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CAPÍTULO 4 O QUOTIDIANO E A RAZÃO SENSÍVEL: CONSTRUÇÕES

4.1 UMA APRESENTAÇÃO PRELIMINAR DE MICHEL MAFFESOLI

4.1.2 Pós-modernidade: a leitura de um tempo para a compreensão da vida

Identificando as transformações que a sociedade contemporânea passa e se mostra variável e, curiosamente, complexa e inquieta, com o impacto que estas transformações geram

no quotidiano de cuidado de Enfermagem às famílias no ambiente Hospitalar, trouxe concep- ções de alguns autores sobre o que seria o tempo atual que vivemos a pós-modernidade.

Em seu livro “Notas da Pós-modernidade”, Maffesoli (2004), refere que este termo é de extrema criticidade e é esta característica que o transforma em provocativo e gera controvérsias. Foi com esta preocupação constante, de perceber no meu quotidiano de cuidado de Enfermagem, nestes últimos dozes anos, as tantas imagens e transformações no processo de cuidar de famílias, crianças, enfim, o processo de cuidar no ambiente Hospitalar, é que estabeleci ser a compreensão do que vem a ser pós-modernidade. Acredito que este seja o caminho possível para o entendimento das reações e ações no processo de cuidar da Enfermagem na sua trajetória histórica.

Para iniciar algumas descrições da noção de pós-modernidade que Maffesoli defende, o mesmo referencia uma frase conhecida dita há séculos por Schopenhauer: “essa realidade é puramente relativa”. Ou seja, todo objeto ou fenômeno está ligado á outros e determinado por estes. Por isso, sujeito a transformações, mudanças, que podem ser ao acaso, o que confere a imagem de impermanência das coisas.

Assim, o relativismo discursado por Maffesoli (2004), trata em relacionar os diversos elementos da vida e atestar um fluxo vital. A pós-modernidade é uma noção que alavanca metodologicamente como compreender relações e fenômenos sociais que estão em estado nascente. Esses períodos de mudança das civilizações que são importantes para o desenvolvimento do ser, é a capacidade do pensamento livre.

Historicamente, prevaleceu o domínio da razão em oposição à sensibilidade, não havia lugar, espaço para que ambos conjugassem sua importância nas relações sociais para a qualidade da vida humana. Foi na modernidade que a tecnologia surgiu de forma avassaladora e qualquer outra forma de ciência foi abolida. Somente o que é comprovado, medido, explicado era científico. As intuições, a descrição do vivido, enfim, a sensibilidade, era descartada como incompatível com as aspirações da modernidade.

A noção de Maffesoli (2004, p. 20), o autor relata que “não existem começos nem fins abruptos” e há um desgaste dos elementos que compõem uma época, e isso, é o fator determinante para um passo à frente, assim, surge a pós-modernidade. Neste novo tempo, a leitura é explorada sobre as seguintes ordens e desordens: remexer as panelas, reunir indícios, dar algumas indicações, objetivando apontar as tendências gerais desta época. Maffesoli (2004, p.21), diz que se fosse possível definir claramente a pós-modernidade, ele diria que “é a sinergia de fenômenos arcaicos com o desenvolvimento tecnológico”. O autor reforça que a

intuição, o retorno ao local, a importância das tribos, da montagem mitológica são as nuanças próprias da pós-modernidade.

Para Lyon (2005), a pós-modernidade é uma idéia, uma experiência cultural, ou uma condição social. É uma forma de crítica à mente dos intelectuais e aos meios de comunicação. O autor diz que é importante aprofundar esta idéia de pós-modernidade, pois esta alerta para questões importantes, desperta nossa sensibilidade e contribui na percepção de problemas, assuntos que precisam ser explicados.

Lyon (2005, p.17), comenta que: “a pós-modernidade, por outro lado, concentra-se no esgotamento da modernidade, e está preocupada com as mudanças sociais putativas. Uma nova espécie de sociedade está surgindo, cujos contornos já podem ser tenuemente percebidos’’. O autor relembra as características da modernidade, onde imperou a racionalização, a diferenciação, o individualismo, o urbanismo, o controle, a disciplina, a ambivalência da modernidade, alienação e exploração, a anomia e perda de direção, a jaula de ferro, uma sociedade de estranhos. Assim, nesse período histórico, as tradições perderam sua importância, houve um distanciamento das pessoas, de seus grupos, suas tribos, o que levou a grandes mudanças nos arranjos familiares, enfim, na imagem da sociedade como um todo.

Para Maffesoli (2004, p. 31):

Talvez a época pós-moderna esteja mais atenta à impermanência das coisas mais estabelecidas. O certo é que a emergência de valores arcaicos, que julgávamos totalmente ultrapassados, deve deixar-nos atentos ao fato de que, se as civilizações são mortais, a vida, por sua vez, curiosamente perdura. Assim, sem atribuir a esse termo um status conceitual demasiadamente rígido, a pós-modernidade foi uma pós-medievalidade, ou seja, que ela nos permite uma nova composição do estar-juntos.

Complementando ainda sobre a noção de pós-modernidade, Maffesoli (2004), referencia como um dever espiralesco do mundo. Quando uma idéia cessa, o qual uma civilização estava alicerçada, uma nova idéia nasce, porém, com a junção de elementos de uma constelação do que foi renegado, dos elementos que existiu e foi importante, bem como, com as novas adequações que o tempo da época anuncia. A pós-modernidade é um mosaico com textos que precisam ser explorados: a crítica da doxa individualista, a importância do lúdico, a função do arquétipo, a necessidade de instaurar uma razão sensível em oposição ao racionalismo dominante, o retorno ao lugar, onde o elo é estabelecido.

com as características do tempo que vivemos, onde ainda persistem famílias sem moradia, falta de tratamento de saúde, políticas públicas indefinidas, enfim, atraso tecnológico em relação aos inúmeros países, pela degradação dos tempos. Zizek (2004, p. 13), relata “que, com a pós-modernidade, tudo se tornou demasiadamente próximo, promiscuo, sem limites, deixando-se penetrar por todos os poros e orifícios”. Este mesmo autor concebe a pós- modernidade como um declínio da ordem, e o efeito social imediato é a perversão, citando a violência, o terrorismo, as guerras ideológicas.

Em contrapartida, tanto Maffesoli (1984-2007) quanto Morin (2007), enfatizam que este jogo da ordem e desordem é o que faz o movimento da vida, e reforça a capacidade de um pensamento livre sem as amarras do poder dominante de limitar os seres humanos aos avanços. A pós-modernidade possibilita um mergulho nas contribuições de épocas passadas, do presenteísmo, para a idealização do futuro, sempre considerando o interesse no presente com a busca de ser feliz, seja qual for a lógica de um povo.

Maffesoli (2007 a), também contribui com a idéia de que o imaginário é outra maneira de ficarmos atentos a sociedade complexa, à solidariedade orgânica que se esboça no sentido de correspondência, de proximidade, de estar com o outro sem perder seu olhar, de inter-relação e interações que se expressam no quotidiano. Então, onde tudo acontece? Na pós-modernidade, o tempo que vivemos hoje. Como? No quotidiano.