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Os determinantes do crescimento econômico para países de renda média

2.3 ARMADILHAS DO DESENVOLVIMENTO E A CAPACIDADE DE

2.3.2 Os determinantes do crescimento econômico para países de renda média

Da literatura resenhada, identificam-se várias razões pelas quais os países de renda média podem enfrentar desafios particulares para manter altas taxas de crescimento e fazer a transição para o grupo de renda elevada. Todavia, não existe um consenso na literatura empírica sobre a existência, de fato, de uma armadilha específica para esses países ou mesmo se ela seria inevitável ou incondicional. De qualquer modo, apesar dessas limitações, e mesmo que esse termo se torne um mito (no sentido de que as armadilhas de renda ocorram com a mesma ou até em frequência maior em outras categorias de renda), a discussão e o próprio conceito ainda se revelam bastante importantes e úteis, sobretudo sob o ponto de vista político. Isso porque várias economias parecem ser confrontadas com o referido conceito durante a transição para o status de desenvolvido e pelo próprio número limitado de países de renda média que conseguiram alcançar um status de economia desenvolvida (mesmo que sua renda absoluta tenha crescido e que outras dimensões além da renda tenham melhorado substancialmente em muitos deles), contribuindo no reconhecimento dos desafios específicos

25 As faixas do PIB per capita relativo aos EUA que os autores usam são de valores menores ou iguais a 10%

que tais países podem enfrentar quando alcançam um estágio particular de desenvolvimento (GLAWE; WAGNER, 2016; ÁGENOR, 2017). Nesse sentido, a literatura em questão debruçou-se sobre os fatores relevantes no processo de desenvolvimento para se alcançar níveis mais elevados de renda.

Para Paus (2017), o principal motivo pelo qual os países da América Latina se encontram na MIT há várias décadas repousa no desenvolvimento insuficiente de capacitações inovativas domésticas, que gerou baixo crescimento da produtividade, rápida desindustrialização, um declínio na sofisticação das exportações de diversos países, fraco desempenho inovativo e subinvestimentos nas capacitações sociais. Adicionalmente, a autora identifica que o atual contexto da globalização traz ainda mais desafios para os países de renda média reduzirem os seus gaps de capacitações, pois eles dispõem de menos tempo para fazer isso, com mais players competindo no espaço inovativo, com as inovações tecnológicas cada vez mais aceleradas e com grandes alterações na arquitetura global da produção.

Vivarelli (2016) fornece uma discussão abrangente sobre uma série de questões que a literatura sugere ser crucial para lidar com os desafios que os países de renda média podem encontrar em suas tentativas de alcançar um status maior de desenvolvimento, com especial atenção ao papel do desenvolvimento da capacidade de inovação. A partir de uma abordagem evolucionária (focando-se no papel da mudança estrutural e da inovação tecnológica), o autor advoga que como as capacitações domésticas, a mudança estrutural e o progresso tecnológico apresentam-se como fenômenos inter-relacionados e que coevoluem simultaneamente, as decisões políticas dos países de renda média devem dar suporte para que essa evolução dinâmica, alinhada a um sistema nacional de inovação ativo, possa contribuir para um processo de catching-up bem sucedido para níveis mais elevados de renda e de produtividade.

Einchegreen, Park e Shin (2012) argumentam que a maior parte (cerca de 85%) da desaceleração econômica entre os países de renda média deveu-se à queda da taxa de crescimento da produtividade, enquanto que a acumulação de capital foi responsável pelo restante. Daude e Fernández-Arias (2010) chegam a conclusões semelhantes em estudo sobre os países da América Latina. Kim e Park (2017) examinam a importância do crescimento da produtividade nos países de renda média no período 1975-2014 e encontram que tal crescimento contribuiu de maneira significativa para a transição do grupo de nível de renda médio para o grupo de renda alta. Ademais, ao analisarem o papel dos fatores que influenciam o crescimento da produtividade em diferentes estágios de renda, os autores identificaram que o fortalecimento de atividades inovadoras e a construção de capacidades inovativas são

relevantes para a superação dos desafios que os países de renda média enfrentam quando transitam para o grupo de alta renda.

Jankowska, Nagengast e Perea (2012) aplicam a abordagem do “product space”26

para os países da América Latina e comparam com o desempenho de casos de sucesso de economias asiáticas para analisar as transformações que ocorreram na estrutura de exportação desses países ao longo do tempo e avaliar se elas contribuíram para o surgimento de uma MIT. Os autores concluem que, apesar de os países latino-americanos terem conseguido aumentar o número de indústrias com vantagens comparativas reveladas, eles especializaram suas pautas de exportação em indústrias de menor valor adicionado, apresentando perfis de exportação com poucas conectividades, enquanto que os países asiáticos foram capazes de evoluir paulatinamente em direção à indústrias de maior valor adicionado.

Utilizando diversos índices que captam as propriedades da estrutura de exportação de um país, Felipe, Abdon e Kumar (2012) comparam o perfil das exportações dos países na MIT com aqueles que conseguiram escapar dela. Os autores encontram que esses últimos, apresentavam uma cesta de exportação mais diversificada, sofisticada e com maiores oportunidades de transformação estrutural quando no momento da transição do nível de renda média para o nível de renda alta, enquanto que os primeiros exibiam um perfil exportador bastante diferente.

Einchegreen, Park e Shin (2014) apontam que uma das maneiras para os países de renda média manter taxas de crescimento elevadas consiste em subir a escada tecnológica para a produção de bens mais sofisticados para penetrar nos mercados globais desses produtos e elevar a concorrência para países em desenvolvimento com custos menores. Utilizando modelos de regressão probit, os autores encontram que países de renda média com uma parcela relativamente elevada de exportações de alta tecnologia reduzem significativamente a probabilidade de desacelerações de crescimento. Outro resultado dos autores foi que países de renda média que passam da etapa de mero montador para produtor de bens tecnologicamente mais sofisticados são menos vulneráveis aos choques globais de demanda.

Aiyar et al. (2013) investigando os determinantes de desacelerações do crescimento (sendo a MIT um caso específico dessas desacelerações) a partir de 42 variáveis por meio de regressões probit e de Bayesian model averaging para validar os resultados, encontram entre

26 O Product Space é uma abordagem empírica desenvolvida por Hidalgo et al. (2007), a qual identifica e

posiciona os produtos mais sofisticados e complexos em um núcleo central densamente conectado, enquanto produtos menos sofisticados ocupam um lugar mais distante do centro (na periferia), apresentando menos conexões com outros produtos. Dessa forma, os países se movem através do espaço-produto desenvolvendo bens próximos aos que eles produzem atualmente.

outras variáveis, que a diversificação setorial da produção e da pauta exportadora estão associadas a uma menor probabilidade de desacelerações de crescimento das economias.

Milberg, Jiang e Gereffi (2014) argumentam que os países de renda média enfrentam um problema de ter atingido um nível de declínio na especialização vertical em relação a outros países em desenvolvimento e que a dificuldade de tais países de se moverem para partes tecnologicamente mais sofisticadas da cadeia de valor pode ser considerara como uma das razões de estarem presos na MIT.

Melguizo et al. (2017) analisam as principais políticas que explicam a MIT com base nas experiências de 76 economias emergentes e países da OCDE, comparando as que mudaram o seu nível de renda com as que permaneceram na mesma faixa ao longo do período 1950-2015. Com base em 23 variáveis e mais de 200 mil estimações usando análises discriminantes lineares e método de controle sintético, os autores identificaram variáveis como capacitações27, participação de manufaturados nas exportações totais, diversificação das exportações e grau de abertura, entre outras, como prioridades políticas para se superar a MIT. Bulman, Eden e Nguyen (2017) encontram evidências de que os determinantes do crescimento diferem entre os níveis de renda, indicando que os países de renda média podem precisar mudar suas estratégias de crescimento para ter uma transição mais tranquila a níveis mais altos de renda. Entre os fatores associados a um crescimento elevado das economias que fizeram a transição, os autores indicam como relevantes, entre outras, a estrutura produtiva (em particular, uma transição mais rápida da agricultura para a indústria) e a maior participação das exportações. Ademais, os autores encontram que o crescimento da produtividade (medida pela produtividade total dos fatores) é uma fonte muito maior de crescimento econômico, em termos absolutos e relativos, nos países de renda média e alta do que nos países de renda baixa.

Glawe e Wagner (2017) avaliam um amplo conjunto de estudos teóricos e empíricos com implicações políticas de maneira a identificar os principais fatores desencadeantes (triggering factors) para assegurar o crescimento a longo prazo e evitar-se cair na MIT (ou nas desacelerações do crescimento) e encontram que os fatores relacionados ao lado produtivo/real da economia28 parecem ser mais importantes do que os macroeconômicos/monetários ou institucionais.

27

Medidas pelo Índice de Complexidade Econômica proposto por Hidalgo e Hausmann (2009), isto é, a quantidade de conhecimento produtivo embutida na estrutura de exportação do país.

28 Sobretudo, as variáveis capital humano, estrutura das exportações e produtividade total dos fatores, justamente

Apreende-se, então, o papel-chave da produtividade, da estrutura produtiva, da inovação tecnológica e das capacitações domésticas para os países de renda média conseguirem, ou não, alcançar taxas sustentadas de crescimento e, consequentemente, empreenderem processos virtuosos de catch-up. Essa discussão, logo, se insere no contexto mais amplo de se compreender a relevância desses fatores para uma economia lograr sucesso em sua trajetória de desenvolvimento, independentemente do seu nível de renda. Nesse particular, diversas são as abordagens que enfatizam a necessidade das economias orientarem suas estratégias de desenvolvimento para a criação e sustentação de tais fatores.

2.3.3 O papel da mudança estrutural e das capacitações tecnológicas para a