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Perturbação esquizotípica da personalidade

No documento Os Estados Passionais nos Homicídios (páginas 82-87)

4. Principais anomalias mentais susceptíveis de aplicação forense

4.3. Síndrome e perturbação delirante

4.4.2. Tipos de esquizofrenia

4.4.2.2. Perturbação esquizotípica da personalidade

As características centrais da perturbação esquizotípica da personalidade são semelhantes às descritas para a personalidade esquizóide (no passado estas afecções eram designadas de esquizofrenia latente ou esquizofrenia “borderline”) no entanto, verifica-se uma deterioração mais marcada nas aptidões sociais e no relacionamento interpessoal e a que se associam comportamentos peculiares, tais como: ideação estranha ou pensamento mágico (inconsistentes com as normas culturais e o nível intelectual e emocional da pessoa) como superstições, experiências de clarividência, telepatia, sexto sentido; ideias sobrevalorizadas; auto-referência não delirante; experiências perceptivas incomuns com ilusões recorrentes, sensação de presença de uma força invisível ou pessoa ausente e sem carácter alucinatório; pensamento ou discurso bizarro, vago, muito elaborado, metafórico, circunstancial ou estereotipado; ideação paranóide; afecto embotado ou inapropriado; comportamento estranho (por exemplo gesticular, falar para si próprio em público); vestuário peculiar e aparência excêntrica ou bizarra149.

148 Cf. DSM-IV in http://allpsych.com/disorders/dsm.html

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Em termos Clínicos costumam considerar-se cinco subtipos principais de esquizofrenia: paranóide, hebefrénico (desorganizado segundo a DSM IV), catatónico, indiferenciado e residual, a que se associa o tipo simples, categoria que não é aceite por todas as classificações. Estas formas designam sobretudo a sintomatologia predominante na altura da avaliação, pois muitos doentes apresentam uma mistura de sintomas dos vários quadros, sendo frequente a passagem de uma forma para outra ao longo da evolução da perturbação. Deste modo, os critérios de diagnóstico propostos pelo DSM IV servem como paradigma básico ao quadro de síndromes da esquizofrenia, sendo certo que a complexidade de cada síndrome justifica uma análise pormenorizada sobre a fenomenologia dessas afecções.

4.4.2.2.1. Esquizofrenia paranóide

Este subtipo de esquizofrenia é considerado o que apresenta melhor prognóstico em relação ao funcionamento profissional e à capacidade de a utonomia do doente, constituindo o modelo mais vulgar da pessoa com esquizofrenia, sendo também considerado como o subtipo mais persistente, homogéneo e estável, com tendência a manter as suas características ao longo de todo o curso.

Inicia-se em regra de modo abrupto ou insidioso nos adultos acima dos 25 anos, e apresenta como primeiros e únicos sintomas uma série de ideias delirantes a que se associam também algumas alucinações. As alterações características do pensamento e da vontade, a desorganização do discurso e do comportamento e o afecto embotado ou inapropriado não são proeminentes.

Nas fases iniciais o doente pode conseguir adaptar-se à vida diária, dissimulando ideias e sentimentos absurdos mas, à medida que a psicose avança, referências e explicações delirantes para o que acontece invadem o EU, tornando o quadro clínico evidente, observando-se, contudo, uma relativa preservação do afecto e das funções cognitivas, embora a doença evolua para uma deterioração da personalidade.

Os doentes são reservados, circunspectos, desconfiados e hostis, sentindo-se perplexos e cada vez mais presos nesta malha. Suspeitam que lhes querem fazer mal, auto-relacionam acontecimentos do dia-a-dia como dirigidos para si, tentam defender-se de supostos inimigos e isolam-se progressivamente voltando-se para si próprios. Apresentam tipicamente ideias delirantes de perseguição e de grandeza ou outras

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(ciúmes, místicas ou somáticas), acompanhadas de alucinações acústico- verbais (por ex. vozes acusatórias, que lhe dão ordens, comentam a sua vida e entram na intimidade).

São quadros muito produtivos, com fortes sentimentos de passividade, ideias delirantes de influenciamento, roubo e difusão do pensamento, sendo habitual que os delírios, embora fragmentados e bizarros, se organizem à volta de um tema e as alucinações se relacionem com o conteúdo das ideias delirantes, podendo predispor as pessoas afectadas a manifestações de grande conflituosidade, raiva e violência ou a comportamentos auto-agressivos e suicidas150.

4.4.2.2.2. Esquizofrenia hebefrénica

Trata-se de um tipo de Esquizofrenia, mais frequente entre os jovens dos 15 aos 25 anos, que se inicia, em regra, insidiosamente, sob a forma de queixas depressivas (frequentes como 1º sinal), introversão e ansiedade, mas vivênc ias de estranheza e sentimentos de perplexidade podem também surgir nesta fase.

Estes doentes que têm um historia familiar de alterações psicopatológicas e um funcionamento pré- morbido deficiente, progridem rapidamente para uma grave regressão e desagregação da vida psíquica em que a incoerência ideo-verbal (discurso e pensamento desorganizados) e da vontade constituem, de certo modo, a triologia características desta forma. Os indivíduos exibem uma atitude néscia e pueril com ambivalência afectiva, risos d iscordantes e paramímias abundantes. Manifestam também uma profunda ruptura no cuidado pessoal e uma intensa perturbação nas áreas instintiva e afectiva, com comportamento marcadamente regredido, desinibido e desorganizado e contacto pobre e inadequado com a realidade e com as outras pessoas, sendo habitual que as atitudes primárias do afecto passem, eventualmente, ao acto.

Este enfraquecimento insidioso da vontade, que se verifica desde o inicio da doença, bem como as perturbações cognitivas e a acentuação da libido conduzem, nos jovens, a perturbações sérias na esfera sexual e à promiscuidade. Ideias delirantes e actividades alucinatórias são esporádicas, pouco sistematizadas e incoerentes151.

4.4.2.2.3. Esquizofrenia catatónica

150 Cf. DSM-IV in http://allpsych.com/disorders/dsm.html

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Segundo KENDLER a esquizofrenia catatónica é, comparativamente com outros subtipos, a que tende a apresentar o inicio mais precoce da doença, o pior funcionamento social e ocupacional e o curso mais crónico152. Trata-se, assim, do subtipo menos comum das cinco formas indicadas, pelo menos nos países desenvolvidos e industrializados, ainda que se mantenha frequente noutras populações como as Africanas.

Em termos clínicos a esquizofrenia catatónica manifesta-se por, pelo menos, dois dos seguintes sintomas psicomotores característicos: acinesia (catalepsia ou estupor); agitação extrema; negativismo intenso ou mutismo; peculiaridades dos movimentos voluntários (por exemplo, estereotipias, maneirismos, caretas); ecolália ou ecopráxia, e por perturbações da vontade e da esfera emocional, exigindo-se presença concomitante de sintomas típicos da esquizofrenia.

Sintomas catatónicos isolados não são específicos desta perturbação, aparecendo também noutros subtipos da esquizofrenia, nas perturbações do humor (episódios depressivos major ou maníacos); noutras perturbações psicóticas; nas doenças orgânicas cerebrais (por exemplo, tumores do lobo frontal, encefalite letárgica, traumatismo craniano, doença cerebrovascular); nas afecções médicas de causa metabólica (como, por exemplo, cetoacidose diabética, encefalopatia hepática, urémia, hipercalcémia, doença de Wilson, porfíria aguda intermitente) ou serem induzidas por substâncias (por exemplo parkinsonismo iatrogénio de causa neuroléptica) e daí a necessidade da esquizofrenia catatónica ser diagnosticada com cuidado, sobretudo nos casos do primeiro episódio psicótico153.

4.4.2.2.4. Esquizofrenia indiferenciada

Entidade clínica na qual os sintomas específicos da esquizofrenia estão preenchidos mas que não satisfazem os critérios para os tipos paranóide, hebefrénico (desorganizado) ou catatónico. A experiencia clínica actual tem demonstrado que as

152

Cf. KENDLER, et al., “Outcome and family study of the subtipes of schizophrenia in the West of

Irland” (1994), in American Journal of Psychiatry, 151, pp. 849-856. Citado por J. C. DIAS CORDEIRO

in “Psiquiatria Forense” (2008), p. 389.

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formas indiferenciadas e paranóides têm vindo a aumentar sobretudo nos países desenvolvidos154.

4.4.2.2.5. Esquizofrenia residual

Manifesta-se pela existência no quadro clínico actual de sintomas negativos (que são comuns) podendo o doente encontrar-se em remissão da sintomatologia psicótica positiva proeminente – como por exemplo: delírios, alucinações, discurso ou comportamento desorganizado – ou apresentar dois ou mais dos sintomas da esquizofrenia mas de forma atenuada tais como, crenças estranhas, leve afrouxamento da associação das ideias, pensamento ilógico e comportamento estranho155.

4.4.2.2.6. Esquizofrenia simples

Para além das categorias anteriormente apresentadas, temos ainda a considerar o tipo simples, descrito por BLEULER, embora seja discutível a sua existência. Assim o DSM IV apenas a inclui em apêndice, por se encontrar em fase de estudo, e designa-a por perturbação deterioração simples. A ICD 10 considera-a, aconselhando no entanto muita prudência no seu diagnóstico que é praticamente de exclusão.

Trata-se de um tipo de esquizofrenia que se inicia, habitualmente, no fim da adolescência, e que se desenvolve de maneira insidiosa, normalmente, após um breve sobressalto psicótico, sem sintomatologia produtiva, estabelecendo a transição entre a personalidade esquizóide ou a esquizotipica e a esquizofrenia com predomínio de sintomas negativos desde o inicio. É uma forma semelhante ao tipo residual mas sem a existência prévia de sintomas psicóticos positivos e com uma evolução para uma deterioração funcional grave.

Estes doentes revelam uma total falta de consciência da alteração e desagregação da personalidade, aceitando com a maior naturalidade a ruína familiar, profissional e social das suas vidas. Permanecem isolados, abúlicos e incapazes de tomar decisões, mantendo um contacto social frouxo e um relacionamento superficial com o sexo oposto. Raramente vêm ao médico, deambulam habitualmente pelas ruas, podendo ser

154 Cit. XAVIER VIERA, “Manual de Psiquiatria Clínica” (2009), p. 633. 155 Cit. J. C. DIAS CORDEIRO, “Psiquiatria Forense” (2008), p. 390.

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aproveitados por grupos marginais, cometendo pequenos crimes, burlas, etc. Episódios irracionais de fúria podem surgir, levando-os a executarem crimes extremamente brutais, consumados fria e isoladamente156.

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