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EMPRESAS DE CAPITAL NACIONAL

3.6. A pesquisa empírica: os efeitos do regime vistos da perspectiva dos contribuintes e do fisco

3.6.2. Resultados da pesquisa

3.6.2.2. Efeitos econômicos do regime brasileiro de tributação de lucros auferidos no exterior

3.6.2.2.2. Percepções do Fisco

Em relação às entrevistas feitas junto ao fisco, cabe ressaltar que foram entrevistadas autoridades fiscais que pertenceram ou pertencem ainda ao médio e alto escalão da RFB. As autoridades de médio escalão ocupavam a posição de delegados da RFB. As autoridades de alto escalão entrevistadas foram o ex-secretário da Receita Federal do Brasil, Everardo Maciel, e o ex-subsecretário da Receita Federal do Brasil, Marcos Vinícius Neder.

187 Os percentuais relativos às cargas tributárias dos países são aproximados.

188 No exemplo analisado, a carga tributária efetiva arcada pela empresa brasileira foi, ao final, de 67%, 50,5% e

Novamente, ressaltamos que o nosso objetivo não foi compor um universo amostral, mas, sim, captar as percepções de entrevistados estrategicamente selecionados.

De forma geral, as opiniões e as percepções demonstradas pelos entrevistados divergem sensivelmente. Os funcionários pertencentes ao médio escalão se posicionaram de forma extremamente favorável ao regime e ressaltaram, a todo tempo, as suas vantagens para a Fazenda Nacional. Os ex-funcionários de elevado escalão na RFB divergiram em diversos pontos tratados relativos às vantagens do regime brasileiro, mas, de modo geral, assumiram uma postura mais crítica em relação a ele, de modo a tratar não apenas das suas vantagens como também das suas falhas e ineficiências.

Apresentaremos, primeiramente, os posicionamentos dos entrevistados pertencentes ao médio escalão da RFB, ressaltando as vantagens do regime e, posteriormente, serão apresentados os relatos dos entrevistados que pertenceram a postos do alto escalão da RFB com um viés mais crítico.

Em relação aos entrevistados de médio escalão é importante ressaltar, primeiramente, que, aos olhos dos entrevistados, o regime brasileiro estabelece o primado da neutralidade na exportação de capitais. Neste sentido, do ponto de vista dos entrevistados, o regime de tributação em bases universais da pessoa jurídica adotado pelo Brasil teria surgido como uma

reação governamental ao fenômeno mais amplo da globalização – causa central da

transformação do Estado-nação no Estado-transcional – estrategicamente orientada para a

defesa contra a perda de base imponível dos Estados. Um dos problemas identificados nas entrevistas que se deseja evitar é a dupla não tributação internacional da renda que ocorre fundamentalmente quando dois Estado deixam de exercer o seu poder de tributar uma determinada materialidade.

Quando questionados sobre o porquê de o regime brasileiro diferir da prática internacional, a postura deste grupo de entrevistados foi no sentido de defender que o regime adotado pelos outros países é facilmente contornável pelo contribuinte e é muito mais difícil de ser fiscalizado.

No tocante à questão do aproveitamento das ajudas de Estado, os entrevistados se posicionaram no sentido de defender que o Brasil não deve homologar automaticamente as ajudas concedidas por outros países. A decisão de homologar deve ser vista como uma decisão de natureza política e, portanto, deve ser analisada casuisticamente pelo Governo Federal.

Ao serem questionados quanto à possibilidade de o regime brasileiro de tributação em bases universais gerar efeitos econômicos danosos ao processo de internacionalização produtiva e à competitividade das empresas de capital nacional no exterior, as autoridades fiscais ora tratadas negaram, em um primeiro momento, que o regime brasileiro gerasse qualquer efeito negativo. No entanto, no decorrer das entrevistas, momento em que o tema foi analisado em maior profundidade, as autoridades entrevistadas reconheceram que o regime pode apresentar impactos econômicos significativos.

Em relação à temática dos efeitos econômicos provocados pelo regime, Marco Aurélio

Greco, em entrevista concedida189, demonstrou interessante visão favorável à tese de que o

regime não afetaria, em princípio, nem o processo de internacionalização produtiva nem a competitividade das empresas brasileiras nos mercados externos. Ele respalda o seu argumento no fato de que a tributação recai sobre o acréscimo que houve no patrimônio da pessoa jurídica brasileira quando do reconhecimento dos lucros auferidos no exterior por sociedades controladas e coligadas. Neste sentido, conforme será demonstrado no próximo capítulo, o referido autor não entende que a tributação recai sobre os lucros auferidos no exterior. Esta perspectiva afastaria, em princípio, a tese de que o regime poderia repercutir negativamente na pessoa jurídica residente no exterior. A única hipótese em que o regime jurídico brasileiro poderia afetar a competitividade das empresas de capital nacional no exterior, a seu ver, seria se houvesse um plano de investimentos da controladora ou coligada nas suas controladas ou coligadas residentes no exterior.

Por “plano de investimentos”, entende-se como sendo o emprego de capital da controladora ou coligada na sua controlada ou coligada residente no exterior (e.g. através de aporte de capital na sociedade controlada ou coligada ou através de empréstimos) para financiar a expansão das suas atividades no exterior ou, simplesmente, para lhe prover maior fluxo de caixa. O plano pode ser periódico ou não. O importante é que ele envolva o investimento de capital na sociedade controlada ou coligada no exterior após a sua constituição. O plano de investimento ficaria caracterizado se, após constituída, a sociedade residente no exterior não tivesse condições de autofinanciar a sua expansão com o seu próprio lucro.

189 Entrevista realizada com o Professor Marco Aurélio Greco, na Escola de Direito de São Paulo da Fundação

Getúlio Vargas, no dia 01/03/2011. O entrevistado autorizou a utilização da entrevista para os fins da presente pesquisa e permitiu a menção ao seu nome.

A visão apresentada pelo entrevistado, apesar de plausível, não se sustenta, pois, a nosso ver, desconsidera o fato de que muitas vezes as empresas são obrigadas a repatriar renda do exterior para poderem adimplir com a tributação incidente no Brasil sobre os lucros auferidos no exterior, fato que reduz a sua capacidade de reinvestimento, ensejando perda de capacidade competitiva. A perspectiva adotada por Marco Aurélio Greco parte de uma separação formal da personalidade jurídica da sociedade controladora ou coligada e da sociedade controlada ou coligada residente no exterior que leva ao equívoco de se inferir que as duas sociedades são entidades economicamente autônomas. Adotar essa perspectiva é plausível para uma análise de repercussões jurídicas (e.g. definição de responsabilidade civil). No entanto, adotá-la para definir as repercussões econômicas consiste, a nosso ver, em um erro já que desconsidera o fato de que um grupo societário deve ser visto como um único grupo econômico. A compreensão mais adequada da dinâmica do sistema financeiro empresarial deve sempre se respaldar na visão do todo, ao invés da visão segmentada das partes que o compõe.

Em relação aos entrevistados que pertenceram a cargos de elevado escalão da RFB, a sua visão, apesar de divergente em diversos pontos, é mais crítica quanto ao regime jurídico vigente atualmente. A entrevista realizada com Everardo Maciel revela, conforme se demonstrou no capítulo 2, que o regime assumiu forma abrangente porque a sua criação havia precedido de uma discussão sobre elisão fiscal internacional considerada essencial para que o regime possuísse contornos antielisivos de modo a combater somente o planejamento fiscal internacional considerado abusivo, envolvendo paraísos fiscais e a concessão de regimes fiscais privilegiados.

Em um primeiro momento da entrevista, o ex-secretário da Receita Federal do Brasil, que foi o autor da proposta encaminhada à Presidência da República do regime de tributação de lucros auferidos no exterior, negou que o regime poderia afetar a internacionalização produtiva ou a competitividade das empresas de capital nacional que operam em mercados

externos. No entanto, ao final da entrevista, ele reconheceu que o regime “pode

eventualmente ter” efeitos concorrenciais negativos e defende que o regime deve ser revisto diante de um debate mais maduro sobre o tema da elisão fiscal internacional.

O ex-subsecretário da Receita Federal do Brasil, Marcos Vinícius Neder, assume uma postura bem mais crítica frente ao regime de tributação em bases universais adotado pelo Brasil. Segundo ele, o regime brasileiro, por possuir uma regra de antidiferimento aplicável de forma geral a qualquer tipo de rendimentos auferido em qualquer jurisdição fiscal, prejudica

concorrencialmente as subsidiárias das empresas de capital nacional na conquista de novos mercados.

Fica claro, na exposição dos resultados das entrevistas realizadas com funcionários e ex-funcionários da RFB, que não há um consenso entre eles quanto às vantagens e desvantagens do regime de tributação em bases universais adotado pelo ordenamento jurídico brasileiro. De modo geral, os funcionários entrevistados de escalão médio tenderam a defender as vantagens decorrentes do regime, em especial, a sua eficiência arrecadatória e os seus relativos baixos custos de fiscalização e controle talvez até por uma postura mais corporativista. Por outro lado, os ex-funcionários entrevistados de maior escalão assumiram uma postura muito mais crítica quanto o regime.

3.7. Conclusões dos efeitos do regime de tributação de lucros auferidos no exterior

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