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No presente capítulo, examinamos os dados obtidos por meio dos instrumentos da pesquisa: currículo Lattes, aplicação de questionários e entrevistas. A análise procura apresentar não só as características do Capes-Cofecub e seus desdobramentos, como também busca apontar possíveis direcionamentos e proposições para apoiar as tomadas de decisão dentro do programa.

Dos três instrumentos utilizados para apoiar a pesquisa, sempre que possível, trabalhamos com a ferramenta Lattes, haja vista que, além de ser um dado bastante exato, possibilita comparar mais precisamente todo o universo dos pesquisadores. Já no caso dos questionários e entrevistas, trabalhamos com amostras. Para o questionário, o retorno dependeu da iniciativa do pesquisador em prestigiar a avaliação, enviando o formulário preenchido. Apesar de várias tentativas, como já mencionado no capítulo 2, tivemos retorno de apenas 38% dos possíveis respondentes. No que se refere às entrevistas dos responsáveis por projeto, buscamos uma amostra representativa de períodos distintos do financiamento, que apresentasse diversificação das áreas de conhecimento daqueles que deram seu depoimento, equilíbrio de gênero e também diversidade de vínculo institucional do coordenador. Ademais, buscamos enriquecer ainda mais as análises qualitativas, com a realização de entrevistas com colaboradores ou com aqueles que tivessem contribuído de alguma forma para a cooperação Brasil-França, ou com pesquisadores cujas linhas de pesquisa se envolvessem com o estudo dessa relação.

No que se refere ao perfil dos pesquisadores que obtiveram o financiamento e à análise cientométrica, pudemos trabalhar com o universo de responsáveis por projetos. Já no que diz respeito às percepções acerca da parceria, de seus pontos positivos, dificuldades e demais resultados, trabalhamos com as amostras coletadas pelo questionário aplicado e também pelas entrevistas realizadas.

5.1 Das características do financiamento

Como apontado no capítulo anterior, a condução do Capes-Cofecub acompanhou a evolução da pós-graduação no Brasil. Vários são os relatos realizados em eventos de comemoração do programa exaltando a sua importância. Conforme depoimento de um colaborador brasileiro: “o programa ajudou na construção da massa crítica no país, formou

muitos pesquisadores brasileiros”. Entretanto, não havia, até então, um estudo analítico sobre as características da parceria. Como lembrado por uma colaboradora brasileira, “não há dados concretos, não foi feita uma avaliação do programa, a minha experiência positiva acerca do programa é de vivência”. Outro colaborador brasileiro confirmou:

Conheço inúmeros professores que foram bolsistas do Capes-Cofecub, principalmente em áreas em que a França é forte, e que estão bem-sucedidos em IES, institutos de pesquisa, mas falta uma avaliação sistemática e sistematizada. Assim, por meio de nosso estudo, buscamos apresentar as peculiaridades da cooperação, seu comportamento ao longo desses 341 anos analisados, o perfil de seus coordenadores, a formação acadêmica e o percurso científico destes, as áreas financiadas, as IES contempladas, a natureza dessas instituições, as Unidades da Federação e as regiões priorizadas.

Nesse período, foram financiados 767 projetos conjuntos de pesquisa. Haja vista a necessidade de padronização das informações para realização das intepretações, 35 projetos que não dispunham dos dados de ao menos um dos coordenadores ou cujo responsável brasileiro não mantinha currículo na plataforma Lattes foram excluídos. Assim, o universo analisado passou a ser de 732 projetos.2

5.1.1 Projetos por ano

Observamos que não houve uniformidade na concessão anual dos recursos. Se, por um lado, verificamos uma constância no lançamento de editais, haja vista que, como já mencionado, apenas em 1981 e 1983 não foram apresentados certames do programa, não houve linearidade no número de financiamentos. Ressalte-se que, como também aludido no capítulo anterior, até a década de 90, não havia um prazo determinado para o financiamento, tendo sido constatados casos de projetos que foram financiados por mais de dez anos. Além disso, até 1983, somente o lado brasileiro estava apto a apresentar candidaturas ao financiamento.

1 É importante mencionar que, embora o programa tenha mais de 35 anos (em 2016 ele comemora 37 anos, visto

que se contam os aniversários do Cofecub a partir de 1979, ano de início das atividades, e não 1978, ano de assinatura do acordo), a análise de dados deu-se apenas até 2012, para que fosse possível mensurar os resultados das parcerias. Assim, em alguns momentos mencionamos a análise dos mais de 35 anos dessa parceria e, em outros, referimo-nos aos 34 anos dos dados de projetos conjuntos examinados.

2 As diferenças entre o número de projetos aqui apresentados e aquele relatado no capítulo anterior referem-se às

exclusões que foram necessárias para a realização das análises. A ausência dessas informações impossibilitou a inclusão dos projetos para fins de interpretação dos dados.

Feitas essas ressalvas, observamos, no gráfico a seguir, que a concessão variou bastante; houve anos em que nem um projeto foi financiado, e outros mais abundantes, como em 2005, quando 46 novos projetos foram apoiados, o maior patamar até a atualidade. A linha de tendência demonstra, contudo, progressão no financiamento.

Gráfico 3: Número de projetos por ano

Fonte: Microdados Capes. Gráfico elaborado pela autora

Em anos recentes, essas irregularidades vêm sendo reduzidas pela definição em edital do número base de projetos a serem aprovados. Essa previsibilidade e uniformidade no aporte anual de recursos para o programa pode auxiliar o trabalho do grupo decisório e dos avaliadores brasileiros,3 uma vez que, embora tenham como foco o mérito, as avaliações podem sofrer ajustes, a depender do quantitativo a ser aprovado.

É importante lembrar também que, como já mencionado no capítulo 4, entre 1995 e 1998, houve, no Capes-Cofecub, uma linha especial para o Norte, visando a dar maior apoio ao desenvolvimento de recursos humanos da região. Os resultados, contudo, não foram

3 No caso francês, a aprovação do número de projetos depende também do montante de projetos aprovados na

significativos. Em depoimento, um colaborador francês lembra que, “no primeiro momento, o acordo era para ajudar as IES no nordeste do Brasil. Houve, em seguida, a desconcentração com abertura para os demais estados do Brasil. Em uma nova repartição geográfica, deu-se foco também para a Amazônia”. Em quatro anos, contudo, apenas oito projetos foram destinados a essa região, sendo três em 1995, primeiro ano dessa linha, outros três em 1996, um em 1997 e um em 1998, último ano dessa modalidade específica. Do total de projetos financiados nesse período, menos de 8% foram destinados para a região Norte. Esses resultados acabaram demonstrando a baixa eficácia da ação, o que acreditamos ter resultado em sua descontinuidade. Segundo depoimento de um colaborador francês, “houve uma tentativa de se ter um projeto Capes-Cofecub específico para a Amazônia, mas não funcionou. Era uma boa iniciativa, mas não poderíamos ter partido do zero, acho que foi muito precipitado.”

Ainda nesse mesmo sentido, lembramos que, entre 1997 e 2000, as agências passaram a dispor de duas modalidades de candidatura, projetos tipos I e tipo II, descritos no capítulo anterior. Nesses quatro anos, visando ao fortalecimento do parceiro brasileiro, foram financiados 30 projetos tipo I, conforme disposto na tabela a seguir:

Tabela 3: Número de projetos tipo I financiados entre 1997 e 2000

Ano Total Tipo I Percentual

1997 29 10 34%

1998 32 5 16%

1999 35 6 17%

2000 35 9 26%

Total 131 30 23%

Fonte de dados: Capes. Tabela elaborada pela autora

Observamos que, no caso do incentivo aos projetos assimétricos (tipo I), o percentual do financiamento também restava menor que aquele direcionado ao financiamento de projetos tipo II; ainda assim, constatamos que havia demanda nesse sentido. Não há indícios dos motivos que levaram à extinção do apoio à modalidade tipo I. Acreditamos que a priorização da excelência possa ter sido o motor dessa decisão.

5.1.2 Distribuição federal e regional

Em termos de Unidade da Federação, na análise de 34 anos, verificou-se que 19 unidades estiveram representadas no programa. Por um lado, oito Unidades da Federação nunca tiveram um único projeto financiado: Acre, Amapá, Roraima, Rondônia, Tocantins, Goiás, Mato Grosso do Sul e Piauí. Por outro lado, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul concentram, respectivamente, o maior número de projetos contemplados.

Em termos de percentual, São Paulo recebeu 28% do financiamento; ressalte-se que a USP possui, ainda, um programa específico com o Cofecub desde 1994. Embora o número de projetos financiados anualmente pelo USP-Cofecub seja pequeno, em torno a 5 projetos, o estado concentra a maior fatia do financiamento Capes-Cofecub. A existência de um programa específico entre a USP e o Cofecub foi, inclusive, apontada como negativa por uma coordenadora brasileira: “acho que a existência de um programa específico para a USP é discriminatória, se fosse assim, seria preciso ter um UFRJ-Cofecub, UFGRS-Cofecub, etc.”.

Gráfico 4: Unidades da Federação contempladas

Fonte: Microdados da Capes. Gráfico elaborado pela autora

O propósito inicial de fortalecer o Nordeste foi bastante alterado, se considerarmos que todo o financiamento para a região totaliza 116 projetos, número bastante inferior ao de São Paulo e Rio de Janeiro, que tiveram, respectivamente, 202 e 167 projetos apoiados pelo programa no período. Ao analisarmos a representatividade regional, a questão se agrava ainda

mais, haja vista que a região Sudeste tem 59% do total do financiamento, mais que o somatório de todas as demais. Essa concentração do financiamento no âmbito do programa é reflexo da própria concentração espacial da produção técnico-científica no Brasil, pois cerca de 80% dos pesquisadores ligados aos diferentes grupos de pesquisa estão nas regiões Sudeste e Sul. (ALBUQUERQUE et al, 2002, 2005; BARROS, 2007; FAPESP, 2011; CAPES, 2010).

Gráfico 5: Distribuição regional dos projetos

Fonte: Microdados da Capes. Gráfico elaborado pela autora

Não há documentação primária com informações claras que evidenciem os motivos da expansão. Os próprios depoimentos comprovam esse desconhecimento. Foi o que relatou um colaborador brasileiro: “não sei se tinham a pretensão de que fosse um programa só para o Nordeste ou se foi só o ponto inicial para que depois ele fluísse de acordo com a demanda”. Outros acreditam que a expansão se deu de maneira espontânea, conforme disposto por um colaborador francês: “o pensamento era criar uma elite francófona no nordeste do Brasil, isso foi muito bem-sucedido nos primeiros anos. Criou-se um vínculo muito forte, a estratégia naquele momento foi boa, mas no Nordeste não tinha tanta estrutura, então nesse aspecto não funcionou”. No entanto, há entrevistados que pensam que houve uma pressão ao Sul para que o programa tivesse alcance nacional, conforme observou um colaborador brasileiro: “é claro que ele sofreu evoluções não previstas. Ele foi inicialmente criado para fortalecer o Nordeste. Depois o ‘sul-maravilha’ se apoderou do programa”.