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Foto 21 – Moldes vazados de letras e números

2.3 O SISTEMA INSTITUCIONAL DE ENSINO DO CAMPO DE PESQUISA IN LOCUS

2.3.5 O sistema institucional brasileiro do século XXI

O sistema institucional das escolas do Brasil de hoje é resultado de toda a complexidade da história de quinhentos anos desde sua colonização, já evidenciados nesse trabalho, anteriormente. No entanto, para compreender o percurso que o terceiro milênio impõe à educação daqui para frente, é necessário se deter nas mudanças da segunda metade do século XX e nas expectativas do presente século. Conforme afirma Grispun (2011, p. 96- 97):

[...] conhecer o tipo de sociedade existente no Brasil de hoje e as condições históricas de seu desenvolvimento, bem como analisar as forças sociais que dominam sua estrutura de poder e os objetivos subjacentes às diversas políticas econômicas, sociais e culturais impostas pelos grupos dominantes, é fundamental para que possamos conhecer a realidade educacional de nosso país.

Diante de tantos desafios que a educação enfrenta, na sociedade pós-moderna, o que não se pode negar é que existam propostas políticas pedagógicas insuficientes, para esse enfrentamento. No entanto, há muitas ações nas instituições de ensino, que por vários motivos, ainda mostram-se anacrônicas. Estudos recentes de Campbell (2009) identificam as inúmeras Leis e demais regulamentos, que desde 1824 (data da primeira Constituição Brasileira), garantem o direito à instrução e promovem a minimizam à exclusão, a partir da educação escolar.

Nos quadros a seguir estão listadas algumas datas importantes, que no decorrer do século XIX proporcionaram direitos e, também, posicionamentos dos interessados pela

educação e de áreas afins, frente à luta pela inclusão, à democratização e à emancipação da classe popular.

Quadro 10 – Leis e manifestações que influenciaram o perfil político e educacional entre os séculos XIX e XX.

1824 A primeira Constituição brasileira garantiu como direito a instrução primária e gratuita para todos os cidadãos.

O modelo sociopolítico existente era caracterizado por privilégios para a nobreza.

A população (sem consciência) não buscava espontaneamente o direito à escola.

Frequência às escolas primárias impostas por coerção, exigência e obrigatoriedade.

1827 Criação da Lei Geral relativa ao ensino elementar, com o surgimento de escolas primárias em todas as vilas mais populosas.

Tentativa de descentralização do ensino. Reivindicação ou remuneração de professores. Currículo diferenciado para meninos e meninas.

1834 A Educação passou a ser responsabilidade das províncias.

As escolas de primeiras letras foram praticamente ignoradas pelas autoridades brasileiras.

1837 Em 2 de dezembro de 1837 foi fundado o Colégio Pedro II, primeiro colégio de instrução secundário oficial. Surge como um elemento fortalecedor do Estado e como agência formadora da nação brasileira em educação e cultura.

O modelo de instituição pública foi mantenedora das elites, da Corte e das províncias.

1843 Criação do único colégio a conferir o grau de Bacharel em Letras, com preparação de exames preparatórios para ingresso nas escolas superiores. A educação formou um considerável grupo de homens públicos e intelectuais do 2.º Reinado.

O Ensino Superior limita-se: às Academias Militares, às Escolas de Medicina de Salvador e do Rio de Janeiro e às faculdades de Direito de Olinda e São Paulo.

1889 Ensino lento e irregular, apesar da Proclamação da República e da expansão do Ensino Superior como formação de profissionais liberais.

Fonte: Campbell (2009, p. 15-17).

Em alguns dos períodos do contexto sinalizado no quadro anterior é importante destacar que, apesar de todas as dificuldades na realização da aplicação dos direitos descritos nas leis, também pode-se perceber o empreendimento das lideranças populares e de alguns teóricos esclarecidos para tornar efetivo as suas aplicações. Para Campbell (2009), as reivindicações se apresentam com um dos requisitos para o desenvolvimento do indivíduo e da nação. Isto porque, do ponto de vista da autora, a escola enquanto instituição social é a única saída para diminuir as desigualdades.

O quadro a seguir é apresentado para acentuar a continuidade de fatos tensos, complexos e, por vezes contraditórios, ocorridos no século XIX e tiveram continuidade no século XX.

Quadro 11 – Conflitos e conquistas marcantes do século XX.

1920 Tensões e conflitos por causa dos processos de urbanização, de industrialização e do recebimento de imigrantes estrangeiros.

Período que se caracteriza por tentativas de mudanças da estrutura de poder agrário para urbano e da redefinição do papel do Estado.

A burguesia percebe que alfabetização das massas de trabalhadores é uma forma de ganhar votos.

A melhoria do ensino é vista como requisito para o desenvolvimento nacional.

O ensino acadêmico serve aos filhos da classe elitista e a escola técnica e primária para os filhos das classes do proletariado urbano.

Mudança do discurso sobre a educação popular com destaque para a política educacional a partir da interferência de grandes pensadores, tais como: Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Lourenço Filho e Almeida Júnior.

1930 Surge o movimento Entusiasmo pela Educação que enfatizava os aspectos quantitativos da educação e resumiu-se na ideia da expansão da rede escolar e na tarefa de alfabetizar o povo. E o Movimento Pedagógico que priorizava a melhoria das condições pedagógicas e didáticas e a criação das primeiras faculdades brasileiras.

1932 Verificação da democratização do ensino a partir do Manifesto dos Pioneiros, que defendiam uma educação nova e pragmática. Propõe-se a por fim a servidão aos interesses de classes elitistas.

Movimentos de reformas do ensino nos estados da Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Distrito Federal (RJ), que buscava a laicidade, gratuidade e aprofundamento nos conteúdos de estudo, assentam a escola unificada. 1934 A Constituição no Artigo 150.ª estabeleceu a necessidade do Plano

Nacional da Educação (PNE) para coordenar e supervisionar as atividades de ensino em todos os níveis.

Implantam-se, de fato, a gratuidade e obrigatoriedade do Ensino Primário. 1937 Na Constituição acrescenta-se, introduz-se o Ensino Profissionalizante

para as classes menos privilegiadas. No entanto, os excluídos saíam da escola ao concluir a escola primária.

Apenas na década de 1940 os planos governamentais contemplam as questões dos jovens e adultos e dos excluídos.

1942 Criação do fundo de ensino, com 25% à Educação de Adultos.

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) visava coordenar os planos anuais de ensino supletivo e oferecer o Serviço de Educação de Adultos (SEA).

Incorpora-se a grande massa de analfabetos à redemocratização do país. Ou seja, a cidadania deveria ser conseguida pelo voto. Então, no país a preocupação deveria voltar-se para os analfabetos.

Continuação Quadro 11.

De 1939 a 1945

Ímpetos reformistas de cunho popular, mesmo pós-guerra.

Surgem movimentos em prol da escola pública, universal e gratuita com repercussão diretamente no Congresso Nacional.

Culminância da luta pelos direitos com a divulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação n.º 4.024/61, efetivada em 1961.

1961 Efetivação da Lei n.º 4.024/61. Redemocratização do ensino.

Ímpeto reformista de cunho popular.

1964 Golpe de Estado tentou silenciar o trabalho desenvolvido pelo Movimento de Educação Brasileira, pois pregava contra as posições da política emergente. Com propagação e difusão nos setores católicos, organizações não governamentais (ONGs), baseada nas ideias de Paulo Freire.

1960 a 1980 O Regime Militar tentou anular a visão política dos movimentos populares e a visão educacional baseada nas ideias de Paulo Freire.

1971 Promulgação da Lei 5.692/71.

Ampliou-se o direito formal da educação e o atendimento a Educação de Jovens e Adultos (EJA).

1985 a 1993 Foram repensados os objetivos do Movimento Brasileiro de Alfabetização (MOBRAL), mudando seu nome para Fundação Educar.

A Constituição de 1988 assegura o Ensino Fundamental para todos independente da idade com regras definidas na LDB.

Durante o governo de Fernando Collor é extinta a Fundação Educar. Com impeachment de Collor iniciam-se projetos e políticas com vistas à extinção do analfabetismo.

2000 Em torno do Plano Decenal de Educação para Todos (PDET) firma-se acordo junto a Organização das Nações Unidas (ONU) com objetivo de organizar ações capazes de minimizar o déficit de escolarização.

Fonte: Campbell (2009, p. 18-22).

Como se pode observar no quadro anterior, muitas foram as dificuldades e as conquistas relativas ao direito à educação no século XX. Entretanto, como afirma Bourdieu (2001), a ação educadora e a escola tem tanto o poder de simular a inclusão quanto de legitimar as desigualdades. Portanto, não bastam as leis, nem tão pouco as ações sem elas. É preciso um esforço concreto de pessoas, dentro da instituição escolar, a favor da inclusão, para que as leis se materializem. Pois, de acordo as ideias defendidas pelo o autor, a instituição escolar ou o sistema de ensino recebe a função de produção das diferenças cognitivas, pois têm muitos dos mecanismos responsáveis pela produção das exclusões e das desigualdades sociais: um das estruturas sociais; outro das estruturas mentais ou do conhecimento.

Ao correlacionar o pensamento de Bourdieu (2001) e de Aranha (2001) podemos detectar mais um foco abordado sobre a inter-relação escola e sociedade: o de que não basta erguer a bandeira da inclusão, para que a educação cumpra seu papel social. Mas sim, se faz

necessário que haja uma postura política educacional, diante da demanda de problemas que emergem da sociedade e se alojam nas escolas. Afinal, a instituição escolar e seus membros podem exercer tanto o poder de regulação quanto o de emancipação sobre: o indivíduo, o seu modo de pensar e de agir.

Sob esse prisma é importante destacar o papel dos envolvidos no processo de construção sócio-educacional, bem como na supervisão sobre as práticas institucionais educativas, que têm o papel ativo na apropriação de conteúdos, necessários ao desenvolvimento de capacidades, que os ajudam na compreensão da realidade. Além de que essas práticas podem promover ou não a participação de cada um nas relações sociais, políticas e culturais do contexto particular e coletivo, onde estão inseridas as instituições.

A escola pública, nesse sentido, se apresenta como um modelo sistêmico de organização que pode simplesmente reproduzir as ideologias na qual foi fundamentada. Nesse caso, a função dela é socializar as pessoas, de acordo com as exigências extramuros. Ou pode intervir na realidade apresentada e criar rupturas e brechas que propiciem o acesso à comunicação e à informação, a fim de desenvolver autonomia e cidadania.

2.3.5.1 O sistema institucional da Secretaria de Estado de Educação no Distrito Federal

Teoricamente, as instituições educacionais públicas do Distrito Federal (DF) são entendidas como lócus de divulgação e de sistematização do saber construído historicamente nos seus diferentes estágios de produção. Na contemporaneidade, assume-se como uma instância articuladora do conhecimento e como instrumento capaz de libertar o indivíduo das relações de opressão, dominação e de se comprometer com a construção de uma sociedade democrática e emancipada (BRASIL, 2004).

Amparada pela ideologia anteriormente descrita, a Secretaria de Estado de Educação (SEE) espera que cada instituição educacional no DF tenha como base norteadora as suas diretrizes, que por sua vez estão respaldadas pela Constituição Nacional, pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) e pelos demais regulamentos que visam ao desenvolvimento humano e ao cumprimento das especificidades da educação. Numa ordem hierárquica, de responsabilidades e de supervisão desses ideais, estão dispostos:

1. O Ministério da Educação50, que disponibiliza os Referenciais Curriculares para a Educação Infantil, Ensino Fundamental e Médio; os Parâmetros Curriculares Nacionais para todas as séries e para a Educação de Jovens e Adultos (EJA); os desafios para Educação Especial frente à LDB; e os parâmetros para Educação Especial.

2. O Conselho Nacional de Educação que disponibiliza as Diretrizes Curriculares Nacionais para todas as séries, até o Ensino Médio, e para a formação de docentes na modalidade normal, EJA, e para Educação Especial. Em observância à Resolução nº 2, de 19 de abril de 1999.

3. O Conselho de Educação do Distrito Federal, que disponibiliza normas para o sistema de Ensino do Distrito Federal em observância às disposições da LDB.

4. O Regimento Escolar das Instituições Educacionais da Rede Pública de Ensino do Distrito Federal, que disponibiliza orientações gerais para todas as séries da educação básica; o Plano Orientador das Ações de Educação Especial nas Escolas Públicas do Distrito Federal, 2005; os currículos da Educação Básica das escolas públicas do DF, na qual a Educação Especial deve se basear as adequações para o Ensino Especial.

Segundo a Resolução nº 1/200 – CEDF, Art. 142, as propostas resultantes desses documentos orientadores devem ter como escopo os fundamentos histórico-sócio-culturais, epistemológicos e didático-pedagógicos na realização da práxis educativa. No que se refere à Educação Especial, ela tem os mesmos parâmetros, no entanto, deve se adequar e se estruturar para atender à demanda.

O Atendimento Educacional Especializado (AEE), nesse caso, refere-se aos procedimentos e à estruturação para acolher as pessoas com dificuldades de aprendizagem e deficiências físicas, psicológicas e mentais, com difícil adaptação à escola regular. Embora a escola inclusiva se refira a todos os estabelecimentos de ensino que, de acordo com as orientações das leis e regulamentos que norteiam suas ações, deveriam ter estrutura física, recursos materiais e profissionais especializados para o AEE, mas não é isto que acontece. No quadro a seguir estão expostos as tipologias e os tipos de atendimento da rede pública de ensino da SEE do DF.

50 O Ministério da Educação foi criado na década 1930, logo após a chegada de Getúlio Vargas ao poder. Com o nome inicial de Ministério da Educação e Saúde Pública, a instituição desenvolvia atividades pertinentes a vários ministérios como saúde, esporte, educação e meio ambiente. Até então, os assuntos ligados à educação eram tratados pelo Departamento Nacional do Ensino, ligado ao Ministério da Justiça.

Quadro 12 – Tipologias e tipos de atendimentos da rede pública de ensino do DF.

Sigla Tipologia Quantidade

CEI Centro de Educação Infantil 22

JI Jardim de Infância 26

CAIC Centro de Atenção Integrada à Criança

14

EC Escola Classe 310

CEF Centro de Ensino Fundamental 165

EP Escola Parque 05

CIL Centro Interescolar de Línguas 08

CEE Centro de Ensino Especial 13

CED Centro Educacional 42

CEM Centro de Ensino Médio 34

EJA Educação de Jovens e Adultos 01

CEP Centro de Educação

Profissional

00

O total de escolas públicas no Distrito Federal é de 645. Sendo que 572 dessas escolas são urbanas e 75, rurais. A tipologia dessas escolas, conforme o quadro 9, define o tipo de atendimento que elas prestam para a comunidade do DF. No caso da cidade do Gama-DF, local de realização desta pesquisa, há um total de 51 escolas, 44 delas são urbanas e 7 são rurais. O DF possui 13 Centros de Ensinos Especiais, sendo que na cidade do Gama há apenas o CEE 1.

A função do Centro de Ensino Especial é a de atender, especificamente, a Educação Especial como modalidade de educação escolar ofertada na Rede Pública de Ensino do Distrito Federal para estudantes com: Deficiência Intelectual, Deficiência Sensorial Auditiva, Deficiência Sensorial Visual, Deficiência Física, Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), Deficiência Múltipla, Surdo Cegueira e Altas Habilidades/Superdotação. De acordo com a recomendação da legislação em vigor, o objetivo da SEE/DF é cumprir o compromisso de promover a igualdade de condições para o acesso e permanência de todos na escola (BRASIL, 2004).

O CEE 1 do Gama-DF atende 450 alunos regularmente matriculados, 170 Alunos com Necessidades Educacionais Especiais (ANEEs), matriculados em escolas comuns, e 362, também de escolas comuns, que usufruem de seu Laboratório de Informática Educativa e são inseridos em seus diversos programas. O serviço prestado pelo CEE à comunidade do Gama e Entorno do DF é especializado no que diz respeito à Educação Especial, mas não é apenas do CEE a tarefa de receber esses alunos especiais. Isto porque a Política de Inclusão que perpassa por todos os documentos legalizados que tratam do assunto define que o aluno que for

identificado como aluno especial deverá ser recebido em todas as escolas regulares, prioritariamente em classes comuns (BRASIL, 1999).

No entanto, sabe-se que as escolas públicas do Distrito Federal não dispõem de todos os recursos materiais e humanos suficientes para as demandas de ANEEs. No caso das pessoas com DSV, por exemplo, o problema se apresenta com maior relevância, pois a SEE/DF tem apenas um Centro de Ensino Especial de Deficientes Sensoriais Visuais (CEEDV), localizado na cidade de Brasília. E o CEE 1 do Gama recebe os alunos com DSV porque eles também apresentam Deficiências Múltiplas e, alguns profissionais particularmente sensibilizados pelo problema, se prepararam para recebê-los.

Ao considerarmos, em especial, a perspectiva de inclusão do DSV em processos de comunicação no ambiente escolar, foco deste trabalho de pesquisa, se faz necessário considerar os aspectos e os problemas sociais emergentes que podem ser ampliados no âmbito escolar. Pois, conforme afirma Aranha (2001, p. 235), “[...] vivemos em uma época que privilegia a imagem, e os meios audiovisuais nos bombardeiam o tempo todo com figuras atraentes e fragmentárias. O signo verbal escrito cede lugar ao simulacro. Ou seja, pode-se mesmo dizer que as imagens espetacularizam a vida [...]”, mas não a vida dos cegos.

O compromisso, então, de procurar meios de promover a participação dos DSVs no processo de comunicação na escola, e por extensão na sociedade, “[...] significa o reconhecimento da comunicação como um direito humano fundamental. Ele envolve mais que o direito à informação, a liberdade de expressão como condição indispensável à emancipação e ao acesso à gestão dos meios [...]” (SOARES, 2011, p. ι9).