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2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO OBJETO DE PESQUISA

3.5 O Papel do coordenador pedagógico no desenvolvimento da Formação dos

Buscamos como referência para esse debate os pressupostos dos teóricos italianos Bondiolli (1998) e Malaguzzi (1999), por serem referências para o Brasil e outros países, no atendimento às crianças e suas famílias em instituições de EI, bem como, por se destacarem por meio de modelos de formação contínua de professores em contexto de atuação, tendo o CP como formador, visando o desenvolvimento profissional trazendo uma discussão profunda e fértil para nosso debate.

Pensamos que seus pressupostos nos ajudarão na reflexão acerca do potencial formativo nos contextos coletivos de trabalho docente, a fim de compreendermos como poderá ser possível ou não as adaptações teórico-práticas da realidade daquelas instituições, ao contexto de um CEI, situado em Fortaleza. Embora saibamos que os aspectos culturais e históricos possuem um significado na forma como se constroem um projeto de sociedade, que tem início desde a primeiríssima infância e que refletem em espaços de vida coletiva, como nas instituições italianas em Reggio Emília, pensamos que tal intento pode ser possível.

Por meio de uma pesquisa bibliográfica constatamos que o desenvolvimento de experiências com a primeiríssima infância desenvolvida naquele país demonstra o envolvimento compartilhado entre gestão, professores e coordenação pedagógica, sempre na busca de um atendimento de qualidade às crianças e suas famílias. Nesse processo o CP tem um relevante papel no desenvolvimento profissional e institucional, por ter como uma de suas principais funções, a formação de professores no contexto institucional, favorecendo tanto o desenvolvimento profissional dos professores quanto da própria instituição.

Assim, no que diz respeito aos modelos de atendimento às crianças pequenas, bem como ao processo de desenvolvimento profissional dos professores, mediado por uma coordenação pedagógica, esses referenciais muito nos inspiram. Conforme Bondioli (1998), a história da coordenação pedagógica na Itália, surge junto com a história do atendimento educacional à criança pequena na rede oficial, sendo a presença deste profissional considerado padrão qualitativo necessário para o credenciamento das creches dessa região, conforme legislação local.

De acordo com Pereira (2014), ao realizar um levantamento bibliográfico sobre o trabalho da coordenação pedagógica na Educação Infantil, deparou-se com um reduzido número de trabalhos sobre a coordenação pedagógica em ambientes coletivos de educação e no

cuidado de crianças pequenas, tornando-se um desafio à reflexão sobre a profissionalidade específica dessa função, o que convoca novos estudos sobre o tema.

No Brasil, a figura do coordenador pedagógico esteve atrelada à história da criação do curso de pedagogia. No entanto, não esteve sempre identificada com este nome, contando com outras denominações, a saber: inspeção, supervisão pedagógica, escolar, educacional, assistência pedagógica e orientação pedagógica.

Contudo, muitas foram as críticas a essa formação, por entendê-la como uma fragmentação do trabalho pedagógico a ser desenvolvido na escola, passando-se a defender uma formação generalista, na qual caberia ao profissional que assumisse um cargo de gestão, o conhecimento holístico de sua função.

Desse modo, conforme esse breve percurso histórico do CP no Brasil, este vem sofrendo transformações no que diz respeito as suas funções, abandonando a ideia de fiscalizador burocrático, passando a ser cobrado cada vez mais a estabelecer um trabalho de parceria e colaboração junto ao professor. Na contemporaneidade, sua principal função é a de formador, articulador e agente transformador no contexto das instituições de EI, deixando de lado aquela compreensão de vigilância e supervisão.

Segundo Pereira (2014), o trabalho do CP de creche é marcado por uma complexidade de ações que definem a sua profissionalidade específica na EI. Para tanto, precisa ter como referência as particularidades do atendimento aos bebês, crianças bem pequenas e crianças pequenas. O CP na EI assume uma especificidade, exatamente pelas características das crianças de creche, se diferenciando de coordenadores de outras etapas da educação básica. Deste modo, é relevante destacar que o trabalho da coordenação na educação infantil é um trabalho diferenciado dos demais coordenadores que atuam em outros níveis de ensino. Contudo, o trabalho do CP que atua em centros de educação infantil em que há o atendimento as crianças de um ano, ainda é mais específico. Podemos dizer que há uma especificidade inclusa em outra especificidade: o trabalho com bebês.

Embora o trabalho do CP, de forma geral, também abranja os aspectos pedagógicos, administrativos e relacionais, ele precisa ter conhecimentos sobre criança, infância, desenvolvimento infantil e Educação Infantil, suas competências e sentimentos, enfim, sobre as características das crianças pequenas (OLIVEIRA-FORMOSINHO; KISHIMOTO, 2002).

Acreditamos, ainda, que sua especificidade também está relacionada ao propósito de instigar nos docentes que atuam com a primeiríssima infância a reflexão acerca da articulação entre o educar e o cuidar nas práticas com as crianças. Conhecer os objetivos da EI

também é fundamental para orientar e acompanhar os profissionais que lidam diretamente com os bebês, evitando, assim, práticas equivocadas que não respeitem ritmos e desenvolvimento próprio dessas crianças. Logo, o CP no CEI é aquele que orienta, articula, acompanha e forma docentes em contextos de trabalho. Conhecer sobre o trabalho que deverá ser desenvolvido com e para os bebês poderá contribuir para uma pedagogia da EI que se traduza em práticas pedagógicas que respeitem as singularidades, diversidades, ritmo e peculiaridades dos bebês e crianças bem pequenas.

Alguns pesquisadores como Saitta (1998), Cipoloni (1998), Vasconcellos (2010), Almeida e Placco (2011), Edwards, Gandini e Forman (2006), Carvalho e Augusto (2006), Zumpano e Almeida (2012), Bruno (2006) apontam o CP na EI como responsável pelo acompanhamento das práticas e da formação do professor, com o objetivo de auxiliá-lo a fazer a transposição e adequação da teoria para a prática.

Saitta (1998), ao se referir ao coordenador pedagógico na creche, enfatiza que este tem um papel inovador nos serviços para a primeira infância, configurando-se como instrumento de programação, estudo, organização, verificação e síntese do projeto pedagógico, bem como a garantia do princípio de continuidade da experiência educacional na creche. Embora sua história e atuação sejam recentes, e ainda com algumas lacunas, é necessário esclarecer seu papel, funções e competências.

Portanto, Saitta (1998) define a organização do serviço na creche, o projeto educacional e as competências profissionais dos educadores como elementos qualitativos no atendimento de creche, estando também relacionados ao seu papel, e defende que para uma melhor organização de seu trabalho é crucial que o CP elabore um plano programático, contendo objetivos, metas, ações, planos de formação com os profissionais da instituição e outros elementos que ele achar necessário.

Quanto ao plano programático do CP, lembramos que, na educação, a importância da documentação e do registro se faz necessária, no sentido de acompanhar, relembrar, rever percursos, como forma de análises dos processos de ensino e aprendizagem em todos os níveis, seja das crianças ou do grupo de trabalho ao qual o CP lidera. Assim, o CP pode lançar mão desse recurso para mapear o percurso de trabalho realizado por ele mesmo e pelo professor na instituição, bem como mediar momentos formativos junto a sua equipe docente (TERZI; FUJIKAWA, 2013).

O Plano de ação, nomeado assim pelas referidas autoras, é o planejamento do CP, pensado, organizado e registrado, das ações de formação, e outras demandas que emergem do contexto institucional e que tem como objetivo mapear as situações manifestadas, identificar as

demandas para declarar e organizar suas intenções de trabalho. Ele deve conter diagnóstico, metas, ações e objetivos a serem trilhados, na obtenção da transformação de práticas de qualidade no atendimento às crianças e suas famílias.

Sobre o planejamento desse instrumento, Terzi e Fujikawa (2013, p. 134) afirmam que “Planejar é mapear na realidade contextualizada focos de atuação para converter as intenções delineadas em deliberação de ações. O ato de planejar é antecedido pela leitura meticulosa da realidade cotidiana vivida na realidade escolar [...]”.

Nesse sentido, corroboramos com os autores, pois o plano de ação permite ao CP fazer uma leitura da realidade a partir do delineamento e acompanhamento das ações cotidianas da realidade local. A partir daí, questiona, levanta hipóteses, na tentativa de interpretar o que não está dito, porém posto. Reflete e aponta intervenções na busca do desenvolvimento profissional dos professores e da instituição.

As autoras ainda apresentam algumas orientações para a elaboração de um plano de ação do CP. São as seguintes dimensões que precisam ser consideradas: Quadro situacional e diagnóstico da realidade; Levantamento de hipóteses, metas e objetivos; Intervenções; Cronograma; e Avaliação. Todas essas dimensões, expressas no plano de ação, permitem ao CP realizar, como já foi dito anteriormente, uma leitura do contexto educacional em que atua, e esta deve se dar a partir das referencias declaradas na Proposta Pedagógica.

A partir desse contexto, fica claro que a atuação do CP no CEI/creche requer dele algumas habilidades e competências profissionais inerentes à sua função. No contexto da Educação Infantil, sua atuação revela uma especificidade que está relacionada às características dos bebês e crianças bem pequenas, pois há uma diferenciação da natureza do trabalho pedagógico realizado nesse contexto. No entanto, vale destacar que a realização deste trabalho pelo CP não é fácil, em virtude também das lacunas de sua formação.

Quanto às competências desse profissional, Saitta (1998) destaca três pontos fundamentais, compreendidos entre a organização do serviço, como espaços, atividades, pessoal e grupo de crianças. O segundo ponto é o projeto educacional realizado, envolvendo os aspectos relacionados aos objetivos específicos, rotinas, necessidades das crianças, aspectos comunicativos, expressivos e cognitivos na dimensão corpo/ambiente/símbolo. Como último ponto, as competências profissionais dos educadores referentes aos conhecimentos psicológicos sobre a primeira infância e sua cultura na contemporaneidade, capacidade para construir um projeto educacional, as relações entre adultos e crianças e pais e educadores.

A referida autora salienta que essas competências, do tipo pedagógico, estão estritamente ligadas e inter-relacionadas às competências de cunho administrativo. Daí ser

difícil separar onde começa um e termina o outro. Porém, afirma que a administração e solução não fazem parte das funções de uma coordenação que deve, então, ser auxiliada por um conveniente aparato administrativo. Na realidade de Fortaleza, o CP no CEI, não conta com este aparato, sendo só para a realização de todas as atividades administrativas e pedagógicas.

Merece destaque o que Saitta (1998) acrescenta com relação ao trabalho coletivo conduzido pelo CP na instituição de Educação Infantil. O autor salienta que o CP precisa conhecer, decodificar e administrar as dinâmicas relacionais e interpessoais do grupo com o qual convive na creche, e evidencia quatro competências ligadas a essa função: capacidade de análise, de organizar os meios de ação mais eficazes, de síntese e de comunicar. Dessa maneira, o papel do CP é de um profissional que possui competências pedagógicas, que possui capacidade de administrar os grupos de trabalho nos planos da comunicação interpessoal e dos conteúdos.

É consenso entre os autores que o papel preponderante do CP é, em qualquer nível de ensino, o de formar professores. Porém, acreditamos que um coordenador pedagógico com as habilidades e competências para tal não se faz de um dia para o outro, mas requer uma formação sólida tanto inicial quanto contínua.

Segundo Pereira (2014), para que o CP na EI cumpra o seu papel de orientar o trabalho dos professores, articulando o processo de construção da proposta pedagógica, de promover momentos de estudo e formação junto aos professores, um grande desafio precisa ser superado, e diz respeito aos conhecimentos sobre os novos saberes sobre infância, criança e Educação Infantil.

Assim como os professores formados na mesma “escola”, Pereira (2014) explica que também passou no seu processo de formação inicial pelas mesmas lacunas de uma formação que não lhe trouxe elementos suficientes para o trabalho específico exigido para a educação com bebês e crianças muito pequenas. Seu trabalho reforça essa ideia, ao constatar os conhecimentos e atitudes do CP sobre a EI, criança e infância e suas especificidades, se assemelhando aos conhecimentos dos professores.

A esse respeito, a pesquisa de Rodrigues (2018) sobre a formação inicial de professores para a docência com bebes revelou que o curso de Pedagogia presencial da FACED- UFC não tem contemplado suficientemente o estudo sobre a docência com crianças de zero a dezoito meses, apresentando como características a superficialidade dos conhecimentos e a carência de experiências práticas com as crianças de zero a dezoito meses.

Tais dados nos mostram que, ao se falar em EI, as abordagens ocorrem de forma mais generalizadas, sem se deter às especificidades do trabalho com os bebês, o que dificulta a

apropriação de saberes que auxiliariam aos professores nas práticas promovidas a essa faixa etária, dando-lhes maior segurança no seu fazer pedagógico.

Portanto, sendo o CP um profissional mais experiente, que deve auxiliar, acompanhar e orientar os professores na reflexão das práticas pedagógicas que envolvem os bebês, suas rotinas, famílias, torna-se um grande desafio o trabalho em creches e CEIs, uma vez que os conhecimentos que envolvem essa faixa etária são superficiais e incompletos.

Logo, espera-se que o CP apoie, oriente e acompanhe os professores. Mas indagamos: Quem os orienta e quem lhes presta apoio técnico? De que forma isso ocorre? Parece-nos urgente pensar numa formação para estes profissionais, uma formação que considere a especificidade dessa função na primeiríssima infância e que promova a apropriação de conhecimentos, habilidades e valores relativos aos aspectos pedagógicos, administrativos e relacionais, requeridos por elas no sentido de ampliarem e fortalecerem suas possibilidades de realização de um trabalho de qualidade, mais eficiente, ético e democrático.

Ao estimular o processo de tomada de decisão, visando à proposição de alternativas para superar esses problemas e ao promover a constante retomada da atividade reflexiva, para readequar e aperfeiçoar as medidas implementadas, o professor coordenador está propiciando condições para o desenvolvimento profissional dos participantes, tornando-os autores de suas práticas (GARRIDO, 2006).

Portanto, o trabalho do professor coordenador é fundamentalmente um trabalho de formação continuada em serviço. Ao subsidiar e organizar a reflexão dos professores sobre as razões que justificam suas ações pedagógicas e sobre as dificuldades que encontram para desenvolver seu trabalho, o professor coordenador está favorecendo a tomada de consciência dos professores sobre suas ações e o conhecimento sobre o contexto escolar em que atuam.

Dessa forma, abordaremos no próximo capítulo o caminho delineado nesta pesquisa para a obtenção dos objetivos delineados.

4 O PERCURSO METODOLÓGICO

“Valentim tem me ensinado sobre os caminhos, caminhares e destinos, que o chegar não é mais valioso do que a andança, que o encontro é precioso e necessário.” (Trecho da narração do vídeo Caminhando com tim tim).7

Este capítulo tem por finalidade apresentar a abordagem de pesquisa que norteou este estudo, bem como as escolhas metodológicas utilizadas para a realização do trabalho de campo. Inicialmente, será explicitado o percurso da pesquisa e, em seguida, serão apresentados os instrumentos e técnicas utilizados para a obtenção dos dados e sua análise, bem como o lócus da pesquisa e os sujeitos que participaram do estudo.

Antes da realização da pesquisa final optamos por realizar uma pesquisa piloto, com o intuito de averiguarmos os instrumentos de coleta de dados. Essa foi uma decisão que nos ajudou a conhecer melhor sobre os aspectos macrossociais que poderiam ou não comprometer o desenrolar da pesquisa, pois como destaca Graue e Walsh (2003), o contexto é um elo de união entre as categorias analíticas dos acontecimentos micro e macrossociais, englobando, assim, tanto os aspectos do contexto local como os dos contextos alargados.

Dessa forma, alguns ajustes nos critérios de seleção da instituição e dos sujeitos da pesquisa foram possíveis por meio do piloto previamente efetivado, que será explicitado adiante.

Vale frisar que tínhamos, a priori, uma expectativa quanto ao campo de investigação, de sujeitos e de instrumentos que iriam nos respaldar para obtenção dos dados. Porém, percebemos que o percurso vai se fazendo no caminhar. Assim, os sujeitos participantes, o contexto e outros elementos foram se tecendo junto ao pesquisador, criando novas tramas e que, portanto, foram acolhidas e ajustadas sem, no entanto, perder de vista os objetivos pretendidos. Assim se deu o nosso caminhar: aprendendo a ver, ouvir e escutar, refazer e reconstruir para apreender novos e velhos sentidos e ressignificar o trilhar da pesquisa, que será apresentada no decorrer da descrição deste capítulo.

7GERHARDT, Genifer. Caminhando com tim tim. 2014. (4min29s). Disponível em:

Para maior clarificação da trajetória metodológica e das escolhas realizadas neste trabalho, apresentaremos também neste capítulo, de forma breve, o desenrolar da pesquisa piloto.