade. Negá-la significa para essa pessoa negar a si própria.

Então, conforme afirma Vygotsky (1997), se V. Hauy encontrou uma solução na educação para resolver os problemas básicos dos indivíduos com DSVs, à nossa Era cabe, além de compreender a DSV como um problema sociopolítico, elaborar subsídios e recursos para que essas pessoas possam trabalhar, qualificar suas vidas e desenvolver suas

potencialidades. Pois, conforme discorre Vygotsky (199ι, p. 113), “[...] uma nova sociedade criará um novo tipo de pessoas cegas [...]”.

2.2.3.1 O Sistema Compensatório Social e a acessibilidade

Ao reportar-se ao sentido literal de comunicação, comunicare, termo latino que significa ‘tornar comum’ e/ou ‘associar’, segundo Vilalba (2006), pode-se dar a relevância que a comunicação humana tem como um direito e um privilégio para todos os indivíduos. Quando se tem dificuldade para obtê-la como intermediária das inter-relações cotidianas, pode-se afirmar que as pessoas têm dificuldade em outros campos e áreas de sua vida, tal qual ficar sem acesso ao conhecimento. Pois a comunicação permite a troca de informações, além de, segundo seus meios, poder contribuir para superar limites, tempo e espaços. Os diversos tipos de linguagens, nesse caso, facilitam e aproximam as pessoas com êxito na comunicação.

Na parte introdutória do livro Introdução à Linguística – domínios e fronteiras de Mussalim e Bentes (2006), Tânia Maria Alkmim33 afirma que:

[...] Linguagem e sociedade estão ligadas entre si de modo inquestionável. Mais que isso, podemos afirmar que essa relação é a base do se humano. A história da humanidade é a história dos seres organizados em sociedade e detentores de um sistema de comunicação oral, ou seja, de uma Língua.(p. 21).

Jakobson (1960), por sua vez, não restringe essa relação sociedade e indivíduo apenas aos domínios sobre a Língua nacional, mas também abrange o processo comunicativo de uma forma mais ampla, referindo-se às emoções, ao contato afetivo entre as pessoas, à relação desses indivíduos com seu contexto e ambiente natural. Para o autor, as relações estabelecidas entre a humanidade por meio da linguagem pode representar experiência, desenvolvimento, coerção e organização cultural e social.

Ao estar impossibilitado de se comunicar por meio das diversas linguagens, o sujeito, então, priva-se de se relacionar com o mundo que o rodeia e de se desenvolver. O Decreto n. 5296/2004, iniciado em 8 de novembro de 2000, quando foi sancionada a Lei 10.048, é uma das formas legais das pessoas com deficiência exigirem seus direitos em relação aos aspectos comunicacionais (ORRICO; FERNANDES, 2012). Em destaque, podem-se citar os direitos que podem ser pleiteados nesta Lei de Acessibilidade, que estão relacionados ao direito à comunicação:

33 Tânia Maria Alkmim é professora do Departamento de Linguística do Instituto de Estudos e Linguagem Unicamp. É Mestre em Linguística pela Unicamp e Doutora em Linguística pela Université Paris V (Sorbonne).

- “A sinalização ambiental para orientação” (p. 83).

- “Divulgação, em lugar, visível, do direito de atendimento prioritário das pessoas portadoras de deficiência ou mobilidade reduzida” (p. 83).

- “Admissão de entrada e permanência de cão guia ou cão guia de acompanhamento junto da pessoa portadora de deficiência [...]” (p. 83) sensorial visual.

- “A existência de local de atendimento específico para pessoas referidas [...]” (p. 83).

- “Serviços de atendimento para pessoas com deficiência auditiva, prestado por intérpretes ou pessoas capacitadas em Língua Brasileira de Sinais [...]” (p. 84). - “Divulgação em lugar visível, do direito do atendimento prioritário às pessoas

com deficiência [...]” (p. 83).

- “Admissão de entrada e permanência de cão guia ou cão guia de acompanhamento junto às pessoas portadoras de deficiência ou de treinador nos locais dispostos no caput 5º[...]” (p. 84).

- “Eliminação de barreiras na comunicação e estabelecimento de mecanismos e alternativas técnicas que tornem acessíveis os sistemas de comunicação e sinalização às pessoas portadoras de deficiência sensorial e com dificuldade de comunicação, para garantir-lhe o direito de acesso à informação, à comunicação, ao trabalho, à educação, ao transporte, à cultura, ao esporte e ao lazer” (p. 84).

A última citação da lei, descrita anteriormente, se apresenta como o direito mais interessante a ser conquistado pelas pessoas com deficiências, especialmente as pessoas com DSV. Isto porque uma sociedade construída com base na equidade de direitos não apenas deve considerar as diferenças, mas deve também se preparar por meios de recursos e instrumentos materiais que supram as necessidades de todos os seus componentes.

Os meios de comunicação, nesse sentido, referem-se a uns dos muitos recursos julgados como indispensáveis às relações humanas entre si e com os outros elementos da natureza. Recursos esses que, por sua vez, se incorporam aos demais subsídios indispensáveis, que, no decorrer da história da humanidade, vêm sendo aprimorados para obtermos os mais variados objetivos. No entanto, quando os meios de comunicação ou qualquer outro instrumento tecnológico não serve para suprir as necessidades das pessoas de uma

determinada sociedade, tornam-se apenas vias que desequilibram a vida e criam desigualdades e injustiças.

Vygotsky (1997), ao tratar do desenvolvimento da pessoa com deficiência e, por consequência, com limitações orgânicas e funcionais, questiona o pensamento que afirma que uma função física, intelectual ou sensorial dos sentidos compense a outra, ou que a não funcionalidade de um dos órgãos se recupere em outro órgão que se torne eficiente. A compensação ou colaboração presentes nos estudos de Vygotsky (1997) referem-se ao posicionamento da pessoa diante da deficiência e ao que esse indivíduo faz com sua estrutura física, emocional e psicológica para superar esses limites. Pois, para o autor, as consequências sociais do ‘defeito’ são confirmadas e consolidadas no âmbito social.

Então, uma sociedade preocupada com as carências de seus componentes deve mobilizar-se para criar meios, também artificiais, e construir outras mediações para que sejam supridas as necessidades e qualificadas as potencialidades de todas as pessoas que a compõem, especialmente as pessoas portadoras de deficiência.

Nesse sentido, Mcluhan (2011), ao afirmar que os meios são extensões do homem, abrange, também, os instrumentos naturais e artificiais para que a pessoa alcance aquilo que não consegue sem essas extensões. Nessa ideia se incluem as necessidades básicas como moradia, recursos para o trabalho e para o lazer e todos os meios capazes de superar e compensar a falta de algo que o ser humano necessita. “[...] Que os nossos sentidos humanos de que os meios são extensões, também se constituem em tributos fixos sobre as nossas energias pessoais e que também configuram a consciência e a experiência de cada um de nós [...]” (p. 37).

Isto implica em afirmar que os responsáveis pelas políticas públicas de uma sociedade veem, muitas vezes, na construção desses meios apenas a extensão de sua própria vaidade e do seu narcisismo, sem que o progresso confira a construção de recursos materiais que supram as indigências dos membros dessa sociedade e que promovam, portanto, e antes de tudo, equidade social permanente. Pois, conforme discorre Mcluhan (2011): “Já explicamos que os meios, ou extensões do homem, são agentes ‘produtores de conhecimento’, mas não agentes ‘produtores de consciência’[...]” (p. θι).

Essa forma de organizar a sociedade com base no funcionamento de um sistema compensatório social, conforme o pensamento de Vygotsky (1997), implica em realizar feituras instrumentais e construir recursos didáticos de acessibilidade que sirvam para exercitar as habilidades e desenvolver competências específicas de cada sujeito. Para Gardner (1994), o sucesso institucional educacional formal, ou não, está ligado ao fato de descobrir

alternativas e meios para que o exercício das múltiplas inteligências, das quais os indivíduos mesmo com algum tipo de deficiência podem desenvolver, seja acessível. Sendo assim, a capacidade desenvolvida de responder às diversas circunstâncias e condições humanas individuais se projetará em benefício de toda uma comunidade.

Na teoria de Gardner (1994) sobre as múltiplas inteligências, fundamenta-se a pluralidade da mente e a impossibilidade de medir a inteligência, pois além do desenvolvimento cognitivo, as pessoas, apesar de serem portadoras de alguma deficiência, podem usar e expressar, a partir de vários sistemas simbólicos utilizados no contexto social, a sua forma pessoal e singular de desenvolver habilidades. Para o autor, os recursos e as atividades para o desenvolvimento de habilidades devem ser construídos tendo como perspectiva o fato de que as inteligências se organizam de forma horizontal e não vertical.

Mediante a essa constatação de Gardner (1994), é possível compreender que no lugar de uma faculdade mental geral, como a memória, existam outras formas individuais de percepção, de conhecimento, de linguagem e de comunicação. Sendo assim, para as pessoas com DSV, a teoria das múltiplas inteligências é capaz de responder criativamente aos problemas gerados socialmente, levando-se em conta a sua deficiência. Dessa forma, também, o poder político e governamental de cada segmento social deverá ser capaz de recriar alternativas capazes de auxiliar na inclusão dessas pessoas em processos indispensáveis à vida em sociedade, tais quais a comunicação e a educação.

O respeito à individualidade e às diferenças torna-se, assim, a estratégia mais adequada para criar o equilíbrio entre as deficiências e intermediar a inclusão. Pois a aquisição do conhecimento e a maneira de se comunicar pertence a cada um. Conforme afirma Buscaglia (1997), se cada um de nós é diferente, tem experiência diferente, recebe o sol e projeta a sombra de modo diferente, por que então, nós queremos ser iguais? Para o autor, um país que se preocupa com as pessoas com deficiência é aquele que se prepara para