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A Ovelha Perdida

No documento Parabolas de Jesus Completo Kistemaker (páginas 179-183)

Após o culto na sinagoga, aos sábados, os judeus costumavam ter uma lauta refeição, para a qual, muitas vezes, havia vários

32. A Ovelha Perdida

Mateus 18.12-14 “Que vos parece? Se um homem tiver cem ovelhas, e uma delas se extraviar, não deixará ele nos montes as noventa e nove, indo procurar a que se extraviou? E, se porventura a encontra, em verdade vos digo que maior prazer sentirá por causa desta do que pelas noventa e nove que não se extraviaram. Assim, pois, não é da vontade de vosso Pai celeste que pereça um só destes pequeninos”. Lucas 15.4-7 “Qual, dentre vós, é o homem que, possuindo cem ovelhas e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove e vai em busca da que se perdeu, até encontrá-la? Achando-a, põe-na sobre os ombros, cheio de júbilo. E, indo para casa, reúne os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Digo-vos que, assim, haverá maior júbilo no céu por um pecador que se arrepende do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento”.

Entre as parábolas contadas por Jesus, a da ovelha perdida é a que cm tido maior apelo entre as crianças. Elas conseguem visualizar a ovelha perdida, o amor e a preocupação do pastor, e sua alegria e felicidade quando a reencontra. Muitas canções e hinos têm sido escritos sobre o tema.

Tanto Mateus quanto Lucas registraram a parábola da ovelha perdida. Em resumo, os dois relatos se mostram idênticos, embora haja variação nos pormenores. É bem possível que Jesus tenha contado a parábola duas vezes, em ocasiões diferentes388.Além disso,

histórias sobre pastores e ovelhas tinham particular interesse e significado para a sociedade pastoril daqueles dias.

Em Mateus, bem como em Lucas, Jesus começa a parábola com uma pergunta de retórica que, em Lucas, envolve os ouvintes (“Qual, dentre vós”): “... que, possuindo cem ovelhas... não deixa no deserto as noventa e nove...?” Alguém que possuísse cem ovelhas não era um homem de muitos recursos. Ele mesmo tomava conta do rebanho, conhecia-as pelo nome e as contava pelo menos uma vez por dia389.

Quando o pastor se distraiu por momentos, uma das ovelhas se afastou, abocanhando algo aqui e ali, até que estava completamente

388 Marshall, Luke, p. 600’; Plummer, St. Luke, p. 368. Para um estudo mais

detalhado, consulte-se J. Jeremias, “Tradition und Redaktion in Lukas 15”, ZNW 62 (1971): 172-89.

desgarrada do resto do rebanho. O pastor deixou o resto do rebanho nos montes (Mateus) ou no deserto (Lucas)390.Embora a parábola diga

apenas que o pastor deixou as noventa e nove ovelhas, não menciona que as deixou desprotegidas391.Além do mais, o objetivo da parábola

não são as noventa e nove, e, sim, aquela que se perdeu. As ovelhas são animais gregários; vivem juntas em grupo. Quando uma ovelha se separa do rebanho, fica desnorteada392. Deita no chão, imóvel,

esperando pelo pastor. Quando ele, afinal, a encontra, coloca-a sobre os ombros, para caminhar de volta, mais depressa, até onde deixou o rebanho393. Logo o pastor, a ovelha e o rebanho estão todos juntos

outra vez.

Este poderia ter sido o final da história, mas não foi. A história cresce em emoção no seu clímax com a alegria que toma conta do pastor. Jesus diz: “... em verdade vos digo que maior prazer sentirá por causa desta, do que pelas noventa e nove, que não se extraviaram” (Mt 18.13). Para ser verdadeira a felicidade precisa ser compartilhada. O pastor vai para casa, chama seus amigos e vizinhos e os convida a se alegrarem com ele, porque, diz o pastor: “... já achei a minha ovelha perdida” (Lc 15.6). A tensão que o pastor sentira enquanto procurava a ovelha extraviada tinha desaparecido, dando lugar à alegria394. Ele comemora com seus amigos e vizinhos.

Aplicação

Os relatos de Mateus e Lucas diferem, obviamente, na aplicação, por causa das circunstâncias históricas nas quais Jesus contou a parábola. No Evangelho de Mateus, uma pergunta foi proposta pelos discípulos: “Quem é, porventura, o maior no reino dos céus?” Ao responder, Jesus, de modo muito significativo, colocou uma criança no círculo dos discípulos e lhes disse: “Se não vos converterdes e não vos tomardes como crianças, de modo algum entrareis no reino dos céus” (Mt 18.3). Prosseguiu advertindo-os a não fazer “tropeçar a um destes pequeninos que crêem em mim”, nem a desprezá-los. Jesus, então, contou a parábola da ovelha perdida e aplicou-a as crianças. “Assim, pois, não é da vontade de

390 M. Black. Ais Aramalc Approach lo lhe Gospels and Acts, 3rd cd. (Oxford;

Clarendon Press, 1967), p. 133, sugere que a palavra montes pode ter recebido a influencia do aramaico tura, “que no siríaco da Palestina tinha dois sentidos: montanha’ e ‘campo’, o ‘campo aberto’ em contraste com os lugares habitados”.

391 “Devemos imagina-las em algum lugar cercado” Smith, Parables, p. 188 nº 2. 392 Armstrong, Parables, p. 185.

393 Jeremias, Parables, p. 134, e Brouwer, Gelijkenissen, pp. 225-26, descreve o

pastor com uma ovelha ao redor do pescoço, segurando suas patas dianteiras e traseiras com cada uma das mãos. Veja-se também SB, 11:209.

394 O Evangelho de Tomé, Citação 107, mostra uma tendência gnóstica na parábola,

acentuando o amor do pastor pela ovelha, por causa de seu tamanho: “Disse Jesus: o reino é como um pastor que possuía cem ovelhas. Uma delas se extraviou; era a maior delas. Ele deixou as noventa e nove e procurou aquela até encontrá-la. Após o esforço, disse à ovelha: “Eu te quero mais que às noventa e nove”.

vosso Pai celeste que pereça um só destes pequeninos”.

No contexto, a expressão se refere às crianças, mas, levando em conta a demonstração visual feita por Jesus, colocando uma delas no círculo dos discípulos, “estes pequeninos” passam a ter conotação espiritual. Jesus está se referindo àqueles cuja fé mantém a simplicidade das crianças395. Como um pastor vigia suas ovelhas, e

até mesmo sai à procura daquela que se extravia, assim Deus cuida daqueles que acreditam nele, especialmente as ainda crianças na fé396. Se algum se extraviar, Deus irá a busca dele porque não quer

“que pereça um só destes pequeninos”.

O Evangelho de Lucas relata que Jesus foi cercado por publicanos e “pecadores”, que tinham vindo para ouvi-lo397. Os

fariseus e os escribas se escandalizaram com isso e murmuravam: “Este recebe pecadores e come com eles” (Lc 15.2). Cercado por aqueles que ainda eram crianças no espírito, Jesus contou a parábola da ovelha perdida, e concluiu, dizendo: “Digo-vos que assim haverá maior júbilo no céu por um pecador que se arrepende, do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento.” Jesus comparou os publicanos e as pessoas sem moral a uma ovelha que se extraviou. Perdida, ela não respondeu mais ao chamado do pastor. Não queria se mexer. Quando o pastor a encontrou, teve que erguê-la e colocá-la em seus ombros para levá-la de volta ao rebanho.

Os coletores de impostos eram judeus empregados pelo governo romano. O povo os considerava traidores e os afastava da sociedade. Pertenciam à mesma classe dos marginalizados moralmente. Um judeu não devia ter qualquer contato com tais pessoas, e muito menos comer com elas. Havia barreiras entre os judeus e os “pecadores”, mas estas não impediram que Jesus ensinasse aos marginalizados a mensagem da salvação. Ele lançou uma ponte sobre esse abismo e trouxe o pecador de volta para Deus.

Deus se alegra mais por um desses proscritos que se arrependem que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento398. Ele está genuinamente interessado na salvação do

pecador. Como um pastor, ele vai à procura do homem que é incapaz

395Morison, St. Matthew, p. 317.

396 Jeremias, Parables, p. 39, traduz Mt 18.14 da seguinte maneira: “não é da

vontade de Deus que nenhum destes mais pequeninos se perca.” Ele aplica a expressão “mais pequeninos” aos apóstatas que deveriam receber o cuidado pastoral por parte da comunidade cristã (p.40).

397 K. H. Rengstorf, TDNT, 1:327-28, apresenta uma dupla interpretação da palavra pecador, como era entendida pela hierarquia judaica. (a) O pecador é “um homem

que vive em oposição, consciente ou intencionalmente, à vontade divina (Torá), diferentemente do justo que faz da submissão a esta vontade sua alegria de viver”. E (b) é o homem “que não se sujeita aos rituais farisaicos”.

398 As regras religiosas daquele século e do século seguinte falam mais sobre a

de fazer qualquer coisa por si mesmo. Deus vai a busca do homem, não o homem em busca de Deus. Neste ponto, o Cristianismo difere das outras religiões do mundo399. Deus encontra o homem que está

perdido em pecado. Quando o pecador é encontrado, há júbilo no céu. Naturalmente, há alegria por aquele que faz a vontade de Deus, mas, quando um pecador volta para Deus, em arrependimento e fé, é chegado o tempo da celebração. Um filho de Deus, que estava perdido, foi achado.

No documento Parabolas de Jesus Completo Kistemaker (páginas 179-183)