• Nenhum resultado encontrado

4 FRATERNIDADE SECULAR

4.2 O Jus-Humanismo Normativo

Como antes destacado, o objetivo a ser alcançado, isto é a transposição da

fraternidade – da história e da filosofia –, para o Direito, encontra no Jus-Humanismo

Normativo o marco teórico necessário e a premissa hermenêutica inafastável. Nessa

perspectiva, adota-se a doutrina concebida originariamente por Ricardo Hasson Sayeg,

em tese de Livre-Docência, Doutrina Humanista de Direito Econômico, defendida no

ano de 2009, na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo

– PUC/SP, depois

revista e ampliada, em parceria acadêmica com Wagner Balera e publicada com o título

Capitalismo Humanista – Filosofia Humanista de Direito Econômico, em 2011.

225

MARITAIN, Jaques. Humanismo Integral. 5. ed. São Paulo: Companhia Editorial Nacional, 1965, p. 4.

A teoria se apresenta como uma terceira via

227

, a partir e tendo como base

um humanismo antropofilíaco, que não se apresenta como teocêntrico, nem

antropocêntrico. Humanismo que se caracteriza por ser fraterno, inclusivo, evolucionista

e emancipador, responsável por proclamar a concretização multidimensional dos

direitos humanos. Antropofilíaco, pois, com aduzem os mestres, ―sob a perspectiva

cultural cristã, os homens mais do que iguais, são irmãos‖.

Explicam os autores

228

:

O dicionário Houaiss define o verbete antropofilia como substantivo feminino: 1. qualidade ou virtude de antropófilo; 2. afeto e interesse pelos seres humanos; socioabilidade. É esse o humanismo da fraternidade entre todos e tudo: embora a religião seja de um grupo, a cultura é de todos, e o Cristo antropologicamente é universal, concreto e irrefutável; de modo que não está sujeito ao relativismo da fé e alcança o direito.

Considerando que a proposta da fraternidade universal tem raízes

indiscutivelmente cristãs, tal categoria integrará o âmago de uma verdadeira revolução

cultural, como reconhecem Ricardo Hasson Sayeg e Wagner Balera

229

, com lastro em

Miguel Reale, Hans Kelsen

230

e mesmo em Carl Gustav Jung

231

(inconsciente coletivo).

227 SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner. Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito

Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 102.

228 Ibidem, p. 103.

229 Ibidem, pp. 95, 103, 107, 109, 110.

230 KELSEN, Hans. A paz pelo Direito. São Paulo: wmfmartinsfontes, 2011. No prefácio desta obra (p. X),

o Mestre de Viena reconhece que somos todos ―integrantes de uma civilização cristã‖.

231

JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. 8. ed. Petrópolis, Editora Vozes, 2012. Segundo Jung, ―o inconsciente coletivo é uma parte da psique que pode distinguir-se de um inconsciente pessoal pelo fato de que não deve sua existência pessoal, não sendo, portanto uma aquisição pessoal. Enquanto o inconsciente pessoal é constituído essencialmente de conteúdos que já foram conscientes e, no entanto, desapareceram da consciência por terem sido esquecidos ou reprimidos, os conteúdos do inconsciente coletivo nunca estiveram na consciência e, portanto não foram adquiridos individualmente, mas devem sua existência apenas à hereditariedade. Enquanto o inconsciente pessoal consiste em sua maior parte de complexos, o conteúdo do inconsciente coletivo é constituído essencialmente de arquétipos‖. A propósito do conceito de arquétipo, Jung ensina que ―indica a existência de determinadas formas na psique, que estão presentes em todo tempo e em todo lugar‖. Diz mais: ―O inconsciente coletivo não se desenvolve individualmente, mas é herdado. Ele consiste de formas preexistentes, arquétipos, que só secundariamente podem tornar-se conscientes. Conferindo uma forma definida aos conteúdos da consciência‖. Nesta obra o autor em dezenas de oportunidades, quase uma centena, faz menção ao cristianismo, aos seus símbolos, personagens e doutrina. Destacam-se algumas afirmações

Destacam Sayeg e Balera, também com fundamento em G. W. F. Hegel, que tal

elemento cultural passou a habitar o espírito objetivo do mundo. Logo, culturalmente, é

possível reconhecer, em face do cristianismo, ―a fraternidade como valor-síntese de

nossa sociedade‖

232

.

Ainda acrescentam os invocados autores, eminentes professores da

PUC/SP

233

, relativamente ao direito positivo, que a cultura cristã da fraternidade ―há de

afirmar-se como elemento jurídico essencial que, a um só tempo, acomoda e conforma

sua efetiva aplicação‖.

Nesse passo, concluem

234

:

A plataforma filosófica aqui apresentada reconhece, portanto, que o centro de gravidade da ordem jurídica, reclamada pelo espírito objetivo do planeta, corresponde aos direitos humanos concretizáveis de modo multidimensional, por imposição da Lei Universal da Fraternidade.

É inegável a influência da doutrina cristã na cultura ocidental e

particularmente no Direito. O Direito, então, seculariza a proposta e a incorpora na

condição de direitos humanos fundamentais.

Sobre o Jus-humanismo Normativo, em feliz síntese, explicitou Camila

Castanhato

235

,

pinçadas do texto: ―o cristianismo permaneceu porque corresponde ao modelo arquetípico vigente‖ (p.22); ―certamente somos os herdeiros de direito da simbólica cristã‖; e ―com certeza o cristianismo abriu-nos o caminho‖.

232

SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner. Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 110. Sobre a afirmação de Hegel, ver as observações de REALE, Miguel, Filosofia do Direito. v.1, 6. ed. São Paulo: Saraiva, p. 200. Destacando o pensamento de Hegel, ver, ainda, SALDANHA, Nelson, Secularização e Democracia. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 37, quando afirma: ―Hegel considerou o estado (e o direito) como expressão específica do Espírito Objetivo, imediatamente posterior à família, que preludiou, como espírito Subjetivo, o advento da polis no caso clássico‖. No pensamento original, HEGEL, G. W. F.. Princípios da Filosofia do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009.

233

SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner. Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 111.

234

Para a teoria jus-humanista normativa, os direitos humanos estão acoplados no intratexto de qualquer direito, positivado ou não. Sabemos que, para os positivistas, a norma é texto (Direito é norma); para os jusnaturalistas, a norma é o valor (Direito é o direito natural), para os neopositivistas, a norma não se limita ao texto, ela abarca também o seu contexto, ou seja, os valores que rodeiam a situação de fato posta diante do Direito (Direito é norma mais valor). Os adeptos do jus-humanismo normativo não rechaçam as demais correntes, pelo contrário, utilizam-nas, mas acrescentam um terceiro elemento no processo hermenêutico: a verificação dos direitos humanos no intratexto da norma positivada.

A teoria assume uma visão holística do Direito ou integral e encontra

inspiração na Física. Afasta-se da tradicional concepção mecanicista newtoniana, para

mergulhar na física quântica, ao reconhecerem os seus autores

– Ricardo Hasson

Sayeg e Wagner Balera – que a humanidade encontra-se em perfeita conexão.

Ricardo Hasson Sayeg, em trabalho individual, em sua tese de livre-

docência, apresentada, no ano de 2009, na Pontifícia Universidade Católica de São

Paulo (PUC/SP), com o título Doutrina Humanista de Direito Econômico, já reconhecia

que a proposta tem

por fundamento a lei universal da fraternidade, decifrada pelo humanismo antropofilíaco, por meio do culturalismo jurídico com foco no poder simbólico de Jesus Cristo, porque, como Ele ensinou e está cientificamente demonstrado, mais do que iguais somos irmãos, uma vez que conectados a um elemento comum, a partícula de Deus, reconhecida pela física quântica e pela cosmologia na teoria do Big-Bang, como também pelo naturalismo, a partir de Darwin.

Quando da publicação da obra Capitalismo Humanista

236

, já em companhia

de Wagner Balera, os autores reafirmaram a proposta original, averbando:

235 CASTANHATO, Camila. Liberdade. Tese (Doutorado em Direito) – Pontifícia Universiade Católica de

São Paulo. São Paulo, 2013.

236

SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner. Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 88.

A fraternidade desloca o homem do centro das coisas para o meio difuso delas. É necessário, de uma vez por todas, aplicar ao direito a assertiva anunciada por Nicolau Copérnico em 1520, segundo a qual não é a Terra nem tampouco o homem o centro do universo. Por estar o homem no meio difuso das coisas, o humanismo antropofilíaco aceita que tudo vem da ―partícula de Deus‖ – elemento comum da formação do universo como creem os físicos na Teoria do Big Banca, independentemente de uma visão teocêntrica.

Assim, tomando por empréstimo a teoria da relatividade de Albert Einstein (E

= Mc

2

), o Jus-Humanismo Normativo

237

conjuga, de forma quântica, o positivismo

jurídico (direito positivo

– TEXTO – matéria), o realismo jurídico (METATEXTO –

densidade vibratória

– movimento/velocidade) e, ainda, os direitos humanos

(INTRATEXTO – energia) para alcançar o resultado que significa a correta e integral

aplicação do direito: os direitos humanos são consubstanciais ao direito positivo,

conforme o realismo jurídico.

É de se averbar que o apelo dos autores à denominada visão quântica do

direito, cuja doutrina se indigita como marco teórico e premissa hermenêutica no

presente trabalho, não se confunde exatamente com o clássico estudo outrora realizado

por Goffredo Telles Júnior, materializado na obra O Direito Quântico – Ensaio sobre o

fundamento da ordem jurídica, apesar de ter alguma afinidade.

Nele, o Filósofo das Arcadas, parte de algumas premissas materializadas em

nota preliminar da magnífica obra

238

: a)

―o advento do ser humano se prende à

237

SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner. Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 120-121.

238 TELLES JÚNIOR, Goffredo. O Direito Quântico

– Ensaio sobre o fundamento da ordem jurídica, 5. ed.

São Paulo: Max Limonad,1980, p. 13-14. Para apresentação do seu ―Direito Quântico‖, o autor, após percorrer toda uma exposição referente à unidade do mundo, o sistema de referência da sociedade e até o que chamou de biologia jurídica, alcança a Norma Jurídica e o Direito. No Direito, incursiona no campo do Direito Subjetivo, relacionando-o ao Direito Objetivo. Ao final, distinguindo Direito Objetivo de Direito Positivo (aquele contém este). Em seguida, conceitua o Direito Natural como sendo o consentâneo com o sistema ético de referência de uma determinada coletividade (p. 422). É o Direito legítimo (p. 424); não imposto; que não é artificial (pseudo-direito, antidireito). O Direito Quântico, para Goffredo Telles Júnior, é exatamente o Direito Natural, o Direito legítimo (p. 426),‖reclamado pelas estruturas dos elementos quântico, nas células dos comportamentos de uma população. É o Direito que entende as inquietações genéticas de um povo ou de um agrupamento humano‖ (p. 426). Diz mais: o Direto Quântico ―é o Direito que liga ou religa o homem à sua própria natureza‖ (p. 426). É o Direito ―que brota da ‗alma‘ do povo‖;

evolução da matéria cósmica‖; b) ―o mundo ético, dentro do qual o Direito se situa, não

é um mundo de natureza especial, mas um estágio da natureza única‖; c) ―a ordenação

jurídica é a própria ordenação universal; é a ordenação da natureza única, no setor em

que é promovida a ordenação cultural‖; d) ―a Teoria Quântica do Direito, o Quantismo

Jurídico, é a tese de que o Direito se insere na Harmonia do Universo‖; e) ―o Direito

Quântico é o Direito Natural – não o Direito Natural doutrinário ou ideal, mas o Direito

Natural da natureza, que é o Direito que flui das realidades bióticas e genéticas dos

agrupamentos humanos; o Direito que simplesmente exprime o ‗sentimento‖ e a

verdadeira índole das coletividades em que ele vigora‖.

A análise quântica do Direito adotada nesta tese considera que no intratexto

de qualquer norma – portanto no nível, por assim dizer, subatômico, habita a lei natural

da fraternidade, materializada objetivamente na dignidade da pessoa humana.

Assim, se de acordo com a física quântica, especificamente a teoria da

relatividade, massa e energia não se distinguem essencialmente, pois energia tem

massa e massa representa energia e, ainda, sendo matéria e energia dois aspectos de

um único elemento que varia conforme a densidade, ao analisar o Direito ou a ordem

jurídica sob o prisma quântico

239

, é possível concluir, como já afirmado anteriormente:

relaciona-se o direito positivo à matéria; os direitos humanos à energia e o realismo à

densidade. Um aspecto é consubstancial ao outro e a Lei Universal da Fraternidade

―exige que na solução de qualquer caso sejam concretizados os direitos humanos tendo

em vista a dignidade da pessoa humana‖

240

.

―exprime o ‗sentimento‘ ou ‗estado de consciência‘ de uma classe, de um segmento social ou de um agrupamento conjuntural estável‖ (p. 427). É quântico, afirma o autor, ―porque não é arbitrário‖, ―porque não é descomedido‖; ―porque é feito sob medida, e é a medida da liberdade humana‖ (p. 427).

239

SAYEG, Ricardo Hasson e BALERA, Wagner, Capitalismo Humanista: Filosofia Humanista de Direito Econômico. Petrópolis: KBR, 2011, p. 120-121.

240