• Nenhum resultado encontrado

3.2 OS MODELOS DE INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR

3.2.1 Os juizados de instrução

3.2.1.2 O modelo espanhol

O sistema espanhol também é o de Juizado de Instrução, mas diverge do sistema francês. Na Espanha, o modelo compõe-se de três fases, quais sejam, a sumária ou de investigação, a intermediária e a do juízo oral. Todas as fases do processo são conduzidas por órgãos do Poder Judiciário, sendo que o Ministério Público se limita apenas à função acusatória e nunca à instrutória, pois esta é atribuição do Juiz Instrutor.304

Salienta-se que nesse país não há muito cuidado com as denominações aplicáveis à fase pré-processual. Por ora utiliza-se da fase de investigação, procedimento preliminar ou sumário. Mas todas, porém, são atividades de instrução. Observa-se, no entanto, que, de um modo geral, utiliza-se a expressão “instrução” para a fase da investigação preliminar na Espanha, a qual é a fase processual prévia ao juízo oral, dirigida à preparação desta.305

303 DELMAS-MARTY, 2000, p. 273, 291-2. Segundo o autor, a análise da viabilidade da acusação pela Sala de

Acusação é obrigatória nos casos dos crimes e facultativa nos demais. No caso de não prosseguimento, o procedimento pode ser arquivado por três motivos: falta de tipicidade do fato, autor desconhecido ou indícios insuficientes. Então a sala de acusação declara que não há lugar para prosseguir – qu’il n’y a lieu à suivre – (art. 212 CPP).

304 SOLAESA. José R. de Prada. In: Sistemas de proceso penal en Europa. Director: Ramón Macia Gómez.

Barcelona. Cedecs Editorial S.L., 1988, p. 98-9.

305 VALLEJO, Manuel Jaén. Acusación e investigación en el sistema procesal penal español. In: Derecho penal

No modelo espanhol, a fase pré-processual, para a proposição da ação penal, é atribuição da Polícia Judicial. Sobre a Polícia Judiciária, Martinez306 esclarece:

Desde antiguo se ha considerado necesaria la existencia de un cuerpo de funcionarios de policía especializado y exclusivamente dedicado auxiliar a la Administración de justicia en la averiguación del delito y en el descubrimiento del delincuente. […] De Policía Judicial suele hablarse en dos sentidos diferentes. En sentido amplio, la Policía Judicial es una de las funciones asumidas por los miembros de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado, tanto si dependen del Gobierno Central como de las Comunidades Autónomas o de los Entes Locales, dentro del ámbito de sus respectivas competencias. En sentido estricto, constituyen la Policía Judicial ciertas unidades orgánicas integradas por miembros del Cuerpo Nacional de Policía y de la Guardia Civil.

No entanto, diverge do nosso sistema – que será abordado em capítulo próprio - uma vez que é dirigida ao Ministério Fiscal, o qual é responsável pela ação penal, mas fiscalizará a fase da investigação preliminar. A investigação pode ser iniciada pela Polícia Judiciária, pelo Juiz Instrutor ou pelo Ministério Público. No caso da Polícia Judiciária e do Juiz de Instrução, estão obrigados a iniciar a investigação de ofício toda vez que tomarem conhecimento da notícia de um crime de ação pública.307

Caso seja a polícia que a inicie, o Juiz seguirá no seu comando. Iniciada a investigação pelo promotor, ele continuará nela até que o Juiz Instrutor a avoque para si. Desse modo, na verdade, o promotor não é o condutor da investigação, mas mero iniciador até que o Juiz a assuma.308

Nesse sentido, Choukr309 esclarece que:

306 MARTÍNEZ, Sara Aragoneses. La jurisdicción penal. In: Derecho procesal penal. Nueva edición, 30 de

junio de 1999. Completada y actualizada. Madrid: Colección Ceura. Editorial Centro de Estudios Ramón, 1999, p. 89-90. Ainda sobre a atuação da Polícia Judiciária o autor refere: “Actuación de los miembros de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado <<en funciones>> de Policía Judicial. Los miembros de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado pueden actuar a requerimiento de la Autoridad Judicial, del Ministerio Fiscal o de sus superiores policiales, o por propia iniciativa. Los Jueces, Tribunales y miembros del Ministerio Fiscal pueden encomendar a los miembros de las Fuerzas y Cuerpos de Seguridad del Estado la práctica de concretas diligencias de investigación, en los términos previstos en el artículo 288 LECr, en defecto de Unidades de Policía Judicial, con carácter transitorio o en supuestos de urgencia y siempre con sujeción a su respectivo ámbito legal y territorial de atribuciones”.

307 SENDRA, Vicente Gimeno. El contenido de la instrucción. In: Lecciones de derecho procesal penal.

Madrid. COLEX, 2001, p. 193.

308 DOMÍNGUEZ, Valentín Cortez. La fase de instrucción. In: Lecciones de derecho procesal penal. Madrid.

COLEX, 2001, p. 181-3.

Assim, no que tange ao início da fase investigativa, muita semelhança existe com nosso modelo, sendo certo que a Polícia Judiciária poderá, ex offício, determinar a realização das diligências necessárias para a apuração do fato delituoso, comunicando de imediato ao Ministério Público e à autoridade judiciária. Com efeito, o Ministério Público, nesse período, embora não dirija as investigações, intervém presenciando per se as diligências, podendo propô-las ao juiz de instrução, artigos 646 e 648, tendo, ainda, certa autonomia investigativa nas hipóteses do artigo 785 da LECrim.

Na Espanha, a Polícia Judiciária, que se encontra subordinada funcionalmente ao Poder Executivo, pode, de ofício, realizar a investigação preliminar.310 Como ocorre em outros modelos de investigação preliminar, em que a Polícia Judiciária não é a titular direta da investigação preliminar, na prática, ela acaba atuando de forma autônoma na apuração dos fatos, como observa Solaesa311:

La policía judicial propiamente no es una parte en el proceso penal español, pero como en casi todos los sistemas su función es la investigación del delito , autores del mismo, etc., si bien, en el caso español, depende para hacerlo de otros actores del proceso – Juez de Instrucción o Ministerio Fiscal - ya que su labor, en el plano formal, es meramente auxiliar. Sin embargo, de ordinario, la policía, una tiene información del hecho delictivo a través de las múltiples vías posibles (denuncias de particulares, información de confidentes, etc.) inicia una investigación autónoma y no procesal del delito que judicializa a conveniencia, o bien cuando ya ha concluido las investigaciones, o cuando le resulta necesario utilizar algún medio de investigación restrictivo de derechos fundamentales (intervenciones telefónicas, entradas o registro, etc.), cuya a autorización compete al juez de instrucción o bien lleva a cabo la detención de algún sospechoso, en cuyo cado pone en conocimiento del juez de instrucción las investigaciones realizadas, continuando frecuentemente con ellas de forma autónoma. […].

Salienta-se que a função principal do Ministério Público, na apuração dos fatos realizada pelo Juizado de Instrução, é o de fiscal da lei.312 Caso o Ministério Público ou a Polícia Judiciária entenderem necessária alguma diligência, deverão postulá-la ao Juiz de Instrução que deferirá ou não, conforme entenda ela pertinente. Nesse sentido, pontua-se que o sistema espanhol é considerado um modelo processual de fortes características

310 GIACOMOLLI, 2006, p. 158. Segundo o autor: “Como regra, a polícia, ante a informação da prática de um fato

delitivo, inicia uma investigação autônoma, judicializando-a quando conclui a investigação, ou quando seja necessário utilizar algum meio de investigação restritivo dos direitos fundamentais. Há que ser consignado que a polícia, ainda que deva cumprir as ordens do Juiz Instrutor, ou do Ministério Público, está subordinada ao Poder Executivo, mais precisamente ao Ministério do Interior – polícia estatal, autonômica e local”.

311 SOLAESA, 1998, p. 103. Segundo o autor, “ya que es corriente que no aporte al juez o al fiscal toda la

información de que dispone sino hasta el momento en que las da por concluidas y culmina la operación con la detenciones de los sospechosos, a los que, tras tomarles declaración, pone a disposición judicial junto con ele testado, que es el documento o expediente elaborado por la policía donde constan los aspectos esenciales de la investigación que ha llevado a cabo”.

312 GIACOMOLLI, 2006, p. 158. Segundo o autor, no sistema espanhol, “O Ministério Público, figura como

coadjuvante do Juiz Instrutor, é cientificado e ouvido a respeito das investigações, podendo estar presente na prática dos atos, inspecionar todo o desenvolvimento da persecutio criminis, bem como solicitar diligências”.

inquisitoriais. Ele não possibilita a igualdade de armas entre as partes, nessa fase da investigação preliminar, tendo em vista o segredo que a permeia, em regra, para o investigado e sua defesa.313

Desse modo, havendo indícios da existência de um crime – noticiado pela denuncia ou querella - começa a investigação do fato, em regra, pelos Juizados Centras de instrução. Isso ocorre por meio de uma decisão chamada de auto de incoación del sumario.314 A investigação é, durante todo o procedimento, presidida pelo Juiz Instrutor, o qual apura o fato e circunstâncias. Todavia, o objetivo da investigação é colher elementos para o exercício da ação penal. Tais elementos não terão o condão de fazer prova para o julgamento final do processo – juízo de culpabilidade.315

Nos crimes graves, com pena superior a nove anos, o procedimento investigatório na Espanha, de acordo com Martínez316, ocorre da seguinte forma:

Regulado en los Libros II y III de la LECr, el proceso por delitos responde a la estructura básica de todo proceso penal: instrucción preliminar, fase intermedia, fase decisoria o de juicio oral, impugnación y ejecución. La instrucción preliminar o <<sumario>> se desenvuelve a través de una serie o sucesión de actos, de un procedimiento, en suma, al que, en lo sucesivo, por ir referido a esta fase, denominaremos procedimiento sumarial. Conforme a una ya consolidada clasificación, distinguimos en el procedimiento la iniciación, el desarrollo y la conclusión.

Terminadas as diligências, ou para nós a fase da investigação preliminar, o magistrado entende por encerrada a fase do sumário. Então ele envia os autos e as demais peças informativas para a audiência e o início da fase processual propriamente dita, com a ação penal. É uma fase intermediária, na qual estão incluídos os atos que se praticam perante o tribunal, a partir do momento que recebe o sumário até o término do procedimento ou a abertura do juízo oral.317

313 VALLEJO, 2003, p. 100-4. 314 MARTÍNEZ, 1999, p. 328. 315 GIACOMOLLI, 2006, p. 157-8.

316 MARTÍNEZ, op. cit., p. 327-8. “Si el Juez de Instrucción considera que los hechos de que ha tenido noticia

(por cualquiera de los medios que hemos estudiado) tiene apariencia delictiva, dictará un auto ordenando la incoación y formación del sumario. Inmediatamente lo pondrá en conocimiento del Fiscal de la respectiva Audiencia y darán parte al presidente de ésta de la formación del sumario. […] Si el Juez acuerda la formación del sumario, el procedimiento entra en la fase de desarrollo.[…] La instrucción gira en torno a un elemento objetivo (el hecho presuntamente punible) y un elemento subjetivo (la persona presuntamente responsable de aquél), sin bien no si8empre es posible deslindar la existencia de actos que tiendan de modo unilateral a comprobar uno o a averiguar otro. Antes al contrario, la investigación de ambos extremos suele ser coetánea”.

317 CATENA, Vítor Moreno. El proceso común. In: Lecciones de derecho procesal penal. Madrid: COLEX,

Nessa fase, procede-se da mesma forma nos casos dos delitos leves, como nos mais graves. Mas há uma ressalva quanto aos delitos mais graves, de acordo com Choukr318:

Procede-se o envio das peças e das manifestações do suspeito e do Ministério Público para a audiência, sendo estes intimados da realização do ato processual enunciado; terão o MP e o suspeito até dez dias para o conhecimento de tudo quanto foi realizado na etapa do sumário, podem requerer diligências a serem apresentadas em audiência, podendo ser formado um incidente caso juiz instrutor não concorde com as diligências reclamadas. Nesta etapa, pode o sumário ser arquivado ou dar-se a abertura do juízo oral, corresponde ao direito brasileiro à ação penal propriamente dita. Este arquivamento pode ser definitivo ou provisório, de acordo com a natureza de seu conteúdo, sendo tais hipótese previstas nos artigos 634 e seguintes da LECrim.

Então pode se verificar, também, que no modelo espanhol, em regra, quem conduz a investigação preliminar é a Polícia Judiciária, em tese, sob a direção do Juiz Instrutor, sendo que ela é endereçada ao Ministério Público.

Do mesmo modo, ficou claro que, encerrada a fase do sumário ou instrução, antes de iniciar a ação penal, acontece uma fase intermediária, que se constitui em etapa de juízo de admissibilidade da acusação, com defesa e contraditório, muito diferente do que acontece no Direito brasileiro.