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1 INTRODUÇÃO

2.2 O território como base geográfica da existência social

O conceito de território, segundo Miranda e Matos (2002), corresponde aos espaços onde se localizam um ou mais agrupamentos humanos articulados entre si. Um território pode corresponder a uma microbacia, microrregião, assentamento, povoado, comunidade de pescadores, reserva indígena, a um conjunto de municípios que, em todos os casos, disponham de identidade natural e cultural. O conceito vai além de aspectos meramente técnicos e político-administrativos. A cultura local é um elemento determinante na delimitação dos territórios e iguala-se a outras variáveis como as sociais, geográficas, demográficas e econômicas. Ressalta-se ainda que a organização social e o capital social são elementos fundamentais para a conceituação e delimitação do território, bem como a análise do entorno nacional e internacional, para identificação das ameaças e oportunidades que incidem sobre ele.

Ainda segundo os mesmos autores, a sustentabilidade do desenvolvimento dos territórios se expressa pela consolidação da coesão social e coesão territorial6.

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A coesão social é entendida como expressão da comunidade rural e das sociedades nacionais integradas pela equidade social, pela solidariedade, pela justiça social e pelo sentimento de pertencer ao território. Já a coesão territorial é entendida como a inserção de espaços, recursos, economias, sociedades e instituições, interligados em um tecido que amolda regiões, revelando-se e definindo-se como entidades cultural, política e socialmente integradas.

A Secretaria de Desenvolvimento Territorial - SDT (BRASIL, 2005) conceitua território como sendo um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo a cidade e o campo, caracterizado por critérios multidimensionais - tais como o ambiente, a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições - e uma população com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão social, cultural e territorial.

Segundo Jara (2004), o território é um conceito dinâmico; nele sobrevive o passado e, ao mesmo tempo, criam-se os arranjos sucessivos do futuro. As forças que causam movimento nos territórios estão fora e dentro dos mesmos.

Territórios não são, simplesmente, um conjunto neutro de fatores naturais e de dotações humanas; constituem-se por laços informais e relações construídas ao longo do tempo, fontes da própria identidade dos indivíduos e dos grupos sociais (ABRAMOVAY, 2003).

Andrade (1995) ressalta que o conceito de território não deve ser confundido com o de espaço ou de lugar, estando mais ligado à idéia de domínio ou de gestão de uma determinada área. Assim, deve-se ligar sempre a idéia de território à idéia de poder, seja este público ou estatal. Para este autor, a formação de um território dá as pessoas que nele habitam a consciência de sua participação, provocando o sentido de territorialidade que, de forma subjetiva, cria uma consciência de confraternização entre elas.

O autor francês Gillardot (1997 apud FURTADO DE SOUZA; FURTADO, 2004, p. 55) destaca as seguintes características do território rural: a) tem limites definidos pelas relações que se estabelecem; b) possui um “centro nervoso” onde a vida pulsa, onde as decisões são tomadas; c) tem uma área de produção; uma área com serviços; uma área com vegetação nativa; d) possui uma rede de circulação constituída de caminhos, estradas e rios. É no território que a população constrói sua identidade, com seus sentimentos de pertença,

expressam seu patrimônio cultural, ou seja, é onde a sociedade define e gesta seu destino. O território é a base geográfica da existência social.

2.2.1 Abordagem territorial do desenvolvimento rural sustentável

Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (BRASIL, 2003a), o enfoque territorial é uma visão essencialmente integradora de espaços, atores sociais, mercados e políticas públicas de intervenção. Busca a integração interna dos territórios rurais e destes com o restante da economia nacional, sua revitalização e reestruturação progressiva, assim como a adoção de novas funções e demandas. Nessa perspectiva o desenvolvimento rural sustentável permite a formulação de políticas e estratégias centradas nas pessoas, por levar em conta os aspectos de interação entre os sistemas sócio-culturais e os sistemas ambientais, e considerar a integração produtiva e a utilização competitiva dos recursos produtivos como meios que permitem a cooperação e co- responsabilidade ampla de diversos atores sociais.

O território é a unidade que melhor dimensiona os laços de proximidade entre pessoas, grupos sociais e instituições que podem ser mobilizadas e convertidas em vantagem no estabelecimento de iniciativas para o desenvolvimento (BRASIL, 2005). Essa abordagem, com foco na gestão coletiva de uma área onde se constrói a identidade de um grupo social, indica que o território pode ser a unidade ideal de planejamento para se alcançar o desenvolvimento sustentável.

Para Miranda e Matos (2002), a adoção de um enfoque territorial tem implicações na definição de políticas públicas de desenvolvimento rural e de gestão do meio ambiente. Esse enfoque pressupõe:

a) reconhecer que há nos territórios rurais uma dimensão urbana que deve estar integrada de forma sinérgica com o ambiente rural;

b) considerar as diferentes funções cumpridas pelos sistemas naturais e o impacto que esses sistemas têm tolerado dos sistemas sociais e econômicos;

c) evidenciar a importância dos fatores históricos, culturais e institucionais que contribuem para a criação de especificidades territoriais;

d) destacar a relevância do manejo sustentável do ambiente e dos recursos naturais; e) abordar a heterogeneidade presente na região em termos do estado do ambiente.

Jara (2004) afirma que a abordagem territorial possibilita visualizar a diversidade de potenciais e possibilidades endógenas de sustentabilidade, visando torná-las dinâmicas, bem como as dificuldades e as ameaças, as rupturas e fragmentações sociais que bloqueiam os processos de desenvolvimento.

O enfoque territorial tem estimulado que os atores não apenas expressem seus conhecimentos, expectativas e conflitos, mas também suas habilidades de construir iniciativas coletivas e se organizarem em torno de novas idéias (ABRAMOVAY, 2003).

2.2.2 Capital humano e social, gestão social e institucionalidade

Conforme discussão anterior, a sustentabilidade dos territórios é garantida às organizações sociais mediante um esforço de coesão social, integração setorial, arranjos produtivos e gestão compartilhada. Segundo Jara (2004), os elementos que sustentam os processos de planejamento interativo são o capital e qualidade social, em escala territorial. Essa visão incorpora a diversidade produtiva, ambiental, social, institucional e cultural dos diversos territórios. A coesão e a confiança podem modificar a estrutura de redes de relacionamento, multiplicando vínculos sociais, com efeitos de escala territorial.

Ainda conforme o mesmo autor, a formação do capital humano e fortalecimento do capital social tornam-se essenciais para a organização da sociedade no planejamento e gestão dos territórios. Metodologias participativas para construção de estratégias de planejamento do desenvolvimento local sustentável levam em consideração o capital humano e social. O capital humano envolve o valor dos recursos humanos, em suas atitudes, história, habilidades, costumes, educação, capacitação e uso do conhecimento.

Para a Secretaria de Desenvolvimento Territorial do Ministério do Desenvolvimento Agrário (BRASIL, 2005), capital social é entendido como o conjunto de relações, sejam pessoais, sociais, ou institucionais, que podem ser mobilizadas pelas pessoas, organizações e movimentos visando um determinado fim, com base em processos de confiança, reciprocidade e cooperação. Envolve a capacidade das pessoas e grupos de estabelecer relações duradouras; desenvolver ações com custos reduzidos nas transações por meio da administração, venda e compra conjunta; compartilhar o uso de bens; conseguir recursos financeiros; e intercambiar informações.

Ressalta ainda que os processos de gestão social precisam se apoiar no capital social dos territórios. A gestão social é o processo pelo qual o conjunto dos atores sociais de um território se envolve em iniciativas que vão desde a mobilização de agentes e fatores locais até à implementação e avaliação das ações planejadas, incluindo as etapas de diagnóstico, elaboração de planos, negociação de políticas e projetos. Pressupõe um compartilhamento de responsabilidades pelo futuro do território, com protagonismo dos agentes locais, tornando-se referencial para a sustentabilidade no processo de desenvolvimento sustentável.

O sucesso do planejamento e gestão de planos de desenvolvimento sustentável será tanto maior quanto mais fortes forem as organizações de base (MIRANDA; MATOS, 2002).

Assim, a promoção da gestão participativa, o intercâmbio de experiências, a formação de parcerias e a construção de identidade, por meio do fortalecimento do capital humano e social,

tornam possíveis consensos significativos em um ambiente de conflito sócio-ambiental. Ressalta-se ainda a importância da institucionalidade para o desenvolvimento dos territórios.

Institucionalidades territoriais, segundo a Secretaria de Desenvolvimento Territorial (BRASIL, 2005), são espaços de expressão, discussão, deliberação e gestão, que congregam a diversidade de atores sociais, com representatividade e paridade entre forças sociais, e cuja atenção é voltada à gestão social das políticas e dos processos de desenvolvimento. Evita a prática verticalizada de gestão e busca acordos de negociação e decisão multisetoriais em um processo de planejamento ascendente, ultrapassando assim o sentido utilitarista imediato da organização. Como exemplo desses espaços, há os fóruns, conselhos, comissões, comitês, consórcios, articulações e outros arranjos institucionais.